De mergulho em naufrágios a 900 km de caminhada: a líder que traz lições do esporte para o trabalho


Daniela Redondo, diretora executiva do Instituto Coca-Cola Brasil, conta como transforma o esporte em ferramenta para ser mais eficiente no trabalho

Por Jayanne Rodrigues
Atualização:
Foto: Pedro Kirilos/Estadão
Entrevista comDaniela RedondoDiretora executiva do Instituto Coca-Cola Brasil

Há alguns anos, Daniela Redondo, 49, jamais imaginaria que poderia praticar corrida. Também tinha um receio de ficar submersa a metros da superfície em mar aberto. Sua história poderia ter parado aí. No entanto, a executiva aprendeu a conviver com esses medos. Hoje, ela conta entusiasmada que é uma mergulhadora autônoma certificada para naufrágios e até resgates. A corrida, que pratica diariamente, virou válvula de escape na rotina. Ambas as modalidades tornaram-se ferramentas valiosas para conduzir a liderança e lidar com problemas no trabalho.

“A maior lição da corrida é a disciplina e a constância. Sem esses dois aspectos, não há evolução. O mergulho me dá a pausa de que preciso. Pode parecer clichê no mundo corporativo, mas quando estamos testando novas formas de trabalho ou lançando uma iniciativa, as coisas nem sempre dão certo. Isso é resiliência, sabe?”, diz Daniela Redondo, diretora executiva do Instituto Coca-Cola Brasil (ICCB), organização social do Grupo Coca-Cola que atua com empregabilidade de jovens.

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Outra descoberta profissional ocorreu durante um período sabático, no qual percorreu 900 quilômetros a pé. Após essa experiência, voltou ao trabalho com novas perspectivas, incluindo a revisão de métodos convencionais.

Em entrevista ao Estadão, Daniela Redondo relembra um episódio em que levou alguns gerentes do instituto para uma reunião de planejamento no parque, depois de perceber que estavam com as ideias bloqueadas. “Eles acharam estranho, mas compraram a ideia. Foi um dos melhores planejamentos que fizemos”, conta.

Confira trechos da entrevista:

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Como foi o início da sua carreira?

Minha carreira não foi linear. Tive vários caminhos para chegar até aqui.

O meu contato com o mundo corporativo vem desde muito nova. Na minha cabeça os executivos viajavam muito. Então, ainda no colégio fiz curso técnico de administração. Também tinha uma admiração pela forma com que as empresas transformavam o mundo, ainda não tinha consciência de ESG, muito longe disso.

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Fui fazendo uma carreira tradicional na administração, com estágio, mas sempre tive em paralelo a isso uma veia empreendedora por causa da minha família, que é comerciante e vem de uma classe mais baixa do ABC Paulista.

Daniela Redondo na sede da Coca-Cola, no Rio de Janeiro.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão
Enquanto estava na faculdade, ajudava meu pai na locadora de vídeos junto com meu irmão. Ainda vendia batons e fazia uns bicos para o salão de beleza da minha tia.

Daniela Redondo

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Eu me mudei para o Rio de Janeiro em 2001. A partir daí, começo a cada vez mais me interessar por impacto social. Em 2009, recebi o convite para trabalhar na Coca-Cola como consultora para fazer modelagem de negócios do que viria a ser o maior programa de empregabilidade do Instituto, que é o projeto de capacitação profissional chamado Coletivo Jovem.

Depois, deixo de ser consultora para ser gerente do Instituto Coca-Cola. Em 2014, assumi a posição de diretora executiva. Dois anos depois, em 2016, pedi demissão para tirar um período sabático. Queria entender como é que poderíamos reduzir a desigualdade de forma massiva.

Conta mais sobre o período sabático.

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O meu sabático foi dividido em três partes.

Vinha de um trabalho muito intenso. Para ter ideia, saímos de 2 pessoas para 48 pessoas entre 2010 e 2016 no Instituto. Então, na primeira fase precisava dar uma zerada mental, limpar a cabeça e as experiências anteriores.

Fiz o Caminho de Santiago sozinha (o roteiro tradicional começa no sudoeste da França e termina no noroeste da Espanha). Caminhei 900 quilômetros em 28 dias.

Daniela Redondo

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Na segunda fase fui pra uma ecovila na Escócia chamada Findhorn. Lá, fiz uma formação sobre design de sustentabilidade e de regeneração. Na ecovila, eram 17 nacionalidades diferentes. Essas pessoas estavam ali para entender como transformar e como contribuir para o mundo. Fiquei cinco semanas lá.

No meio do processo, avaliei que precisava voltar para o mundo corporativo. Então, na terceira etapa do período sabático decidi ir para Londres entender como as cidades europeias estavam avançando na agenda de sustentabilidade.

Logo depois, a Coca-Cola me convida para retornar, era dezembro de 2017. Volto para o mesmo cargo como diretora executiva, mas tentando compreender como impactar mais pessoas e ter mais estratégias para mudar os ponteiros da desigualdade do país. O período sabático durou um ano e meio.

Como esse período sabático te ajudou enquanto líder?

Todo mundo que já tinha trabalhado comigo comentava que voltei diferente. São muitos motivos. Mas um deles é que, quando você sai do mundo corporativo, começa a ter um modus operandi em que naturaliza muitas coisas.

Como líder, me ajudou a ampliar a perspectiva e a escuta. O segundo ponto foi desconstruir modelos e ferramentas que são dadas como supereficientes no mundo corporativo. Aprendi que, se você tirar as pessoas do que elas fazem do dia a dia, ajuda muito.

Daniela Redondo, diretora executiva do Instituto Coca-Cola Brasil.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Por exemplo, voltei no auge do planejamento do ano seguinte. Quando fazia perguntas para os gerentes, eles ficavam travados. Percebi que eles precisavam zerar. Levei os gerentes para um parque e fizemos o planejamento lá. Eles precisavam sair do escritório para conseguir quebrar alguns vieses.

No começo, eles acharam esquisito, mas depois compraram a ideia. Foi um dos melhores planejamentos que fizemos. Então, o que pode parecer meio esquisito para o mundo corporativo, às vezes ajuda.

Outra mudança foi a maneira de tomar decisões. Hoje, a minha decisão é mais colaborativa, tento escutar todas as pessoas. Isso traz mais coerência para o ambiente de trabalho.

Defina seu estilo de liderança.

Tenho uma visão que vai para além do que está acontecendo no calor do momento. Consigo imaginar a longo prazo. Não tenho medo de experimentar o que vier, não sofro com o “como fazer” e consigo engajar as pessoas para virar uma realidade. Porque tem que inspirar para que as pessoas comprem uma ideia.

O contraponto é que sou extremamente acelerada, já recebi muitos feedbacks. Aprendi nesses últimos anos a estar atenta para respeitar o ritmo dos outros. Nem tudo precisa ser corrido e para ontem.

É muito bom ser visionária, mas no dia a dia pode ser intenso trabalhar comigo. Estou consciente disso e trabalho constantemente para equilibrar esses pratinhos.

Daniela Redondo

Você pratica alguns esportes como o mergulho e a corrida. Isso veio antes da sua entrada no mundo corporativo ou depois?

O mergulho sempre foi um sonho. Sou mergulhadora autônoma (modalidade esportiva que consiste em submergir totalmente na água com um equipamento de respiração) de naufrágio e resgate com certificação.

No começo, tinha claustrofobia quando afundava. Passei uns 20 mergulhos só trabalhando mentalmente a sensação de afundar. É um controle mental intenso. Escolhi insistir porque sabia que ia valer a pena.

Já perguntaram se queria trabalhar com isso, mas é um hobby. Já mergulhei no Rio, que é o meu quintal, Recife, Fernando de Noronha e viajei para o exterior sozinha só para mergulhar.

A corrida é um esporte democrático e prático. Fui estimulada por um amigo instrutor de mergulho, tinha medo de correr, achava que não ia conseguir.

Daniela Redondo durante corrida matinal no Rio de Janeiro.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão
A corrida me ajuda muito no trabalho, é a minha válvula de escape. O mergulho também tem um papel importante, é a única coisa na minha vida em que não penso em nada. É como se fosse uma meditação profunda. A corrida é onde tenho as ideias e resolvo tudo.

Daniela Redondo

Como esses esportes influenciaram a sua forma de trabalhar e liderar?

A maior lição da corrida é a disciplina e a constância. Sem esses dois aspectos, não há evolução. É quase clichê falar isso no mundo corporativo, mas às vezes estamos testando uma nova forma de trabalho ou lançando uma iniciativa e as coisas não dão certo. Isso é resiliência, sabe? Ninguém falou que ia ser fácil.

A corrida é a prova cabal de que é isso: o seu corpo fala que está difícil, mas você insiste, levanta cedo e vai. Essa disciplina traz muita realização.

Daniela Redondo

O mergulho dá o break (pausa) de que preciso. Quase ninguém fala, mas o mergulho tem como característica primordial a redundância. Apesar de ser chamado de mergulho autônomo, não tem como fazer sozinho, porque senão morre. Então, você sempre tem que estar em dupla, é a regra básica.

Por exemplo, eu e você somos uma dupla, mas em um final de semana vou mergulhar sozinha. Então tenho que passar a confiar em uma pessoa que não conheço porque estamos juntos dentro de um barco. Porque é dela que vai depender sua vida lá embaixo na água. Então, confiar no outro é uma premissa do mergulho.

Existe um passo a passo para alcançar um cargo de liderança?

Acredito que é menos o passo a passo tradicional e mais uma atitude construtiva e desafios com a equipe com que você está diretamente ou com a liderança. Sou o exemplo vivo disso. Desenvolva suas atitudes, e naturalmente o caminho profissional é mais bem-sucedido.

Se fosse pensar em alguns conselhos diria:

  • Tenha muito foco em resolver problemas. Infelizmente, encontramos muita gente que só traz o problema e nunca vem com uma proposta de solução. Apontar um problema é ótimo, mas é melhor falar o seguinte: “Ainda não sei qual é a solução, mas não se preocupa, vamos correr atrás e pensar juntos”.
  • Seja criativo. É importante não só para catalisar o impacto onde quer que você trabalhe, como também o impacto do que você está fazendo para entregar soluções e conseguir quebrar barreiras. Por exemplo, não podemos executar determinado plano por causa da política da empresa, mas será que é possível encontrar um caminho que não burle a regra da organização e seja criativo o suficiente para gerar valor para o negócio?

Então, o que me faz acordar e trabalhar por longas horas é ver que estamos pavimentando uma estrada para um caminho maior. Não esqueça de olhar para o futuro e honrar quem veio antes. Às vezes, as coisas não foram executadas perfeitamente, mas naquele momento que as pessoas construíram aquilo era a perspectiva que elas tinham.

Por fim, não se preocupe com a linearidade da sua carreira. Se você não se preocupar com isso de forma tão obcecada em busca dos caminhos tradicionais, acredito que consegue navegar com mais facilidade na carreira profissional.

Há alguns anos, Daniela Redondo, 49, jamais imaginaria que poderia praticar corrida. Também tinha um receio de ficar submersa a metros da superfície em mar aberto. Sua história poderia ter parado aí. No entanto, a executiva aprendeu a conviver com esses medos. Hoje, ela conta entusiasmada que é uma mergulhadora autônoma certificada para naufrágios e até resgates. A corrida, que pratica diariamente, virou válvula de escape na rotina. Ambas as modalidades tornaram-se ferramentas valiosas para conduzir a liderança e lidar com problemas no trabalho.

“A maior lição da corrida é a disciplina e a constância. Sem esses dois aspectos, não há evolução. O mergulho me dá a pausa de que preciso. Pode parecer clichê no mundo corporativo, mas quando estamos testando novas formas de trabalho ou lançando uma iniciativa, as coisas nem sempre dão certo. Isso é resiliência, sabe?”, diz Daniela Redondo, diretora executiva do Instituto Coca-Cola Brasil (ICCB), organização social do Grupo Coca-Cola que atua com empregabilidade de jovens.

Outra descoberta profissional ocorreu durante um período sabático, no qual percorreu 900 quilômetros a pé. Após essa experiência, voltou ao trabalho com novas perspectivas, incluindo a revisão de métodos convencionais.

Em entrevista ao Estadão, Daniela Redondo relembra um episódio em que levou alguns gerentes do instituto para uma reunião de planejamento no parque, depois de perceber que estavam com as ideias bloqueadas. “Eles acharam estranho, mas compraram a ideia. Foi um dos melhores planejamentos que fizemos”, conta.

Confira trechos da entrevista:

Como foi o início da sua carreira?

Minha carreira não foi linear. Tive vários caminhos para chegar até aqui.

O meu contato com o mundo corporativo vem desde muito nova. Na minha cabeça os executivos viajavam muito. Então, ainda no colégio fiz curso técnico de administração. Também tinha uma admiração pela forma com que as empresas transformavam o mundo, ainda não tinha consciência de ESG, muito longe disso.

Fui fazendo uma carreira tradicional na administração, com estágio, mas sempre tive em paralelo a isso uma veia empreendedora por causa da minha família, que é comerciante e vem de uma classe mais baixa do ABC Paulista.

Daniela Redondo na sede da Coca-Cola, no Rio de Janeiro.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão
Enquanto estava na faculdade, ajudava meu pai na locadora de vídeos junto com meu irmão. Ainda vendia batons e fazia uns bicos para o salão de beleza da minha tia.

Daniela Redondo

Eu me mudei para o Rio de Janeiro em 2001. A partir daí, começo a cada vez mais me interessar por impacto social. Em 2009, recebi o convite para trabalhar na Coca-Cola como consultora para fazer modelagem de negócios do que viria a ser o maior programa de empregabilidade do Instituto, que é o projeto de capacitação profissional chamado Coletivo Jovem.

Depois, deixo de ser consultora para ser gerente do Instituto Coca-Cola. Em 2014, assumi a posição de diretora executiva. Dois anos depois, em 2016, pedi demissão para tirar um período sabático. Queria entender como é que poderíamos reduzir a desigualdade de forma massiva.

Conta mais sobre o período sabático.

O meu sabático foi dividido em três partes.

Vinha de um trabalho muito intenso. Para ter ideia, saímos de 2 pessoas para 48 pessoas entre 2010 e 2016 no Instituto. Então, na primeira fase precisava dar uma zerada mental, limpar a cabeça e as experiências anteriores.

Fiz o Caminho de Santiago sozinha (o roteiro tradicional começa no sudoeste da França e termina no noroeste da Espanha). Caminhei 900 quilômetros em 28 dias.

Daniela Redondo

Na segunda fase fui pra uma ecovila na Escócia chamada Findhorn. Lá, fiz uma formação sobre design de sustentabilidade e de regeneração. Na ecovila, eram 17 nacionalidades diferentes. Essas pessoas estavam ali para entender como transformar e como contribuir para o mundo. Fiquei cinco semanas lá.

No meio do processo, avaliei que precisava voltar para o mundo corporativo. Então, na terceira etapa do período sabático decidi ir para Londres entender como as cidades europeias estavam avançando na agenda de sustentabilidade.

Logo depois, a Coca-Cola me convida para retornar, era dezembro de 2017. Volto para o mesmo cargo como diretora executiva, mas tentando compreender como impactar mais pessoas e ter mais estratégias para mudar os ponteiros da desigualdade do país. O período sabático durou um ano e meio.

Como esse período sabático te ajudou enquanto líder?

Todo mundo que já tinha trabalhado comigo comentava que voltei diferente. São muitos motivos. Mas um deles é que, quando você sai do mundo corporativo, começa a ter um modus operandi em que naturaliza muitas coisas.

Como líder, me ajudou a ampliar a perspectiva e a escuta. O segundo ponto foi desconstruir modelos e ferramentas que são dadas como supereficientes no mundo corporativo. Aprendi que, se você tirar as pessoas do que elas fazem do dia a dia, ajuda muito.

Daniela Redondo, diretora executiva do Instituto Coca-Cola Brasil.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Por exemplo, voltei no auge do planejamento do ano seguinte. Quando fazia perguntas para os gerentes, eles ficavam travados. Percebi que eles precisavam zerar. Levei os gerentes para um parque e fizemos o planejamento lá. Eles precisavam sair do escritório para conseguir quebrar alguns vieses.

No começo, eles acharam esquisito, mas depois compraram a ideia. Foi um dos melhores planejamentos que fizemos. Então, o que pode parecer meio esquisito para o mundo corporativo, às vezes ajuda.

Outra mudança foi a maneira de tomar decisões. Hoje, a minha decisão é mais colaborativa, tento escutar todas as pessoas. Isso traz mais coerência para o ambiente de trabalho.

Defina seu estilo de liderança.

Tenho uma visão que vai para além do que está acontecendo no calor do momento. Consigo imaginar a longo prazo. Não tenho medo de experimentar o que vier, não sofro com o “como fazer” e consigo engajar as pessoas para virar uma realidade. Porque tem que inspirar para que as pessoas comprem uma ideia.

O contraponto é que sou extremamente acelerada, já recebi muitos feedbacks. Aprendi nesses últimos anos a estar atenta para respeitar o ritmo dos outros. Nem tudo precisa ser corrido e para ontem.

É muito bom ser visionária, mas no dia a dia pode ser intenso trabalhar comigo. Estou consciente disso e trabalho constantemente para equilibrar esses pratinhos.

Daniela Redondo

Você pratica alguns esportes como o mergulho e a corrida. Isso veio antes da sua entrada no mundo corporativo ou depois?

O mergulho sempre foi um sonho. Sou mergulhadora autônoma (modalidade esportiva que consiste em submergir totalmente na água com um equipamento de respiração) de naufrágio e resgate com certificação.

No começo, tinha claustrofobia quando afundava. Passei uns 20 mergulhos só trabalhando mentalmente a sensação de afundar. É um controle mental intenso. Escolhi insistir porque sabia que ia valer a pena.

Já perguntaram se queria trabalhar com isso, mas é um hobby. Já mergulhei no Rio, que é o meu quintal, Recife, Fernando de Noronha e viajei para o exterior sozinha só para mergulhar.

A corrida é um esporte democrático e prático. Fui estimulada por um amigo instrutor de mergulho, tinha medo de correr, achava que não ia conseguir.

Daniela Redondo durante corrida matinal no Rio de Janeiro.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão
A corrida me ajuda muito no trabalho, é a minha válvula de escape. O mergulho também tem um papel importante, é a única coisa na minha vida em que não penso em nada. É como se fosse uma meditação profunda. A corrida é onde tenho as ideias e resolvo tudo.

Daniela Redondo

Como esses esportes influenciaram a sua forma de trabalhar e liderar?

A maior lição da corrida é a disciplina e a constância. Sem esses dois aspectos, não há evolução. É quase clichê falar isso no mundo corporativo, mas às vezes estamos testando uma nova forma de trabalho ou lançando uma iniciativa e as coisas não dão certo. Isso é resiliência, sabe? Ninguém falou que ia ser fácil.

A corrida é a prova cabal de que é isso: o seu corpo fala que está difícil, mas você insiste, levanta cedo e vai. Essa disciplina traz muita realização.

Daniela Redondo

O mergulho dá o break (pausa) de que preciso. Quase ninguém fala, mas o mergulho tem como característica primordial a redundância. Apesar de ser chamado de mergulho autônomo, não tem como fazer sozinho, porque senão morre. Então, você sempre tem que estar em dupla, é a regra básica.

Por exemplo, eu e você somos uma dupla, mas em um final de semana vou mergulhar sozinha. Então tenho que passar a confiar em uma pessoa que não conheço porque estamos juntos dentro de um barco. Porque é dela que vai depender sua vida lá embaixo na água. Então, confiar no outro é uma premissa do mergulho.

Existe um passo a passo para alcançar um cargo de liderança?

Acredito que é menos o passo a passo tradicional e mais uma atitude construtiva e desafios com a equipe com que você está diretamente ou com a liderança. Sou o exemplo vivo disso. Desenvolva suas atitudes, e naturalmente o caminho profissional é mais bem-sucedido.

Se fosse pensar em alguns conselhos diria:

  • Tenha muito foco em resolver problemas. Infelizmente, encontramos muita gente que só traz o problema e nunca vem com uma proposta de solução. Apontar um problema é ótimo, mas é melhor falar o seguinte: “Ainda não sei qual é a solução, mas não se preocupa, vamos correr atrás e pensar juntos”.
  • Seja criativo. É importante não só para catalisar o impacto onde quer que você trabalhe, como também o impacto do que você está fazendo para entregar soluções e conseguir quebrar barreiras. Por exemplo, não podemos executar determinado plano por causa da política da empresa, mas será que é possível encontrar um caminho que não burle a regra da organização e seja criativo o suficiente para gerar valor para o negócio?

Então, o que me faz acordar e trabalhar por longas horas é ver que estamos pavimentando uma estrada para um caminho maior. Não esqueça de olhar para o futuro e honrar quem veio antes. Às vezes, as coisas não foram executadas perfeitamente, mas naquele momento que as pessoas construíram aquilo era a perspectiva que elas tinham.

Por fim, não se preocupe com a linearidade da sua carreira. Se você não se preocupar com isso de forma tão obcecada em busca dos caminhos tradicionais, acredito que consegue navegar com mais facilidade na carreira profissional.

Há alguns anos, Daniela Redondo, 49, jamais imaginaria que poderia praticar corrida. Também tinha um receio de ficar submersa a metros da superfície em mar aberto. Sua história poderia ter parado aí. No entanto, a executiva aprendeu a conviver com esses medos. Hoje, ela conta entusiasmada que é uma mergulhadora autônoma certificada para naufrágios e até resgates. A corrida, que pratica diariamente, virou válvula de escape na rotina. Ambas as modalidades tornaram-se ferramentas valiosas para conduzir a liderança e lidar com problemas no trabalho.

“A maior lição da corrida é a disciplina e a constância. Sem esses dois aspectos, não há evolução. O mergulho me dá a pausa de que preciso. Pode parecer clichê no mundo corporativo, mas quando estamos testando novas formas de trabalho ou lançando uma iniciativa, as coisas nem sempre dão certo. Isso é resiliência, sabe?”, diz Daniela Redondo, diretora executiva do Instituto Coca-Cola Brasil (ICCB), organização social do Grupo Coca-Cola que atua com empregabilidade de jovens.

Outra descoberta profissional ocorreu durante um período sabático, no qual percorreu 900 quilômetros a pé. Após essa experiência, voltou ao trabalho com novas perspectivas, incluindo a revisão de métodos convencionais.

Em entrevista ao Estadão, Daniela Redondo relembra um episódio em que levou alguns gerentes do instituto para uma reunião de planejamento no parque, depois de perceber que estavam com as ideias bloqueadas. “Eles acharam estranho, mas compraram a ideia. Foi um dos melhores planejamentos que fizemos”, conta.

Confira trechos da entrevista:

Como foi o início da sua carreira?

Minha carreira não foi linear. Tive vários caminhos para chegar até aqui.

O meu contato com o mundo corporativo vem desde muito nova. Na minha cabeça os executivos viajavam muito. Então, ainda no colégio fiz curso técnico de administração. Também tinha uma admiração pela forma com que as empresas transformavam o mundo, ainda não tinha consciência de ESG, muito longe disso.

Fui fazendo uma carreira tradicional na administração, com estágio, mas sempre tive em paralelo a isso uma veia empreendedora por causa da minha família, que é comerciante e vem de uma classe mais baixa do ABC Paulista.

Daniela Redondo na sede da Coca-Cola, no Rio de Janeiro.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão
Enquanto estava na faculdade, ajudava meu pai na locadora de vídeos junto com meu irmão. Ainda vendia batons e fazia uns bicos para o salão de beleza da minha tia.

Daniela Redondo

Eu me mudei para o Rio de Janeiro em 2001. A partir daí, começo a cada vez mais me interessar por impacto social. Em 2009, recebi o convite para trabalhar na Coca-Cola como consultora para fazer modelagem de negócios do que viria a ser o maior programa de empregabilidade do Instituto, que é o projeto de capacitação profissional chamado Coletivo Jovem.

Depois, deixo de ser consultora para ser gerente do Instituto Coca-Cola. Em 2014, assumi a posição de diretora executiva. Dois anos depois, em 2016, pedi demissão para tirar um período sabático. Queria entender como é que poderíamos reduzir a desigualdade de forma massiva.

Conta mais sobre o período sabático.

O meu sabático foi dividido em três partes.

Vinha de um trabalho muito intenso. Para ter ideia, saímos de 2 pessoas para 48 pessoas entre 2010 e 2016 no Instituto. Então, na primeira fase precisava dar uma zerada mental, limpar a cabeça e as experiências anteriores.

Fiz o Caminho de Santiago sozinha (o roteiro tradicional começa no sudoeste da França e termina no noroeste da Espanha). Caminhei 900 quilômetros em 28 dias.

Daniela Redondo

Na segunda fase fui pra uma ecovila na Escócia chamada Findhorn. Lá, fiz uma formação sobre design de sustentabilidade e de regeneração. Na ecovila, eram 17 nacionalidades diferentes. Essas pessoas estavam ali para entender como transformar e como contribuir para o mundo. Fiquei cinco semanas lá.

No meio do processo, avaliei que precisava voltar para o mundo corporativo. Então, na terceira etapa do período sabático decidi ir para Londres entender como as cidades europeias estavam avançando na agenda de sustentabilidade.

Logo depois, a Coca-Cola me convida para retornar, era dezembro de 2017. Volto para o mesmo cargo como diretora executiva, mas tentando compreender como impactar mais pessoas e ter mais estratégias para mudar os ponteiros da desigualdade do país. O período sabático durou um ano e meio.

Como esse período sabático te ajudou enquanto líder?

Todo mundo que já tinha trabalhado comigo comentava que voltei diferente. São muitos motivos. Mas um deles é que, quando você sai do mundo corporativo, começa a ter um modus operandi em que naturaliza muitas coisas.

Como líder, me ajudou a ampliar a perspectiva e a escuta. O segundo ponto foi desconstruir modelos e ferramentas que são dadas como supereficientes no mundo corporativo. Aprendi que, se você tirar as pessoas do que elas fazem do dia a dia, ajuda muito.

Daniela Redondo, diretora executiva do Instituto Coca-Cola Brasil.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Por exemplo, voltei no auge do planejamento do ano seguinte. Quando fazia perguntas para os gerentes, eles ficavam travados. Percebi que eles precisavam zerar. Levei os gerentes para um parque e fizemos o planejamento lá. Eles precisavam sair do escritório para conseguir quebrar alguns vieses.

No começo, eles acharam esquisito, mas depois compraram a ideia. Foi um dos melhores planejamentos que fizemos. Então, o que pode parecer meio esquisito para o mundo corporativo, às vezes ajuda.

Outra mudança foi a maneira de tomar decisões. Hoje, a minha decisão é mais colaborativa, tento escutar todas as pessoas. Isso traz mais coerência para o ambiente de trabalho.

Defina seu estilo de liderança.

Tenho uma visão que vai para além do que está acontecendo no calor do momento. Consigo imaginar a longo prazo. Não tenho medo de experimentar o que vier, não sofro com o “como fazer” e consigo engajar as pessoas para virar uma realidade. Porque tem que inspirar para que as pessoas comprem uma ideia.

O contraponto é que sou extremamente acelerada, já recebi muitos feedbacks. Aprendi nesses últimos anos a estar atenta para respeitar o ritmo dos outros. Nem tudo precisa ser corrido e para ontem.

É muito bom ser visionária, mas no dia a dia pode ser intenso trabalhar comigo. Estou consciente disso e trabalho constantemente para equilibrar esses pratinhos.

Daniela Redondo

Você pratica alguns esportes como o mergulho e a corrida. Isso veio antes da sua entrada no mundo corporativo ou depois?

O mergulho sempre foi um sonho. Sou mergulhadora autônoma (modalidade esportiva que consiste em submergir totalmente na água com um equipamento de respiração) de naufrágio e resgate com certificação.

No começo, tinha claustrofobia quando afundava. Passei uns 20 mergulhos só trabalhando mentalmente a sensação de afundar. É um controle mental intenso. Escolhi insistir porque sabia que ia valer a pena.

Já perguntaram se queria trabalhar com isso, mas é um hobby. Já mergulhei no Rio, que é o meu quintal, Recife, Fernando de Noronha e viajei para o exterior sozinha só para mergulhar.

A corrida é um esporte democrático e prático. Fui estimulada por um amigo instrutor de mergulho, tinha medo de correr, achava que não ia conseguir.

Daniela Redondo durante corrida matinal no Rio de Janeiro.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão
A corrida me ajuda muito no trabalho, é a minha válvula de escape. O mergulho também tem um papel importante, é a única coisa na minha vida em que não penso em nada. É como se fosse uma meditação profunda. A corrida é onde tenho as ideias e resolvo tudo.

Daniela Redondo

Como esses esportes influenciaram a sua forma de trabalhar e liderar?

A maior lição da corrida é a disciplina e a constância. Sem esses dois aspectos, não há evolução. É quase clichê falar isso no mundo corporativo, mas às vezes estamos testando uma nova forma de trabalho ou lançando uma iniciativa e as coisas não dão certo. Isso é resiliência, sabe? Ninguém falou que ia ser fácil.

A corrida é a prova cabal de que é isso: o seu corpo fala que está difícil, mas você insiste, levanta cedo e vai. Essa disciplina traz muita realização.

Daniela Redondo

O mergulho dá o break (pausa) de que preciso. Quase ninguém fala, mas o mergulho tem como característica primordial a redundância. Apesar de ser chamado de mergulho autônomo, não tem como fazer sozinho, porque senão morre. Então, você sempre tem que estar em dupla, é a regra básica.

Por exemplo, eu e você somos uma dupla, mas em um final de semana vou mergulhar sozinha. Então tenho que passar a confiar em uma pessoa que não conheço porque estamos juntos dentro de um barco. Porque é dela que vai depender sua vida lá embaixo na água. Então, confiar no outro é uma premissa do mergulho.

Existe um passo a passo para alcançar um cargo de liderança?

Acredito que é menos o passo a passo tradicional e mais uma atitude construtiva e desafios com a equipe com que você está diretamente ou com a liderança. Sou o exemplo vivo disso. Desenvolva suas atitudes, e naturalmente o caminho profissional é mais bem-sucedido.

Se fosse pensar em alguns conselhos diria:

  • Tenha muito foco em resolver problemas. Infelizmente, encontramos muita gente que só traz o problema e nunca vem com uma proposta de solução. Apontar um problema é ótimo, mas é melhor falar o seguinte: “Ainda não sei qual é a solução, mas não se preocupa, vamos correr atrás e pensar juntos”.
  • Seja criativo. É importante não só para catalisar o impacto onde quer que você trabalhe, como também o impacto do que você está fazendo para entregar soluções e conseguir quebrar barreiras. Por exemplo, não podemos executar determinado plano por causa da política da empresa, mas será que é possível encontrar um caminho que não burle a regra da organização e seja criativo o suficiente para gerar valor para o negócio?

Então, o que me faz acordar e trabalhar por longas horas é ver que estamos pavimentando uma estrada para um caminho maior. Não esqueça de olhar para o futuro e honrar quem veio antes. Às vezes, as coisas não foram executadas perfeitamente, mas naquele momento que as pessoas construíram aquilo era a perspectiva que elas tinham.

Por fim, não se preocupe com a linearidade da sua carreira. Se você não se preocupar com isso de forma tão obcecada em busca dos caminhos tradicionais, acredito que consegue navegar com mais facilidade na carreira profissional.

Há alguns anos, Daniela Redondo, 49, jamais imaginaria que poderia praticar corrida. Também tinha um receio de ficar submersa a metros da superfície em mar aberto. Sua história poderia ter parado aí. No entanto, a executiva aprendeu a conviver com esses medos. Hoje, ela conta entusiasmada que é uma mergulhadora autônoma certificada para naufrágios e até resgates. A corrida, que pratica diariamente, virou válvula de escape na rotina. Ambas as modalidades tornaram-se ferramentas valiosas para conduzir a liderança e lidar com problemas no trabalho.

“A maior lição da corrida é a disciplina e a constância. Sem esses dois aspectos, não há evolução. O mergulho me dá a pausa de que preciso. Pode parecer clichê no mundo corporativo, mas quando estamos testando novas formas de trabalho ou lançando uma iniciativa, as coisas nem sempre dão certo. Isso é resiliência, sabe?”, diz Daniela Redondo, diretora executiva do Instituto Coca-Cola Brasil (ICCB), organização social do Grupo Coca-Cola que atua com empregabilidade de jovens.

Outra descoberta profissional ocorreu durante um período sabático, no qual percorreu 900 quilômetros a pé. Após essa experiência, voltou ao trabalho com novas perspectivas, incluindo a revisão de métodos convencionais.

Em entrevista ao Estadão, Daniela Redondo relembra um episódio em que levou alguns gerentes do instituto para uma reunião de planejamento no parque, depois de perceber que estavam com as ideias bloqueadas. “Eles acharam estranho, mas compraram a ideia. Foi um dos melhores planejamentos que fizemos”, conta.

Confira trechos da entrevista:

Como foi o início da sua carreira?

Minha carreira não foi linear. Tive vários caminhos para chegar até aqui.

O meu contato com o mundo corporativo vem desde muito nova. Na minha cabeça os executivos viajavam muito. Então, ainda no colégio fiz curso técnico de administração. Também tinha uma admiração pela forma com que as empresas transformavam o mundo, ainda não tinha consciência de ESG, muito longe disso.

Fui fazendo uma carreira tradicional na administração, com estágio, mas sempre tive em paralelo a isso uma veia empreendedora por causa da minha família, que é comerciante e vem de uma classe mais baixa do ABC Paulista.

Daniela Redondo na sede da Coca-Cola, no Rio de Janeiro.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão
Enquanto estava na faculdade, ajudava meu pai na locadora de vídeos junto com meu irmão. Ainda vendia batons e fazia uns bicos para o salão de beleza da minha tia.

Daniela Redondo

Eu me mudei para o Rio de Janeiro em 2001. A partir daí, começo a cada vez mais me interessar por impacto social. Em 2009, recebi o convite para trabalhar na Coca-Cola como consultora para fazer modelagem de negócios do que viria a ser o maior programa de empregabilidade do Instituto, que é o projeto de capacitação profissional chamado Coletivo Jovem.

Depois, deixo de ser consultora para ser gerente do Instituto Coca-Cola. Em 2014, assumi a posição de diretora executiva. Dois anos depois, em 2016, pedi demissão para tirar um período sabático. Queria entender como é que poderíamos reduzir a desigualdade de forma massiva.

Conta mais sobre o período sabático.

O meu sabático foi dividido em três partes.

Vinha de um trabalho muito intenso. Para ter ideia, saímos de 2 pessoas para 48 pessoas entre 2010 e 2016 no Instituto. Então, na primeira fase precisava dar uma zerada mental, limpar a cabeça e as experiências anteriores.

Fiz o Caminho de Santiago sozinha (o roteiro tradicional começa no sudoeste da França e termina no noroeste da Espanha). Caminhei 900 quilômetros em 28 dias.

Daniela Redondo

Na segunda fase fui pra uma ecovila na Escócia chamada Findhorn. Lá, fiz uma formação sobre design de sustentabilidade e de regeneração. Na ecovila, eram 17 nacionalidades diferentes. Essas pessoas estavam ali para entender como transformar e como contribuir para o mundo. Fiquei cinco semanas lá.

No meio do processo, avaliei que precisava voltar para o mundo corporativo. Então, na terceira etapa do período sabático decidi ir para Londres entender como as cidades europeias estavam avançando na agenda de sustentabilidade.

Logo depois, a Coca-Cola me convida para retornar, era dezembro de 2017. Volto para o mesmo cargo como diretora executiva, mas tentando compreender como impactar mais pessoas e ter mais estratégias para mudar os ponteiros da desigualdade do país. O período sabático durou um ano e meio.

Como esse período sabático te ajudou enquanto líder?

Todo mundo que já tinha trabalhado comigo comentava que voltei diferente. São muitos motivos. Mas um deles é que, quando você sai do mundo corporativo, começa a ter um modus operandi em que naturaliza muitas coisas.

Como líder, me ajudou a ampliar a perspectiva e a escuta. O segundo ponto foi desconstruir modelos e ferramentas que são dadas como supereficientes no mundo corporativo. Aprendi que, se você tirar as pessoas do que elas fazem do dia a dia, ajuda muito.

Daniela Redondo, diretora executiva do Instituto Coca-Cola Brasil.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Por exemplo, voltei no auge do planejamento do ano seguinte. Quando fazia perguntas para os gerentes, eles ficavam travados. Percebi que eles precisavam zerar. Levei os gerentes para um parque e fizemos o planejamento lá. Eles precisavam sair do escritório para conseguir quebrar alguns vieses.

No começo, eles acharam esquisito, mas depois compraram a ideia. Foi um dos melhores planejamentos que fizemos. Então, o que pode parecer meio esquisito para o mundo corporativo, às vezes ajuda.

Outra mudança foi a maneira de tomar decisões. Hoje, a minha decisão é mais colaborativa, tento escutar todas as pessoas. Isso traz mais coerência para o ambiente de trabalho.

Defina seu estilo de liderança.

Tenho uma visão que vai para além do que está acontecendo no calor do momento. Consigo imaginar a longo prazo. Não tenho medo de experimentar o que vier, não sofro com o “como fazer” e consigo engajar as pessoas para virar uma realidade. Porque tem que inspirar para que as pessoas comprem uma ideia.

O contraponto é que sou extremamente acelerada, já recebi muitos feedbacks. Aprendi nesses últimos anos a estar atenta para respeitar o ritmo dos outros. Nem tudo precisa ser corrido e para ontem.

É muito bom ser visionária, mas no dia a dia pode ser intenso trabalhar comigo. Estou consciente disso e trabalho constantemente para equilibrar esses pratinhos.

Daniela Redondo

Você pratica alguns esportes como o mergulho e a corrida. Isso veio antes da sua entrada no mundo corporativo ou depois?

O mergulho sempre foi um sonho. Sou mergulhadora autônoma (modalidade esportiva que consiste em submergir totalmente na água com um equipamento de respiração) de naufrágio e resgate com certificação.

No começo, tinha claustrofobia quando afundava. Passei uns 20 mergulhos só trabalhando mentalmente a sensação de afundar. É um controle mental intenso. Escolhi insistir porque sabia que ia valer a pena.

Já perguntaram se queria trabalhar com isso, mas é um hobby. Já mergulhei no Rio, que é o meu quintal, Recife, Fernando de Noronha e viajei para o exterior sozinha só para mergulhar.

A corrida é um esporte democrático e prático. Fui estimulada por um amigo instrutor de mergulho, tinha medo de correr, achava que não ia conseguir.

Daniela Redondo durante corrida matinal no Rio de Janeiro.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão
A corrida me ajuda muito no trabalho, é a minha válvula de escape. O mergulho também tem um papel importante, é a única coisa na minha vida em que não penso em nada. É como se fosse uma meditação profunda. A corrida é onde tenho as ideias e resolvo tudo.

Daniela Redondo

Como esses esportes influenciaram a sua forma de trabalhar e liderar?

A maior lição da corrida é a disciplina e a constância. Sem esses dois aspectos, não há evolução. É quase clichê falar isso no mundo corporativo, mas às vezes estamos testando uma nova forma de trabalho ou lançando uma iniciativa e as coisas não dão certo. Isso é resiliência, sabe? Ninguém falou que ia ser fácil.

A corrida é a prova cabal de que é isso: o seu corpo fala que está difícil, mas você insiste, levanta cedo e vai. Essa disciplina traz muita realização.

Daniela Redondo

O mergulho dá o break (pausa) de que preciso. Quase ninguém fala, mas o mergulho tem como característica primordial a redundância. Apesar de ser chamado de mergulho autônomo, não tem como fazer sozinho, porque senão morre. Então, você sempre tem que estar em dupla, é a regra básica.

Por exemplo, eu e você somos uma dupla, mas em um final de semana vou mergulhar sozinha. Então tenho que passar a confiar em uma pessoa que não conheço porque estamos juntos dentro de um barco. Porque é dela que vai depender sua vida lá embaixo na água. Então, confiar no outro é uma premissa do mergulho.

Existe um passo a passo para alcançar um cargo de liderança?

Acredito que é menos o passo a passo tradicional e mais uma atitude construtiva e desafios com a equipe com que você está diretamente ou com a liderança. Sou o exemplo vivo disso. Desenvolva suas atitudes, e naturalmente o caminho profissional é mais bem-sucedido.

Se fosse pensar em alguns conselhos diria:

  • Tenha muito foco em resolver problemas. Infelizmente, encontramos muita gente que só traz o problema e nunca vem com uma proposta de solução. Apontar um problema é ótimo, mas é melhor falar o seguinte: “Ainda não sei qual é a solução, mas não se preocupa, vamos correr atrás e pensar juntos”.
  • Seja criativo. É importante não só para catalisar o impacto onde quer que você trabalhe, como também o impacto do que você está fazendo para entregar soluções e conseguir quebrar barreiras. Por exemplo, não podemos executar determinado plano por causa da política da empresa, mas será que é possível encontrar um caminho que não burle a regra da organização e seja criativo o suficiente para gerar valor para o negócio?

Então, o que me faz acordar e trabalhar por longas horas é ver que estamos pavimentando uma estrada para um caminho maior. Não esqueça de olhar para o futuro e honrar quem veio antes. Às vezes, as coisas não foram executadas perfeitamente, mas naquele momento que as pessoas construíram aquilo era a perspectiva que elas tinham.

Por fim, não se preocupe com a linearidade da sua carreira. Se você não se preocupar com isso de forma tão obcecada em busca dos caminhos tradicionais, acredito que consegue navegar com mais facilidade na carreira profissional.

Há alguns anos, Daniela Redondo, 49, jamais imaginaria que poderia praticar corrida. Também tinha um receio de ficar submersa a metros da superfície em mar aberto. Sua história poderia ter parado aí. No entanto, a executiva aprendeu a conviver com esses medos. Hoje, ela conta entusiasmada que é uma mergulhadora autônoma certificada para naufrágios e até resgates. A corrida, que pratica diariamente, virou válvula de escape na rotina. Ambas as modalidades tornaram-se ferramentas valiosas para conduzir a liderança e lidar com problemas no trabalho.

“A maior lição da corrida é a disciplina e a constância. Sem esses dois aspectos, não há evolução. O mergulho me dá a pausa de que preciso. Pode parecer clichê no mundo corporativo, mas quando estamos testando novas formas de trabalho ou lançando uma iniciativa, as coisas nem sempre dão certo. Isso é resiliência, sabe?”, diz Daniela Redondo, diretora executiva do Instituto Coca-Cola Brasil (ICCB), organização social do Grupo Coca-Cola que atua com empregabilidade de jovens.

Outra descoberta profissional ocorreu durante um período sabático, no qual percorreu 900 quilômetros a pé. Após essa experiência, voltou ao trabalho com novas perspectivas, incluindo a revisão de métodos convencionais.

Em entrevista ao Estadão, Daniela Redondo relembra um episódio em que levou alguns gerentes do instituto para uma reunião de planejamento no parque, depois de perceber que estavam com as ideias bloqueadas. “Eles acharam estranho, mas compraram a ideia. Foi um dos melhores planejamentos que fizemos”, conta.

Confira trechos da entrevista:

Como foi o início da sua carreira?

Minha carreira não foi linear. Tive vários caminhos para chegar até aqui.

O meu contato com o mundo corporativo vem desde muito nova. Na minha cabeça os executivos viajavam muito. Então, ainda no colégio fiz curso técnico de administração. Também tinha uma admiração pela forma com que as empresas transformavam o mundo, ainda não tinha consciência de ESG, muito longe disso.

Fui fazendo uma carreira tradicional na administração, com estágio, mas sempre tive em paralelo a isso uma veia empreendedora por causa da minha família, que é comerciante e vem de uma classe mais baixa do ABC Paulista.

Daniela Redondo na sede da Coca-Cola, no Rio de Janeiro.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão
Enquanto estava na faculdade, ajudava meu pai na locadora de vídeos junto com meu irmão. Ainda vendia batons e fazia uns bicos para o salão de beleza da minha tia.

Daniela Redondo

Eu me mudei para o Rio de Janeiro em 2001. A partir daí, começo a cada vez mais me interessar por impacto social. Em 2009, recebi o convite para trabalhar na Coca-Cola como consultora para fazer modelagem de negócios do que viria a ser o maior programa de empregabilidade do Instituto, que é o projeto de capacitação profissional chamado Coletivo Jovem.

Depois, deixo de ser consultora para ser gerente do Instituto Coca-Cola. Em 2014, assumi a posição de diretora executiva. Dois anos depois, em 2016, pedi demissão para tirar um período sabático. Queria entender como é que poderíamos reduzir a desigualdade de forma massiva.

Conta mais sobre o período sabático.

O meu sabático foi dividido em três partes.

Vinha de um trabalho muito intenso. Para ter ideia, saímos de 2 pessoas para 48 pessoas entre 2010 e 2016 no Instituto. Então, na primeira fase precisava dar uma zerada mental, limpar a cabeça e as experiências anteriores.

Fiz o Caminho de Santiago sozinha (o roteiro tradicional começa no sudoeste da França e termina no noroeste da Espanha). Caminhei 900 quilômetros em 28 dias.

Daniela Redondo

Na segunda fase fui pra uma ecovila na Escócia chamada Findhorn. Lá, fiz uma formação sobre design de sustentabilidade e de regeneração. Na ecovila, eram 17 nacionalidades diferentes. Essas pessoas estavam ali para entender como transformar e como contribuir para o mundo. Fiquei cinco semanas lá.

No meio do processo, avaliei que precisava voltar para o mundo corporativo. Então, na terceira etapa do período sabático decidi ir para Londres entender como as cidades europeias estavam avançando na agenda de sustentabilidade.

Logo depois, a Coca-Cola me convida para retornar, era dezembro de 2017. Volto para o mesmo cargo como diretora executiva, mas tentando compreender como impactar mais pessoas e ter mais estratégias para mudar os ponteiros da desigualdade do país. O período sabático durou um ano e meio.

Como esse período sabático te ajudou enquanto líder?

Todo mundo que já tinha trabalhado comigo comentava que voltei diferente. São muitos motivos. Mas um deles é que, quando você sai do mundo corporativo, começa a ter um modus operandi em que naturaliza muitas coisas.

Como líder, me ajudou a ampliar a perspectiva e a escuta. O segundo ponto foi desconstruir modelos e ferramentas que são dadas como supereficientes no mundo corporativo. Aprendi que, se você tirar as pessoas do que elas fazem do dia a dia, ajuda muito.

Daniela Redondo, diretora executiva do Instituto Coca-Cola Brasil.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Por exemplo, voltei no auge do planejamento do ano seguinte. Quando fazia perguntas para os gerentes, eles ficavam travados. Percebi que eles precisavam zerar. Levei os gerentes para um parque e fizemos o planejamento lá. Eles precisavam sair do escritório para conseguir quebrar alguns vieses.

No começo, eles acharam esquisito, mas depois compraram a ideia. Foi um dos melhores planejamentos que fizemos. Então, o que pode parecer meio esquisito para o mundo corporativo, às vezes ajuda.

Outra mudança foi a maneira de tomar decisões. Hoje, a minha decisão é mais colaborativa, tento escutar todas as pessoas. Isso traz mais coerência para o ambiente de trabalho.

Defina seu estilo de liderança.

Tenho uma visão que vai para além do que está acontecendo no calor do momento. Consigo imaginar a longo prazo. Não tenho medo de experimentar o que vier, não sofro com o “como fazer” e consigo engajar as pessoas para virar uma realidade. Porque tem que inspirar para que as pessoas comprem uma ideia.

O contraponto é que sou extremamente acelerada, já recebi muitos feedbacks. Aprendi nesses últimos anos a estar atenta para respeitar o ritmo dos outros. Nem tudo precisa ser corrido e para ontem.

É muito bom ser visionária, mas no dia a dia pode ser intenso trabalhar comigo. Estou consciente disso e trabalho constantemente para equilibrar esses pratinhos.

Daniela Redondo

Você pratica alguns esportes como o mergulho e a corrida. Isso veio antes da sua entrada no mundo corporativo ou depois?

O mergulho sempre foi um sonho. Sou mergulhadora autônoma (modalidade esportiva que consiste em submergir totalmente na água com um equipamento de respiração) de naufrágio e resgate com certificação.

No começo, tinha claustrofobia quando afundava. Passei uns 20 mergulhos só trabalhando mentalmente a sensação de afundar. É um controle mental intenso. Escolhi insistir porque sabia que ia valer a pena.

Já perguntaram se queria trabalhar com isso, mas é um hobby. Já mergulhei no Rio, que é o meu quintal, Recife, Fernando de Noronha e viajei para o exterior sozinha só para mergulhar.

A corrida é um esporte democrático e prático. Fui estimulada por um amigo instrutor de mergulho, tinha medo de correr, achava que não ia conseguir.

Daniela Redondo durante corrida matinal no Rio de Janeiro.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão
A corrida me ajuda muito no trabalho, é a minha válvula de escape. O mergulho também tem um papel importante, é a única coisa na minha vida em que não penso em nada. É como se fosse uma meditação profunda. A corrida é onde tenho as ideias e resolvo tudo.

Daniela Redondo

Como esses esportes influenciaram a sua forma de trabalhar e liderar?

A maior lição da corrida é a disciplina e a constância. Sem esses dois aspectos, não há evolução. É quase clichê falar isso no mundo corporativo, mas às vezes estamos testando uma nova forma de trabalho ou lançando uma iniciativa e as coisas não dão certo. Isso é resiliência, sabe? Ninguém falou que ia ser fácil.

A corrida é a prova cabal de que é isso: o seu corpo fala que está difícil, mas você insiste, levanta cedo e vai. Essa disciplina traz muita realização.

Daniela Redondo

O mergulho dá o break (pausa) de que preciso. Quase ninguém fala, mas o mergulho tem como característica primordial a redundância. Apesar de ser chamado de mergulho autônomo, não tem como fazer sozinho, porque senão morre. Então, você sempre tem que estar em dupla, é a regra básica.

Por exemplo, eu e você somos uma dupla, mas em um final de semana vou mergulhar sozinha. Então tenho que passar a confiar em uma pessoa que não conheço porque estamos juntos dentro de um barco. Porque é dela que vai depender sua vida lá embaixo na água. Então, confiar no outro é uma premissa do mergulho.

Existe um passo a passo para alcançar um cargo de liderança?

Acredito que é menos o passo a passo tradicional e mais uma atitude construtiva e desafios com a equipe com que você está diretamente ou com a liderança. Sou o exemplo vivo disso. Desenvolva suas atitudes, e naturalmente o caminho profissional é mais bem-sucedido.

Se fosse pensar em alguns conselhos diria:

  • Tenha muito foco em resolver problemas. Infelizmente, encontramos muita gente que só traz o problema e nunca vem com uma proposta de solução. Apontar um problema é ótimo, mas é melhor falar o seguinte: “Ainda não sei qual é a solução, mas não se preocupa, vamos correr atrás e pensar juntos”.
  • Seja criativo. É importante não só para catalisar o impacto onde quer que você trabalhe, como também o impacto do que você está fazendo para entregar soluções e conseguir quebrar barreiras. Por exemplo, não podemos executar determinado plano por causa da política da empresa, mas será que é possível encontrar um caminho que não burle a regra da organização e seja criativo o suficiente para gerar valor para o negócio?

Então, o que me faz acordar e trabalhar por longas horas é ver que estamos pavimentando uma estrada para um caminho maior. Não esqueça de olhar para o futuro e honrar quem veio antes. Às vezes, as coisas não foram executadas perfeitamente, mas naquele momento que as pessoas construíram aquilo era a perspectiva que elas tinham.

Por fim, não se preocupe com a linearidade da sua carreira. Se você não se preocupar com isso de forma tão obcecada em busca dos caminhos tradicionais, acredito que consegue navegar com mais facilidade na carreira profissional.

Entrevista por Jayanne Rodrigues

Formada em jornalismo pela Universidade do Estado da Bahia, é repórter de Carreiras. Cobre futuro do trabalho, tendências no mundo corporativo, lideranças e outros assuntos que impactam diretamente a cultura de trabalho no Brasil. No Estadão, também atuou como plantonista da madrugada, cobriu judiciário e tem passagem pela home page do jornal.

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