Há um ano, Bolsonaro sancionava o Auxílio Brasil. Seu valor médio estava previsto em cerca de R$ 240, um aumento em relação aos R$ 200 pagos no Bolsa Família. De lá para cá, foi tornado permanente um piso mínimo de R$ 400 – elevado temporariamente para R$ 600. Lula e Bolsonaro prometeram tornar estes R$ 600 permanentes, com o petista indicando ainda um adicional de R$ 150 por criança na primeira infância.
É um aumento considerável. Veja que o piso antes da pandemia era de cerca de R$ 50 para o Bolsa Família. Além do valor pago, o público cresceu significativamente. Com isso, saímos do orçamento anual do Bolsa Família de cerca de R$ 35 bilhões pré-covid para algo entre R$ 150 bilhões e R$ 200 bilhões – cerca de 5 vezes mais.
O Auxílio cresceu demais? Se alguém dissesse há poucos anos que teríamos tamanho orçamento para as transferências de renda na assistência social, qualquer especialista apontaria o número como uma quimera. O desafio agora é usar da melhor forma. Muita coisa no Auxílio Brasil não faz sentido.
A começar pelo piso, que na prática implica valor único de R$ 600. Vale para um homem que ganha renda de trabalho informal e vive sozinho ou para uma mãe desempregada com várias crianças.
Será melhor reduzir o piso e permitir que o valor oscile – para que, em famílias mais numerosas, o valor seja maior (redistribuindo as transferências per capita). Os R$ 600 como valor único foram um modelo escolhido para marketing, não para minimizar os indicadores de pobreza.
Os critérios para receber o Auxílio também deixaram de fazer sentido à medida que ele cresceu. Um domicílio que por pouco não satisfaz a linha de corte para o programa, receberá zero, enquanto outro receberá os R$ 600.
Também porque a renda das famílias mais pobres flutua muito, limites rígidos podem não ser ideais para entrar em programas sociais. Principalmente em um programa com orçamento tão robusto, não é racional manter o apego aos R$ 600. Melhor seria ampliar a cobertura, tornando mais flexíveis os limites de entrada, e calibrar o valor do benefício. Para um mesmo orçamento, mais famílias atendidas.
Na metade mais pobre dos brasileiros estão várias crianças cujas famílias não recebem nenhum benefício, por não serem tão vulneráveis a ponto de cair nas linhas da assistência. Uma boa ambição seria transformar o Auxílio em uma renda infantil semiuniversal, como já existe em muitos países. Há desenhos superiores ao nosso. Os R$ 600 como número cabalístico precisa ser abandonado.