RIO - Ainda sem data para começar, a nova gestão da Petrobras terá como prioridade resolver a questão do reajuste dos preços dos combustíveis. É o que sinaliza o indicado pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a presidência da empresa, o senador petista Jean Paul Prates, que deve assumir a companhia nas próximas semanas. Para isso, o governo vem tentando aprovar o nome de Prates como presidente interino no Conselho de Administração da estatal, depois que o presidente da gestão anterior, Caio Paes de Andrade, renunciou ao cargo na quarta-feira, 4. Sem o atalho da aprovação como interino pelos conselheiros, os trâmites normais exigiriam a realização de assembleia de acionistas e a chegada do senador poderia demorar pelo menos dois meses.
Após receber do novo governo a indicação de Prates para o cargo, no último dia 2, a Petrobras encaminhou o nome do senador para o setor de conformidade da companhia, que avalia se a documentação e o currículo do indicado se enquadram no estatuto da empresa e na Lei das Estatais. Esse processo demora entre cinco e 20 dias. Em seguida, a indicação passa pelo Comitê de Pessoas (Cope) do Conselho de Administração, que tem oito dias, prorrogáveis, para se manifestar. Ao fim do processo, o nome ainda passa por uma votação no colegiado de 11 membros. Se aprovado por maioria simples, o indicado é empossado no cargo.
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Com experiência de mais de 30 anos no setor de óleo e gás, Prates não deve ter problema para ser aprovado. Foi membro da assessoria jurídica da Petrobras internacional (Braspetro), no fim da década de 1980 e, no início da década de 1990, fundou a primeira consultoria brasileira especializada em petróleo. Foi secretário de Energia do Rio Grande do Norte em 2007, e, antes disso, foi um dos responsáveis pelo marco regulatório da abertura do mercado de petróleo, em 1997. Mais recentemente, foi relator de dois projetos para redução do preço dos combustíveis.
O futuro presidente da Petrobras nega que sua intenção seja intervir diretamente nos preços, preferindo indicar uma abordagem via política pública, como a criação de uma conta de compensação de preços. “Não tem bala de prata”, costumava dizer Prates, muito antes da vitória do presidente Lula nas eleições presidenciais do ano passado.
Em outubro, Prates explicou ao Estadão/Broadcast que a mudança na política de preços da empresa está baseada em quatro pilares. O primeiro seria substituir a atual política de paridade de importação por um preço de referência, que seria aplicado por produto, por região e por área de influência. Outra proposta é uma conta de estabilização, que seria alimentada por lucros extraordinários das empresas do setor, royalties e dividendos. Inicialmente, era previsto também arrecadação de recursos via imposto de exportação de petróleo, mas a ideia teve resistência e foi descartada.
O terceiro pilar para uma queda sustentável dos preços também passa pela criação de estoques reguladores, com uma estruturação de política nacional junto a todas as empresas do mercado de óleo e gás e de biocombustíveis. Para completar o processo, o futuro presidente da estatal pretende ampliar a capacidade de refino da companhia com ampliações das plantas já existentes e com a conclusão de obras ou unidades novas, com foco em diesel, Gás Liquefeito de Petróleo (GLP) e aproveitamento do gás natural, disse Prates em outubro.
Fim da venda de refinarias
A proposta enterra de vez o programa de desinvestimento em refino da gestão anterior, que, em 2019, colocou à venda oito das 13 refinarias da companhia. De lá para cá, o programa conseguiu vender apenas uma refinaria de grande porte, na Bahia, e duas pequenas: uma no Paraná (SIX) e outra no Amazonas (Reman). A Refinaria de Mataripe, na Bahia, é dona de 14% do mercado de refino. Hoje, é controlada pela Acelen, braço de investimento do fundo de investimento árabe Mubadala.
Ao contrário dos quatro presidentes que passaram pela empresa no governo Bolsonaro, Prates defende que a Petrobras explore energias renováveis, seguindo o caminho das principais petroleiras globais, o que indica diversificar investimentos. Hoje, a maioria dos recursos está concentrada na exploração e produção, principalmente na região do pré-sal. Na gestão anterior, a teoria era a de que a Petrobras deveria se concentrar na produção de combustíveis mais limpos, como o diesel RX, resultante do coprocessamento do diesel fóssil com óleos vegetais, cuja produção ainda é tímida.
Dividendos
A pretensão de Prates é bem aceita por especialistas do setor, mas contraria a atual estratégia da empresa. Para executar o novo plano, será preciso aumentar, e muito, o volume de investimentos da companhia nos próximos anos, e, por consequência, reduzir o pagamento de dividendos.
Em plano estratégico divulgado no fim de novembro do ano passado, a atual diretoria da Petrobras informou pretender investir US$ 78 bilhões de 2023 até 2027, sendo 83% reservados à exploração e produção de petróleo. O montante não é pequeno para o que se propõe, mas, segundo o entorno de Prates, é limitado para a transformação pretendida.
Essa seria uma das maiores mudanças na estrutura da companhia, que, segundo o atual governo, vinha sendo usada pela gestão Bolsonaro como “vaca leiteira”, termo que no mercado financeiro se refere a empresas boas pagadoras de dividendos, e, portanto mais procuradas pelos investidores. Prates quer elevar significativamente os investimentos, mesmo que para isso reduza os proventos dos acionistas, entre eles a União.
Na gestão anterior, a Petrobras chegou a distribuir dividendos aos seus acionistas no mesmo valor do lucro obtido no período, somando cerca de R$ 173 bilhões de janeiro a setembro. Com a perspectiva de queda na próxima distribuição, as ações da companhia têm perdido valor na bolsa brasileira.
“Os proventos da Petrobras no ano passado foram altos, mas não devemos ver essa força no quarto trimestre, porque já deve ter a influência do novo presidente, e isso já está sendo precificado nas ações”, disse o analista da Ativa Investimentos Ilan Arbetman.