Reforma tributária: ‘Projeção de perda do setor de serviços é irreal’, diz economista-chefe da Fiesp


Igor Rocha destaca que 90% do setor está no Simples Nacional e outros 5% são empresas que prestam serviços a outras empresas e vão passar a tomar crédito tributário, o que hoje não acontece

Por Francisco Carlos de Assis
Atualização:
Foto: Everton Amaro
Entrevista comIgor RochaEconomista-chefe da Fiesp

A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que entrou de corpo e alma no apoio à reforma tributária e considera o texto aprovado pela Câmara positivo, discorda de que o setor de serviços será o mais prejudicado com a reforma. Para o economista-chefe da entidade, Igor Rocha, a indústria da transformação já abarca uma gama grande de serviços e as reclamações do setor redundam em desinformação à sociedade.

“A gente sabe que estes dados são irreais e não vamos perder. Primeiro que 90% dos serviços estão no Simples Nacional, que não vai mudar nada”, diz ele, em entrevista ao Estadão/Broadcast. “Dos 10% restantes, metade presta serviços a outras empresas e vai passar a tomar créditos tributários, o que não acontece hoje. Sobram 5% e por causa disso eu vou lascar um País todo. Não vou continuar neste sistema tributário paleolítico e desalinhado da experiência internacional”, prossegue.

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E, embora a entidade seja entusiasta da reforma tributária, o economista lembra que a Fiesp pediu a retirada do texto final do artigo 19, que abre espaço para que Estados possam criar uma contribuição sobre produtos primários e semielaborados. “Pedimos isso e a alíquota máxima de 25% para o IVA (Imposto sobre Valor Agregado)”, diz. “Supondo que a indústria tenha 25% de alíquota, se os Estados criarem novas contribuições, a alíquota da indústria vai subir.”

Em relação ao crescimento econômico, a Fiesp está otimista com o desempenho da economia como um todo este ano, tanto que projeta 3,1% de PIB para 2023. “Eu acredito que o mercado vai continuar convergindo para a nossa projeção. Mas a indústria não está legal, não. A projeção para o ano é de queda de 0,5% para a produção industrial e de 0,4% para o PIB da indústria. Se isso se concretizar, será a sétima queda em dez anos”, afirma Rocha.

Economista-chefe da Fiesp, Igor Rocha Foto: Everton Amaro
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Leia abaixo os principais trechos da entrevista.

Qual a sua visão sobre a reforma tributária, que ainda reúne muitas controvérsias ao seu redor?

Ela é boa, positiva e não é de um setor, mas de todo o Brasil. Foi aprovada na Câmara e contou com apoio de 98% dos economistas. A questão é que o País se acostumou a conviver com desigualdades regionais e setoriais nos seus 500 anos de descobrimento.

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E esta reforma resolve essas desigualdades?

Sim, porque a maioria dos municípios ganha com a reforma sobre consumo, o que reduz a desigualdade regional. No campo setorial também porque elimina a dificuldade de setores mais tributados, como a indústria da transformação, por exemplo, que responde por 12,9% do PIB e que sozinha arca com mais 30% da arrecadação total. É uma desproporção que acaba, obviamente, dificultando a performance.

A indústria apoia tanto a reforma porque vai pagar menos impostos?

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A indústria da transformação nunca pediu tratamento diferenciado. O que a gente quer é uma reforma que simplifique a grande complexidade que tem hoje na apuração, recolhimento e análise de impostos. O que a indústria quer é um tratamento minimamente isonômico. Não tem sentido o setor que paga a conta - e que por isso é prejudicado na sua performance - continuar pagando-a e quem não paga - e que por isso tem uma performance melhor -, seguir pagando menos.

A indústria abarca uma gama grande de serviços, segmento que diz ser o maior perdedor com a reforma. Isso não preocupa?

Não, porque a gente sabe que esses dados são irreais e não vamos perder. Primeiro que 90% dos serviços estão no Simples Nacional (regime tributário especial para micro e pequenas empresas), que não vai mudar nada. As pessoas se esquecem disso.

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O secretário da Fazenda para a reforma, Bernard Appy, bate sempre nesta questão...

Porque é verdade. Não entendo o porquê de as pessoas perpetuarem a desinformação. Onde querem chegar com isso? Não faz sentido continuarem dizendo uma coisa dessa, que é danosa à sociedade. Se você tira 90% que é Simples, sobram 10% dos quais a metade é pessoa jurídica para pessoa jurídica, são empresas que prestam serviços a outras empresas. E elas vão passar a tomar crédito tributário, o que hoje não acontece. Aí sobram 5% e, por causa disso, eu vou lascar todo um País. Não vou continuar neste sistema tributário paleolítico e desalinhado da experiência internacional.

Qual sua avaliação sobre o artigo 19 da reforma, que pode levar à taxação de exportações?

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Na verdade o artigo 19 pode dar competência para os Estados criarem a contribuição sobre produtos primários e semielaborados.

Mas no fim do dia essa contribuição não pode afetar as exportações?

Pode, mas aí você já está na terceira derivada, está muito além. Pode afetar, mas dá pra gente retomar um pouquinho para trás porque esta nem é a reflexão imediata. O grave é o que pode acontecer antes com estes impostos sobre os primários e semielaborados. Supondo que a indústria tenha 25% de alíquota, se os Estados criarem novas contribuições, a alíquota da indústria vai subir. Serão novos impostos fora do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). Aí é muito ruim.

Mas isso não preocupa vocês?

Preocupa e foi por isso que pedimos para tirar o artigo 19 do texto da reforma. Verbalizamos isso publicamente e em particular aos presidentes da Câmara (Arthur Lira) e do Senado (Rodrigo Pacheco). Pedimos isso e a alíquota máxima de 25% para o IVA (Imposto sobre Valor Agregado).

O prazo da transição é outro ponto que recebe muitas críticas. Acha que poderia ser mais curto?

Sem sombras de dúvidas de que seria melhor se fosse mais curta. Mas quando você procura entender o porquê do prazo mais longo, vai chegar aos tratamentos especiais que foram concedidos até 2032. Se reduzir esta transição, você vai se chocar com estes tratamentos especiais e gerar uma onda de judicialização, aumentando a insegurança jurídica.

Que avaliação você faz da reforma administrativa, bandeira que o presidente da Câmara, Arthur Lira, passou a empunhar recentemente?

A reforma administrativa tem um impacto muito do ponto de vista expectacional. Ela tem duas frentes: a da otimização dos gastos públicos e a da eficiência da máquina pública, onde a reforma administrativa tem um potencial enorme. Do ponto de vista dos gastos, só haverá impacto se de fato entrar em algumas bolas divididas que são bastante delicadas, sobre algumas castas do setor público que são muito privilegiadas.

O arcabouço fiscal vai conseguir zerar o déficit primário?

É um desafio, mas eu gostei bastante do arcabouço. Talvez isso seja o que me dissocia de alguns economistas que o colocam só como algo bom. Eu sou muito otimista com relação ao arcabouço.

Por quê?

Porque é um arcabouço que saiu da forma mais objetiva possível, da demanda da sociedade. As pessoas têm de entender às vezes que cabe aos economistas mostrar para a sociedade os ganhos e as perdas. Mas a escolha sobre qual caminho seguir é feita pela política, pelo reflexo da sociedade. E o arcabouço é complexo porque as demandas da sociedade são complexas.

Você esperava por um crescimento de 0,9% do PIB no segundo trimestre?

Não é por nada, não, mas a gente esperava por um crescimento de 0,8% e veio 0,9%. Para a PIM (Produção Industrial Mensal) estávamos com queda de 0,5% e veio 0,6%. Uma diferença de 0,1 ponto porcentual está bom, né? Antes, só para falar do PIB, desde maio que eu estava com crescimento 2,6% enquanto o mercado estava com 1%. Eu não conseguia entender de onde eles estavam tirando isso porque o carregamento estatístico já apontava para um PIB de 2,4%. Agora que o mercado convergiu para 2,56% nós elevamos nossa projeção de PIB no ano para 3,1%. Eu acho que o mercado vai continuar convergindo para a nossa projeção.

Qual a sua previsão para a indústria no fim do ano?

A indústria não está legal, não. A projeção para o ano é de queda de 0,5% para a produção industrial e de 0,4% para o PIB da indústria. Se isso se concretizar, será a sétima queda em dez anos.

A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que entrou de corpo e alma no apoio à reforma tributária e considera o texto aprovado pela Câmara positivo, discorda de que o setor de serviços será o mais prejudicado com a reforma. Para o economista-chefe da entidade, Igor Rocha, a indústria da transformação já abarca uma gama grande de serviços e as reclamações do setor redundam em desinformação à sociedade.

“A gente sabe que estes dados são irreais e não vamos perder. Primeiro que 90% dos serviços estão no Simples Nacional, que não vai mudar nada”, diz ele, em entrevista ao Estadão/Broadcast. “Dos 10% restantes, metade presta serviços a outras empresas e vai passar a tomar créditos tributários, o que não acontece hoje. Sobram 5% e por causa disso eu vou lascar um País todo. Não vou continuar neste sistema tributário paleolítico e desalinhado da experiência internacional”, prossegue.

E, embora a entidade seja entusiasta da reforma tributária, o economista lembra que a Fiesp pediu a retirada do texto final do artigo 19, que abre espaço para que Estados possam criar uma contribuição sobre produtos primários e semielaborados. “Pedimos isso e a alíquota máxima de 25% para o IVA (Imposto sobre Valor Agregado)”, diz. “Supondo que a indústria tenha 25% de alíquota, se os Estados criarem novas contribuições, a alíquota da indústria vai subir.”

Em relação ao crescimento econômico, a Fiesp está otimista com o desempenho da economia como um todo este ano, tanto que projeta 3,1% de PIB para 2023. “Eu acredito que o mercado vai continuar convergindo para a nossa projeção. Mas a indústria não está legal, não. A projeção para o ano é de queda de 0,5% para a produção industrial e de 0,4% para o PIB da indústria. Se isso se concretizar, será a sétima queda em dez anos”, afirma Rocha.

Economista-chefe da Fiesp, Igor Rocha Foto: Everton Amaro

Leia abaixo os principais trechos da entrevista.

Qual a sua visão sobre a reforma tributária, que ainda reúne muitas controvérsias ao seu redor?

Ela é boa, positiva e não é de um setor, mas de todo o Brasil. Foi aprovada na Câmara e contou com apoio de 98% dos economistas. A questão é que o País se acostumou a conviver com desigualdades regionais e setoriais nos seus 500 anos de descobrimento.

E esta reforma resolve essas desigualdades?

Sim, porque a maioria dos municípios ganha com a reforma sobre consumo, o que reduz a desigualdade regional. No campo setorial também porque elimina a dificuldade de setores mais tributados, como a indústria da transformação, por exemplo, que responde por 12,9% do PIB e que sozinha arca com mais 30% da arrecadação total. É uma desproporção que acaba, obviamente, dificultando a performance.

A indústria apoia tanto a reforma porque vai pagar menos impostos?

A indústria da transformação nunca pediu tratamento diferenciado. O que a gente quer é uma reforma que simplifique a grande complexidade que tem hoje na apuração, recolhimento e análise de impostos. O que a indústria quer é um tratamento minimamente isonômico. Não tem sentido o setor que paga a conta - e que por isso é prejudicado na sua performance - continuar pagando-a e quem não paga - e que por isso tem uma performance melhor -, seguir pagando menos.

A indústria abarca uma gama grande de serviços, segmento que diz ser o maior perdedor com a reforma. Isso não preocupa?

Não, porque a gente sabe que esses dados são irreais e não vamos perder. Primeiro que 90% dos serviços estão no Simples Nacional (regime tributário especial para micro e pequenas empresas), que não vai mudar nada. As pessoas se esquecem disso.

O secretário da Fazenda para a reforma, Bernard Appy, bate sempre nesta questão...

Porque é verdade. Não entendo o porquê de as pessoas perpetuarem a desinformação. Onde querem chegar com isso? Não faz sentido continuarem dizendo uma coisa dessa, que é danosa à sociedade. Se você tira 90% que é Simples, sobram 10% dos quais a metade é pessoa jurídica para pessoa jurídica, são empresas que prestam serviços a outras empresas. E elas vão passar a tomar crédito tributário, o que hoje não acontece. Aí sobram 5% e, por causa disso, eu vou lascar todo um País. Não vou continuar neste sistema tributário paleolítico e desalinhado da experiência internacional.

Qual sua avaliação sobre o artigo 19 da reforma, que pode levar à taxação de exportações?

Na verdade o artigo 19 pode dar competência para os Estados criarem a contribuição sobre produtos primários e semielaborados.

Mas no fim do dia essa contribuição não pode afetar as exportações?

Pode, mas aí você já está na terceira derivada, está muito além. Pode afetar, mas dá pra gente retomar um pouquinho para trás porque esta nem é a reflexão imediata. O grave é o que pode acontecer antes com estes impostos sobre os primários e semielaborados. Supondo que a indústria tenha 25% de alíquota, se os Estados criarem novas contribuições, a alíquota da indústria vai subir. Serão novos impostos fora do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). Aí é muito ruim.

Mas isso não preocupa vocês?

Preocupa e foi por isso que pedimos para tirar o artigo 19 do texto da reforma. Verbalizamos isso publicamente e em particular aos presidentes da Câmara (Arthur Lira) e do Senado (Rodrigo Pacheco). Pedimos isso e a alíquota máxima de 25% para o IVA (Imposto sobre Valor Agregado).

O prazo da transição é outro ponto que recebe muitas críticas. Acha que poderia ser mais curto?

Sem sombras de dúvidas de que seria melhor se fosse mais curta. Mas quando você procura entender o porquê do prazo mais longo, vai chegar aos tratamentos especiais que foram concedidos até 2032. Se reduzir esta transição, você vai se chocar com estes tratamentos especiais e gerar uma onda de judicialização, aumentando a insegurança jurídica.

Que avaliação você faz da reforma administrativa, bandeira que o presidente da Câmara, Arthur Lira, passou a empunhar recentemente?

A reforma administrativa tem um impacto muito do ponto de vista expectacional. Ela tem duas frentes: a da otimização dos gastos públicos e a da eficiência da máquina pública, onde a reforma administrativa tem um potencial enorme. Do ponto de vista dos gastos, só haverá impacto se de fato entrar em algumas bolas divididas que são bastante delicadas, sobre algumas castas do setor público que são muito privilegiadas.

O arcabouço fiscal vai conseguir zerar o déficit primário?

É um desafio, mas eu gostei bastante do arcabouço. Talvez isso seja o que me dissocia de alguns economistas que o colocam só como algo bom. Eu sou muito otimista com relação ao arcabouço.

Por quê?

Porque é um arcabouço que saiu da forma mais objetiva possível, da demanda da sociedade. As pessoas têm de entender às vezes que cabe aos economistas mostrar para a sociedade os ganhos e as perdas. Mas a escolha sobre qual caminho seguir é feita pela política, pelo reflexo da sociedade. E o arcabouço é complexo porque as demandas da sociedade são complexas.

Você esperava por um crescimento de 0,9% do PIB no segundo trimestre?

Não é por nada, não, mas a gente esperava por um crescimento de 0,8% e veio 0,9%. Para a PIM (Produção Industrial Mensal) estávamos com queda de 0,5% e veio 0,6%. Uma diferença de 0,1 ponto porcentual está bom, né? Antes, só para falar do PIB, desde maio que eu estava com crescimento 2,6% enquanto o mercado estava com 1%. Eu não conseguia entender de onde eles estavam tirando isso porque o carregamento estatístico já apontava para um PIB de 2,4%. Agora que o mercado convergiu para 2,56% nós elevamos nossa projeção de PIB no ano para 3,1%. Eu acho que o mercado vai continuar convergindo para a nossa projeção.

Qual a sua previsão para a indústria no fim do ano?

A indústria não está legal, não. A projeção para o ano é de queda de 0,5% para a produção industrial e de 0,4% para o PIB da indústria. Se isso se concretizar, será a sétima queda em dez anos.

A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que entrou de corpo e alma no apoio à reforma tributária e considera o texto aprovado pela Câmara positivo, discorda de que o setor de serviços será o mais prejudicado com a reforma. Para o economista-chefe da entidade, Igor Rocha, a indústria da transformação já abarca uma gama grande de serviços e as reclamações do setor redundam em desinformação à sociedade.

“A gente sabe que estes dados são irreais e não vamos perder. Primeiro que 90% dos serviços estão no Simples Nacional, que não vai mudar nada”, diz ele, em entrevista ao Estadão/Broadcast. “Dos 10% restantes, metade presta serviços a outras empresas e vai passar a tomar créditos tributários, o que não acontece hoje. Sobram 5% e por causa disso eu vou lascar um País todo. Não vou continuar neste sistema tributário paleolítico e desalinhado da experiência internacional”, prossegue.

E, embora a entidade seja entusiasta da reforma tributária, o economista lembra que a Fiesp pediu a retirada do texto final do artigo 19, que abre espaço para que Estados possam criar uma contribuição sobre produtos primários e semielaborados. “Pedimos isso e a alíquota máxima de 25% para o IVA (Imposto sobre Valor Agregado)”, diz. “Supondo que a indústria tenha 25% de alíquota, se os Estados criarem novas contribuições, a alíquota da indústria vai subir.”

Em relação ao crescimento econômico, a Fiesp está otimista com o desempenho da economia como um todo este ano, tanto que projeta 3,1% de PIB para 2023. “Eu acredito que o mercado vai continuar convergindo para a nossa projeção. Mas a indústria não está legal, não. A projeção para o ano é de queda de 0,5% para a produção industrial e de 0,4% para o PIB da indústria. Se isso se concretizar, será a sétima queda em dez anos”, afirma Rocha.

Economista-chefe da Fiesp, Igor Rocha Foto: Everton Amaro

Leia abaixo os principais trechos da entrevista.

Qual a sua visão sobre a reforma tributária, que ainda reúne muitas controvérsias ao seu redor?

Ela é boa, positiva e não é de um setor, mas de todo o Brasil. Foi aprovada na Câmara e contou com apoio de 98% dos economistas. A questão é que o País se acostumou a conviver com desigualdades regionais e setoriais nos seus 500 anos de descobrimento.

E esta reforma resolve essas desigualdades?

Sim, porque a maioria dos municípios ganha com a reforma sobre consumo, o que reduz a desigualdade regional. No campo setorial também porque elimina a dificuldade de setores mais tributados, como a indústria da transformação, por exemplo, que responde por 12,9% do PIB e que sozinha arca com mais 30% da arrecadação total. É uma desproporção que acaba, obviamente, dificultando a performance.

A indústria apoia tanto a reforma porque vai pagar menos impostos?

A indústria da transformação nunca pediu tratamento diferenciado. O que a gente quer é uma reforma que simplifique a grande complexidade que tem hoje na apuração, recolhimento e análise de impostos. O que a indústria quer é um tratamento minimamente isonômico. Não tem sentido o setor que paga a conta - e que por isso é prejudicado na sua performance - continuar pagando-a e quem não paga - e que por isso tem uma performance melhor -, seguir pagando menos.

A indústria abarca uma gama grande de serviços, segmento que diz ser o maior perdedor com a reforma. Isso não preocupa?

Não, porque a gente sabe que esses dados são irreais e não vamos perder. Primeiro que 90% dos serviços estão no Simples Nacional (regime tributário especial para micro e pequenas empresas), que não vai mudar nada. As pessoas se esquecem disso.

O secretário da Fazenda para a reforma, Bernard Appy, bate sempre nesta questão...

Porque é verdade. Não entendo o porquê de as pessoas perpetuarem a desinformação. Onde querem chegar com isso? Não faz sentido continuarem dizendo uma coisa dessa, que é danosa à sociedade. Se você tira 90% que é Simples, sobram 10% dos quais a metade é pessoa jurídica para pessoa jurídica, são empresas que prestam serviços a outras empresas. E elas vão passar a tomar crédito tributário, o que hoje não acontece. Aí sobram 5% e, por causa disso, eu vou lascar todo um País. Não vou continuar neste sistema tributário paleolítico e desalinhado da experiência internacional.

Qual sua avaliação sobre o artigo 19 da reforma, que pode levar à taxação de exportações?

Na verdade o artigo 19 pode dar competência para os Estados criarem a contribuição sobre produtos primários e semielaborados.

Mas no fim do dia essa contribuição não pode afetar as exportações?

Pode, mas aí você já está na terceira derivada, está muito além. Pode afetar, mas dá pra gente retomar um pouquinho para trás porque esta nem é a reflexão imediata. O grave é o que pode acontecer antes com estes impostos sobre os primários e semielaborados. Supondo que a indústria tenha 25% de alíquota, se os Estados criarem novas contribuições, a alíquota da indústria vai subir. Serão novos impostos fora do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). Aí é muito ruim.

Mas isso não preocupa vocês?

Preocupa e foi por isso que pedimos para tirar o artigo 19 do texto da reforma. Verbalizamos isso publicamente e em particular aos presidentes da Câmara (Arthur Lira) e do Senado (Rodrigo Pacheco). Pedimos isso e a alíquota máxima de 25% para o IVA (Imposto sobre Valor Agregado).

O prazo da transição é outro ponto que recebe muitas críticas. Acha que poderia ser mais curto?

Sem sombras de dúvidas de que seria melhor se fosse mais curta. Mas quando você procura entender o porquê do prazo mais longo, vai chegar aos tratamentos especiais que foram concedidos até 2032. Se reduzir esta transição, você vai se chocar com estes tratamentos especiais e gerar uma onda de judicialização, aumentando a insegurança jurídica.

Que avaliação você faz da reforma administrativa, bandeira que o presidente da Câmara, Arthur Lira, passou a empunhar recentemente?

A reforma administrativa tem um impacto muito do ponto de vista expectacional. Ela tem duas frentes: a da otimização dos gastos públicos e a da eficiência da máquina pública, onde a reforma administrativa tem um potencial enorme. Do ponto de vista dos gastos, só haverá impacto se de fato entrar em algumas bolas divididas que são bastante delicadas, sobre algumas castas do setor público que são muito privilegiadas.

O arcabouço fiscal vai conseguir zerar o déficit primário?

É um desafio, mas eu gostei bastante do arcabouço. Talvez isso seja o que me dissocia de alguns economistas que o colocam só como algo bom. Eu sou muito otimista com relação ao arcabouço.

Por quê?

Porque é um arcabouço que saiu da forma mais objetiva possível, da demanda da sociedade. As pessoas têm de entender às vezes que cabe aos economistas mostrar para a sociedade os ganhos e as perdas. Mas a escolha sobre qual caminho seguir é feita pela política, pelo reflexo da sociedade. E o arcabouço é complexo porque as demandas da sociedade são complexas.

Você esperava por um crescimento de 0,9% do PIB no segundo trimestre?

Não é por nada, não, mas a gente esperava por um crescimento de 0,8% e veio 0,9%. Para a PIM (Produção Industrial Mensal) estávamos com queda de 0,5% e veio 0,6%. Uma diferença de 0,1 ponto porcentual está bom, né? Antes, só para falar do PIB, desde maio que eu estava com crescimento 2,6% enquanto o mercado estava com 1%. Eu não conseguia entender de onde eles estavam tirando isso porque o carregamento estatístico já apontava para um PIB de 2,4%. Agora que o mercado convergiu para 2,56% nós elevamos nossa projeção de PIB no ano para 3,1%. Eu acho que o mercado vai continuar convergindo para a nossa projeção.

Qual a sua previsão para a indústria no fim do ano?

A indústria não está legal, não. A projeção para o ano é de queda de 0,5% para a produção industrial e de 0,4% para o PIB da indústria. Se isso se concretizar, será a sétima queda em dez anos.

Entrevista por Francisco Carlos de Assis

Francisco Carlos de Assis é repórter

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