Após puxar junto com a agropecuária um resultado que, em 2023, surpreendeu as previsões iniciais, o desempenho do setor de serviços, maior empregador do País, será neste ano ainda mais importante para sustentar a economia.
As previsões do mercado indicam que 65% do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2024 virá das diversas atividades que compõem o setor de serviços nas contas nacionais, como o comércio, os bancos e as empresas de transporte, além de outros segmentos. O percentual leva em conta as projeções de economistas coletadas pelo Banco Central (BC) no Boletim Focus e o peso, no resultado total, de cada um dos três setores da economia: serviços, agropecuária e indústria.
Sem os impulsos da supersafra e dos estímulos fiscais, principais responsáveis pelas surpresas do PIB no ano passado, o crescimento da economia cairá praticamente pela metade: de 2,9%, em 2023, para 1,5% neste ano, segundo as projeções.
A tendência é que, com a economia global perdendo tração, as exportações contribuam menos no resultado esperado, ao passo que a expectativa para os investimentos é de uma reação bastante tímida.
O consumo das famílias, no entanto, deve evitar uma desaceleração mais forte, como reflexo da taxa de desemprego no menor patamar em quase nove anos e da recuperação da renda. Além disso, há o alívio da inflação no bolso das famílias.
O crédito, conforme os economistas, também deve ser uma importante alavanca do desempenho econômico neste ano, na esteira dos cortes da Selic, em paralelo à redução tanto da inadimplência quanto do comprometimento da renda dos consumidores com o pagamento de dívidas.
O contexto é favorável às atividades mais atreladas à economia doméstica, ainda que o País esteja longe de voltar a viver uma “festa do crédito”, já que os juros, embora em queda, continuam elevados. “Já começamos a ver uma redução nas taxas finais de empréstimo, mas ainda muito no começo. Os juros subiram para o 20º andar, agora estão no 19º. Ou seja, não voltaram para o que era antes, mas o elevador está descendo”, comenta o economista da Serasa Experian Luiz Rabi.
Para o economista-chefe do PicPay, Marco Caruso, o mais provável é que o consumo continue sendo mais puxado por produtos essenciais, como os alimentos, dado o alívio da inflação nos orçamentos das famílias de baixa renda.
“Tudo que é ligado ao consumo, principalmente dos produtos de preços mais baixos, continuará mostrando uma história positiva em 2024. Além da melhora no emprego e na renda, a desinflação aconteceu de forma mais clara nas famílias de baixa renda. É o estrato social com maior propensão ao consumo”, observa Caruso. “No crédito, os piores momentos ficaram para trás, mas a foto ainda é complicada”, acrescenta.
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No cenário do PicPay, parecido com os traçados por instituições como Santander e XP Investimentos, a atividade deve ficar perto da estagnação até março.
Já nos trimestres seguintes, a tendência é de a economia voltar a crescer, embora em ritmo bastante moderado, à medida que os cortes de juros, junto com o melhor ambiente para as concessões dos bancos, chegarem às taxas de mercado, favorecendo o consumo de bens mais dependentes de crédito, como carros e eletrodomésticos.
Demais componentes
A indústria é, do lado da oferta, o único componente do PIB que deve crescer mais do que no ano passado: de 1,3% para 1,8%, conforme a mediana das projeções do mercado. Se for mesmo esse o ritmo, o setor responderá por 26% do crescimento do PIB deste ano, mais do que o dobro da contribuição de 2023: 10%.
Para Margato, da XP, o desempenho será encabeçado pela indústria extrativa, na qual a expectativa é de maior produção de petróleo e minério de ferro. Na indústria de transformação, o crescimento tende a ser mais lento. “Temos visto estagnação do setor há vários trimestres”, afirma o economista.
No campo, a tendência é de não repetição da safra recorde de grãos, com a volta da produção argentina pressionando os preços da soja, a principal commodity agrícola embarcada pelo Brasil. A agropecuária, uma grande força da economia no ano passado, deve sair de cena e não contribuir para o crescimento previsto para este ano.
Espera-se que os juros mais baixos estimulem os investimentos, mas de forma bastante gradual. Após a queda de 2,5% do ano passado, a perspectiva é de crescimento de 1,4% da chamada formação bruta de capital fixo.
Há confiança no mercado de que o governo, se não zerar o déficit como previsto no Orçamento, vai ao menos se esforçar para diminuir o buraco das contas públicas, o que representa um freio ao plano do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de retomar obras públicas. Além disso, como o foco do ajuste fiscal está do lado das receitas, a cobrança de impostos deve drenar recursos da economia.