O treinamento do economista tem exercícios matemáticos, cabeludos, de “otimização”. Para encontrar um número que é o ponto ótimo, ideal, para um problema. Afinal, empresas precisam calibrar o preço para maximizar o lucro: ele deve ser alto, mas não tão alto a ponto de inibir as vendas. Governos querem arrecadar: mas, se a alíquota do imposto for elevada demais, a sonegação e a elisão derrubarão a receita. Daí, a busca pelo “ótimo”. Nem pouco, nem muito.
Veja: o ministro Barroso suspendeu o piso salarial da enfermagem, aprovado no Congresso – que teve o cuidado de emendar a Constituição para prever o piso. Mas Barroso aponta que o piso constitucional pode ser inconstitucional.
Os efeitos adversos provocados pelo aumento do custo com esses profissionais prejudicariam o direito à saúde – pela decisão. Por exemplo, fechamento de leitos, de hospitais, demissões. O Supremo reunirá, assim, informação de diversos atores para examinar se esses impactos impedem a aplicação do piso.
Já seria complicado conseguir PhDs em economia para concordar sobre se os efeitos líquidos do piso serão positivos para a sociedade ou como esses efeitos se distribuirão no tempo. O piso, claro, pressiona custos, mas contribui para atrair melhor mão de obra para a carreira. Pense em um vestibulando inteligente que não passava em medicina e não via futuro promissor na enfermagem, mas muda de ideia.
Eventual falência dos hospitais pode também não ser considerada negativa por alguns economistas: o hospital que quebra libera imóvel, capital físico e capital humano para ser empregado eventualmente por operações mais eficientes. Não caberia ao Estado trabalhar contra essa “destruição criativa”. Já outros argumentariam que a quebradeira concentraria o setor, que subiria os preços.
Difícil saber quem está certo, são muitas equações, e os efeitos dependem do tempo. Mas é fascinante que o STF possa considerar uma lei inconstitucional mesmo prevista na Constituição: estaria, assim, fazendo o controle de constitucionalidade de um parâmetro. De um número. Neste caso, lê-se que o piso pode ser, sim, criado – mas não pode ser alto demais a ponto de ter efeitos adversos fortes. Em economês, o Supremo quer o ponto ótimo.
Tem expertise para isso? O desafio de encontrar a “dose certa” está em boa parte de nossas maiores questões – do valor ótimo para o salário mínimo ao da tributação de lucros e dividendos. O Parlamento parece mais vocacionado para exercícios de otimização do que uma corte constitucional.