Opinião|Restauração florestal e um novo imaginário de desenvolvimento


Um dos gargalos para que o reflorestamento não decole é não estar associado ao que de fato é: uma atividade que pode gerar mais de 2,5 milhões de empregos

Por Renata Piazzon
Atualização:

O que vem à sua cabeça quando se fala em restauração florestal? Em uma conversa recente com um empresário da Amazônia, ouvi dele a seguinte provocação: independentemente da precisão técnica, nenhum dos nomes usados atualmente — restauração, reflorestamento, recuperação, regeneração — está associado a uma atividade economicamente viável, capaz de conciliar conservação da floresta e geração de riqueza. “O nome carrega um viés estritamente ambiental”, reiterou. Para ele, precisamos de um nome que incorpore uma visão de negócio.

Concordando ou não com a necessidade de um novo nome, o fato é que existe uma dissonância brutal entre o discurso dentro e fora da Amazônia. Para quem está de fora, a vocação da Amazônia está na floresta e a restauração seria o caminho natural para a consolidação de uma economia baseada na natureza — o fato de existir quase uma França de terras abandonadas na região pode transformar o Brasil em uma potência ambiental. Mas, para quem está no território, a agenda de restauração parece ainda não fazer parte da visão de desenvolvimento.

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O Brasil apresenta um elevado potencial de produção de florestas, sendo uma das maiores referências globais na ciência da restauração florestal, além de uma das áreas prioritárias para restauração ecológica no mundo. A restauração de ecossistemas tem um papel crucial no enfrentamento da crise climática, na melhoria da qualidade do solo e da água, na proteção da biodiversidade. Ao restabelecer as funções ecológicas da floresta e a produtividade da terra, ganham o meio-ambiente, a economia e a sociedade como um todo.

Temos a oportunidade extraordinária de sermos a maior potência verde dos trópicos Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Mas, ao mesmo tempo, e diferentemente do resto do mundo, nossa maior emissão de gases do efeito estufa vem do desmatamento e das mudanças no uso da terra. Da área já desmatada, 90% configuram pastagens de baixa produtividade. Temos um déficit de pelo menos 24 milhões de hectares de áreas que precisam ser restauradas para se cumprir o Código Florestal, considerando-se florestas e demais formas de vegetação nativa do país.

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Sem querer entrar em jargões climáticos, a ciência mostra que é impossível chegar a 1,5 ou 2 graus de aumento de temperatura média global sem retirarmos carbono da atmosfera. Em todos os cenários, a transição para uma economia de baixo carbono não se faz suficiente. É preciso capturar carbono. A restauração nos dá, então, a oportunidade de uma Amazônia com produtividade e riqueza. Mas, então, por que essa agenda não decola?

São muitos os gargalos, desde a insegurança jurídica ligada à titularidade de terras no Brasil até financiamento, ausência de incentivos e políticas públicas que promovam a restauração de nativas, mas um deles passa despercebido: a falta de imaginário.

Essa agenda parece não capturar o imaginário público, que guarda símbolos compartilhados capazes de reforçar uma ideia de desenvolvimento. Nesse imaginário, a restauração não está associada ao que de fato é: uma atividade que pode gerar mais de 2,5 milhões de empregos, se considerados os esforços para o cumprimento da primeira NDC brasileira (Contribuição Nacional Determinada ao Acordo de Paris), que incluía a restauração de 12 milhões de hectares. Tampouco é entendida como uma atividade que pode ter participação significativa no PIB, tal como o agronegócio.

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Para que isso ocorra, é preciso que se torne uma agenda de Estado, com participação do setor privado, financeiro e da sociedade civil. O Brasil tem um exemplo bem-sucedido com restauração de espécies exóticas que pode servir de inspiração. No fim da década de 1970, a recém-criada Embrapa liderou um esforço coletivo de pesquisa e desenvolvimento de espécies exóticas. Hoje, depois de mais de 40 anos de pesquisa florestal, o Brasil alcançou um dos maiores índices de produtividade de plantio comercial de eucalipto do mundo, o que nos proporciona vantagens comparativas e competitivas nos mercados mundiais de produtos da madeira processada.

À filantropia, cabe fomentar um movimento pré-competitivo que possa criar as condições favoráveis para que essa agenda avance. Entre as medidas necessárias para o fomento ao setor, destacam-se a integração da restauração nos planos e políticas de agricultura, como Plano ABC+, com ampla adoção e apoio às várias modalidades de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) e sistemas agroflorestais (SAF), o apoio a pesquisa e desenvolvimento e a capacitação dos distintos elos da cadeia da restauração, impulsionando ações em diferentes frentes, como coleta de sementes, produção de mudas, insumos, assistência técnica, plantio, manejo e comercialização.

Também é fundamental o advocacy pela integridade socioambiental e climática do mercado de carbono. O mercado de carbono é, sem dúvida, uma oportunidade de financiamento da restauração no curto prazo. Essa oportunidade pode ganhar ainda mais escala com a nova lei de concessões florestais, por exemplo, que permite a exploração de créditos de carbono em áreas públicas concedidas. É um dos instrumentos que viabilizam a descarbonização da economia; porém, ele não deve ser entendido como sinônimo da política climática brasileira. Muitas outras ações são necessárias e complementares ao mercado, incluindo os planos setoriais de mitigação e adaptação.

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No setor privado, algumas iniciativas ambiciosas surgiram recentemente. A re.green se apresenta como uma provedora de infraestruturas naturais. Ela nasce com a missão de mostrar que é possível criar riqueza não eliminando a natureza, mas devolvendo a natureza. A meta da re.green é restaurar 1 milhão de hectares, o que faz dela uma das maiores experiências do gênero no mundo.

A Belterra, startup criada em 2020 com o propósito de viabilizar a implementação de sistemas agroflorestais em grande escala, é outro bom exemplo. Em parceria com agricultores de pequenas e médias propriedades, já plantou mais de 2 mil hectares de agroflorestas em 5 estados, auxiliando na preservação de 20 mil hectares. Parceiros de peso como Fundo Vale, Cargill e Good Energies Foundation já embarcaram na iniciativa.

Temos a oportunidade extraordinária de sermos a maior potência verde dos trópicos. Para isso, é preciso criar as condições para que os investimentos na economia da restauração tragam retorno e os negócios prosperem, ao mesmo tempo em que conservem a floresta e gerem renda para quem nela vive. Dar conta da viabilidade econômica é garantir a segurança climática, alimentar e a transição energética. Nenhum país pode se beneficiar mais do que o Brasil dessa agenda.

O que vem à sua cabeça quando se fala em restauração florestal? Em uma conversa recente com um empresário da Amazônia, ouvi dele a seguinte provocação: independentemente da precisão técnica, nenhum dos nomes usados atualmente — restauração, reflorestamento, recuperação, regeneração — está associado a uma atividade economicamente viável, capaz de conciliar conservação da floresta e geração de riqueza. “O nome carrega um viés estritamente ambiental”, reiterou. Para ele, precisamos de um nome que incorpore uma visão de negócio.

Concordando ou não com a necessidade de um novo nome, o fato é que existe uma dissonância brutal entre o discurso dentro e fora da Amazônia. Para quem está de fora, a vocação da Amazônia está na floresta e a restauração seria o caminho natural para a consolidação de uma economia baseada na natureza — o fato de existir quase uma França de terras abandonadas na região pode transformar o Brasil em uma potência ambiental. Mas, para quem está no território, a agenda de restauração parece ainda não fazer parte da visão de desenvolvimento.

O Brasil apresenta um elevado potencial de produção de florestas, sendo uma das maiores referências globais na ciência da restauração florestal, além de uma das áreas prioritárias para restauração ecológica no mundo. A restauração de ecossistemas tem um papel crucial no enfrentamento da crise climática, na melhoria da qualidade do solo e da água, na proteção da biodiversidade. Ao restabelecer as funções ecológicas da floresta e a produtividade da terra, ganham o meio-ambiente, a economia e a sociedade como um todo.

Temos a oportunidade extraordinária de sermos a maior potência verde dos trópicos Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Mas, ao mesmo tempo, e diferentemente do resto do mundo, nossa maior emissão de gases do efeito estufa vem do desmatamento e das mudanças no uso da terra. Da área já desmatada, 90% configuram pastagens de baixa produtividade. Temos um déficit de pelo menos 24 milhões de hectares de áreas que precisam ser restauradas para se cumprir o Código Florestal, considerando-se florestas e demais formas de vegetação nativa do país.

Sem querer entrar em jargões climáticos, a ciência mostra que é impossível chegar a 1,5 ou 2 graus de aumento de temperatura média global sem retirarmos carbono da atmosfera. Em todos os cenários, a transição para uma economia de baixo carbono não se faz suficiente. É preciso capturar carbono. A restauração nos dá, então, a oportunidade de uma Amazônia com produtividade e riqueza. Mas, então, por que essa agenda não decola?

São muitos os gargalos, desde a insegurança jurídica ligada à titularidade de terras no Brasil até financiamento, ausência de incentivos e políticas públicas que promovam a restauração de nativas, mas um deles passa despercebido: a falta de imaginário.

Essa agenda parece não capturar o imaginário público, que guarda símbolos compartilhados capazes de reforçar uma ideia de desenvolvimento. Nesse imaginário, a restauração não está associada ao que de fato é: uma atividade que pode gerar mais de 2,5 milhões de empregos, se considerados os esforços para o cumprimento da primeira NDC brasileira (Contribuição Nacional Determinada ao Acordo de Paris), que incluía a restauração de 12 milhões de hectares. Tampouco é entendida como uma atividade que pode ter participação significativa no PIB, tal como o agronegócio.

Para que isso ocorra, é preciso que se torne uma agenda de Estado, com participação do setor privado, financeiro e da sociedade civil. O Brasil tem um exemplo bem-sucedido com restauração de espécies exóticas que pode servir de inspiração. No fim da década de 1970, a recém-criada Embrapa liderou um esforço coletivo de pesquisa e desenvolvimento de espécies exóticas. Hoje, depois de mais de 40 anos de pesquisa florestal, o Brasil alcançou um dos maiores índices de produtividade de plantio comercial de eucalipto do mundo, o que nos proporciona vantagens comparativas e competitivas nos mercados mundiais de produtos da madeira processada.

À filantropia, cabe fomentar um movimento pré-competitivo que possa criar as condições favoráveis para que essa agenda avance. Entre as medidas necessárias para o fomento ao setor, destacam-se a integração da restauração nos planos e políticas de agricultura, como Plano ABC+, com ampla adoção e apoio às várias modalidades de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) e sistemas agroflorestais (SAF), o apoio a pesquisa e desenvolvimento e a capacitação dos distintos elos da cadeia da restauração, impulsionando ações em diferentes frentes, como coleta de sementes, produção de mudas, insumos, assistência técnica, plantio, manejo e comercialização.

Também é fundamental o advocacy pela integridade socioambiental e climática do mercado de carbono. O mercado de carbono é, sem dúvida, uma oportunidade de financiamento da restauração no curto prazo. Essa oportunidade pode ganhar ainda mais escala com a nova lei de concessões florestais, por exemplo, que permite a exploração de créditos de carbono em áreas públicas concedidas. É um dos instrumentos que viabilizam a descarbonização da economia; porém, ele não deve ser entendido como sinônimo da política climática brasileira. Muitas outras ações são necessárias e complementares ao mercado, incluindo os planos setoriais de mitigação e adaptação.

No setor privado, algumas iniciativas ambiciosas surgiram recentemente. A re.green se apresenta como uma provedora de infraestruturas naturais. Ela nasce com a missão de mostrar que é possível criar riqueza não eliminando a natureza, mas devolvendo a natureza. A meta da re.green é restaurar 1 milhão de hectares, o que faz dela uma das maiores experiências do gênero no mundo.

A Belterra, startup criada em 2020 com o propósito de viabilizar a implementação de sistemas agroflorestais em grande escala, é outro bom exemplo. Em parceria com agricultores de pequenas e médias propriedades, já plantou mais de 2 mil hectares de agroflorestas em 5 estados, auxiliando na preservação de 20 mil hectares. Parceiros de peso como Fundo Vale, Cargill e Good Energies Foundation já embarcaram na iniciativa.

Temos a oportunidade extraordinária de sermos a maior potência verde dos trópicos. Para isso, é preciso criar as condições para que os investimentos na economia da restauração tragam retorno e os negócios prosperem, ao mesmo tempo em que conservem a floresta e gerem renda para quem nela vive. Dar conta da viabilidade econômica é garantir a segurança climática, alimentar e a transição energética. Nenhum país pode se beneficiar mais do que o Brasil dessa agenda.

O que vem à sua cabeça quando se fala em restauração florestal? Em uma conversa recente com um empresário da Amazônia, ouvi dele a seguinte provocação: independentemente da precisão técnica, nenhum dos nomes usados atualmente — restauração, reflorestamento, recuperação, regeneração — está associado a uma atividade economicamente viável, capaz de conciliar conservação da floresta e geração de riqueza. “O nome carrega um viés estritamente ambiental”, reiterou. Para ele, precisamos de um nome que incorpore uma visão de negócio.

Concordando ou não com a necessidade de um novo nome, o fato é que existe uma dissonância brutal entre o discurso dentro e fora da Amazônia. Para quem está de fora, a vocação da Amazônia está na floresta e a restauração seria o caminho natural para a consolidação de uma economia baseada na natureza — o fato de existir quase uma França de terras abandonadas na região pode transformar o Brasil em uma potência ambiental. Mas, para quem está no território, a agenda de restauração parece ainda não fazer parte da visão de desenvolvimento.

O Brasil apresenta um elevado potencial de produção de florestas, sendo uma das maiores referências globais na ciência da restauração florestal, além de uma das áreas prioritárias para restauração ecológica no mundo. A restauração de ecossistemas tem um papel crucial no enfrentamento da crise climática, na melhoria da qualidade do solo e da água, na proteção da biodiversidade. Ao restabelecer as funções ecológicas da floresta e a produtividade da terra, ganham o meio-ambiente, a economia e a sociedade como um todo.

Temos a oportunidade extraordinária de sermos a maior potência verde dos trópicos Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Mas, ao mesmo tempo, e diferentemente do resto do mundo, nossa maior emissão de gases do efeito estufa vem do desmatamento e das mudanças no uso da terra. Da área já desmatada, 90% configuram pastagens de baixa produtividade. Temos um déficit de pelo menos 24 milhões de hectares de áreas que precisam ser restauradas para se cumprir o Código Florestal, considerando-se florestas e demais formas de vegetação nativa do país.

Sem querer entrar em jargões climáticos, a ciência mostra que é impossível chegar a 1,5 ou 2 graus de aumento de temperatura média global sem retirarmos carbono da atmosfera. Em todos os cenários, a transição para uma economia de baixo carbono não se faz suficiente. É preciso capturar carbono. A restauração nos dá, então, a oportunidade de uma Amazônia com produtividade e riqueza. Mas, então, por que essa agenda não decola?

São muitos os gargalos, desde a insegurança jurídica ligada à titularidade de terras no Brasil até financiamento, ausência de incentivos e políticas públicas que promovam a restauração de nativas, mas um deles passa despercebido: a falta de imaginário.

Essa agenda parece não capturar o imaginário público, que guarda símbolos compartilhados capazes de reforçar uma ideia de desenvolvimento. Nesse imaginário, a restauração não está associada ao que de fato é: uma atividade que pode gerar mais de 2,5 milhões de empregos, se considerados os esforços para o cumprimento da primeira NDC brasileira (Contribuição Nacional Determinada ao Acordo de Paris), que incluía a restauração de 12 milhões de hectares. Tampouco é entendida como uma atividade que pode ter participação significativa no PIB, tal como o agronegócio.

Para que isso ocorra, é preciso que se torne uma agenda de Estado, com participação do setor privado, financeiro e da sociedade civil. O Brasil tem um exemplo bem-sucedido com restauração de espécies exóticas que pode servir de inspiração. No fim da década de 1970, a recém-criada Embrapa liderou um esforço coletivo de pesquisa e desenvolvimento de espécies exóticas. Hoje, depois de mais de 40 anos de pesquisa florestal, o Brasil alcançou um dos maiores índices de produtividade de plantio comercial de eucalipto do mundo, o que nos proporciona vantagens comparativas e competitivas nos mercados mundiais de produtos da madeira processada.

À filantropia, cabe fomentar um movimento pré-competitivo que possa criar as condições favoráveis para que essa agenda avance. Entre as medidas necessárias para o fomento ao setor, destacam-se a integração da restauração nos planos e políticas de agricultura, como Plano ABC+, com ampla adoção e apoio às várias modalidades de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) e sistemas agroflorestais (SAF), o apoio a pesquisa e desenvolvimento e a capacitação dos distintos elos da cadeia da restauração, impulsionando ações em diferentes frentes, como coleta de sementes, produção de mudas, insumos, assistência técnica, plantio, manejo e comercialização.

Também é fundamental o advocacy pela integridade socioambiental e climática do mercado de carbono. O mercado de carbono é, sem dúvida, uma oportunidade de financiamento da restauração no curto prazo. Essa oportunidade pode ganhar ainda mais escala com a nova lei de concessões florestais, por exemplo, que permite a exploração de créditos de carbono em áreas públicas concedidas. É um dos instrumentos que viabilizam a descarbonização da economia; porém, ele não deve ser entendido como sinônimo da política climática brasileira. Muitas outras ações são necessárias e complementares ao mercado, incluindo os planos setoriais de mitigação e adaptação.

No setor privado, algumas iniciativas ambiciosas surgiram recentemente. A re.green se apresenta como uma provedora de infraestruturas naturais. Ela nasce com a missão de mostrar que é possível criar riqueza não eliminando a natureza, mas devolvendo a natureza. A meta da re.green é restaurar 1 milhão de hectares, o que faz dela uma das maiores experiências do gênero no mundo.

A Belterra, startup criada em 2020 com o propósito de viabilizar a implementação de sistemas agroflorestais em grande escala, é outro bom exemplo. Em parceria com agricultores de pequenas e médias propriedades, já plantou mais de 2 mil hectares de agroflorestas em 5 estados, auxiliando na preservação de 20 mil hectares. Parceiros de peso como Fundo Vale, Cargill e Good Energies Foundation já embarcaram na iniciativa.

Temos a oportunidade extraordinária de sermos a maior potência verde dos trópicos. Para isso, é preciso criar as condições para que os investimentos na economia da restauração tragam retorno e os negócios prosperem, ao mesmo tempo em que conservem a floresta e gerem renda para quem nela vive. Dar conta da viabilidade econômica é garantir a segurança climática, alimentar e a transição energética. Nenhum país pode se beneficiar mais do que o Brasil dessa agenda.

O que vem à sua cabeça quando se fala em restauração florestal? Em uma conversa recente com um empresário da Amazônia, ouvi dele a seguinte provocação: independentemente da precisão técnica, nenhum dos nomes usados atualmente — restauração, reflorestamento, recuperação, regeneração — está associado a uma atividade economicamente viável, capaz de conciliar conservação da floresta e geração de riqueza. “O nome carrega um viés estritamente ambiental”, reiterou. Para ele, precisamos de um nome que incorpore uma visão de negócio.

Concordando ou não com a necessidade de um novo nome, o fato é que existe uma dissonância brutal entre o discurso dentro e fora da Amazônia. Para quem está de fora, a vocação da Amazônia está na floresta e a restauração seria o caminho natural para a consolidação de uma economia baseada na natureza — o fato de existir quase uma França de terras abandonadas na região pode transformar o Brasil em uma potência ambiental. Mas, para quem está no território, a agenda de restauração parece ainda não fazer parte da visão de desenvolvimento.

O Brasil apresenta um elevado potencial de produção de florestas, sendo uma das maiores referências globais na ciência da restauração florestal, além de uma das áreas prioritárias para restauração ecológica no mundo. A restauração de ecossistemas tem um papel crucial no enfrentamento da crise climática, na melhoria da qualidade do solo e da água, na proteção da biodiversidade. Ao restabelecer as funções ecológicas da floresta e a produtividade da terra, ganham o meio-ambiente, a economia e a sociedade como um todo.

Temos a oportunidade extraordinária de sermos a maior potência verde dos trópicos Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Mas, ao mesmo tempo, e diferentemente do resto do mundo, nossa maior emissão de gases do efeito estufa vem do desmatamento e das mudanças no uso da terra. Da área já desmatada, 90% configuram pastagens de baixa produtividade. Temos um déficit de pelo menos 24 milhões de hectares de áreas que precisam ser restauradas para se cumprir o Código Florestal, considerando-se florestas e demais formas de vegetação nativa do país.

Sem querer entrar em jargões climáticos, a ciência mostra que é impossível chegar a 1,5 ou 2 graus de aumento de temperatura média global sem retirarmos carbono da atmosfera. Em todos os cenários, a transição para uma economia de baixo carbono não se faz suficiente. É preciso capturar carbono. A restauração nos dá, então, a oportunidade de uma Amazônia com produtividade e riqueza. Mas, então, por que essa agenda não decola?

São muitos os gargalos, desde a insegurança jurídica ligada à titularidade de terras no Brasil até financiamento, ausência de incentivos e políticas públicas que promovam a restauração de nativas, mas um deles passa despercebido: a falta de imaginário.

Essa agenda parece não capturar o imaginário público, que guarda símbolos compartilhados capazes de reforçar uma ideia de desenvolvimento. Nesse imaginário, a restauração não está associada ao que de fato é: uma atividade que pode gerar mais de 2,5 milhões de empregos, se considerados os esforços para o cumprimento da primeira NDC brasileira (Contribuição Nacional Determinada ao Acordo de Paris), que incluía a restauração de 12 milhões de hectares. Tampouco é entendida como uma atividade que pode ter participação significativa no PIB, tal como o agronegócio.

Para que isso ocorra, é preciso que se torne uma agenda de Estado, com participação do setor privado, financeiro e da sociedade civil. O Brasil tem um exemplo bem-sucedido com restauração de espécies exóticas que pode servir de inspiração. No fim da década de 1970, a recém-criada Embrapa liderou um esforço coletivo de pesquisa e desenvolvimento de espécies exóticas. Hoje, depois de mais de 40 anos de pesquisa florestal, o Brasil alcançou um dos maiores índices de produtividade de plantio comercial de eucalipto do mundo, o que nos proporciona vantagens comparativas e competitivas nos mercados mundiais de produtos da madeira processada.

À filantropia, cabe fomentar um movimento pré-competitivo que possa criar as condições favoráveis para que essa agenda avance. Entre as medidas necessárias para o fomento ao setor, destacam-se a integração da restauração nos planos e políticas de agricultura, como Plano ABC+, com ampla adoção e apoio às várias modalidades de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) e sistemas agroflorestais (SAF), o apoio a pesquisa e desenvolvimento e a capacitação dos distintos elos da cadeia da restauração, impulsionando ações em diferentes frentes, como coleta de sementes, produção de mudas, insumos, assistência técnica, plantio, manejo e comercialização.

Também é fundamental o advocacy pela integridade socioambiental e climática do mercado de carbono. O mercado de carbono é, sem dúvida, uma oportunidade de financiamento da restauração no curto prazo. Essa oportunidade pode ganhar ainda mais escala com a nova lei de concessões florestais, por exemplo, que permite a exploração de créditos de carbono em áreas públicas concedidas. É um dos instrumentos que viabilizam a descarbonização da economia; porém, ele não deve ser entendido como sinônimo da política climática brasileira. Muitas outras ações são necessárias e complementares ao mercado, incluindo os planos setoriais de mitigação e adaptação.

No setor privado, algumas iniciativas ambiciosas surgiram recentemente. A re.green se apresenta como uma provedora de infraestruturas naturais. Ela nasce com a missão de mostrar que é possível criar riqueza não eliminando a natureza, mas devolvendo a natureza. A meta da re.green é restaurar 1 milhão de hectares, o que faz dela uma das maiores experiências do gênero no mundo.

A Belterra, startup criada em 2020 com o propósito de viabilizar a implementação de sistemas agroflorestais em grande escala, é outro bom exemplo. Em parceria com agricultores de pequenas e médias propriedades, já plantou mais de 2 mil hectares de agroflorestas em 5 estados, auxiliando na preservação de 20 mil hectares. Parceiros de peso como Fundo Vale, Cargill e Good Energies Foundation já embarcaram na iniciativa.

Temos a oportunidade extraordinária de sermos a maior potência verde dos trópicos. Para isso, é preciso criar as condições para que os investimentos na economia da restauração tragam retorno e os negócios prosperem, ao mesmo tempo em que conservem a floresta e gerem renda para quem nela vive. Dar conta da viabilidade econômica é garantir a segurança climática, alimentar e a transição energética. Nenhum país pode se beneficiar mais do que o Brasil dessa agenda.

O que vem à sua cabeça quando se fala em restauração florestal? Em uma conversa recente com um empresário da Amazônia, ouvi dele a seguinte provocação: independentemente da precisão técnica, nenhum dos nomes usados atualmente — restauração, reflorestamento, recuperação, regeneração — está associado a uma atividade economicamente viável, capaz de conciliar conservação da floresta e geração de riqueza. “O nome carrega um viés estritamente ambiental”, reiterou. Para ele, precisamos de um nome que incorpore uma visão de negócio.

Concordando ou não com a necessidade de um novo nome, o fato é que existe uma dissonância brutal entre o discurso dentro e fora da Amazônia. Para quem está de fora, a vocação da Amazônia está na floresta e a restauração seria o caminho natural para a consolidação de uma economia baseada na natureza — o fato de existir quase uma França de terras abandonadas na região pode transformar o Brasil em uma potência ambiental. Mas, para quem está no território, a agenda de restauração parece ainda não fazer parte da visão de desenvolvimento.

O Brasil apresenta um elevado potencial de produção de florestas, sendo uma das maiores referências globais na ciência da restauração florestal, além de uma das áreas prioritárias para restauração ecológica no mundo. A restauração de ecossistemas tem um papel crucial no enfrentamento da crise climática, na melhoria da qualidade do solo e da água, na proteção da biodiversidade. Ao restabelecer as funções ecológicas da floresta e a produtividade da terra, ganham o meio-ambiente, a economia e a sociedade como um todo.

Temos a oportunidade extraordinária de sermos a maior potência verde dos trópicos Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Mas, ao mesmo tempo, e diferentemente do resto do mundo, nossa maior emissão de gases do efeito estufa vem do desmatamento e das mudanças no uso da terra. Da área já desmatada, 90% configuram pastagens de baixa produtividade. Temos um déficit de pelo menos 24 milhões de hectares de áreas que precisam ser restauradas para se cumprir o Código Florestal, considerando-se florestas e demais formas de vegetação nativa do país.

Sem querer entrar em jargões climáticos, a ciência mostra que é impossível chegar a 1,5 ou 2 graus de aumento de temperatura média global sem retirarmos carbono da atmosfera. Em todos os cenários, a transição para uma economia de baixo carbono não se faz suficiente. É preciso capturar carbono. A restauração nos dá, então, a oportunidade de uma Amazônia com produtividade e riqueza. Mas, então, por que essa agenda não decola?

São muitos os gargalos, desde a insegurança jurídica ligada à titularidade de terras no Brasil até financiamento, ausência de incentivos e políticas públicas que promovam a restauração de nativas, mas um deles passa despercebido: a falta de imaginário.

Essa agenda parece não capturar o imaginário público, que guarda símbolos compartilhados capazes de reforçar uma ideia de desenvolvimento. Nesse imaginário, a restauração não está associada ao que de fato é: uma atividade que pode gerar mais de 2,5 milhões de empregos, se considerados os esforços para o cumprimento da primeira NDC brasileira (Contribuição Nacional Determinada ao Acordo de Paris), que incluía a restauração de 12 milhões de hectares. Tampouco é entendida como uma atividade que pode ter participação significativa no PIB, tal como o agronegócio.

Para que isso ocorra, é preciso que se torne uma agenda de Estado, com participação do setor privado, financeiro e da sociedade civil. O Brasil tem um exemplo bem-sucedido com restauração de espécies exóticas que pode servir de inspiração. No fim da década de 1970, a recém-criada Embrapa liderou um esforço coletivo de pesquisa e desenvolvimento de espécies exóticas. Hoje, depois de mais de 40 anos de pesquisa florestal, o Brasil alcançou um dos maiores índices de produtividade de plantio comercial de eucalipto do mundo, o que nos proporciona vantagens comparativas e competitivas nos mercados mundiais de produtos da madeira processada.

À filantropia, cabe fomentar um movimento pré-competitivo que possa criar as condições favoráveis para que essa agenda avance. Entre as medidas necessárias para o fomento ao setor, destacam-se a integração da restauração nos planos e políticas de agricultura, como Plano ABC+, com ampla adoção e apoio às várias modalidades de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) e sistemas agroflorestais (SAF), o apoio a pesquisa e desenvolvimento e a capacitação dos distintos elos da cadeia da restauração, impulsionando ações em diferentes frentes, como coleta de sementes, produção de mudas, insumos, assistência técnica, plantio, manejo e comercialização.

Também é fundamental o advocacy pela integridade socioambiental e climática do mercado de carbono. O mercado de carbono é, sem dúvida, uma oportunidade de financiamento da restauração no curto prazo. Essa oportunidade pode ganhar ainda mais escala com a nova lei de concessões florestais, por exemplo, que permite a exploração de créditos de carbono em áreas públicas concedidas. É um dos instrumentos que viabilizam a descarbonização da economia; porém, ele não deve ser entendido como sinônimo da política climática brasileira. Muitas outras ações são necessárias e complementares ao mercado, incluindo os planos setoriais de mitigação e adaptação.

No setor privado, algumas iniciativas ambiciosas surgiram recentemente. A re.green se apresenta como uma provedora de infraestruturas naturais. Ela nasce com a missão de mostrar que é possível criar riqueza não eliminando a natureza, mas devolvendo a natureza. A meta da re.green é restaurar 1 milhão de hectares, o que faz dela uma das maiores experiências do gênero no mundo.

A Belterra, startup criada em 2020 com o propósito de viabilizar a implementação de sistemas agroflorestais em grande escala, é outro bom exemplo. Em parceria com agricultores de pequenas e médias propriedades, já plantou mais de 2 mil hectares de agroflorestas em 5 estados, auxiliando na preservação de 20 mil hectares. Parceiros de peso como Fundo Vale, Cargill e Good Energies Foundation já embarcaram na iniciativa.

Temos a oportunidade extraordinária de sermos a maior potência verde dos trópicos. Para isso, é preciso criar as condições para que os investimentos na economia da restauração tragam retorno e os negócios prosperem, ao mesmo tempo em que conservem a floresta e gerem renda para quem nela vive. Dar conta da viabilidade econômica é garantir a segurança climática, alimentar e a transição energética. Nenhum país pode se beneficiar mais do que o Brasil dessa agenda.

Opinião por Renata Piazzon

Diretora-geral do Instituto Arapyaú, cofacilitadora da Coalizão Brasil Clima Florestas e Agricultura e representante do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável (CDESS)

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