BRASÍLIA – O custo do gasto tributário no Brasil deve bater R$ 523,7 bilhões em 2024, de acordo com dados da Receita Federal. O cálculo desses incentivos fiscais, que diminuem a arrecadação do governo, não inclui a desoneração da folha de pagamentos, que não estava vigente quando o Orçamento deste ano foi elaborado.
Essa cifra, que saltou nos últimos anos, deixou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva “mal impressionado” – disse ontem a ministra do Planejamento, Simone Tebet – e está na mira da equipe econômica, cuja agenda passa pela correção da erosão da base fiscal (ou seja, da arrecadação) e revisão de benefícios. Mais de um terço das benesses tributárias é direcionada ao Simples Nacional e à agricultura e à agroindústria.
Lula citou besta terça-feira, 18, um valor inclusive superior ao gasto tributário projetado pelo Fisco para este ano. “De repente, você descobre que tem R$ 646 bilhões de benefícios fiscais para os ricos desse País”, destacou, durante entrevista à CBN nesta terça-feira, 18.
O presidente se referia aos números apresentados por Tebet em reunião da Junta de Execução Orçamentária (JEO). O dado engloba os gastos com renúncia fiscal, benefícios financeiros e creditícios. Dos R$ 646,6 bilhões projetados em 2023, R$ 519 bilhões são de benefícios tributários e R$ 127,6 bilhões de benefícios financeiros e creditícios. O valor correspondeu a 34% da receita primária líquida e a 5,96% do PIB.
“Você pega, por exemplo, a Confederação Nacional da Agricultura, que tem uma isenção de quase R$ 60 bilhões. Pega setor de combustível que tem isenção de quase R$ 32 bilhões. Ou seja, você vai tentar jogar isso em cima do aposentado? Do pescador? Da dona de casa? Da empregada doméstica?”, questionou Lula. Ele também citou a prorrogação da desoneração da folha para 17 setores da economia, cobrando uma contrapartida para o trabalhador.
O documento do Fisco aponta que, em 2024, o principal gasto tributário do País será com o Simples Nacional, que responde por 23,94% das renúncias – R$ 125,359 bilhões no total (veja a lista completa abaixo). Para agricultura e agroindústria, mencionados por Lula, os benefícios somam R$ 58,925 bilhões em 2024, 11,25% do total.
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No relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) que foi levado a Lula ontem, sobre as contas do governo federal no ano de 2023, a Corte destacou que, num contexto de restrição fiscal como o enfrentado pela União, os valores associados a esses benefícios deveriam ser considerados “com maior atenção em virtude do seu impacto nas contas públicas”.
Olhando para os dados do ano passado, o TCU chamou atenção para o fato de os gastos tributários relacionados ao Simples e à agricultura e agroindústria, juntos, terem somado mais de um terço do valor das renúncias (33,22%). Na comparação com 2022, houve crescimento de 12,56% no total, acima da inflação no período.
“Note-se que o incremento, tanto dos montantes dos novos gastos tributários quanto dos valores totais dos benefícios, ocorrido nos últimos dois anos, conforme demonstrado, vai de encontro à atual situação de restrição fiscal experimentada pelo País, bem como ao ‘plano de redução gradual de incentivos e benefícios federais de natureza tributária e o encerramento de benefícios fiscais’”, diz o relatório aprovado pelo plenário do TCU na semana passada.
Embora não conste nas projeções para 2024, a Receita já estimou que serão necessários R$ 26,3 bilhões para restituir a perda arrecadatória com a prorrogação da desoneração – R$ 15,8 bilhões compensam o benefício concedido aos 17 setores da economia que mais empregam e os outros R$ 10,5 bilhões bancam a mudança na tributação das prefeituras. O TCU pontuou que a benesse aplicada à folha de salários foi o benefício incidente sobre a contribuição previdenciária que mais cresceu entre 2022 e 2023, com avanço de 19,6% no período.
O que é a desoneração da folha de pagamentos
A desoneração da folha de pagamentos foi instituída em 2011 para setores intensivos em mão de obra. Juntos, eles incluem milhares de empresas que empregam 9 milhões de pessoas. A medida substitui a contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a folha de salários por alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta. Ela resulta, na prática, em redução da carga tributária da contribuição previdenciária devida pelas empresas. No caso dos municípios, o benefício reduz a tributação de 20% para 8%.
Por decisão do Congresso, em votações expressivas, a política foi prorrogada até 2027 pelo Congresso Nacional, mas acabou suspensa por uma decisão liminar do STF em ação movida pelo governo federal. A alegação é que o Congresso não previu uma fonte de receitas para bancar o programa e não estimou o impacto do benefício nas contas públicas. O Legislativo, porém, argumenta que medidas foram aprovadas para aumentar as receitas da União e que a estimativa de impacto estava descrita na proposta aprovada.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou, em entrevista ao Estadão, um acordo para manter a desoneração em 2024 e negociar uma cobrança gradual a partir do ano que vem. Segundo o Desonera Brasil, os 17 setores beneficiados empregam 9,3 milhões de pessoas, e criou 151 mil empregos nos dois primeiros meses do ano. O movimento menciona ainda que o salário médio nestes setores é 12,7% maior ao dos setores que não são desonerados, dados que comprovariam os benefícios da medida.