Por trás de ‘O dilema das redes’


Considerar que somos um dócil rebanho sem nenhuma energia interna de defesa é uma ideia ingênua e perigosa

Por Jaime Troiano
Atualização:

Em cartaz na Netflix. Quem não viu ainda O dilema das redes precisa ver, se quiser! Há razões de sobra para isso. Afinal, queiramos ou não, estamos imersos numa grande trama digital. Somos como o peixe que não sabe que tudo ao redor dele é água. Nossa água são bits, numa infinita estratosfera binária.

O que o filme revela não é, em si, uma grande novidade, mas tem um tratamento diferente de outros que também denunciam ou simplesmente mostram como somos levados a fazer e pensar o que outros querem que façamos ou pensemos. É como se os algoritmos estivessem de tocaia numa curva digital que acessamos e que acabam mapeando nossos próximos desejos e necessidades. Eugênio Bucci, num belo artigo no Estado de 24/9, diz: “Enredaram a humanidade”.

O filme sugere que somos cativos, somos conduzidos, somos treinados, somos seduzidos, somos menos nós mesmos e mais o que eles, que dirigem as redes sociais, querem que sejamos. Os porcos da Revolução dos Bichos (George Orwell), pelo menos, se revoltaram, ainda que ao fim da história tenham se submetido a uma opressiva tirania. Nós seríamos os porquinhos mais dóceis na história.

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Filme nos leva a pensar que vivemos sob um torpor obediente das redes sociais. Foto: Netflix/Divulgação

O que o filme nos leva a pensar é que vivemos sob um torpor obediente, como uma droga que nos imobiliza. Sobre adictos de redes e drogas.

Bem, eu poderia parar aqui e simplesmente concordar com a existência deste plano maligno das redes e seus métodos de dominação dos nossos sentidos, vontades e opiniões. Como se elas estivessem pondo em marcha algo tão fantasioso como foi também Os Protocolos dos Sábios de Sião, mas substituindo judeus e maçons pelos Zuckerbergs da vida. Mas isso não é verdade. E eu fico ruminando duas encucações.

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São duas cismas que eu tenho. A primeira é mais cinematográfica. Lembro-me de um filme com estrutura semelhante. Russell Crowe, no papel de um importante ex-executivo de uma indústria de tabaco (O informante). Ele acaba revelando, numa entrevista na tevê, no programa 60 minutos, como o fabricante acrescentava substâncias viciadoras no produto. Em O dilema das redes, são ex-executivos do Facebook, Twitter, Instagram, Pinterest que fazem a denúncia.

Ficou na minha cabeça uma pergunta: será que esses profissionais que saíram das redes não estavam fazendo, por meio do filme, uma certa delação premiada para ver se conseguem se libertar da tornozeleira eletrônica da culpa que carregam? Expiada a culpa, rompe-se a tornozeleira.

E os que continuam nas respectivas empresas estão esperando uma chance para suas delações? Ou não estão nem aí para isso?

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A segunda cisma que tenho me incomoda muito mais. O filme faz questão de insistir em nossa incapacidade de resistir à pressão e a uma sedução diabólica das lógicas algorítmicas. Ulisses se prendeu ao mastro do navio para resistir ao canto das sereias. Mas podemos pensar que, para nós, não há Homero que nos impeça de ser seduzidos. Ou será que há?

Há, sim! Nós somos Homeros de nós mesmos. Nós não somos vulneráveis e indefesos, como o filme imagina. Temos uma energia interna, consciente ou inconsciente, que nos permite reagir contra o que não nos convém. Mesmo que nossa psique muitas vezes vacile. Mas daí a considerar que somos um dócil rebanho sem nenhuma energia interna de defesa é uma ideia ingênua e perigosa.

Não tenho qualquer dúvida: nós vamos viver neste aquário digital sem repetir a história dos peixes. Por um desígnio da evolução, ela nos presenteou com uma capacidade de conseguir entender o que os peixes nunca entenderão. Temos como dizer não, se quisermos. Alguns de nós com mais preparo ou sensibilidade, outros com menos, mas todos com seu próprio aparato interno que funciona como mastros.

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Vejam o filme. Mas, se não quiserem, não vejam. Afinal, nós temos como dizer não.

*PRESIDENTE DA TROIANOBRANDING

Em cartaz na Netflix. Quem não viu ainda O dilema das redes precisa ver, se quiser! Há razões de sobra para isso. Afinal, queiramos ou não, estamos imersos numa grande trama digital. Somos como o peixe que não sabe que tudo ao redor dele é água. Nossa água são bits, numa infinita estratosfera binária.

O que o filme revela não é, em si, uma grande novidade, mas tem um tratamento diferente de outros que também denunciam ou simplesmente mostram como somos levados a fazer e pensar o que outros querem que façamos ou pensemos. É como se os algoritmos estivessem de tocaia numa curva digital que acessamos e que acabam mapeando nossos próximos desejos e necessidades. Eugênio Bucci, num belo artigo no Estado de 24/9, diz: “Enredaram a humanidade”.

O filme sugere que somos cativos, somos conduzidos, somos treinados, somos seduzidos, somos menos nós mesmos e mais o que eles, que dirigem as redes sociais, querem que sejamos. Os porcos da Revolução dos Bichos (George Orwell), pelo menos, se revoltaram, ainda que ao fim da história tenham se submetido a uma opressiva tirania. Nós seríamos os porquinhos mais dóceis na história.

Filme nos leva a pensar que vivemos sob um torpor obediente das redes sociais. Foto: Netflix/Divulgação

O que o filme nos leva a pensar é que vivemos sob um torpor obediente, como uma droga que nos imobiliza. Sobre adictos de redes e drogas.

Bem, eu poderia parar aqui e simplesmente concordar com a existência deste plano maligno das redes e seus métodos de dominação dos nossos sentidos, vontades e opiniões. Como se elas estivessem pondo em marcha algo tão fantasioso como foi também Os Protocolos dos Sábios de Sião, mas substituindo judeus e maçons pelos Zuckerbergs da vida. Mas isso não é verdade. E eu fico ruminando duas encucações.

São duas cismas que eu tenho. A primeira é mais cinematográfica. Lembro-me de um filme com estrutura semelhante. Russell Crowe, no papel de um importante ex-executivo de uma indústria de tabaco (O informante). Ele acaba revelando, numa entrevista na tevê, no programa 60 minutos, como o fabricante acrescentava substâncias viciadoras no produto. Em O dilema das redes, são ex-executivos do Facebook, Twitter, Instagram, Pinterest que fazem a denúncia.

Ficou na minha cabeça uma pergunta: será que esses profissionais que saíram das redes não estavam fazendo, por meio do filme, uma certa delação premiada para ver se conseguem se libertar da tornozeleira eletrônica da culpa que carregam? Expiada a culpa, rompe-se a tornozeleira.

E os que continuam nas respectivas empresas estão esperando uma chance para suas delações? Ou não estão nem aí para isso?

A segunda cisma que tenho me incomoda muito mais. O filme faz questão de insistir em nossa incapacidade de resistir à pressão e a uma sedução diabólica das lógicas algorítmicas. Ulisses se prendeu ao mastro do navio para resistir ao canto das sereias. Mas podemos pensar que, para nós, não há Homero que nos impeça de ser seduzidos. Ou será que há?

Há, sim! Nós somos Homeros de nós mesmos. Nós não somos vulneráveis e indefesos, como o filme imagina. Temos uma energia interna, consciente ou inconsciente, que nos permite reagir contra o que não nos convém. Mesmo que nossa psique muitas vezes vacile. Mas daí a considerar que somos um dócil rebanho sem nenhuma energia interna de defesa é uma ideia ingênua e perigosa.

Não tenho qualquer dúvida: nós vamos viver neste aquário digital sem repetir a história dos peixes. Por um desígnio da evolução, ela nos presenteou com uma capacidade de conseguir entender o que os peixes nunca entenderão. Temos como dizer não, se quisermos. Alguns de nós com mais preparo ou sensibilidade, outros com menos, mas todos com seu próprio aparato interno que funciona como mastros.

Vejam o filme. Mas, se não quiserem, não vejam. Afinal, nós temos como dizer não.

*PRESIDENTE DA TROIANOBRANDING

Em cartaz na Netflix. Quem não viu ainda O dilema das redes precisa ver, se quiser! Há razões de sobra para isso. Afinal, queiramos ou não, estamos imersos numa grande trama digital. Somos como o peixe que não sabe que tudo ao redor dele é água. Nossa água são bits, numa infinita estratosfera binária.

O que o filme revela não é, em si, uma grande novidade, mas tem um tratamento diferente de outros que também denunciam ou simplesmente mostram como somos levados a fazer e pensar o que outros querem que façamos ou pensemos. É como se os algoritmos estivessem de tocaia numa curva digital que acessamos e que acabam mapeando nossos próximos desejos e necessidades. Eugênio Bucci, num belo artigo no Estado de 24/9, diz: “Enredaram a humanidade”.

O filme sugere que somos cativos, somos conduzidos, somos treinados, somos seduzidos, somos menos nós mesmos e mais o que eles, que dirigem as redes sociais, querem que sejamos. Os porcos da Revolução dos Bichos (George Orwell), pelo menos, se revoltaram, ainda que ao fim da história tenham se submetido a uma opressiva tirania. Nós seríamos os porquinhos mais dóceis na história.

Filme nos leva a pensar que vivemos sob um torpor obediente das redes sociais. Foto: Netflix/Divulgação

O que o filme nos leva a pensar é que vivemos sob um torpor obediente, como uma droga que nos imobiliza. Sobre adictos de redes e drogas.

Bem, eu poderia parar aqui e simplesmente concordar com a existência deste plano maligno das redes e seus métodos de dominação dos nossos sentidos, vontades e opiniões. Como se elas estivessem pondo em marcha algo tão fantasioso como foi também Os Protocolos dos Sábios de Sião, mas substituindo judeus e maçons pelos Zuckerbergs da vida. Mas isso não é verdade. E eu fico ruminando duas encucações.

São duas cismas que eu tenho. A primeira é mais cinematográfica. Lembro-me de um filme com estrutura semelhante. Russell Crowe, no papel de um importante ex-executivo de uma indústria de tabaco (O informante). Ele acaba revelando, numa entrevista na tevê, no programa 60 minutos, como o fabricante acrescentava substâncias viciadoras no produto. Em O dilema das redes, são ex-executivos do Facebook, Twitter, Instagram, Pinterest que fazem a denúncia.

Ficou na minha cabeça uma pergunta: será que esses profissionais que saíram das redes não estavam fazendo, por meio do filme, uma certa delação premiada para ver se conseguem se libertar da tornozeleira eletrônica da culpa que carregam? Expiada a culpa, rompe-se a tornozeleira.

E os que continuam nas respectivas empresas estão esperando uma chance para suas delações? Ou não estão nem aí para isso?

A segunda cisma que tenho me incomoda muito mais. O filme faz questão de insistir em nossa incapacidade de resistir à pressão e a uma sedução diabólica das lógicas algorítmicas. Ulisses se prendeu ao mastro do navio para resistir ao canto das sereias. Mas podemos pensar que, para nós, não há Homero que nos impeça de ser seduzidos. Ou será que há?

Há, sim! Nós somos Homeros de nós mesmos. Nós não somos vulneráveis e indefesos, como o filme imagina. Temos uma energia interna, consciente ou inconsciente, que nos permite reagir contra o que não nos convém. Mesmo que nossa psique muitas vezes vacile. Mas daí a considerar que somos um dócil rebanho sem nenhuma energia interna de defesa é uma ideia ingênua e perigosa.

Não tenho qualquer dúvida: nós vamos viver neste aquário digital sem repetir a história dos peixes. Por um desígnio da evolução, ela nos presenteou com uma capacidade de conseguir entender o que os peixes nunca entenderão. Temos como dizer não, se quisermos. Alguns de nós com mais preparo ou sensibilidade, outros com menos, mas todos com seu próprio aparato interno que funciona como mastros.

Vejam o filme. Mas, se não quiserem, não vejam. Afinal, nós temos como dizer não.

*PRESIDENTE DA TROIANOBRANDING

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