RIO - Impulsionadas pela compra de campos maduros da Petrobras, a produção de pequenas e médias petroleiras passou de 3 mil para 150 mil barris por dia em cinco anos. Essa expansão vai acelerar no curto prazo, quando campos já negociados mudarem de mãos e suas operações forem recauchutadas, aponta a Associação Brasileira de Produtores Independentes de Petróleo e Gás (Abpip), que reúne 39 empresas.
Em que pese a justa euforia do setor, executivos reunidos pela entidade no Rio de Janeiro, por ocasião da Rio, Oil & Gas, afirmam que o avanço da produção independente no Brasil será mais agressivo e sustentado quanto menor for a burocracia estatal e mais ajustado forem os royalties à sua realidade financeira.
De acordo com o secretário executivo da Abpip, Anabal Santos, a produção das empresas associadas deve alcançar a casa dos 220 mil barris diários nos próximos meses. O salto estará ligado à transição da operação em três polos, negócios que avançaram entre o fim de 2021 e início desse ano.
Um deles é o polo Carmópolis, no Sergipe, que tem 11 concessões compradas por US$ 1,1 bilhão pela Carmo Energy (Cobra). Outro é o polo Potiguar, com 22 campos em terra e no mar do Rio Grande do Norte que foram adquiridos pela 3R Petroleum ao preço de US$ 1,38 bilhão.
Completa o trio o polo Bahia-Terra, com 28 campos onshore nas bacias do Recôncavo e Tucano. O contrato de compra deve ser assinado pelas compradoras consorciadas PetroRecôncavo e Eneva a qualquer momento, tão logo seja superado imbróglio na Justiça. O negócio está paralisado por uma liminar obtida pela Aguila Energia, antiga ofertante desclassificada do processo pela Petrobras sob a alegação de falta de lastro financeiro à operação.
Para Santos, além dessa engorda relacionada à absorção de operações ativas da Petrobras, a produção das empresas independentes vai ser cada vez mais incrementada por meio de ganhos de eficiência e campanhas de revitalização desses campos, em produção há décadas. No polo Bahia-Terra, por exemplo, o primeiro óleo é de 1958.
Simplificação
Os executivos defendem agenda de simplificação regulatória e ajuste das cobranças dos royalties. Eles pedem pela revisão dos processos hoje exigidos pela Agência Nacional de Petróleo, Biocombustíveis e Gás Natural (ANP) e pleiteiam, inclusive, a criação de uma superintendência focada em campos maduros para reforçar a atenção da agência a essa fatia do mercado.
O presidente da PetroRecôncavo, Marcelo Magalhães, observa que um processo de transferência de concessão no Brasil demora hoje entre dez e 12 meses na média, tempo em que se deixa de desenvolver projetos e realizar receita.
“Isso tem implicações de caráter financeiro, fiscal e societário. Precisamos de processos céleres porque estamos em uma indústria que precisa fazer investimentos logo porque pode deixar de ser relevante em 10 ou 15 anos”, diz Magalhães, que também acumula a vice-presidência da Abpip.
A mesma lógica, diz o diretor de Relações Institucionais da Perenco no Brasil, Leonardo Caldas, se aplica ao tempo de obtenção da aprovação das transações no Cade ou das licenças ambientais pelas novas operadoras. Mais do que tempo, observa o executivo, a burocracia consome hora-homem de forma desproporcional ao porte das empresas.
Anabal Santos cita a resolução de pendências regulatórias que a ANP busca sanar em meio à passagem de bastão da concessão e operação. “Um caminho é criar uma lista de pendências e assinar um termo de ajuste de conduta (TAC) com a nova empresa se comprometendo a regularizar toda situação mesmo depois de concluída a transferência da concessão”, afirma.
Royalties condizentes
Os executivos reconhecem avanços nos últimos anos como as resoluções que cortaram à metade, para 5%, a incidência dos royalties às empresas de pequeno porte que produzem até 1 mil barris por dia e de médio porte que produzem até 10 mil barris diários. Para Magalhães, no entanto, esse corte penaliza empresas que ultrapassam esses tetos. O ideal, defende, é a aplicação da redução para todos os campos enquadrados como marginais, que contam 313 no País.
“Reduzir carga tributária é o que permite a ampliação de investimentos que, no nosso caso, muda muito o perfil de retorno dos projetos”, diz Magalhães. Por trás, a tese de que taxar menos as empresas que atuam em campos maduros vai abrir espaço para mais investimentos na recuperação desses ativos, maximizando receitas e, com elas, o próprio bolo dos royalties e todas as externalidades à cadeia.
Outra reclamação diz sobre o preço de referência do barril para os royalties. Eles apontam fato de a taxa ser aplicada sobre o preço cheio, quando vendem o óleo à Petrobras a preço descontado pelo processo de tratamento e utilização de instalações da estatal, como os dutos. Segundo Santos, o desajuste leva a cobranças efetivas de até 17% sobre a receita dessas produtoras.
Uma das alternativas propostas é a cobrança de royalties direto sobre o valor de nota fiscal da venda. Recentemente, também, o governo federal indicou disposição de antecipar a revisão dos preços de referência do barril para o cálculo de royalties a fim de poupar pequenas e médias empresas do setor.
“Muitas das regras que valem ainda hoje só tinham sentido em um mercado totalmente dominado pela Petrobras. É preciso fazer ajustes para acompanhar a abertura do mercado”, diz Magalhães.
Desinvestimentos da Petrobras
Os executivos também defendem a continuidade do processo de desinvestimentos da Petrobras, acordado com o Cade, e maior diligência por parte da ANP na cobrança pela devolução de blocos da estatal que nunca foram desenvolvidos, ainda que possuam declaração de comercialidade.
Considerando somente campos em terra, a Abpip conta 194 concessões ainda passíveis de venda pela Petrobras, com produção agregada pouco menor que as 47 concessões ainda em processo de venda. Soma-se a esses campos, uma série de ativos offshore. Segundo a Abpip, pelo menos 24 poços teriam sido declarados comerciais há mais de dez anos e nunca produziram sob a Petrobras.
“É preciso exigir uma posição da Petrobras. Ou vai (produzir) ou então devolve. Esses campos não são mais atrativos para eles (Petrobras), mas podem ser bem aproveitados por empresas de porte menor”, diz Santos.
Sobre o impacto de eventual troca de governo sobre o programa de desinvestimentos de campos maduros da Petrobras, os executivos disseram acreditar que o processo está pacificado dentro da estatal, hoje focada em ativos maiores no pré-sal e futuras províncias, como a Margem Equatorial.
Caldas, da Perenco, lembra que parte da inciativa começou ainda sob governos do PT e Magalhães, da PetroRecôcavo, sugere que o interesse público na venda de campos maduros para sua recuperação é notório e suprapartidário. “Veja o que acontece na Bahia. O governador da Bahia é do PT e eu garanto que está muito satisfeito com a atividade econômica que despertamos”, diz Magalhães.