RIO - Shell, Raízen e Senai vão investir R$ 120 milhões na construção de um Centro de Bioenergia, em Piracicaba (SP), para o desenvolvimento de soluções de descarbonização a partir da cana-de-açúcar. O objetivo é acelerar os projetos voltados para transição energética e escalar a produção de etanol de segunda geração (E2G), tecnologia brasileira que tem um mercado imenso, segundo disseram executivos envolvidos no projeto ao Estadão/Broadcast.
Nos cinco anos iniciais, as pesquisas do Centro focarão em ganhos de eficiência e sustentabilidade no processo de produção do E2G, atualmente já produzido em escala comercial no País em duas plantas da Raízen. Outras sete unidades estão em estágio de construção:
- Univalem (Valparaíso/SP);
- Barra (Barra Bonita/SP);
- Vale do Rosário (Morro Agudo/SP);
- Gasa (Andradina/SP);
- Caarapó (Caarapó/MS);
- Tarumã (Tarumã/SP);
- Jataí (Jataí/GO).
A previsão é de que o Centro fique pronto em 2026, e vai contar com laboratório e plantas piloto projetados para mimetizar operações industriais. Do total investido, R$ 72 milhões virão da Shell, pela cláusula de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Para o presidente da Raízen, empresa fruto de uma joint-venture entre Shell e Cosan, Ricardo Mussa, a decisão da construção do Centro visa avançar na produção de E2G e demais produtos que serão utilizados no futuro, atrás da maior eficiência e redução de emissões.
“Quando eu tenho de fazer esse tipo de teste em uma planta de escala industrial, é muito complexo. Então, aqui (o Centro) é um marco muito importante para o Brasil manter a liderança nessa tecnologia”, disse Mussa, citando o potencial para avançar em pesquisas para reduzir o consumo de enzimas, reaproveitar subprodutos, entre outras soluções.
Liderança brasileira
O etanol de segunda geração é produzido a partir do bagaço da cana de açúcar após a produção do etanol, por isso é considerado um combustível ainda mais sustentável do que o original. Segundo Mussa, a demanda já ultrapassa a produção de E2G da Raízen. O novo combustível emite 30% a menos Gases de Efeito Estufa (GEE) do que o Etanol de Primeira Geração (E1G) e 80% menos do que a gasolina.
“Quando você põe o etanol de segunda geração numa planta de cana-de-açúcar, você aumenta em 50% a sua produção de etanol, sem precisar de um pé de cana a mais. Então, não tem nada mais sustentável que você fazer de um resíduo (bagaço da cana) um produto que tem uma pegada de carbono muito baixa”, explicou Mussa, acrescentando que o Brasil já é hoje o maior produtor mundial de etanol de segunda geração e vai se firmar na liderança. “Vai ser um grande exportador, e não só do produto, mas espera também exportar a tecnologia”.
Mussa ressaltou que boa parte da biomassa proveniente da cana-de-açúcar é destinada para gerar vapor para as usinas. “Então, se a gente encontrar uma maneira de eletrificar as usinas, por exemplo, e sobrar mais biomassa, você pode aumentar muito a produção de etanol de segunda geração”.
O papel do Senai será organizar a complexidade do desenvolvimento tecnológico das pesquisas, investir e organizar a infraestrutura, além de orquestrar as diversas disciplinas e tecnologias necessárias para desenvolver esse “gap” tecnológico, informou o gerente do Distrito Tecnológico do Senai-SP, Fabricio Lopes. “Há uma complexidade em desenvolver o etanol de segunda geração. Exige múltiplos conhecimentos, não só no pré-processamento da biomassa, mas também na parte da fermentação, conhecimento em materiais”, disse Lopes.
‘Etanol é o carro elétrico do Brasil’
Para o vice-presidente Shell para América Latina, Lauran Wetemans, “o carro elétrico do Brasil se chama etanol”. Ele elogiou a cláusula de PD&I da ANP como um incentivo eficiente para a evolução tecnológica do País, e aposta não apenas na exportação do etanol segunda geração, como ocorre atualmente, mas também no mercado brasileiro para consumir o biocombustível e demais futuros produtos decorrentes das pesquisas do Centro. Além do setor automotivo, o executivo vê espaço para o uso do etanol nos setores bioquímico, de bebidas, do bioplástico e para o Sustainable Aviation Fuel (SAF).
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“A gente gosta muito de hidrogênio, mas é um produto muito caro. É fácil falar sobre produtos de baixo carbono, mas se eles não são acessíveis, ou estão muito caros, ou não existem no mercado, ou não são escaláveis, você tem um problema”, avaliou Wetemans, informando que o E2G é apenas um pouco mais caro que o etanol original.
Wetemans afirmou ainda, que o Brasil tem um potencial enorme para desenvolver biocombustíveis do futuro, e disse aguardar para a próxima semana o anúncio do governo sobre aumento da mistura de etanol na gasolina e do biodiesel no diesel, com a promulgação da Lei do Combustível do Futuro, marcada para o dia 8. “A gente está contribuindo com essa agenda de transição energética do governo do Brasil com produtos que são acessíveis para todos os brasileiros, e também vão ajudar o Brasil a estar á frente no desenvolvimento de biocombustíveis no mundo inteiro”, concluiu.