RIO – Com a saída de Guido Mantega do páreo, a corrida pela presidência da Vale abriu esta semana reconfigurada, enquanto o Comitê de Pessoas digere a avaliação sobre Eduardo Bartolomeo, atual CEO, elaborada por uma firma especializada.
O comitê – composto por quatro dos membros do Conselho de Administração – vai levar a sua recomendação aos demais conselheiros em uma reunião extraordinária, na manhã da próxima sexta-feira, 2. Inicialmente, o encontro seria nesta terça-feira, 30, mas foi transferido. Desde a semana passada, o governo queria ganhar tempo para negociar a sucessão com os conselheiros e busca protelar a decisão.
O Estadão/Broadcast apurou que a avaliação reconhece méritos da gestão de Bartolomeo, especialmente melhorias operacionais e em segurança – o executivo assumiu a liderança da mineradora no momento mais dramático da companhia, em 2019, logo após o desastre de Brumadinho, em que morreram 270 pessoas.
Contudo, disse um interlocutor, o estudo não recomenda a recondução imediata do executivo. A avaliação anota, como ponto fraco, a falta de diálogo com o governo. Isto é um problema, pois a Vale depende de licenças para operar e de concessões de ferrovias e portos. Desde setembro do ano passado, o executivo vem trabalhando para sanar esta deficiência.
Para embasar as suas conclusões, o Comitê de Pessoas pediu à firma que fez o estudo, Vila Nova Partners, mais algumas informações sobre o desempenho do executivo. Procurada pela reportagem, a Vila Nova Partners não quis se manifestar.
Freio na interferência
Até a última sexta-feira, o governo Lula trabalhava nos bastidores para emplacar Mantega no cargo de presidente da Vale. A pressão chegou ao ápice com o ministro Alexandre Silveira, de Minas e Energia, telefonando para conselheiros a fim de defender o nome do ex-ministro, conforme pessoas próximas do assunto.
A iniciativa foi um tiro no pé. Os acionistas da mineradora ficaram desconfortáveis com a perspectiva de ter o ex-ministro no comando da mineradora e, também, com a forma como o governo atuou. Assim, na quinta-feira, dois representantes do Conselho de Administração da companhia – Daniel Stieler, presidente do colegiado, e Ollie Oliveira, líder dos conselheiros independentes – se encontraram com Silveira para argumentar contra a intervenção em favor de Mantega.
No dia seguinte, o governo recuou e desistiu de tentar emplacar o ex-ministro com o cargo de CEO da mineradora. Havia até a expectativa – que não se concretizou – de uma carta de Mantega se retirando da corrida pela presidência da Vale.
Morde e assopra
No mesmo dia em que desistiu de colocar Mantega como CEO da mineradora, o Ministério dos Transportes notificou a Vale de uma cobrança de R$ 25,7 bilhões em concessões renovadas antecipadamente no fim do governo Jair Bolsonaro, como revelou o Estadão.
Agora, a questão é se o nome de Bartolomeo ganhou ou perdeu força na disputa. Por um lado, o executivo perdeu o status de “defesa” contra Mantega – a interferência do governo estava unindo os conselheiros em torno do atual CEO. Por outro lado, o Conselho de Administração pode decidir pelo fim do contrato de Bartolomeo para não irritar ainda mais o Planalto.
Esta opção seria vista como uma “contrapartida” pela retirada do nome de Mantega. Para a companhia, disse um observador, o ideal é que a questão seja resolvida com um consenso, não com “vencedores e perdedores”, o que poderia ter efeitos ruins para a companhia.
Um conselheiro ouvido pelo Estadão/Broadcast disse que os dados estão rolando. O governo ainda tem importante influência por meio da Previ, fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil. A entidade é a maior acionista individual da Vale, com 8,7% (se consideradas participações indiretas, o índice chega a 10%), e tem dois representantes no Conselho de Administração: Stieler e João Fukunaga, que é presidente da Previ e do Comitê de Pessoas.
Com o jogo “zerado”, há várias opções em aberto. Na sexta-feira, os conselheiros podem decidir que Bartolomeo fica e o processo de sucessão se encerra. Uma ideia que ainda circula é de dar um mandato de um ano para o executivo - o período previsto pela governança da companhia é de três anos, mas o Conselho poderia fazer uma mudança no estatuto, disse uma pessoa próxima da Vale. Com o novo mandato, ainda que mais curto, o executivo teria a oportunidade de dar continuidade à aproximação com o governo, buscando alinhamento.
A outra hipótese é o Conselho de Administração adiar a decisão, em busca de mais diálogo e consenso sobre a manutenção ou não do executivo no cargo atual.
Finalmente, o colegiado pode decidir que é hora de mudar a liderança da gigante brasileira. Se for esta a decisão, o processo de sucessão continua com a contratação de uma firma de headhunter internacional para buscar executivos - dentro e fora da Vale - e propor uma lista tríplice.
Não faltam nomes nas especulações para esta hipótese. Um dos mais citados é do conselheiro Luiz Henrique Guimarães, ex-presidente da Cosan, que ocupa um assento no Conselho de Administração por indicação de Rubens Ometto, que comprou uma fatia de 4,9% no capital da Vale. Como a parcela do empresário não alcança 5%, Guimarães é considerado um conselheiro “independente”.