Petrobras: Como fica venda de ativos com a queda de braço entre governo e empresa


Lula tem pedido a suspensão imediata das vendas, mas há pelo menos 23 negócios já em estágio adiantado; ruído tem provocado impacto nas ações da estatal e das empresas compradoras

Por Denise Luna e Gabriel Vasconcelos
Atualização:

RIO - A Petrobras tem assistido a uma queda de braço interna sobre a venda de ativos à iniciativa privada. De um lado estão a diretoria e o Conselho de Administração da estatal que, formados no governo anterior, pregam ao menos a conclusão das vendas que já tiveram contratos assinados e aguardam o chamado fechamento (closing) dos negócios, com a transferência das operações. Do outro lado, o novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem cobrado, até publicamente, a suspensão imediata dos 23 processos em andamento que constam do portfólio de desinvestimento da estatal. O governo, no entanto, não deixa claro quais ativos deseja que fiquem com a empresa, uma dúvida que deve durar até a próxima Assembleia Geral Ordinária (AGO), prevista para 27 de abril.

Lula disse ter determinado a Prates, presidente da Petrobras, o fim dessas vendas e a busca de uma "saída política, não judicial" para a questão Foto: Sergio Moraes/Reuters

Desde a transição de governo, o hoje presidente da estatal, o ex-senador pelo PT Jean Paul Prates, fala em paralisação das vendas para reavaliação, sem que isso signifique cancelamento sumário. Prates e outros membros da transição descartaram as vendas de refinarias, mas sempre deixaram em aberto o futuro dos campos maduros, manifestando atenção a multas ligadas ao cancelamento de contratos, que gerariam custos indesejados à estatal.

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Na terça-feira, 23, porém, em entrevista a ao site Brasil 247, Lula disse ter determinado a Prates o fim dessas vendas e a busca de uma “saída política, não judicial” para a questão. Alas do PT e sindicatos, como a Federação Única dos Petroleiros (FUP), são contra as vendas e pregam, inclusive, a reversão de negócios fechados no passado.

Analistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast reconhecem que esse ruídos, somados ao imposto sobre exportação de petróleo, têm deteriorado o ambiente de negócios do setor no País, mas dizem se tratar somente de discurso político de Lula. Eles apostam em condução pragmática de Prates, o que passa pela conclusão dos negócios que já têm contratos assinados.

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Ao todo, 12 vendas, entre campos maduros e refinarias, foram fechadas em 2022 e uma 13ª veio em janeiro deste ano, envolvendo o campo de Albacora Leste, comprado pela petroleira independente Prio. Hoje, 12 ativos estão na fase vinculante da negociação, ou seja, já recebem propostas. Outros seis ainda não chegaram lá, e seguem na fase anterior das negociações, chamada de “não vinculante”.

A situação mais crítica envolve cinco ativos com negociações avançadas, ou seja, que têm contratos assinados, mas ainda aguardam o fechamento e a transferência dos ativos, o que vem com o aval de órgãos reguladores. São quatro conjuntos de campos de produção no Espírito Santo e no Rio Grande do Norte, e a refinaria de lubrificantes Lubnor, do Ceará. No caso dos campos, as compradoras são as petroleiras 3R Petroleum, Seacrest e BW Energy. Em função das aquisições, elas se alavancaram, caso da 3R Petroleum, ou abriram capital, caso da Seacrest, que fez o processo de forma inédita na Bolsa de Oslo, na Noruega.

A maior atenção do mercado recai sobre o Polo Potiguar, negociado com a 3R Petroleum. Na última sexta, 17, porém, a Petrobras notificou a empresa reiterando a disposição em concluir o negócio, o que fez as ações ganharem algum fôlego. Caso que também chama atenção é o do Polo Bahia Terra, de extração de petróleo na bacia do Recôncavo, na Bahia. Em fase vinculante de negociação com o consórcio de empresas Petrorecôncavo e Eneva, o processo caminha lentamente, tendo sido interrompido por judicializações e interdições da ANP. Segundo a Petrobras, ainda não foi tomada qualquer decisão a respeito dos ativos.

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Impacto nas ações

Essas incertezas têm provocado um vaivém nas ações das empresas envolvidas, inclusive da Petrobras, que em um mês perdeu quase 10% do valor de mercado. A perda da Prio é de cerca de 16%; da 3R, de 23%; a PetroRecôncavo recuou 29% no período, e a Eneva, 6%.

Secretário-executivo da Associação Brasileira de Produtores Independentes de Petróleo e Gás Natural (ABPIP), Anabal Santos Jr. disse enxergar na fala de Lula, sobre “saída política e não jurídica”, um aceno ao diálogo com o setor. “Apesar dos ruídos, o presidente sinaliza que vai buscar uma saída consensuada. De nossa parte, não queremos trazer agravantes para a questão da segurança jurídica do País, que já está abalada. Queremos apenas que o que já foi negociado seja honrado”, disse.

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Na leitura de Santos, há forte pressão política de sindicatos contra eventual transferência de empregados da Petrobras para outras regiões após a venda dos ativos. “Mas isso, que envolve cerca de 2 mil pessoas, não pode travar os benefícios à economia dessas regiões, com 300 mil, até 400 mil pessoas”, afirmou. Segundo a ABPIP, a venda de ativos traz investimentos para regiões onde a Petrobras já não tem interesse em atuar, como o polo de Golfinho (ES), que já estava em descomissionamento (processo de desativação), quando foi adquirido pela BW Energy.

“Os campos em terra têm média de produção de 33 barris diários por poço. Em águas rasas, cada poço rende 2 mil barris por dia, o que no pré-sal chega ao exuberante número de 25 mil barris. A Petrobras não tem mais interesse nos campos menores, e faz sentido que sejam vendidos, em continuidade a um processo que começou lá no governo Dilma Rousseff, também do PT”, afirmou.

Lubnor

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Na sexta-feira, 17, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) revogou a resolução que permitia a venda de ativos de refino da estatal, o que sinalizou suspensão da operação da Lubnor (CE), único dos ativos desse tipo à venda que chegou à fase de assinatura, um passo antes do fechamento do contrato.

As outras unidades, Rnest (PE), Repar (PR) e Refap (RS), apesar de estarem sob o guarda-chuva do Termo de Cessação de Conduta (TCC) do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), estão na fase não vinculante e não devem mais ser vendidas, em linha com o que Prates e membros do governo têm dito desde dezembro.

De acordo com o sociólogo Mahatma dos Santos, pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), os prazos de venda da empresa acordados com o Cade já caducaram em dezembro de 2021, mas a Petrobras pediu prorrogação no caso da Lubnor, o que ainda não foi decidido.

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Segundo o especialista, as decisões do CNPE se sobrepõem às do Cade, e tanto diretoria e o Conselho atuais, quanto os que serão eleitos para a nova gestão terão de levar em consideração a decisão do órgão. “Há múltiplos atores querendo interferir nessas decisões (sobre os ativos da Petrobras) e tem o aspecto jurídico da discussão com o Cade”, afirmou.

Ele disse que o prazo de 90 dias solicitado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) para avaliação dos desinvestimentos da empresa, publicado em 1º de março, dará tempo para a realização da Assembleia Geral Ordinária (AGO), prevista para 27 de abril, quando entram executivos e executivas mais alinhados com o atual governo, e que devem encerrar de vez o processo.

Analistas apostam em pragmatismo

Para o analista de óleo e gás da Wood Mackenzie, Marcelo de Assis, a resistência de momento a vendas avançadas é cálculo político para mobilizar a base eleitoral e não encontra eco na realidade. “A tendência é que prevaleça o pragmatismo: o que já tem contrato deverá ser concluído e o que ainda está precoce, deve ser cancelado”, disse Assis.

Ele afirmou se tratar de negócios pequenos no “universo Petrobras” e que qualquer insistência em manter, tanto os campos maduros, quanto a Lubnor, não “para em pé” do ponto de vista econômico-financeiro e pode arranhar a imagem da companhia, que ficaria em posição jurídica “frágil”.

Na visão do analista Pedro Galdi, da Mirae Asset, além de não renderem nada relevante para a Petrobras, os ativos à venda, principalmente de exploração e produção, têm sido fundamentais para o desenvolvimento de outras petroleiras de menor porte no País.

“Afeta sim (as ações da Petrobras), pois fica obrigada a ficar com ativos que não remuneram adequadamente a empresa. Além disso, a venda desses ativos tem sentido para que as pequenas (3R, PRIO e PetroRecôncavo) possam ampliar sua capacidade de produção. Pesa também a taxação sobre exportação de óleo cru”, disse Galdi ao Estadão/Broadcast.

Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, observou que Lula sempre se mostrou contra a venda de ativos da empresa, e o movimento já era esperado pelo mercado. Mas alertou que a empresa teria um ônus muito grande em romper contratos que já estão assinados. “Isso traz maior indefinição e deflagra uma situação para os ativos que não estão assinados, como o Polo Bahia Terra, que estava sendo negociado com a PetroRecôncavo e Eneva”, avaliou.

Já o Polo Potiguar, que está sendo negociado com a 3R, não tem cláusula de desistência, e por esse motivo, Arbetman prevê que será efetivado. “Os que não estão assinados não vão para frente, e nos assinados, na falta de possibilidade de serem cancelados, poderá haver judicialização”, afirmou.

RIO - A Petrobras tem assistido a uma queda de braço interna sobre a venda de ativos à iniciativa privada. De um lado estão a diretoria e o Conselho de Administração da estatal que, formados no governo anterior, pregam ao menos a conclusão das vendas que já tiveram contratos assinados e aguardam o chamado fechamento (closing) dos negócios, com a transferência das operações. Do outro lado, o novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem cobrado, até publicamente, a suspensão imediata dos 23 processos em andamento que constam do portfólio de desinvestimento da estatal. O governo, no entanto, não deixa claro quais ativos deseja que fiquem com a empresa, uma dúvida que deve durar até a próxima Assembleia Geral Ordinária (AGO), prevista para 27 de abril.

Lula disse ter determinado a Prates, presidente da Petrobras, o fim dessas vendas e a busca de uma "saída política, não judicial" para a questão Foto: Sergio Moraes/Reuters

Desde a transição de governo, o hoje presidente da estatal, o ex-senador pelo PT Jean Paul Prates, fala em paralisação das vendas para reavaliação, sem que isso signifique cancelamento sumário. Prates e outros membros da transição descartaram as vendas de refinarias, mas sempre deixaram em aberto o futuro dos campos maduros, manifestando atenção a multas ligadas ao cancelamento de contratos, que gerariam custos indesejados à estatal.

Na terça-feira, 23, porém, em entrevista a ao site Brasil 247, Lula disse ter determinado a Prates o fim dessas vendas e a busca de uma “saída política, não judicial” para a questão. Alas do PT e sindicatos, como a Federação Única dos Petroleiros (FUP), são contra as vendas e pregam, inclusive, a reversão de negócios fechados no passado.

Analistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast reconhecem que esse ruídos, somados ao imposto sobre exportação de petróleo, têm deteriorado o ambiente de negócios do setor no País, mas dizem se tratar somente de discurso político de Lula. Eles apostam em condução pragmática de Prates, o que passa pela conclusão dos negócios que já têm contratos assinados.

Ao todo, 12 vendas, entre campos maduros e refinarias, foram fechadas em 2022 e uma 13ª veio em janeiro deste ano, envolvendo o campo de Albacora Leste, comprado pela petroleira independente Prio. Hoje, 12 ativos estão na fase vinculante da negociação, ou seja, já recebem propostas. Outros seis ainda não chegaram lá, e seguem na fase anterior das negociações, chamada de “não vinculante”.

A situação mais crítica envolve cinco ativos com negociações avançadas, ou seja, que têm contratos assinados, mas ainda aguardam o fechamento e a transferência dos ativos, o que vem com o aval de órgãos reguladores. São quatro conjuntos de campos de produção no Espírito Santo e no Rio Grande do Norte, e a refinaria de lubrificantes Lubnor, do Ceará. No caso dos campos, as compradoras são as petroleiras 3R Petroleum, Seacrest e BW Energy. Em função das aquisições, elas se alavancaram, caso da 3R Petroleum, ou abriram capital, caso da Seacrest, que fez o processo de forma inédita na Bolsa de Oslo, na Noruega.

A maior atenção do mercado recai sobre o Polo Potiguar, negociado com a 3R Petroleum. Na última sexta, 17, porém, a Petrobras notificou a empresa reiterando a disposição em concluir o negócio, o que fez as ações ganharem algum fôlego. Caso que também chama atenção é o do Polo Bahia Terra, de extração de petróleo na bacia do Recôncavo, na Bahia. Em fase vinculante de negociação com o consórcio de empresas Petrorecôncavo e Eneva, o processo caminha lentamente, tendo sido interrompido por judicializações e interdições da ANP. Segundo a Petrobras, ainda não foi tomada qualquer decisão a respeito dos ativos.

Impacto nas ações

Essas incertezas têm provocado um vaivém nas ações das empresas envolvidas, inclusive da Petrobras, que em um mês perdeu quase 10% do valor de mercado. A perda da Prio é de cerca de 16%; da 3R, de 23%; a PetroRecôncavo recuou 29% no período, e a Eneva, 6%.

Secretário-executivo da Associação Brasileira de Produtores Independentes de Petróleo e Gás Natural (ABPIP), Anabal Santos Jr. disse enxergar na fala de Lula, sobre “saída política e não jurídica”, um aceno ao diálogo com o setor. “Apesar dos ruídos, o presidente sinaliza que vai buscar uma saída consensuada. De nossa parte, não queremos trazer agravantes para a questão da segurança jurídica do País, que já está abalada. Queremos apenas que o que já foi negociado seja honrado”, disse.

Na leitura de Santos, há forte pressão política de sindicatos contra eventual transferência de empregados da Petrobras para outras regiões após a venda dos ativos. “Mas isso, que envolve cerca de 2 mil pessoas, não pode travar os benefícios à economia dessas regiões, com 300 mil, até 400 mil pessoas”, afirmou. Segundo a ABPIP, a venda de ativos traz investimentos para regiões onde a Petrobras já não tem interesse em atuar, como o polo de Golfinho (ES), que já estava em descomissionamento (processo de desativação), quando foi adquirido pela BW Energy.

“Os campos em terra têm média de produção de 33 barris diários por poço. Em águas rasas, cada poço rende 2 mil barris por dia, o que no pré-sal chega ao exuberante número de 25 mil barris. A Petrobras não tem mais interesse nos campos menores, e faz sentido que sejam vendidos, em continuidade a um processo que começou lá no governo Dilma Rousseff, também do PT”, afirmou.

Lubnor

Na sexta-feira, 17, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) revogou a resolução que permitia a venda de ativos de refino da estatal, o que sinalizou suspensão da operação da Lubnor (CE), único dos ativos desse tipo à venda que chegou à fase de assinatura, um passo antes do fechamento do contrato.

As outras unidades, Rnest (PE), Repar (PR) e Refap (RS), apesar de estarem sob o guarda-chuva do Termo de Cessação de Conduta (TCC) do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), estão na fase não vinculante e não devem mais ser vendidas, em linha com o que Prates e membros do governo têm dito desde dezembro.

De acordo com o sociólogo Mahatma dos Santos, pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), os prazos de venda da empresa acordados com o Cade já caducaram em dezembro de 2021, mas a Petrobras pediu prorrogação no caso da Lubnor, o que ainda não foi decidido.

Segundo o especialista, as decisões do CNPE se sobrepõem às do Cade, e tanto diretoria e o Conselho atuais, quanto os que serão eleitos para a nova gestão terão de levar em consideração a decisão do órgão. “Há múltiplos atores querendo interferir nessas decisões (sobre os ativos da Petrobras) e tem o aspecto jurídico da discussão com o Cade”, afirmou.

Ele disse que o prazo de 90 dias solicitado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) para avaliação dos desinvestimentos da empresa, publicado em 1º de março, dará tempo para a realização da Assembleia Geral Ordinária (AGO), prevista para 27 de abril, quando entram executivos e executivas mais alinhados com o atual governo, e que devem encerrar de vez o processo.

Analistas apostam em pragmatismo

Para o analista de óleo e gás da Wood Mackenzie, Marcelo de Assis, a resistência de momento a vendas avançadas é cálculo político para mobilizar a base eleitoral e não encontra eco na realidade. “A tendência é que prevaleça o pragmatismo: o que já tem contrato deverá ser concluído e o que ainda está precoce, deve ser cancelado”, disse Assis.

Ele afirmou se tratar de negócios pequenos no “universo Petrobras” e que qualquer insistência em manter, tanto os campos maduros, quanto a Lubnor, não “para em pé” do ponto de vista econômico-financeiro e pode arranhar a imagem da companhia, que ficaria em posição jurídica “frágil”.

Na visão do analista Pedro Galdi, da Mirae Asset, além de não renderem nada relevante para a Petrobras, os ativos à venda, principalmente de exploração e produção, têm sido fundamentais para o desenvolvimento de outras petroleiras de menor porte no País.

“Afeta sim (as ações da Petrobras), pois fica obrigada a ficar com ativos que não remuneram adequadamente a empresa. Além disso, a venda desses ativos tem sentido para que as pequenas (3R, PRIO e PetroRecôncavo) possam ampliar sua capacidade de produção. Pesa também a taxação sobre exportação de óleo cru”, disse Galdi ao Estadão/Broadcast.

Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, observou que Lula sempre se mostrou contra a venda de ativos da empresa, e o movimento já era esperado pelo mercado. Mas alertou que a empresa teria um ônus muito grande em romper contratos que já estão assinados. “Isso traz maior indefinição e deflagra uma situação para os ativos que não estão assinados, como o Polo Bahia Terra, que estava sendo negociado com a PetroRecôncavo e Eneva”, avaliou.

Já o Polo Potiguar, que está sendo negociado com a 3R, não tem cláusula de desistência, e por esse motivo, Arbetman prevê que será efetivado. “Os que não estão assinados não vão para frente, e nos assinados, na falta de possibilidade de serem cancelados, poderá haver judicialização”, afirmou.

RIO - A Petrobras tem assistido a uma queda de braço interna sobre a venda de ativos à iniciativa privada. De um lado estão a diretoria e o Conselho de Administração da estatal que, formados no governo anterior, pregam ao menos a conclusão das vendas que já tiveram contratos assinados e aguardam o chamado fechamento (closing) dos negócios, com a transferência das operações. Do outro lado, o novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem cobrado, até publicamente, a suspensão imediata dos 23 processos em andamento que constam do portfólio de desinvestimento da estatal. O governo, no entanto, não deixa claro quais ativos deseja que fiquem com a empresa, uma dúvida que deve durar até a próxima Assembleia Geral Ordinária (AGO), prevista para 27 de abril.

Lula disse ter determinado a Prates, presidente da Petrobras, o fim dessas vendas e a busca de uma "saída política, não judicial" para a questão Foto: Sergio Moraes/Reuters

Desde a transição de governo, o hoje presidente da estatal, o ex-senador pelo PT Jean Paul Prates, fala em paralisação das vendas para reavaliação, sem que isso signifique cancelamento sumário. Prates e outros membros da transição descartaram as vendas de refinarias, mas sempre deixaram em aberto o futuro dos campos maduros, manifestando atenção a multas ligadas ao cancelamento de contratos, que gerariam custos indesejados à estatal.

Na terça-feira, 23, porém, em entrevista a ao site Brasil 247, Lula disse ter determinado a Prates o fim dessas vendas e a busca de uma “saída política, não judicial” para a questão. Alas do PT e sindicatos, como a Federação Única dos Petroleiros (FUP), são contra as vendas e pregam, inclusive, a reversão de negócios fechados no passado.

Analistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast reconhecem que esse ruídos, somados ao imposto sobre exportação de petróleo, têm deteriorado o ambiente de negócios do setor no País, mas dizem se tratar somente de discurso político de Lula. Eles apostam em condução pragmática de Prates, o que passa pela conclusão dos negócios que já têm contratos assinados.

Ao todo, 12 vendas, entre campos maduros e refinarias, foram fechadas em 2022 e uma 13ª veio em janeiro deste ano, envolvendo o campo de Albacora Leste, comprado pela petroleira independente Prio. Hoje, 12 ativos estão na fase vinculante da negociação, ou seja, já recebem propostas. Outros seis ainda não chegaram lá, e seguem na fase anterior das negociações, chamada de “não vinculante”.

A situação mais crítica envolve cinco ativos com negociações avançadas, ou seja, que têm contratos assinados, mas ainda aguardam o fechamento e a transferência dos ativos, o que vem com o aval de órgãos reguladores. São quatro conjuntos de campos de produção no Espírito Santo e no Rio Grande do Norte, e a refinaria de lubrificantes Lubnor, do Ceará. No caso dos campos, as compradoras são as petroleiras 3R Petroleum, Seacrest e BW Energy. Em função das aquisições, elas se alavancaram, caso da 3R Petroleum, ou abriram capital, caso da Seacrest, que fez o processo de forma inédita na Bolsa de Oslo, na Noruega.

A maior atenção do mercado recai sobre o Polo Potiguar, negociado com a 3R Petroleum. Na última sexta, 17, porém, a Petrobras notificou a empresa reiterando a disposição em concluir o negócio, o que fez as ações ganharem algum fôlego. Caso que também chama atenção é o do Polo Bahia Terra, de extração de petróleo na bacia do Recôncavo, na Bahia. Em fase vinculante de negociação com o consórcio de empresas Petrorecôncavo e Eneva, o processo caminha lentamente, tendo sido interrompido por judicializações e interdições da ANP. Segundo a Petrobras, ainda não foi tomada qualquer decisão a respeito dos ativos.

Impacto nas ações

Essas incertezas têm provocado um vaivém nas ações das empresas envolvidas, inclusive da Petrobras, que em um mês perdeu quase 10% do valor de mercado. A perda da Prio é de cerca de 16%; da 3R, de 23%; a PetroRecôncavo recuou 29% no período, e a Eneva, 6%.

Secretário-executivo da Associação Brasileira de Produtores Independentes de Petróleo e Gás Natural (ABPIP), Anabal Santos Jr. disse enxergar na fala de Lula, sobre “saída política e não jurídica”, um aceno ao diálogo com o setor. “Apesar dos ruídos, o presidente sinaliza que vai buscar uma saída consensuada. De nossa parte, não queremos trazer agravantes para a questão da segurança jurídica do País, que já está abalada. Queremos apenas que o que já foi negociado seja honrado”, disse.

Na leitura de Santos, há forte pressão política de sindicatos contra eventual transferência de empregados da Petrobras para outras regiões após a venda dos ativos. “Mas isso, que envolve cerca de 2 mil pessoas, não pode travar os benefícios à economia dessas regiões, com 300 mil, até 400 mil pessoas”, afirmou. Segundo a ABPIP, a venda de ativos traz investimentos para regiões onde a Petrobras já não tem interesse em atuar, como o polo de Golfinho (ES), que já estava em descomissionamento (processo de desativação), quando foi adquirido pela BW Energy.

“Os campos em terra têm média de produção de 33 barris diários por poço. Em águas rasas, cada poço rende 2 mil barris por dia, o que no pré-sal chega ao exuberante número de 25 mil barris. A Petrobras não tem mais interesse nos campos menores, e faz sentido que sejam vendidos, em continuidade a um processo que começou lá no governo Dilma Rousseff, também do PT”, afirmou.

Lubnor

Na sexta-feira, 17, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) revogou a resolução que permitia a venda de ativos de refino da estatal, o que sinalizou suspensão da operação da Lubnor (CE), único dos ativos desse tipo à venda que chegou à fase de assinatura, um passo antes do fechamento do contrato.

As outras unidades, Rnest (PE), Repar (PR) e Refap (RS), apesar de estarem sob o guarda-chuva do Termo de Cessação de Conduta (TCC) do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), estão na fase não vinculante e não devem mais ser vendidas, em linha com o que Prates e membros do governo têm dito desde dezembro.

De acordo com o sociólogo Mahatma dos Santos, pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), os prazos de venda da empresa acordados com o Cade já caducaram em dezembro de 2021, mas a Petrobras pediu prorrogação no caso da Lubnor, o que ainda não foi decidido.

Segundo o especialista, as decisões do CNPE se sobrepõem às do Cade, e tanto diretoria e o Conselho atuais, quanto os que serão eleitos para a nova gestão terão de levar em consideração a decisão do órgão. “Há múltiplos atores querendo interferir nessas decisões (sobre os ativos da Petrobras) e tem o aspecto jurídico da discussão com o Cade”, afirmou.

Ele disse que o prazo de 90 dias solicitado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) para avaliação dos desinvestimentos da empresa, publicado em 1º de março, dará tempo para a realização da Assembleia Geral Ordinária (AGO), prevista para 27 de abril, quando entram executivos e executivas mais alinhados com o atual governo, e que devem encerrar de vez o processo.

Analistas apostam em pragmatismo

Para o analista de óleo e gás da Wood Mackenzie, Marcelo de Assis, a resistência de momento a vendas avançadas é cálculo político para mobilizar a base eleitoral e não encontra eco na realidade. “A tendência é que prevaleça o pragmatismo: o que já tem contrato deverá ser concluído e o que ainda está precoce, deve ser cancelado”, disse Assis.

Ele afirmou se tratar de negócios pequenos no “universo Petrobras” e que qualquer insistência em manter, tanto os campos maduros, quanto a Lubnor, não “para em pé” do ponto de vista econômico-financeiro e pode arranhar a imagem da companhia, que ficaria em posição jurídica “frágil”.

Na visão do analista Pedro Galdi, da Mirae Asset, além de não renderem nada relevante para a Petrobras, os ativos à venda, principalmente de exploração e produção, têm sido fundamentais para o desenvolvimento de outras petroleiras de menor porte no País.

“Afeta sim (as ações da Petrobras), pois fica obrigada a ficar com ativos que não remuneram adequadamente a empresa. Além disso, a venda desses ativos tem sentido para que as pequenas (3R, PRIO e PetroRecôncavo) possam ampliar sua capacidade de produção. Pesa também a taxação sobre exportação de óleo cru”, disse Galdi ao Estadão/Broadcast.

Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, observou que Lula sempre se mostrou contra a venda de ativos da empresa, e o movimento já era esperado pelo mercado. Mas alertou que a empresa teria um ônus muito grande em romper contratos que já estão assinados. “Isso traz maior indefinição e deflagra uma situação para os ativos que não estão assinados, como o Polo Bahia Terra, que estava sendo negociado com a PetroRecôncavo e Eneva”, avaliou.

Já o Polo Potiguar, que está sendo negociado com a 3R, não tem cláusula de desistência, e por esse motivo, Arbetman prevê que será efetivado. “Os que não estão assinados não vão para frente, e nos assinados, na falta de possibilidade de serem cancelados, poderá haver judicialização”, afirmou.

RIO - A Petrobras tem assistido a uma queda de braço interna sobre a venda de ativos à iniciativa privada. De um lado estão a diretoria e o Conselho de Administração da estatal que, formados no governo anterior, pregam ao menos a conclusão das vendas que já tiveram contratos assinados e aguardam o chamado fechamento (closing) dos negócios, com a transferência das operações. Do outro lado, o novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem cobrado, até publicamente, a suspensão imediata dos 23 processos em andamento que constam do portfólio de desinvestimento da estatal. O governo, no entanto, não deixa claro quais ativos deseja que fiquem com a empresa, uma dúvida que deve durar até a próxima Assembleia Geral Ordinária (AGO), prevista para 27 de abril.

Lula disse ter determinado a Prates, presidente da Petrobras, o fim dessas vendas e a busca de uma "saída política, não judicial" para a questão Foto: Sergio Moraes/Reuters

Desde a transição de governo, o hoje presidente da estatal, o ex-senador pelo PT Jean Paul Prates, fala em paralisação das vendas para reavaliação, sem que isso signifique cancelamento sumário. Prates e outros membros da transição descartaram as vendas de refinarias, mas sempre deixaram em aberto o futuro dos campos maduros, manifestando atenção a multas ligadas ao cancelamento de contratos, que gerariam custos indesejados à estatal.

Na terça-feira, 23, porém, em entrevista a ao site Brasil 247, Lula disse ter determinado a Prates o fim dessas vendas e a busca de uma “saída política, não judicial” para a questão. Alas do PT e sindicatos, como a Federação Única dos Petroleiros (FUP), são contra as vendas e pregam, inclusive, a reversão de negócios fechados no passado.

Analistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast reconhecem que esse ruídos, somados ao imposto sobre exportação de petróleo, têm deteriorado o ambiente de negócios do setor no País, mas dizem se tratar somente de discurso político de Lula. Eles apostam em condução pragmática de Prates, o que passa pela conclusão dos negócios que já têm contratos assinados.

Ao todo, 12 vendas, entre campos maduros e refinarias, foram fechadas em 2022 e uma 13ª veio em janeiro deste ano, envolvendo o campo de Albacora Leste, comprado pela petroleira independente Prio. Hoje, 12 ativos estão na fase vinculante da negociação, ou seja, já recebem propostas. Outros seis ainda não chegaram lá, e seguem na fase anterior das negociações, chamada de “não vinculante”.

A situação mais crítica envolve cinco ativos com negociações avançadas, ou seja, que têm contratos assinados, mas ainda aguardam o fechamento e a transferência dos ativos, o que vem com o aval de órgãos reguladores. São quatro conjuntos de campos de produção no Espírito Santo e no Rio Grande do Norte, e a refinaria de lubrificantes Lubnor, do Ceará. No caso dos campos, as compradoras são as petroleiras 3R Petroleum, Seacrest e BW Energy. Em função das aquisições, elas se alavancaram, caso da 3R Petroleum, ou abriram capital, caso da Seacrest, que fez o processo de forma inédita na Bolsa de Oslo, na Noruega.

A maior atenção do mercado recai sobre o Polo Potiguar, negociado com a 3R Petroleum. Na última sexta, 17, porém, a Petrobras notificou a empresa reiterando a disposição em concluir o negócio, o que fez as ações ganharem algum fôlego. Caso que também chama atenção é o do Polo Bahia Terra, de extração de petróleo na bacia do Recôncavo, na Bahia. Em fase vinculante de negociação com o consórcio de empresas Petrorecôncavo e Eneva, o processo caminha lentamente, tendo sido interrompido por judicializações e interdições da ANP. Segundo a Petrobras, ainda não foi tomada qualquer decisão a respeito dos ativos.

Impacto nas ações

Essas incertezas têm provocado um vaivém nas ações das empresas envolvidas, inclusive da Petrobras, que em um mês perdeu quase 10% do valor de mercado. A perda da Prio é de cerca de 16%; da 3R, de 23%; a PetroRecôncavo recuou 29% no período, e a Eneva, 6%.

Secretário-executivo da Associação Brasileira de Produtores Independentes de Petróleo e Gás Natural (ABPIP), Anabal Santos Jr. disse enxergar na fala de Lula, sobre “saída política e não jurídica”, um aceno ao diálogo com o setor. “Apesar dos ruídos, o presidente sinaliza que vai buscar uma saída consensuada. De nossa parte, não queremos trazer agravantes para a questão da segurança jurídica do País, que já está abalada. Queremos apenas que o que já foi negociado seja honrado”, disse.

Na leitura de Santos, há forte pressão política de sindicatos contra eventual transferência de empregados da Petrobras para outras regiões após a venda dos ativos. “Mas isso, que envolve cerca de 2 mil pessoas, não pode travar os benefícios à economia dessas regiões, com 300 mil, até 400 mil pessoas”, afirmou. Segundo a ABPIP, a venda de ativos traz investimentos para regiões onde a Petrobras já não tem interesse em atuar, como o polo de Golfinho (ES), que já estava em descomissionamento (processo de desativação), quando foi adquirido pela BW Energy.

“Os campos em terra têm média de produção de 33 barris diários por poço. Em águas rasas, cada poço rende 2 mil barris por dia, o que no pré-sal chega ao exuberante número de 25 mil barris. A Petrobras não tem mais interesse nos campos menores, e faz sentido que sejam vendidos, em continuidade a um processo que começou lá no governo Dilma Rousseff, também do PT”, afirmou.

Lubnor

Na sexta-feira, 17, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) revogou a resolução que permitia a venda de ativos de refino da estatal, o que sinalizou suspensão da operação da Lubnor (CE), único dos ativos desse tipo à venda que chegou à fase de assinatura, um passo antes do fechamento do contrato.

As outras unidades, Rnest (PE), Repar (PR) e Refap (RS), apesar de estarem sob o guarda-chuva do Termo de Cessação de Conduta (TCC) do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), estão na fase não vinculante e não devem mais ser vendidas, em linha com o que Prates e membros do governo têm dito desde dezembro.

De acordo com o sociólogo Mahatma dos Santos, pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), os prazos de venda da empresa acordados com o Cade já caducaram em dezembro de 2021, mas a Petrobras pediu prorrogação no caso da Lubnor, o que ainda não foi decidido.

Segundo o especialista, as decisões do CNPE se sobrepõem às do Cade, e tanto diretoria e o Conselho atuais, quanto os que serão eleitos para a nova gestão terão de levar em consideração a decisão do órgão. “Há múltiplos atores querendo interferir nessas decisões (sobre os ativos da Petrobras) e tem o aspecto jurídico da discussão com o Cade”, afirmou.

Ele disse que o prazo de 90 dias solicitado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) para avaliação dos desinvestimentos da empresa, publicado em 1º de março, dará tempo para a realização da Assembleia Geral Ordinária (AGO), prevista para 27 de abril, quando entram executivos e executivas mais alinhados com o atual governo, e que devem encerrar de vez o processo.

Analistas apostam em pragmatismo

Para o analista de óleo e gás da Wood Mackenzie, Marcelo de Assis, a resistência de momento a vendas avançadas é cálculo político para mobilizar a base eleitoral e não encontra eco na realidade. “A tendência é que prevaleça o pragmatismo: o que já tem contrato deverá ser concluído e o que ainda está precoce, deve ser cancelado”, disse Assis.

Ele afirmou se tratar de negócios pequenos no “universo Petrobras” e que qualquer insistência em manter, tanto os campos maduros, quanto a Lubnor, não “para em pé” do ponto de vista econômico-financeiro e pode arranhar a imagem da companhia, que ficaria em posição jurídica “frágil”.

Na visão do analista Pedro Galdi, da Mirae Asset, além de não renderem nada relevante para a Petrobras, os ativos à venda, principalmente de exploração e produção, têm sido fundamentais para o desenvolvimento de outras petroleiras de menor porte no País.

“Afeta sim (as ações da Petrobras), pois fica obrigada a ficar com ativos que não remuneram adequadamente a empresa. Além disso, a venda desses ativos tem sentido para que as pequenas (3R, PRIO e PetroRecôncavo) possam ampliar sua capacidade de produção. Pesa também a taxação sobre exportação de óleo cru”, disse Galdi ao Estadão/Broadcast.

Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, observou que Lula sempre se mostrou contra a venda de ativos da empresa, e o movimento já era esperado pelo mercado. Mas alertou que a empresa teria um ônus muito grande em romper contratos que já estão assinados. “Isso traz maior indefinição e deflagra uma situação para os ativos que não estão assinados, como o Polo Bahia Terra, que estava sendo negociado com a PetroRecôncavo e Eneva”, avaliou.

Já o Polo Potiguar, que está sendo negociado com a 3R, não tem cláusula de desistência, e por esse motivo, Arbetman prevê que será efetivado. “Os que não estão assinados não vão para frente, e nos assinados, na falta de possibilidade de serem cancelados, poderá haver judicialização”, afirmou.

RIO - A Petrobras tem assistido a uma queda de braço interna sobre a venda de ativos à iniciativa privada. De um lado estão a diretoria e o Conselho de Administração da estatal que, formados no governo anterior, pregam ao menos a conclusão das vendas que já tiveram contratos assinados e aguardam o chamado fechamento (closing) dos negócios, com a transferência das operações. Do outro lado, o novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem cobrado, até publicamente, a suspensão imediata dos 23 processos em andamento que constam do portfólio de desinvestimento da estatal. O governo, no entanto, não deixa claro quais ativos deseja que fiquem com a empresa, uma dúvida que deve durar até a próxima Assembleia Geral Ordinária (AGO), prevista para 27 de abril.

Lula disse ter determinado a Prates, presidente da Petrobras, o fim dessas vendas e a busca de uma "saída política, não judicial" para a questão Foto: Sergio Moraes/Reuters

Desde a transição de governo, o hoje presidente da estatal, o ex-senador pelo PT Jean Paul Prates, fala em paralisação das vendas para reavaliação, sem que isso signifique cancelamento sumário. Prates e outros membros da transição descartaram as vendas de refinarias, mas sempre deixaram em aberto o futuro dos campos maduros, manifestando atenção a multas ligadas ao cancelamento de contratos, que gerariam custos indesejados à estatal.

Na terça-feira, 23, porém, em entrevista a ao site Brasil 247, Lula disse ter determinado a Prates o fim dessas vendas e a busca de uma “saída política, não judicial” para a questão. Alas do PT e sindicatos, como a Federação Única dos Petroleiros (FUP), são contra as vendas e pregam, inclusive, a reversão de negócios fechados no passado.

Analistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast reconhecem que esse ruídos, somados ao imposto sobre exportação de petróleo, têm deteriorado o ambiente de negócios do setor no País, mas dizem se tratar somente de discurso político de Lula. Eles apostam em condução pragmática de Prates, o que passa pela conclusão dos negócios que já têm contratos assinados.

Ao todo, 12 vendas, entre campos maduros e refinarias, foram fechadas em 2022 e uma 13ª veio em janeiro deste ano, envolvendo o campo de Albacora Leste, comprado pela petroleira independente Prio. Hoje, 12 ativos estão na fase vinculante da negociação, ou seja, já recebem propostas. Outros seis ainda não chegaram lá, e seguem na fase anterior das negociações, chamada de “não vinculante”.

A situação mais crítica envolve cinco ativos com negociações avançadas, ou seja, que têm contratos assinados, mas ainda aguardam o fechamento e a transferência dos ativos, o que vem com o aval de órgãos reguladores. São quatro conjuntos de campos de produção no Espírito Santo e no Rio Grande do Norte, e a refinaria de lubrificantes Lubnor, do Ceará. No caso dos campos, as compradoras são as petroleiras 3R Petroleum, Seacrest e BW Energy. Em função das aquisições, elas se alavancaram, caso da 3R Petroleum, ou abriram capital, caso da Seacrest, que fez o processo de forma inédita na Bolsa de Oslo, na Noruega.

A maior atenção do mercado recai sobre o Polo Potiguar, negociado com a 3R Petroleum. Na última sexta, 17, porém, a Petrobras notificou a empresa reiterando a disposição em concluir o negócio, o que fez as ações ganharem algum fôlego. Caso que também chama atenção é o do Polo Bahia Terra, de extração de petróleo na bacia do Recôncavo, na Bahia. Em fase vinculante de negociação com o consórcio de empresas Petrorecôncavo e Eneva, o processo caminha lentamente, tendo sido interrompido por judicializações e interdições da ANP. Segundo a Petrobras, ainda não foi tomada qualquer decisão a respeito dos ativos.

Impacto nas ações

Essas incertezas têm provocado um vaivém nas ações das empresas envolvidas, inclusive da Petrobras, que em um mês perdeu quase 10% do valor de mercado. A perda da Prio é de cerca de 16%; da 3R, de 23%; a PetroRecôncavo recuou 29% no período, e a Eneva, 6%.

Secretário-executivo da Associação Brasileira de Produtores Independentes de Petróleo e Gás Natural (ABPIP), Anabal Santos Jr. disse enxergar na fala de Lula, sobre “saída política e não jurídica”, um aceno ao diálogo com o setor. “Apesar dos ruídos, o presidente sinaliza que vai buscar uma saída consensuada. De nossa parte, não queremos trazer agravantes para a questão da segurança jurídica do País, que já está abalada. Queremos apenas que o que já foi negociado seja honrado”, disse.

Na leitura de Santos, há forte pressão política de sindicatos contra eventual transferência de empregados da Petrobras para outras regiões após a venda dos ativos. “Mas isso, que envolve cerca de 2 mil pessoas, não pode travar os benefícios à economia dessas regiões, com 300 mil, até 400 mil pessoas”, afirmou. Segundo a ABPIP, a venda de ativos traz investimentos para regiões onde a Petrobras já não tem interesse em atuar, como o polo de Golfinho (ES), que já estava em descomissionamento (processo de desativação), quando foi adquirido pela BW Energy.

“Os campos em terra têm média de produção de 33 barris diários por poço. Em águas rasas, cada poço rende 2 mil barris por dia, o que no pré-sal chega ao exuberante número de 25 mil barris. A Petrobras não tem mais interesse nos campos menores, e faz sentido que sejam vendidos, em continuidade a um processo que começou lá no governo Dilma Rousseff, também do PT”, afirmou.

Lubnor

Na sexta-feira, 17, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) revogou a resolução que permitia a venda de ativos de refino da estatal, o que sinalizou suspensão da operação da Lubnor (CE), único dos ativos desse tipo à venda que chegou à fase de assinatura, um passo antes do fechamento do contrato.

As outras unidades, Rnest (PE), Repar (PR) e Refap (RS), apesar de estarem sob o guarda-chuva do Termo de Cessação de Conduta (TCC) do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), estão na fase não vinculante e não devem mais ser vendidas, em linha com o que Prates e membros do governo têm dito desde dezembro.

De acordo com o sociólogo Mahatma dos Santos, pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), os prazos de venda da empresa acordados com o Cade já caducaram em dezembro de 2021, mas a Petrobras pediu prorrogação no caso da Lubnor, o que ainda não foi decidido.

Segundo o especialista, as decisões do CNPE se sobrepõem às do Cade, e tanto diretoria e o Conselho atuais, quanto os que serão eleitos para a nova gestão terão de levar em consideração a decisão do órgão. “Há múltiplos atores querendo interferir nessas decisões (sobre os ativos da Petrobras) e tem o aspecto jurídico da discussão com o Cade”, afirmou.

Ele disse que o prazo de 90 dias solicitado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) para avaliação dos desinvestimentos da empresa, publicado em 1º de março, dará tempo para a realização da Assembleia Geral Ordinária (AGO), prevista para 27 de abril, quando entram executivos e executivas mais alinhados com o atual governo, e que devem encerrar de vez o processo.

Analistas apostam em pragmatismo

Para o analista de óleo e gás da Wood Mackenzie, Marcelo de Assis, a resistência de momento a vendas avançadas é cálculo político para mobilizar a base eleitoral e não encontra eco na realidade. “A tendência é que prevaleça o pragmatismo: o que já tem contrato deverá ser concluído e o que ainda está precoce, deve ser cancelado”, disse Assis.

Ele afirmou se tratar de negócios pequenos no “universo Petrobras” e que qualquer insistência em manter, tanto os campos maduros, quanto a Lubnor, não “para em pé” do ponto de vista econômico-financeiro e pode arranhar a imagem da companhia, que ficaria em posição jurídica “frágil”.

Na visão do analista Pedro Galdi, da Mirae Asset, além de não renderem nada relevante para a Petrobras, os ativos à venda, principalmente de exploração e produção, têm sido fundamentais para o desenvolvimento de outras petroleiras de menor porte no País.

“Afeta sim (as ações da Petrobras), pois fica obrigada a ficar com ativos que não remuneram adequadamente a empresa. Além disso, a venda desses ativos tem sentido para que as pequenas (3R, PRIO e PetroRecôncavo) possam ampliar sua capacidade de produção. Pesa também a taxação sobre exportação de óleo cru”, disse Galdi ao Estadão/Broadcast.

Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, observou que Lula sempre se mostrou contra a venda de ativos da empresa, e o movimento já era esperado pelo mercado. Mas alertou que a empresa teria um ônus muito grande em romper contratos que já estão assinados. “Isso traz maior indefinição e deflagra uma situação para os ativos que não estão assinados, como o Polo Bahia Terra, que estava sendo negociado com a PetroRecôncavo e Eneva”, avaliou.

Já o Polo Potiguar, que está sendo negociado com a 3R, não tem cláusula de desistência, e por esse motivo, Arbetman prevê que será efetivado. “Os que não estão assinados não vão para frente, e nos assinados, na falta de possibilidade de serem cancelados, poderá haver judicialização”, afirmou.

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