ESPECIAL PARA O ESTADÃO - É praticamente unânime entre consultorias, universidades, economistas e analistas ouvidos pelo Estadão que a reforma tributária trará crescimento ao Produto Interno Bruto (PIB) a médio e longo prazos. O que varia são quando e como isso vai ocorrer, e tamanho do impacto diante das incertezas em relação ao texto que será aprovado.
Para eles, ganhos de eficiência com a otimização dos tributos e a redução da burocracia, não cumulatividade, tributação no destino e estabilidade de regras vão aumentar a produtividade das empresas, reduzir gastos e atrair mais investimentos, com impactos no crescimento econômico.
Estudo recente da Tendências Consultoria aponta que, em dez anos, a reforma pode acrescentar de 4% a 8% de crescimento no PIB agregado. São levados em consideração um cenário básico (com normalização macroeconômica mais desafiadora) e outro otimista (governo recupera capital político e aprofunda reformas). Já em um cenário pessimista (com crise de governabilidade interna e turbulências internacionais), a reforma teria efeitos nulos no PIB.
Entre as várias premissas desses cenários estão as políticas interna e externa, previsões de inflação e de taxa de juro, trajetória fiscal e capacidade do governo em implementar agendas econômicas. Também foram avaliados resultados de reformas similares em outros países, como Índia, China e Canadá, informa Alessandra Ribeiro, economista e sócia da Tendências.
Leia Também:
“Nosso estudo considera um número amplo de exceções no texto final e as alíquotas do IVA Dual entre 25,7% e 27,3%”, diz. Ela tem previsões também de curto prazo no cenário básico, com um adicional de crescimento no PIB de 0,10 ponto porcentual já em 2025 e de 0,20 em 2026.
Outro trabalho que leva em consideração um prazo mais longo de aplicação da reforma projeta impactos de 4% a 20% do PIB acumulado após 15 anos. Também são avaliados os três cenários, sendo que no conservador o impacto seria de 12%.
A simulação foi realizada pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) antes das alterações acrescentadas no Congresso ao texto original da reforma.
“Por enquanto, as mudanças no texto original não alteram as previsões de ganhos na macroeconomia, mas para os setores vai mudar bastante, pois alguns estão conseguindo mais benefícios e exceções”, afirma Edson Paulo Domingues, professor do Cedeplar/UFMG e um dos responsáveis pelo estudo. Segundo ele, após a conclusão do texto, se houver mais mudanças significativas a conta geral também será refeita.
Mais investimentos
Na visão de Marcus Vinicius Gonçalves, sócio-líder da área de Impostos da KPMG no Brasil, a melhora no PIB no pós reforma tributária virá, por exemplo, do aumento dos investimentos de empresas após mudanças como o fim de acúmulo de créditos nas exportações, menos insegurança jurídica e menos contenciosos, redução de custos de compliance e simplificação tributária, entre outros.
Gonçalves ressalta que o Brasil passa a ter um sistema tributário mais moderno e alinhado com os países mais desenvolvidos. “Ao ter menos exigências, menos necessidade de pessoas cuidando de cada detalhe da apuração do imposto e menos contenciosos, todo esse custo pode se reverter em investimentos e, mais para a frente, terá reflexos no PIB”.
O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, avalia que os resultados da reforma vão demorar a aparecer e, neste momento, a discussão do tema, que é muito importante, está sendo ofuscada por questões que estão “nublando o cenário macroeconômico”, como indefinições em relação a taxa de juros e de câmbio.
“Certamente no curto prazo não devemos ver impacto no PIB pois ele deveria vir via investimentos, mas isso não depende só da reforma, mas de todo um conjunto macroeconômico estável; infelizmente não é que temos hoje”, afirma Vale. “Embora o investidor veja a reforma como um estimulador, as imprevisibilidade e variáveis econômicas acabam nublando esse cenário que poderia ser mais positivo com a reforma tributária”.
Sem guerra fiscal
O Brasil tem uma história de altos custos para pagar os impostos e por tributar na origem, o que gera guerra fiscal entre os Estados e acaba levando a produção não para onde é mais eficiente, mas para onde paga menos imposto, resultando assim na má alocação de capital, lembra Armando Castelar, pesquisador associado do Ibre/FGV
Por essa e outras razões, diz ele, há uma expectativa grande de que a reforma reduza custos tributários e aumente a eficiência da economia, permitindo um crescimento mais rápido. Castelar concorda, mas ressalta que toda essa discussão foi em cima de uma proposta conceitual, que tinha uma alíquota única para todos os setores e não envolvia aumento de carga.
“Hoje é menos claro se o impacto será significativo ou não porque o texto atual é uma regra bem menos eficiente do ponto de vista de gerar crescimento do que a proposta que orientou a PEC 45 (em 2019)”, ressalta Castelar. Para ele, as expectativas foram mitigadas de forma relevante pelas exceções incluídas no texto e por haver aumento de imposto em alguns segmentos. “Hoje há menos otimismo em relação à proposta colocada inicialmente.”
Teresa Fernandes, da TF Consultoria, também tem dúvidas sobre os impactos significativos da reforma no PIB. Ela teme, inclusive, por aumento da carga tributária no somatório dos impostos, em parte porque o governo precisa buscar equilíbrio fiscal nas contas. “Se a indústria, por exemplo, pagar menos impostos e conseguir produzir e vender produtos mais baratos, ela pode ter uma participação maior no PIB e gerar maiores ganhos à economia.”
Vantagem colateral
Na opinião de Angelo Ambrizzi, head tributário do Marcos Martins Advogados, o crescimento econômico “será uma vantagem colateral” da reforma, pois diminuirá a burocracia, vai trazer mais segurança jurídica, menos judicialização e menos autuações da Receita Federal. “Como o sistema será mais fácil e mais seguro, o cenário será favorável para o capital estrangeiro e novos investidores devem aportar dinheiro no Brasil no longo prazo” - quadro que puxa a economia para cima.
A economista Lorreine Messias, do Núcleo de Pesquisas em Tributação do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), se debruçou em experiências de reformas tributárias recentes em outros países, principalmente aqueles com características similares às do Brasil, como a Índia.
Ela conta que o País teve vários impactos positivos, como maior integração entre suas províncias, maior circulação de mercadorias, maior segurança jurídica, a taxa de formalização entre trabalhadores aumentou e houve abertura de novas empresas. “É um caso que ajuda a iluminar o Brasil, apesar de lá terem sido feitas várias concessões”.
Outro estudo internacional feito em 33 países mostrou que o impacto médio foi de 6% no crescimento do PIB. “Isso foi visto em outros lugares do mundo e não tem porque ser diferente aqui”, diz a economista.