BRASÍLIA – O enfrentamento da emergência climática ganhou a votação que o governo fez na sociedade civil para a definição das prioridades de políticas públicas para os próximos quatro anos (2023- 2027) incluídas no Plano Plurianual (PPA).
Os programas mais votados entraram no PPA e serão acompanhados com lupa pelo Ministério do Planejamento e Orçamento, responsável pela elaboração do plano. Na lista de prioridades também estão a atenção primária à saúde, gastos com educação e o enfrentamento da pobreza.
O plano foi repaginado pela equipe da ministra Simone Tebet com a missão de restaurar o planejamento de médio prazo no Brasil, que foi praticamente abandonado, diante dos seguidos incêndios e solavancos de curto prazo que a economia brasileira vem passando – entre eles a crise fiscal, os seguidos déficits das contas públicas, o baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e também o impacto da covid-19.
O PPA nasce agora com o carimbo de “Participativo”. O projeto de lei foi assinado hoje pelo presidente Luiz Inácio da Silva em cerimônia, no Palácio do Planalto, e entregue ao Congresso Nacional, após receber propostas de todo o País em plenárias estaduais realizadas em todas as capitais, com a participação de 309 movimentos e organizações da sociedade civil, que apresentaram suas demandas e defenderam suas propostas. A própria ministra participou de algumas das plenárias estaduais.
É a primeira vez que movimentos e organizações da sociedade civil participam diretamente da definição do PPA para os próximos quatro anos, principal instrumento de planejamento de médio prazo. Foram recebidos mais de 1,5 milhão de votos e 8.254 propostas. Os programas mais votados foram incluídos como prioridade no plano.
O PPA reformulado também é um primeiro passo para a realização de uma proposta antiga do presidente Lula de fazer com que a elaboração do Orçamento do governo seja feita com a participação da sociedade.
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O que é o PPA?
Previsto na Constituição e com relevância esvaziada ao longo da última década, inclusive pelos próprios senadores e deputados, o PPA estabelece as diretrizes e metas a serem seguidas pelo governo federal. É como se fosse um livro de cabeceira com a visão de futuro e o caminho para que as metas sejam atingidas ao final do período – neste caso, 2027.
À frente da elaboração do PPA, a secretária nacional de Planejamento do Ministério do Planejamento e Orçamento, Leany Lemos, destaca que o PPA virou uma peça muito “acessória, de prateleira, por não ter realismo fiscal”.. “Queremos fazer uma governança forte de acompanhamento de metas. Não tem um centavo no orçamento se não estiver no PPA”, avisa.
Segundo ele, o PPA é um programa que fundamenta os Orçamentos dos anos seguintes. Daí, a importância do resgate do planejamento de médio prazo. Para a secretária, muitos dos planos atuais do País são gerados justamente pela falta de planejamento.
A secretária reconhece que o resultado da votação, que colocou o programa de enfrentamento da emergência climática no topo da lista, surpreendeu. Leny conta que o movimento ambiental se organizou e até mesmo a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, pediu votos nas suas redes sociais. Para a secretária, o resultado mostrou a força de uma agenda nova, global e contemporânea. A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, também fez propaganda para que os programas do sua pasta ganhassem prioridade.
O novo PPA tem 88 programas, que juntos somam R$ 13,3 trilhões. O projeto, que terá que ser aprovado pelo Congresso até o final do ano, junto com o Orçamento de 2024, contém também sete indicadores-chave nacionais e metas a serem atingidas para melhorar o desenvolvimento do País. São elas:
- Taxa de extrema pobreza
- Produto Interno Bruto (PIB) per capita (por habitante)
- Volume de emissão de gases de efeito estufa no Brasil
- Rendimento domiciliar per capita nas grandes regiões
- Razão entre as rendas dos 10% mais ricos e dos 40% mais pobres;
- Taxa de desemprego
- Desmatamento anual do bioma Amazônia
Para cada das metas, há um sistema de banda (intervalo) que aponta o resultado desejável e o resultado base (o piso) ao final de 2027. É uma forma de monitorar, cobrar e acompanhar a evolução dessas políticas ao longo dos anos.
Por exemplo: no caso da extrema pobreza, o País deverá estar no cenário desejável em 2,72% em 2027, ante os 6% registrados no final do ano passado. No cenário-base, a taxa de pobreza estará em 4,78%.
No caso da meta de redução do desmatamento anual da Amazônia, a meta é reduzir de 11.524 quilômetros quadrados para 2.319 quilômetros quadrados.
Para a diretora da Instituição Fiscal Independente (IFI), Vilma Pinto, a reformulação do PPA sobre novas bases é um caminho importante na direção de melhorar a governança fiscal no País, mas precisa vir acompanhado de outras medidas. “Reforça a governança fiscal, mas o PPA sozinho ainda não é suficiente. Existem avanços importantes que precisam ser feitos e, de certa forma, precisam ser sinalizados”, avalia Vilma.
A especialista em contas públicas alertou que o PPA repaginado não retira a necessidade de o governo implementar no processo orçamentário brasileiro o chamado quadro de despesas de médio prazo, conhecido por MTEF, na sigla em inglês. Esse quadro, que faz parte da reforma do Orçamento, que está sendo elaborada pelo Ministério do Planejamento, parte da construção de um cenário fiscal acompanhado da definição de metas plurianuais para a dívida pública.
A partir desse quadro de despesas de médio prazo é que é definido o resultado fiscal (receitas menos despesas) necessário para o cumprimento das metas de endividamento e a definição do espaço fiscal disponível para alocação de recursos do Orçamento no médio prazo.
A diretora da IFI, porém, avalia como positiva a participação popular na definição das prioridades do PPA num ambiente coletivo. “Quando se coloca a sociedade para participar, quando diferentes setores e atores econômicos são ouvidos, é mais fácil dimensionar melhor quais são as prioridades que a sociedade está demandando”, afirma.