A economia brasileira encerrou 2023, primeiro ano do terceiro mandato de Lula, estagnada, mas os bons resultados dos primeiros trimestres contribuíram para um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2,9% no ano passado. O número foi divulgado nesta sexta-feira, 1º, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O número fechado do crescimento de 2023 surpreendeu positivamente. No início do ano, as previsões dos analistas para o desempenho da economia eram bem mais modestas. Não passavam de um crescimento de 1%. Se essas projeções se confirmassem, apontariam para uma desaceleração relevante em relação a 2022, quando o PIB avançou 3%.
“O ano de 2023 terminou bem melhor do que se imaginava”, afirma Alessandra Ribeiro, economista e sócia da consultoria Tendências.
O resultado do PIB do ano passado ficou dentro do esperado pelos analistas ouvidos pelo Projeções Broadcast, cujo intervalo variava de alta de 2,8% a 3,2%. Mas veio um pouco abaixo da mediana das previsões, que era de avanço de 3%.
No quarto trimestre, a economia ficou estagnada em relação aos três meses anteriores. Nesta sexta-feira, o IBGE revisou o crescimento do terceiro trimestre de 0,1% para zero.
No ano passado, pela ótica da oferta, a agropecuária foi o grande destaque. A supersafra e os bons preços no mercado internacional garantiram um crescimento de 15,1% para o setor - um recorde desde o início da série histórica, em 1996.
Com a safra concentrada no início do ano, os números positivos da agropecuária ficaram concentrados nos primeiros meses de 2023. No primeiro trimestre, por exemplo, o agro cresceu 20,9%.
“A previsão era de um crescimento da safra em relação a 2022, mas foi uma safra bem mais forte do que se esperava”, afirma Natália Cotarelli, economista do banco Itaú. “Esse agro mais forte foi responsável por cerca de um terço do crescimento de 2023 e ajudou também outros setores. Beneficiou a parte de serviços de transporte e armazenamento, por exemplo.”
Em 2023, outro destaque foi o setor de serviços, com alta de 2,4%. A indústria avançou 1,6%, ajudada, sobretudo, pelo setor extrativista - a atividade teve alta de 8,7%.
“Não foi só o agro (que surpreendeu). Houve uma resiliência da economia de serviços e mesmo da indústria”, afirma Alessandra. “Apesar de alguns comportamentos negativos na parte de transformação e construção, toda a parte de indústria extrativa veio melhor do que o esperado.”
Pela ótica da demanda, o ponto positivo foi o consumo das famílias, com alta de 3,1%, turbinado pelo aumento das transferências do governo, reajuste do salário mínimo acima da inflação e mercado de trabalho aquecido. No último trimestre do ano passado, porém, houve queda de 0,2%, revertendo uma sequência de nove trimestres consecutivos de crescimento.
“Quando a gente olha a renda disponível das famílias, composta por salários, benefícios e transferências do governo, está num nível super alto. Isso faz com que as pessoas demandem mais, e o País tenha um PIB melhor”, afirma Laiz Carvalho, economista para o Brasil do BNP Paribas.
Outro destaque do lado da demanda foi a contribuição do setor externo. As exportações cresceram 9,1% no ano passado em relação a 2022, e as importações caíram 1,2%. Em 2023, o Brasil colheu um saldo comercial recorde de US$ 98,8 bilhões. “A agropecuária e a indústria extrativa ajudaram a exportação a ser destaque do ano”, afirma Natália, do Itaú.
Por outro lado, impactado pelo aperto monetário, a formação bruta de capital fixo (os investimentos) foi a grande decepção do ano. Em 2023, a queda foi de 3%. No quarto trimestre, no entanto, houve alta de 0,9% na comparação com os três meses anteriores, interrompendo uma sequência de quatro leituras com quedas seguidas.
No ano passado, a taxa de investimento foi de 16,5% do PIB, abaixo do apurado em 2022 (17,8%). A taxa de poupança também caiu e marcou 15,4% do PIB em 2023. Em 2022, foi de 15,8%.
“Como qualquer país emergente, o Brasil tem uma dependência de capital externo para investimento. Não podemos desconsiderar o aperto monetário no mundo. Ativos de maior risco - e podemos colocar países nesse grupo - perdem quando as taxas de juros no EUA estão elevadas”, afirma Tatiana Pinheiro, economista-chefe da Galapagos Capital. “Houve uma mudança dos investimentos preferindo caixa, ativos sem risco.”
“Mas não podemos tirar a parte brasileira na discussão. Houve uma série de debates da condução da política doméstica que não foram favoráveis para o Brasil ser destino de investimento, como mudança da meta de inflação, se vai ter arcabouço fiscal ou não vai ter arcabouço, de reestatização”, acrescenta.
O que esperar de 2024?
A expectativa dos economistas é que a economia brasileira desacelere neste ano. Antes da divulgação dos números fechados de 2023, os analistas trabalhavam com um crescimento na faixa de 1,5% a 2%.
Em 2024, a agricultura não deve ter o mesmo desempenho de 2023. Os dados da Companhia Nacional da Abastecimento (Conab) apontam para 316,7 milhões de toneladas na safra 2023/2024, 1,5% abaixo do observado na safra 2022/2023.
Sem a força da agropecuária, o setor de serviços, pelo lado da demanda, e o consumo das famílias, pelo lado da oferta, devem desempenhar um papel importante na economia. “No final do ano passado, algumas medidas anunciadas podem ajudar a aumentar esse consumo. Uma delas é precatórios”, diz Laiz.
Em dezembro, o governo abriu crédito extraordinário para o pagamento de mais de R$ 90 bilhões em precatórios. Parte começou a chegar para a população em janeiro, o que deve ajudar no consumo neste início do ano. “Houve também o anúncio de que eles vão adiantar o pagamento dos precatórios que estavam previstos para junho. Isso faz com que dinheiro chegue mais cedo na mão das pessoas e elas acabam consumindo mais”, afirma Laiz.
Os investimentos também devem voltar a crescer, turbinados pelo ciclo de queda dos juros. Atualmente, a Selic está em 11,25% ao ano. A expectativa do mercado, de acordo com o boletim Focus, do Banco Central, é a de que ela encerre o ano em 9%.
“O PIB industrial deve crescer mais em 2024. Vamos ver mais ajuda da construção civil e da indústria de transformação. Na nossa avaliação, principalmente no segundo semestre, são setores que vão sentir mais a queda de juros”, diz Alessandra. “Do lado da demanda, isso vai aparecer em investimento.”