No mundo corporativo, durante muito tempo, a ascensão na carreira esteve relacionada à capacidade de dar respostas. Executivos eram reconhecidos e promovidos com base na habilidade de tomar decisões rápidas e oferecer soluções de maneira eficaz. Hoje, essa lógica se inverteu. Daqui em diante, mais do que dar respostas, é fundamental saber fazer as perguntas corretas.
A mentalidade que valorizava as respostas rápidas muitas vezes deixava de lado a importância do questionamento e da investigação. No entanto, os atuais desafios do cenário corporativo exigem uma nova abordagem. Nesse contexto, há um deslocamento do modelo tradicional centrado em respostas para um foco renovado na busca por insights e entendimento profundo.
É preciso dominar a arte de fazer perguntas. Seja para as pessoas ou para ferramentas de inteligência artificial. Afinal, a qualidade do prompt que fornecemos às ferramentas de IA é o que determina a qualidade das informações que recebemos.
Mas se os sistemas generativos já são capazes de responder a tudo, o que cabe a nós, meros mortais? A principal habilidade de que precisamos ao usá-los é sermos capazes de fazer perguntas claras e objetivas, para obter respostas precisas e profundas.
Tecnologias como big data e analytics podem, ainda, auxiliar líderes na formulação perguntas mais estratégicas e direcionadas, por meio de ferramentas de coleta e análise de dados. Ou seja, se a inteligências artificial fornece respostas, ela também pode ajudar a formular as perguntas importantes para impulsionar o seu negócio.
A diversidade de experiências e origens na equipe é outro fator capaz de enriquecer o espectro de perguntas feitas, promovendo uma compreensão mais ampla e soluções mais inovadoras. Os líderes precisam fomentar um ambiente inclusivo, que valorize e estimule uma variedade de perspectivas.
Basicamente, em vez de se apoiarem exclusivamente nas próprias respostas, líderes excepcionais incentivam a curiosidade, a investigação e o diálogo aberto, criando um ambiente onde as perguntas certas conduzem a descobertas significativas. E esse paradigma se reflete em diversas áreas.
O interessante é que, por mais alinhada que esteja com as novas tecnologias e ferramentas digitais, essa abordagem não é novidade. Sócrates, um dos fundadores da filosofia ocidental, já insistia na ideia de fazer boas perguntas há 2.500 anos.
O questionamento socrático é uma abordagem de diálogo que busca estimular o pensamento crítico, a investigação e a descoberta. Em vez de simplesmente fornecer respostas prontas, o questionamento socrático incentiva as pessoas a explorar as próprias suposições, considerar diferentes perspectivas e refletir sobre o significado mais profundo de suas crenças e ideias.
A técnica pode ser aplicada de diversas maneiras, mas geralmente envolve fazer uma série de perguntas cuidadosamente elaboradas. Cada uma delas se relaciona com a resposta dada à anterior, com o objetivo de levar o interlocutor a uma compreensão mais profunda do assunto em questão.
Contudo, é preciso estar atento às armadilhas nesse processo. A interrupção prematura, a suposição sobre o pensamento alheio, o contra-argumento imediato ou o uso de sarcasmo pode não apenas frustrar a troca de ideias, mas também desencorajar a participação ativa dos membros da equipe.
Para líderes e executivos, o questionamento socrático é uma ferramenta poderosa. Em vez de impor soluções ou tomar decisões unilaterais, os líderes que dominam a técnica são capazes de cultivar um ambiente de aprendizado contínuo, estimular a criatividade e promover a inovação.
Isso vai ao encontro do que propõem os pesquisadores da área de liderança e cultura, conforme artigo publicado na MIT Sloan Management Review. Líderes devem fazer perguntas poderosas e admitir que não têm todas as respostas, promovendo uma cultura de curiosidade e colaboração.
Ao incentivar a reflexão crítica e o questionamento dentro das equipes, os líderes podem desenvolver uma cultura organizacional mais adaptável, resiliente e orientada a soluções. Além disso, não correrão o risco de passar uma vida inteira tentando saber tudo, para depois descobrir que as pessoas não suportam um sabe-tudo.
Atualmente, a capacidade de dizer “Eu não sei” e buscar respostas é uma habilidade valiosa e respeitada. Conforme disse Jensen Huang, CEO da Nvidia: “Eu provavelmente dou poucas respostas e faço muito perguntas. Eu seria capaz de passar um dia todo sem fazer nada além perguntas. Assim, ajudo meu time a explorar boas ideias que eles nem notariam.”
Como podemos superar a cultura de “saber tudo” nas organizações e abraçar uma mentalidade de “aprender tudo”? Para entender como fazer isso na prática, uma pesquisa publicada na Harvard Business Review aponta cinco tipos perguntas estratégicas, que deixarei a seguir acompanhadas de dicas para aplicá-las:
- Perguntas investigativas — esclareça o motivo: ao enfrentar um problema, comece esclarecendo seus objetivos. Pergunte-se o que você deseja alcançar e o que precisa aprender. Utilize perguntas de “Por quê?” para aprofundar sua compreensão e evitar tratar o problema sem entender o que o provocou.
- Perguntas especulativas — explore alternativas criativas: amplie sua perspectiva considerando possibilidades alternativas. Utilize perguntas especulativas como “E se…?” e “O que mais…?”, para estimular soluções criativas.
- Perguntas produtivas — avalie os recursos disponíveis: perguntas do tipo “Como mensurar isso?” ou “Quanto tempo levamos para…” ajudam a avaliar a disponibilidade de recursos para sanar o problema. Elas influenciam a velocidade da tomada de decisão, a introdução de iniciativas e o ritmo de crescimento.
- Perguntas interpretativas — sintetize e compreenda: estas perguntas incentivam a reformulação do problema central. Após perguntas investigativas, especulativas e produtivas, questione “Então, o que isso significa?”, para extrair as implicações de uma observação ou ideia.
- Perguntas subjetivas — reconheça as emoções envolvidas: este tipo de perguntas lida com questões emocionais, como frustrações, tensões e interesses que possam influenciar a tomada de decisão. Neste caso, é preciso questionar “O que não está sendo falado?” ou “Como vocês se sentem em relação a isso?”.
Por isso, vale mencionar a importância da resiliência emocional no processo de fazer perguntas, especialmente aquelas que podem desencadear resistência ou desconforto. Os líderes precisam desenvolver a habilidade de manter um diálogo aberto e construtivo, mesmo quando as perguntas levam a territórios desafiadores.
Existem métodos e programas de treinamento que as organizações podem implementar para melhorar as habilidades de questionamento de seus líderes e colaboradores. O que pode transformar a capacidade de questionar em uma competência central dentro da empresa.
Em suma, a transição de um executivo que sabe todas as respostas para um que faz as perguntas certas não é apenas uma mudança de comportamento. É uma evolução que reflete um profundo entendimento das demandas de um mundo complexo e em rápida mudança.
Se inteligência artificial hoje é capaz de fornecer respostas para tudo, o que nos torna relevantes é a nossa capacidade de fazer as perguntas corretas. Ao abraçarmos a arte de perguntar como uma habilidade essencial, não estamos apenas ajustando nossa abordagem à liderança; estamos redefinindo o papel do líder no século XXI.