RIO - A redução do preço da gasolina anunciado pela Petrobras nesta terça-feira, 19, deve provocar uma queda na inflação oficial no País em julho e agosto, mas o alívio nos preços deve ser pontual e será sentido mais pela população de média e alta renda que tem carro próprio do que pelos mais pobres.
A Petrobras anunciou uma redução de R$ 0,20 (4,9%) no preço da gasolina nas refinarias, que entra em vigor nesta quarta-feira. A redução marca a estreia de reajustes do novo presidente da companhia, Caio Paes de Andrade, que tomou posse há três semanas, quando o preço do petróleo começou a se estabilizar em torno dos US$ 100 o barril.
Segundo cálculos do economista da Fundação Getulio Vargas (FGV), André Braz, o corte da gasolina vai levar a uma queda de 0,05 ponto porcentual no IPCA em julho, e de até 0,10 ponto em agosto.
“Como a redução de 4,9% nos preços da gasolina é na refinaria, ela não chega nessa magnitude na bomba, que tem a gasolina do tipo C, com mistura de 27% de álcool anidro. No fim, grosso modo, mais ou menos um terço dessa queda nas refinarias vai chegar de fato na bomba, pouco menos de 2%”, calcula Braz, que é coordenador de índice de preços da FGV.
Segundo o economista, a cada 1% de queda no preço da gasolina, a inflação recua 0,07 ponto porcentual.
Para Braz, haverá um impacto no IPCA (índice oficial de inflação do País), mas nada que consolide uma redução da inflação para a meta do Banco Central ou leve a melhora da percepção da população sobre a dinâmica de preços, que seguem pressionados em outras frentes, como os alimentos.
“Na prática, uma família de baixa renda, que gasta muito com alimentos, não vai perceber nenhuma melhora na inflação a partir da queda no preço da gasolina, simplesmente porque não chega perto do posto de gasolina.”
O preço do diesel – que tem mais impacto sobre o custo do frete e do preço dos alimentos – se manteve inalterado, segundo a companhia, já que ainda há muita volatilidade nesse combustível no mercado internacional.
Impacto na inflação em 2022
O corte da gasolina também deve reduzir a inflação no consolidado do ano. Luis Menon, economista da Garde Asset, calcula que o corte no preço do combustível deve retirar 0,20 ponto porcentual do IPCA em 2022. Dessa forma, sua projeção para a inflação neste ano caiu de 7,1% para 6,9%.
O economista-chefe do Banco Alfa, Luís Otávio de Souza Leal, também projeta uma redução entre 0,20 e 0,25 ponto porcentual no IPCA de 2022 por causa do corte da gasolina.
Ele ressalta, no entanto, que tem sido difícil estimar a redução total do combustível na bomba por causa da sequência de alterações de preços em um curto espaço de tempo.
Nas últimas quatro semanas, o preço médio da gasolina no Brasil passou de R$ 7,39 por litro para R$ 6,07, segundo levantamento da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). A queda tem relação com o corte na alíquota do ICMS cobrado, que foi limitada em 17% em lei aprovada no Congresso.
“É tanto impacto junto nos combustíveis que fica difícil mensurar o que vai ficar no fim das contas. Quando a expectativa é de redução de R$ 0,10, cada centavo faz diferença, e o posto pode ser cobrado por isso. Mas quando são quase R$ 2 (na soma dos ajustes), os centavos acabam perdidos no caminho”, diz Leal.
Reajuste
Segundo a Petrobras, a decisão de reduzir o preço da gasolina foi técnica, apesar de o presidente Jair Bolsonaro pressionar publicamente a empresa nos últimos dias para que fosse promovida uma queda geral de preços.
Minutos antes do anúncio, Bolsonaro disse a apoiadores que, com o novo presidente, a Petrobras iria “achar seu rumo agora”, ou seja, deixar de repassar a volatilidade dos preços internacionais para o mercado interno, como vem praticando. A decisão sobre reajustes é tomada pelo presidente da companhia e mais dois diretores, o Financeiro e o de Comercialização.
“Essa redução acompanha a evolução dos preços internacionais de referência, que se estabilizaram em patamar inferior para a gasolina, e é coerente com a prática de preços da Petrobras, que busca o equilíbrio de seus preços com o mercado global, mas sem o repasse para os preços internos da volatilidade conjuntural das cotações internacionais e da taxa de câmbio”, disse a Petrobras em nota ao anunciar o reajuste.
Horas depois, uma nova nota da companhia reforçou “que ajustes de preços de produtos são realizados no curso normal de seus negócios e seguem as suas políticas comerciais vigentes”.
Segundo uma fonte da companhia, o reajuste era necessário porque o preço da gasolina se estabilizou, enquanto o diesel continua volátil, e a estatal não poderia deixar de reduzir o preço só para não parecer que foi um pedido de Bolsonaro.
Única concorrente da Petrobras no mercado brasileiro, a Acelen, controladora da Refinaria de Mataripe, na Bahia, privatizada no fim do ano passado, já havia reduzido a gasolina em 7% na semana passada.
Desde 2016, a Petrobras pratica a política de paridade de importação (PPI), amplamente criticada pelo governo e por opositores de Bolsonaro. Pelo PPI, a empresa precisa acompanhar os preços do mercado internacional, levando em conta a variação da cotação do petróleo, do dólar e o custo de importação.
“Desta vez, o que realmente trouxe o preço (da gasolina) da Petrobras para baixo foi o movimento do mercado internacional de petróleo e derivados, em queda. A gasolina caiu bem no mundo. O preço nacional poderia ter caído até mais, não fosse o dólar, que não ajudou muito subindo nos últimos dias”, disse o analista da StoneX Pedro Shinzato.
Para Shinzato, a companhia poderia ter reduzido também o preço do diesel, uma vez que haveria espaço para diminuição da paridade internacional.
Shinzato afirma que, antes do anúncio de reajuste, o preço internacional da gasolina estava 6,3% menor que o praticado pela empresa brasileira, cerca de R$ 0,26 mais barato por litro. Com a redução de R$ 0,20, portanto, a Petrobras se aproxima dos preços internacionais, mas ainda vai praticar preço 1,3% maior que a média verificada no exterior – diferença de R$ 0,05, segundo as cotações internacionais.
Com base nos preços praticados pela Refinaria de Paulínia (Replan), considerados bom termo para o acompanhamento dos preços da Petrobras, a alta no preço da gasolina acumula, agora, 24,4% no ano e 42,6% em 12 meses. Antes da redução nos preços, esses índices eram, respectivamente, de 30,8% e 49,9%, segundo cálculos da StoneX.
Já o presidente da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), Sérgio Araújo, definiu a redução no preço da gasolina pela Petrobras como “tecnicamente acertada” e “coerente”, um primeiro sinal de que a atual gestão da estatal pode respeitar o preço de paridade internacional.
“As janelas para importação estavam abertas para gasolina e para o diesel. Para a gasolina, havia uns seis ou sete dias. Então, faz sentido a movimentação feita pela Petrobras. A companhia foi coerente com o compromisso de praticar o preço de paridade internacional”, diz Araújo.
Ele afirmou, no entanto, que para os pequenos e médios importadores a janela continua fechada. “Nossos associados ainda se sentem inseguros, exatamente em função do histórico desse 2022, quando a Petrobras esteve consistentemente trabalhando com preços artificiais, abaixo da paridade. Isso coloca uma desconfiança muito grande, além do ambiente pré-eleitoral, que também traz incertezas”, afirma.
Para o coordenador da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar, a redução de preço acontece em um momento em que a alta da gasolina acumula uma variação de 169,1% desde o início do governo Bolsonaro, em 2019.
“É inadmissível que o Brasil, autossuficiente em petróleo, tenha de se submeter à equivocada política de preço de paridade de importação, que reajusta os combustíveis com base na cotação internacional do petróleo, variação do câmbio e custos de importação. A marca do PPI está na escalada da inflação que corrói o poder de compra do povo brasileiro”, disse, em nota. / COLABOROU GUILHERME BIANCHINI