É o fim da linha para as criptomoedas? Leia o artigo


Parece provável que o setor não consiga sobreviver à necessidade de regulação

Por Paul Krugman

THE NEW YORK TIMES - Acontecimentos recentes deixaram clara a necessidade de regulação dos criptoativos, uma indústria que cresceu do zero até uma capitalização de mercado de US$ 3 trilhões um ano atrás, apesar de a maior parte disso já ter evaporado. Mas também parece provável que o setor não consiga sobreviver à regulação.

A história até aqui: os criptoativos atingiram seu auge de proeminência pública no ano passado, quando um comercial no estilo “a sorte favorece os corajosos” de Matt Damon – patrocinado pela casa de câmbio digital Crypto.com, com base em Cingapura – foi ao ar pela primeira vez. Naquele momento, 1 bitcoin valia mais de US$ 60 mil.

Depois de 14 anos, as criptomoedas quase não avançaram enquanto substitutas para o papel tradicional do dinheiro Foto: Dado Ruvic/Reuters
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Agora, vale menos de US$ 17 mil. Então, pessoas que compraram a criptomoeda depois do comercial de Damon perderam mais de 70%. De fato, já que a maioria das pessoas que compraram bitcoin o fez quando o valor estava alto, a maior parte dos investidores na criptomoeda – cerca de três quartos, de acordo com uma nova análise do Banco de Compensações Internacionais – perdeu dinheiro até aqui.

Ainda assim, valores de ativos despencam o tempo todo. Pessoas que compraram ações da Meta, a empresa anteriormente conhecida como Facebook, em seu pico, no ano passado, tiveram perdas similares às dos investidores em bitcoin.

Portanto, valores em queda não significam que as criptomoedas estão arruinadas. Os defensores dos criptoativos certamente não desistirão. De acordo com uma reportagem do Washington Post, muitos assinantes do selo Twitter Blue Verified, a desastrosa (e agora em suspensão) tentativa de Elon Musk de tirar dinheiro dos usuários do Twitter, foram perfis que divulgam posições políticas de direita, pornografia e especulação em criptomoedas.

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Mais revelador do que os valores dos criptoativos tem sido o colapso das plataformas de corretagem das moedas digitais. Recentemente, a FTX, uma das maiores casas de criptoativos, pediu recuperação judicial – e parece que os indivíduos que administram a plataforma simplesmente saquearam bilhões de dólares dos investidores, provavelmente usando os fundos em um esforço fracassado para impulsionar a Alameda Research, sua empresa-irmã.

A pergunta que deveríamos fazer é: por que firmas como FTX ou Terra (a dita cunhadora de stablecoins que colapsou em maio) foram criadas?

Afinal, o estudo técnico que iniciou o movimento das criptomoedas, em 2008, assinado pelo pseudônimo Satoshi Nakamoto, foi intitulado “Bitcoin: um sistema de dinheiro eletrônico p2p”. Ou seja, a ideia era que tokens eletrônicos cuja validade era estabelecida com técnicas emprestadas da criptografia tornariam possível às pessoas evitar instituições financeiras. Se você quisesse transferir fundos para alguém, poderia simplesmente mandar-lhe um número, uma chave, sem a necessidade de depender de um Citigroup ou Santander para realizar a transação.

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Nunca ficou claro exatamente por que qualquer indivíduo a não ser algum criminoso gostaria de fazer isso. Apesar de defensores dos criptoativos apontarem com frequência para a crise financeira de 2008 como motivação para seu trabalho, essa crise nunca prejudicou o sistema de pagamentos – a capacidade dos indivíduos de transferir dinheiro por meio de bancos. Ainda assim, a ideia de um sistema monetário que não requereria confiança em instituições financeiras era interessante e, podia-se argumentar, merecia uma tentativa.

Poucos avanços

Depois de 14 anos, porém, as criptomoedas quase não avançaram enquanto substitutas para o papel tradicional do dinheiro. São desajeitadas demais para o uso em transações comuns. Seu valor é instável demais. Poucos investidores aceitam manter suas chaves de criptomoedas consigo mesmos – é arriscado demais perdê-las, digamos, instalando-as em algum dispositivo de armazenamento.

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As criptomoedas são compradas principalmente por meio de plataformas de câmbio como Coinbase e, sim, FTX, que pegam o dinheiro dos usuários e mantêm tokens de criptoativos em seu nome.

Confiança

Essas casas de câmbio são – adivinhe só – instituições financeiras, cuja capacidade de atrair investidores depende – adivinhe outra vez – da confiança dos investidores. Em outras palavras, o ecossistema cripto basicamente evoluiu para se tornar exatamente aquilo que deveria substituir: um sistema financeiro de intermediários cuja capacidade de operar depende da percepção de confiabilidade que eles detêm.

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Já que é assim, qual o sentido disso? Por que uma indústria que, na melhor das hipóteses, simplesmente repetiu o sistema bancário convencional tem qualquer valor fundamental?

Além disso, a confiança nas instituições financeiras decorre em parte da validação do Tio Sam: o governo americano supervisiona bancos, regula os riscos que eles podem assumir e garante muitos depósitos; enquanto os criptoativos operam amplamente sem supervisão. Investidores têm de confiar na honestidade e na competência de empreendedores; quando eles oferecem negócios excepcionalmente rentáveis, os investidores devem acreditar não apenas em sua competência, mas também em sua genialidade.

Conforme os defensores dos criptoativos adoram nos recordar, previsões anteriores a respeito do declínio do setor não se concretizaram. Realmente, o fato de que bitcoins e seus competidores não são verdadeiramente usáveis como dinheiro vivo não precisa significar que as criptomoedas não tenham nenhum valor – afinal, é possível afirmar o mesmo a respeito do ouro.

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Mas, se o governo finalmente se movimentar para regular as firmas cripto, o que evitaria, entre outras coisas, que elas prometessem retornos impossíveis de entregar, é difícil ver que vantagem essas empresas teriam em relação aos bancos comuns. Mesmo se o valor do bitcoin não chegar a zero (o que ainda pode ocorrer), há um argumento forte sustentando que a indústria cripto, que voou tão alto poucos meses atrás, está fadada ao esquecimento. /TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

THE NEW YORK TIMES - Acontecimentos recentes deixaram clara a necessidade de regulação dos criptoativos, uma indústria que cresceu do zero até uma capitalização de mercado de US$ 3 trilhões um ano atrás, apesar de a maior parte disso já ter evaporado. Mas também parece provável que o setor não consiga sobreviver à regulação.

A história até aqui: os criptoativos atingiram seu auge de proeminência pública no ano passado, quando um comercial no estilo “a sorte favorece os corajosos” de Matt Damon – patrocinado pela casa de câmbio digital Crypto.com, com base em Cingapura – foi ao ar pela primeira vez. Naquele momento, 1 bitcoin valia mais de US$ 60 mil.

Depois de 14 anos, as criptomoedas quase não avançaram enquanto substitutas para o papel tradicional do dinheiro Foto: Dado Ruvic/Reuters

Agora, vale menos de US$ 17 mil. Então, pessoas que compraram a criptomoeda depois do comercial de Damon perderam mais de 70%. De fato, já que a maioria das pessoas que compraram bitcoin o fez quando o valor estava alto, a maior parte dos investidores na criptomoeda – cerca de três quartos, de acordo com uma nova análise do Banco de Compensações Internacionais – perdeu dinheiro até aqui.

Ainda assim, valores de ativos despencam o tempo todo. Pessoas que compraram ações da Meta, a empresa anteriormente conhecida como Facebook, em seu pico, no ano passado, tiveram perdas similares às dos investidores em bitcoin.

Portanto, valores em queda não significam que as criptomoedas estão arruinadas. Os defensores dos criptoativos certamente não desistirão. De acordo com uma reportagem do Washington Post, muitos assinantes do selo Twitter Blue Verified, a desastrosa (e agora em suspensão) tentativa de Elon Musk de tirar dinheiro dos usuários do Twitter, foram perfis que divulgam posições políticas de direita, pornografia e especulação em criptomoedas.

Mais revelador do que os valores dos criptoativos tem sido o colapso das plataformas de corretagem das moedas digitais. Recentemente, a FTX, uma das maiores casas de criptoativos, pediu recuperação judicial – e parece que os indivíduos que administram a plataforma simplesmente saquearam bilhões de dólares dos investidores, provavelmente usando os fundos em um esforço fracassado para impulsionar a Alameda Research, sua empresa-irmã.

A pergunta que deveríamos fazer é: por que firmas como FTX ou Terra (a dita cunhadora de stablecoins que colapsou em maio) foram criadas?

Afinal, o estudo técnico que iniciou o movimento das criptomoedas, em 2008, assinado pelo pseudônimo Satoshi Nakamoto, foi intitulado “Bitcoin: um sistema de dinheiro eletrônico p2p”. Ou seja, a ideia era que tokens eletrônicos cuja validade era estabelecida com técnicas emprestadas da criptografia tornariam possível às pessoas evitar instituições financeiras. Se você quisesse transferir fundos para alguém, poderia simplesmente mandar-lhe um número, uma chave, sem a necessidade de depender de um Citigroup ou Santander para realizar a transação.

Nunca ficou claro exatamente por que qualquer indivíduo a não ser algum criminoso gostaria de fazer isso. Apesar de defensores dos criptoativos apontarem com frequência para a crise financeira de 2008 como motivação para seu trabalho, essa crise nunca prejudicou o sistema de pagamentos – a capacidade dos indivíduos de transferir dinheiro por meio de bancos. Ainda assim, a ideia de um sistema monetário que não requereria confiança em instituições financeiras era interessante e, podia-se argumentar, merecia uma tentativa.

Poucos avanços

Depois de 14 anos, porém, as criptomoedas quase não avançaram enquanto substitutas para o papel tradicional do dinheiro. São desajeitadas demais para o uso em transações comuns. Seu valor é instável demais. Poucos investidores aceitam manter suas chaves de criptomoedas consigo mesmos – é arriscado demais perdê-las, digamos, instalando-as em algum dispositivo de armazenamento.

As criptomoedas são compradas principalmente por meio de plataformas de câmbio como Coinbase e, sim, FTX, que pegam o dinheiro dos usuários e mantêm tokens de criptoativos em seu nome.

Confiança

Essas casas de câmbio são – adivinhe só – instituições financeiras, cuja capacidade de atrair investidores depende – adivinhe outra vez – da confiança dos investidores. Em outras palavras, o ecossistema cripto basicamente evoluiu para se tornar exatamente aquilo que deveria substituir: um sistema financeiro de intermediários cuja capacidade de operar depende da percepção de confiabilidade que eles detêm.

Já que é assim, qual o sentido disso? Por que uma indústria que, na melhor das hipóteses, simplesmente repetiu o sistema bancário convencional tem qualquer valor fundamental?

Além disso, a confiança nas instituições financeiras decorre em parte da validação do Tio Sam: o governo americano supervisiona bancos, regula os riscos que eles podem assumir e garante muitos depósitos; enquanto os criptoativos operam amplamente sem supervisão. Investidores têm de confiar na honestidade e na competência de empreendedores; quando eles oferecem negócios excepcionalmente rentáveis, os investidores devem acreditar não apenas em sua competência, mas também em sua genialidade.

Conforme os defensores dos criptoativos adoram nos recordar, previsões anteriores a respeito do declínio do setor não se concretizaram. Realmente, o fato de que bitcoins e seus competidores não são verdadeiramente usáveis como dinheiro vivo não precisa significar que as criptomoedas não tenham nenhum valor – afinal, é possível afirmar o mesmo a respeito do ouro.

Mas, se o governo finalmente se movimentar para regular as firmas cripto, o que evitaria, entre outras coisas, que elas prometessem retornos impossíveis de entregar, é difícil ver que vantagem essas empresas teriam em relação aos bancos comuns. Mesmo se o valor do bitcoin não chegar a zero (o que ainda pode ocorrer), há um argumento forte sustentando que a indústria cripto, que voou tão alto poucos meses atrás, está fadada ao esquecimento. /TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

THE NEW YORK TIMES - Acontecimentos recentes deixaram clara a necessidade de regulação dos criptoativos, uma indústria que cresceu do zero até uma capitalização de mercado de US$ 3 trilhões um ano atrás, apesar de a maior parte disso já ter evaporado. Mas também parece provável que o setor não consiga sobreviver à regulação.

A história até aqui: os criptoativos atingiram seu auge de proeminência pública no ano passado, quando um comercial no estilo “a sorte favorece os corajosos” de Matt Damon – patrocinado pela casa de câmbio digital Crypto.com, com base em Cingapura – foi ao ar pela primeira vez. Naquele momento, 1 bitcoin valia mais de US$ 60 mil.

Depois de 14 anos, as criptomoedas quase não avançaram enquanto substitutas para o papel tradicional do dinheiro Foto: Dado Ruvic/Reuters

Agora, vale menos de US$ 17 mil. Então, pessoas que compraram a criptomoeda depois do comercial de Damon perderam mais de 70%. De fato, já que a maioria das pessoas que compraram bitcoin o fez quando o valor estava alto, a maior parte dos investidores na criptomoeda – cerca de três quartos, de acordo com uma nova análise do Banco de Compensações Internacionais – perdeu dinheiro até aqui.

Ainda assim, valores de ativos despencam o tempo todo. Pessoas que compraram ações da Meta, a empresa anteriormente conhecida como Facebook, em seu pico, no ano passado, tiveram perdas similares às dos investidores em bitcoin.

Portanto, valores em queda não significam que as criptomoedas estão arruinadas. Os defensores dos criptoativos certamente não desistirão. De acordo com uma reportagem do Washington Post, muitos assinantes do selo Twitter Blue Verified, a desastrosa (e agora em suspensão) tentativa de Elon Musk de tirar dinheiro dos usuários do Twitter, foram perfis que divulgam posições políticas de direita, pornografia e especulação em criptomoedas.

Mais revelador do que os valores dos criptoativos tem sido o colapso das plataformas de corretagem das moedas digitais. Recentemente, a FTX, uma das maiores casas de criptoativos, pediu recuperação judicial – e parece que os indivíduos que administram a plataforma simplesmente saquearam bilhões de dólares dos investidores, provavelmente usando os fundos em um esforço fracassado para impulsionar a Alameda Research, sua empresa-irmã.

A pergunta que deveríamos fazer é: por que firmas como FTX ou Terra (a dita cunhadora de stablecoins que colapsou em maio) foram criadas?

Afinal, o estudo técnico que iniciou o movimento das criptomoedas, em 2008, assinado pelo pseudônimo Satoshi Nakamoto, foi intitulado “Bitcoin: um sistema de dinheiro eletrônico p2p”. Ou seja, a ideia era que tokens eletrônicos cuja validade era estabelecida com técnicas emprestadas da criptografia tornariam possível às pessoas evitar instituições financeiras. Se você quisesse transferir fundos para alguém, poderia simplesmente mandar-lhe um número, uma chave, sem a necessidade de depender de um Citigroup ou Santander para realizar a transação.

Nunca ficou claro exatamente por que qualquer indivíduo a não ser algum criminoso gostaria de fazer isso. Apesar de defensores dos criptoativos apontarem com frequência para a crise financeira de 2008 como motivação para seu trabalho, essa crise nunca prejudicou o sistema de pagamentos – a capacidade dos indivíduos de transferir dinheiro por meio de bancos. Ainda assim, a ideia de um sistema monetário que não requereria confiança em instituições financeiras era interessante e, podia-se argumentar, merecia uma tentativa.

Poucos avanços

Depois de 14 anos, porém, as criptomoedas quase não avançaram enquanto substitutas para o papel tradicional do dinheiro. São desajeitadas demais para o uso em transações comuns. Seu valor é instável demais. Poucos investidores aceitam manter suas chaves de criptomoedas consigo mesmos – é arriscado demais perdê-las, digamos, instalando-as em algum dispositivo de armazenamento.

As criptomoedas são compradas principalmente por meio de plataformas de câmbio como Coinbase e, sim, FTX, que pegam o dinheiro dos usuários e mantêm tokens de criptoativos em seu nome.

Confiança

Essas casas de câmbio são – adivinhe só – instituições financeiras, cuja capacidade de atrair investidores depende – adivinhe outra vez – da confiança dos investidores. Em outras palavras, o ecossistema cripto basicamente evoluiu para se tornar exatamente aquilo que deveria substituir: um sistema financeiro de intermediários cuja capacidade de operar depende da percepção de confiabilidade que eles detêm.

Já que é assim, qual o sentido disso? Por que uma indústria que, na melhor das hipóteses, simplesmente repetiu o sistema bancário convencional tem qualquer valor fundamental?

Além disso, a confiança nas instituições financeiras decorre em parte da validação do Tio Sam: o governo americano supervisiona bancos, regula os riscos que eles podem assumir e garante muitos depósitos; enquanto os criptoativos operam amplamente sem supervisão. Investidores têm de confiar na honestidade e na competência de empreendedores; quando eles oferecem negócios excepcionalmente rentáveis, os investidores devem acreditar não apenas em sua competência, mas também em sua genialidade.

Conforme os defensores dos criptoativos adoram nos recordar, previsões anteriores a respeito do declínio do setor não se concretizaram. Realmente, o fato de que bitcoins e seus competidores não são verdadeiramente usáveis como dinheiro vivo não precisa significar que as criptomoedas não tenham nenhum valor – afinal, é possível afirmar o mesmo a respeito do ouro.

Mas, se o governo finalmente se movimentar para regular as firmas cripto, o que evitaria, entre outras coisas, que elas prometessem retornos impossíveis de entregar, é difícil ver que vantagem essas empresas teriam em relação aos bancos comuns. Mesmo se o valor do bitcoin não chegar a zero (o que ainda pode ocorrer), há um argumento forte sustentando que a indústria cripto, que voou tão alto poucos meses atrás, está fadada ao esquecimento. /TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

THE NEW YORK TIMES - Acontecimentos recentes deixaram clara a necessidade de regulação dos criptoativos, uma indústria que cresceu do zero até uma capitalização de mercado de US$ 3 trilhões um ano atrás, apesar de a maior parte disso já ter evaporado. Mas também parece provável que o setor não consiga sobreviver à regulação.

A história até aqui: os criptoativos atingiram seu auge de proeminência pública no ano passado, quando um comercial no estilo “a sorte favorece os corajosos” de Matt Damon – patrocinado pela casa de câmbio digital Crypto.com, com base em Cingapura – foi ao ar pela primeira vez. Naquele momento, 1 bitcoin valia mais de US$ 60 mil.

Depois de 14 anos, as criptomoedas quase não avançaram enquanto substitutas para o papel tradicional do dinheiro Foto: Dado Ruvic/Reuters

Agora, vale menos de US$ 17 mil. Então, pessoas que compraram a criptomoeda depois do comercial de Damon perderam mais de 70%. De fato, já que a maioria das pessoas que compraram bitcoin o fez quando o valor estava alto, a maior parte dos investidores na criptomoeda – cerca de três quartos, de acordo com uma nova análise do Banco de Compensações Internacionais – perdeu dinheiro até aqui.

Ainda assim, valores de ativos despencam o tempo todo. Pessoas que compraram ações da Meta, a empresa anteriormente conhecida como Facebook, em seu pico, no ano passado, tiveram perdas similares às dos investidores em bitcoin.

Portanto, valores em queda não significam que as criptomoedas estão arruinadas. Os defensores dos criptoativos certamente não desistirão. De acordo com uma reportagem do Washington Post, muitos assinantes do selo Twitter Blue Verified, a desastrosa (e agora em suspensão) tentativa de Elon Musk de tirar dinheiro dos usuários do Twitter, foram perfis que divulgam posições políticas de direita, pornografia e especulação em criptomoedas.

Mais revelador do que os valores dos criptoativos tem sido o colapso das plataformas de corretagem das moedas digitais. Recentemente, a FTX, uma das maiores casas de criptoativos, pediu recuperação judicial – e parece que os indivíduos que administram a plataforma simplesmente saquearam bilhões de dólares dos investidores, provavelmente usando os fundos em um esforço fracassado para impulsionar a Alameda Research, sua empresa-irmã.

A pergunta que deveríamos fazer é: por que firmas como FTX ou Terra (a dita cunhadora de stablecoins que colapsou em maio) foram criadas?

Afinal, o estudo técnico que iniciou o movimento das criptomoedas, em 2008, assinado pelo pseudônimo Satoshi Nakamoto, foi intitulado “Bitcoin: um sistema de dinheiro eletrônico p2p”. Ou seja, a ideia era que tokens eletrônicos cuja validade era estabelecida com técnicas emprestadas da criptografia tornariam possível às pessoas evitar instituições financeiras. Se você quisesse transferir fundos para alguém, poderia simplesmente mandar-lhe um número, uma chave, sem a necessidade de depender de um Citigroup ou Santander para realizar a transação.

Nunca ficou claro exatamente por que qualquer indivíduo a não ser algum criminoso gostaria de fazer isso. Apesar de defensores dos criptoativos apontarem com frequência para a crise financeira de 2008 como motivação para seu trabalho, essa crise nunca prejudicou o sistema de pagamentos – a capacidade dos indivíduos de transferir dinheiro por meio de bancos. Ainda assim, a ideia de um sistema monetário que não requereria confiança em instituições financeiras era interessante e, podia-se argumentar, merecia uma tentativa.

Poucos avanços

Depois de 14 anos, porém, as criptomoedas quase não avançaram enquanto substitutas para o papel tradicional do dinheiro. São desajeitadas demais para o uso em transações comuns. Seu valor é instável demais. Poucos investidores aceitam manter suas chaves de criptomoedas consigo mesmos – é arriscado demais perdê-las, digamos, instalando-as em algum dispositivo de armazenamento.

As criptomoedas são compradas principalmente por meio de plataformas de câmbio como Coinbase e, sim, FTX, que pegam o dinheiro dos usuários e mantêm tokens de criptoativos em seu nome.

Confiança

Essas casas de câmbio são – adivinhe só – instituições financeiras, cuja capacidade de atrair investidores depende – adivinhe outra vez – da confiança dos investidores. Em outras palavras, o ecossistema cripto basicamente evoluiu para se tornar exatamente aquilo que deveria substituir: um sistema financeiro de intermediários cuja capacidade de operar depende da percepção de confiabilidade que eles detêm.

Já que é assim, qual o sentido disso? Por que uma indústria que, na melhor das hipóteses, simplesmente repetiu o sistema bancário convencional tem qualquer valor fundamental?

Além disso, a confiança nas instituições financeiras decorre em parte da validação do Tio Sam: o governo americano supervisiona bancos, regula os riscos que eles podem assumir e garante muitos depósitos; enquanto os criptoativos operam amplamente sem supervisão. Investidores têm de confiar na honestidade e na competência de empreendedores; quando eles oferecem negócios excepcionalmente rentáveis, os investidores devem acreditar não apenas em sua competência, mas também em sua genialidade.

Conforme os defensores dos criptoativos adoram nos recordar, previsões anteriores a respeito do declínio do setor não se concretizaram. Realmente, o fato de que bitcoins e seus competidores não são verdadeiramente usáveis como dinheiro vivo não precisa significar que as criptomoedas não tenham nenhum valor – afinal, é possível afirmar o mesmo a respeito do ouro.

Mas, se o governo finalmente se movimentar para regular as firmas cripto, o que evitaria, entre outras coisas, que elas prometessem retornos impossíveis de entregar, é difícil ver que vantagem essas empresas teriam em relação aos bancos comuns. Mesmo se o valor do bitcoin não chegar a zero (o que ainda pode ocorrer), há um argumento forte sustentando que a indústria cripto, que voou tão alto poucos meses atrás, está fadada ao esquecimento. /TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

THE NEW YORK TIMES - Acontecimentos recentes deixaram clara a necessidade de regulação dos criptoativos, uma indústria que cresceu do zero até uma capitalização de mercado de US$ 3 trilhões um ano atrás, apesar de a maior parte disso já ter evaporado. Mas também parece provável que o setor não consiga sobreviver à regulação.

A história até aqui: os criptoativos atingiram seu auge de proeminência pública no ano passado, quando um comercial no estilo “a sorte favorece os corajosos” de Matt Damon – patrocinado pela casa de câmbio digital Crypto.com, com base em Cingapura – foi ao ar pela primeira vez. Naquele momento, 1 bitcoin valia mais de US$ 60 mil.

Depois de 14 anos, as criptomoedas quase não avançaram enquanto substitutas para o papel tradicional do dinheiro Foto: Dado Ruvic/Reuters

Agora, vale menos de US$ 17 mil. Então, pessoas que compraram a criptomoeda depois do comercial de Damon perderam mais de 70%. De fato, já que a maioria das pessoas que compraram bitcoin o fez quando o valor estava alto, a maior parte dos investidores na criptomoeda – cerca de três quartos, de acordo com uma nova análise do Banco de Compensações Internacionais – perdeu dinheiro até aqui.

Ainda assim, valores de ativos despencam o tempo todo. Pessoas que compraram ações da Meta, a empresa anteriormente conhecida como Facebook, em seu pico, no ano passado, tiveram perdas similares às dos investidores em bitcoin.

Portanto, valores em queda não significam que as criptomoedas estão arruinadas. Os defensores dos criptoativos certamente não desistirão. De acordo com uma reportagem do Washington Post, muitos assinantes do selo Twitter Blue Verified, a desastrosa (e agora em suspensão) tentativa de Elon Musk de tirar dinheiro dos usuários do Twitter, foram perfis que divulgam posições políticas de direita, pornografia e especulação em criptomoedas.

Mais revelador do que os valores dos criptoativos tem sido o colapso das plataformas de corretagem das moedas digitais. Recentemente, a FTX, uma das maiores casas de criptoativos, pediu recuperação judicial – e parece que os indivíduos que administram a plataforma simplesmente saquearam bilhões de dólares dos investidores, provavelmente usando os fundos em um esforço fracassado para impulsionar a Alameda Research, sua empresa-irmã.

A pergunta que deveríamos fazer é: por que firmas como FTX ou Terra (a dita cunhadora de stablecoins que colapsou em maio) foram criadas?

Afinal, o estudo técnico que iniciou o movimento das criptomoedas, em 2008, assinado pelo pseudônimo Satoshi Nakamoto, foi intitulado “Bitcoin: um sistema de dinheiro eletrônico p2p”. Ou seja, a ideia era que tokens eletrônicos cuja validade era estabelecida com técnicas emprestadas da criptografia tornariam possível às pessoas evitar instituições financeiras. Se você quisesse transferir fundos para alguém, poderia simplesmente mandar-lhe um número, uma chave, sem a necessidade de depender de um Citigroup ou Santander para realizar a transação.

Nunca ficou claro exatamente por que qualquer indivíduo a não ser algum criminoso gostaria de fazer isso. Apesar de defensores dos criptoativos apontarem com frequência para a crise financeira de 2008 como motivação para seu trabalho, essa crise nunca prejudicou o sistema de pagamentos – a capacidade dos indivíduos de transferir dinheiro por meio de bancos. Ainda assim, a ideia de um sistema monetário que não requereria confiança em instituições financeiras era interessante e, podia-se argumentar, merecia uma tentativa.

Poucos avanços

Depois de 14 anos, porém, as criptomoedas quase não avançaram enquanto substitutas para o papel tradicional do dinheiro. São desajeitadas demais para o uso em transações comuns. Seu valor é instável demais. Poucos investidores aceitam manter suas chaves de criptomoedas consigo mesmos – é arriscado demais perdê-las, digamos, instalando-as em algum dispositivo de armazenamento.

As criptomoedas são compradas principalmente por meio de plataformas de câmbio como Coinbase e, sim, FTX, que pegam o dinheiro dos usuários e mantêm tokens de criptoativos em seu nome.

Confiança

Essas casas de câmbio são – adivinhe só – instituições financeiras, cuja capacidade de atrair investidores depende – adivinhe outra vez – da confiança dos investidores. Em outras palavras, o ecossistema cripto basicamente evoluiu para se tornar exatamente aquilo que deveria substituir: um sistema financeiro de intermediários cuja capacidade de operar depende da percepção de confiabilidade que eles detêm.

Já que é assim, qual o sentido disso? Por que uma indústria que, na melhor das hipóteses, simplesmente repetiu o sistema bancário convencional tem qualquer valor fundamental?

Além disso, a confiança nas instituições financeiras decorre em parte da validação do Tio Sam: o governo americano supervisiona bancos, regula os riscos que eles podem assumir e garante muitos depósitos; enquanto os criptoativos operam amplamente sem supervisão. Investidores têm de confiar na honestidade e na competência de empreendedores; quando eles oferecem negócios excepcionalmente rentáveis, os investidores devem acreditar não apenas em sua competência, mas também em sua genialidade.

Conforme os defensores dos criptoativos adoram nos recordar, previsões anteriores a respeito do declínio do setor não se concretizaram. Realmente, o fato de que bitcoins e seus competidores não são verdadeiramente usáveis como dinheiro vivo não precisa significar que as criptomoedas não tenham nenhum valor – afinal, é possível afirmar o mesmo a respeito do ouro.

Mas, se o governo finalmente se movimentar para regular as firmas cripto, o que evitaria, entre outras coisas, que elas prometessem retornos impossíveis de entregar, é difícil ver que vantagem essas empresas teriam em relação aos bancos comuns. Mesmo se o valor do bitcoin não chegar a zero (o que ainda pode ocorrer), há um argumento forte sustentando que a indústria cripto, que voou tão alto poucos meses atrás, está fadada ao esquecimento. /TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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