Iago Santos, de 29 anos, descobriu os benefícios dos serviços de delivery ao trabalhar como designer gráfico na Barra, bairro nobre de Salvador. No local, ele recebia sem complicações os pedidos pessoais de roupas e equipamentos eletrônicos. Quando precisou alterar o endereço de destino para sua casa, em São Caetano, região periférica da capital baiana, percebeu que aquela área não era atendida. A frustração o motivou a modificar aquela realidade.
Em 2018, ele deixou o emprego e apostou na criação de um sistema de entregas que contemplasse bairros periféricos. “Nas ruas, perguntei a outras pessoas se viviam essa dor também”, conta. “Algumas favelas tinham o serviço dos Correios, mas outras, nenhum.”
O que era uma ideia virou um negócio no ano seguinte, mesmo período em que Ana Luiza Sena, de 29 anos, aceitou o convite do amigo para agregar ao projeto os seus conhecimentos de administração e marketing. Moradora de outro bairro periférico, a jovem sofria com as mesmas restrições logísticas. “Foi por querer sair dessa realidade e trazer novas possibilidades para as pessoas dessas áreas que topei participar sem nem saber como faríamos.”
A startup TrazFavela passou a operar e crescer nas comunidades. Iago conta que, no início, a comunicação com os comerciantes era de porta em porta. Já os entregadores eram parados nas ruas e atraídos para a proposta de negócio. Depois, a oferta de delivery se espalhou de forma orgânica. Hoje, mais de 4 mil entregas já foram realizadas por mais de 200 profissionais, atendendo 170 empresas de médio e pequeno portes.
O negócio, diz Iago, tem um objetivo de mão dupla: levar o produto do comerciante periférico a qualquer destino e entregar, na favela, encomendas de outras origens. O delivery já conseguiu alcançar 90% da capital baiana e mais cinco cidades metropolitanas. Até novembro, devem estar disponíveis duas versões de aplicativo para facilitar o acesso de comerciantes e o cadastro de entregadores. Para o próximo ano, a meta é expandir o serviço para São Paulo e Rio de Janeiro, além de mais uma cidade do Nordeste.
Programa do Google
Apesar da adesão crescente dos clientes, encontrar investidores que acreditassem no potencial do TrazFavela foi um dos grandes desafios da dupla de empreendedores. “A gente recebia vários ‘nãos’, mesmo apresentando os números. O preconceito era muito forte”, explica Iago.
A mudança de chave veio com a participação no programa de investimento para empreendedores negros Black Founders Fund, do Google. Parte do aporte financeiro custeou o contrato de mais pessoas e a compra das mochilas dos entregadores.
“O que estamos fazendo é que o dinheiro circule dentro da favela, gerando emprego, renda e oportunidades para ela mesma”, diz Iago.