Se esperar crise de crédito esfriar a economia, recessão já estará contratada, diz ex-BC


Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central, vê ‘negação’ em comunicado do Comitê de Política Monetária que manteve a taxa básica de juro em 13,75% ao ano

Por Vinicius Neder
Atualização:
Foto: Amanda Perobelli/Estadão - 27/7/2017
Entrevista comTony VolponEx-diretor do Banco Central

RIO - A possibilidade de uma crise de crédito é “grave o suficiente” para esfriar ainda mais a economia brasileira, mas o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) perdeu a oportunidade de incorporar esse cenário nos cálculos que definem o nível da taxa básica de juros (Selic), avalia o economista Tony Volpon, que ocupou uma cadeira no órgão, como diretor de Assuntos Internacionais, de 2015 a 2016.

Na última quarta-feira, 22, o Copom anunciou a decisão de manter a Selic em 13,75% ao ano, nível no qual a taxa está estacionada desde agosto do ano passado. O objetivo é arrefecer a demanda, para segurar a inflação elevada e minar as perspectivas de que os preços seguirão pressionados no médio prazo, em parte por causa das incertezas em relação ao reequilíbrio das contas do governo, que deverão fechar no vermelho este ano.

No comunicado sobre a decisão, o Copom citou os problemas de crédito em dois trechos. Para sustentar que o “ambiente externo se deteriorou”, os diretores do BC disseram que “os episódios envolvendo bancos nos EUA e na Europa elevaram a incerteza e a volatilidade dos mercados e requerem monitoramento”, numa referência à quebra do Silicon Valley Bank e aos problemas do Credit Suisse.

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E, ao listar os “riscos de baixa” para a inflação no médio prazo, incluíram a possibilidade de haver “uma desaceleração na concessão doméstica de crédito” maior do que a esperada, por causa da combinação de endividamento e inadimplência elevados com alguma retração dos bancos após a revelação do escândalo contábil da Lojas Americanas.

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Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central, vê “negação” em comunicado da reunião do Copom que manteve a taxa básica de juro em 13,75%

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Para Volpon, é pouco. Em artigos e manifestações recentes, o ex-diretor do BC, que já ocupou posições em instituições financeiras como Nomura, UBS e WHG, tem demonstrado mais preocupação do que a média dos analistas, identificando um padrão nas crises ao longo da história, em que eventos financeiros servem de gatilho para recessões. Esse padrão pode ser dividido em fases. Num primeiro momento, BCs e autoridades econômicas tendem a negar a crise. Segundo Volpon, o comunicado da última quarta-feira, 22, deixa o BC ainda na fase de “negação”.

Segundo Volpon, diretores do Copom estão tendo uma leitura muito mecânica do boletim Focus; '(O comitê) não está vendo todo o jogo, está vendo a bola à sua frente a acabou'  Foto: Dida Sampaio/Estadão

Às vésperas da viagem presidencial à China, o economista – que dará um curso, como professor visitante da Universidade Georgetown, nos EUA, sobre os impactos da ascensão chinesa no sistema financeiro global – vê oportunidades para o Brasil diante dos recentes movimentos geopolíticos. A dúvida é se o País saberá aproveitá-las. A seguir, os principais trechos da entrevista:

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Como o BC considerou o risco de crise de crédito na última reunião do Copom, na quarta-feira passada?

Para entender o Copom, é muito bom comparar com o Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA, que também anunciou decisão sobre juros na quarta-feira, 22). Os dois saíram no mesmo dia, os dois estão enfrentando uma inflação que está bem acima do desejado, os dois têm um problema com o mercado de crédito, diferentes, mas que passa por algum tipo de credit crunch (travamento de crédito). O que o Fed fez? O (presidente do Fed, Jerome) Powell foi muito pragmático, saiu um pouco da negação (da crise de crédito). Ele incorporou essa novidade. Mudou a decisão dele. Ele claramente disse que, em função de certo repique econômico no início do ano, estava projetando uma alta de juro maior e, agora, essa questão do crédito é equivalente a um aperto monetário adicional. Portanto, não vai subir os juros tanto. Então, o Fed incorporou a novidade, o chamado “choque exógeno” (que se produz no exterior ou fora de um sistema), na decisão dele. O nosso Copom, pelo comunicado de quarta-feira, reconheceu o fato, mas não o incorporou. Ele meio que empatou o jogo: colocou a questão do crédito como sendo um fator negativo, baixista de inflação, e colocou a desancoragem das expectativas (de inflação) como sendo positivo. Um empata o outro, não mudou nada.

E qual desses fatores que o BC tratou forma ‘empatada’ importa mais?

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O (Boletim) Focus (relatório do BC que coleta projeções de analistas de mercado) não mente, abriu (aumentou) bastante a expectativa de inflação, mas eles (os diretores que formam o Copom) estão tendo uma leitura muito mecânica do Focus. Pega o Focus, coloca no modelo, roda o modelo e pronto. Então, não posso baixar juros este ano inteiro, em função dessa alta de expectativas. Já a questão do crédito é muito mais difícil de colocar no modelo. Em vez de reconhecer que é algo importante, mas difícil de quantificar, ele (o Copom) se gruda naquilo que é mais fácil de quantificar. Se fosse um pouco menos técnico e tivesse mais visão de jogo... Ele está sendo muito estreito na perspectiva. Não está vendo o todo, não está vendo todo o jogo, está vendo a bola à sua frente a acabou. Foi o que o Powell fez: ele disse que tem essa coisa aqui, não sei muito como medir, mas sei que é importante, e ela pode ser bem importante.

Antes mesmo dos problemas com o Silicon Valley Bank, nos EUA, e com o Credit Suisse, na Europa, o Ministério da Fazenda já vinha demonstrando, publicamente, preocupação com o mercado de crédito no Brasil. O governo está mais preocupado do que o BC?

Não diria que estamos tendo uma crise de crédito como está tendo nos Estados Unidos. Lá, é um pouco mais complicado. Entendo que o Powell deveria estar mais preocupado do que o (presidente do BC do Brasil, Roberto) Campos Neto. O BC parece que vai primeiro querer ver o impacto na atividade, para precificar (incluir nos preços, ou seja, nos cálculos) isso na sua decisão, mas ele tinha que ser prospectivo. Se for esperar o impacto na atividade, já contratou a recessão. Aí, vai cortar juros depois? Fica atrasado. O BC deveria ter comprado “opcionalidade” (ter mais de uma opção). O BC sempre está tomando decisões em situações de incerteza. É inerente ao processo, mas quando a incerteza está muito maior do que o normal, você deve ficar com a cabeça mais aberta e sinalizar que, olha, dependendo do que acontecer, estou aberto para ir nessa direção ou naquela. E o BC não fez isso (na quarta-feira, 22). Fecharam a porta a qualquer movimento possível de corte de juros mais célere. Inclusive na reunião de maio. Obviamente, a realidade pode se impor. Se, realmente, a economia caminhar para uma recessão, seja aqui seja lá fora, se o Fed cortar juros também, eles vão acabar seguindo. Visão de jogo é ficar aberto.

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Se o governo tem uma visão diferente do BC, pode querer tomar medidas para compensar a inação do BC, caso o problema de crédito piore?

Isso é outro problema. Tivemos um grande período ruim de políticas “parafiscais” (medidas que envolvem gastos públicos que não passam pelo Orçamento, como o crédito do BNDES ou saques do FGTS) com a (ex-presidente) Dilma (Rousseff). No primeiro mandato (de Dilma), especialmente, já que o (ex-ministro da Fazenda Joaquim) Levy começou a desmontar isso quando ele chegou (no segundo governo Dilma, em 2015). Independentemente de ter independência formal e de ter certa cobertura, já que é muito improvável que esse Senado aceite qualquer movimento por parte do governo para destituir o Roberto Campos Neto, o BC deveria, ainda assim, para resguardar a credibilidade da instituição e o apoio político à autonomia, tentar entrar num jogo cooperativo com o governo. Especialmente com a parte do governo que está querendo. Na minha leitura, o (ministro da Fazenda, Fernando) Haddad está querendo ter um jogo cooperativo com BC. Está tentando, está recebendo muita crítica no governo, mas acho que ele está tentando. E o BC, me parece que não. Talvez eu esteja errado nisso, talvez o Roberto Campos fique no WhatsApp tentando explicar o que ele está fazendo para o Haddad o tempo inteiro. Mas a impressão que me dá, de fora, e eu posso estar errado, é que não tem muita comunicação. É uma comunicação de bastidor.

Há espaço para cortar os juros?

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Claramente, é totalmente razoável, reconhecendo níveis de incerteza e a totalidade da situação, dizer, como Powell fez, que sentiu o baque, vou mudar o que vou fazer, mas tem que ver. Nós já fizemos a nossa alta, já temos uma política (monetária) extremamente contracionista. Então, o BC poderia dizer que tem um choque negativo, que é a questão do crédito, que tem uma incerteza fiscal, que tem que ser sanada, que sabe que o Focus é poluído por isso e pela discussão sobre qual será a meta (de inflação). O BC tem que ter visão mais holística: entende que tem a poluição, entende que tem esse choque, então, pode dizer que, talvez, lá para maio ou junho, não tenha que ter uma política tão contracionista. Pode ter uma política menos contracionista, mas ainda contracionista, porque tem um problema inflacionário, a inflação corrente está muito alta, não tem discussão sobre isso, mas não preciso ter esse nível de contração, porque, como disse o Powell ontem, esse choque de crédito é equivalente a um aumento de juros.

Por que o choque de crédito é equivalente a um aumento de juros?

As duas coisas têm o mesmo efeito sobre a demanda. Então, se acontece uma coisa inesperada, uma surpresa, no jargão, um choque exógeno, que diminui o nível da demanda agregada, que é o que está acontecendo tanto aqui quanto lá fora, isso substitui os juros. O BC estava achando o nível de juros adequado, antes do choque. Vamos ler a última ata e comunicado da última reunião: (o BC disse) estou com juros adequados, mas tem uma possibilidade de ter que subir os juros ainda mais. Aí tem esse choque. Em vez de ele dizer que o choque, pelo menos, faria admitir que é muito improvável que tenha que aumentar os juros ainda mais, que aquela famosa frase no final do comunicado, que ele manteve. Muita gente estava achando que o BC ia tirar essa frase, que seria um reconhecimento de que tem esse fator negativo sobre a demanda.

Por que o choque de crédito contém a demanda?

É a mesma lógica do aumento dos juros, o dinheiro fica mais caro, você vai lá pedir um empréstimo, e o banco nega.

Os juros altos pioram o choque de crédito?

Primeiro, uma crise endógena de crédito, como está ocorrendo, será tanto pior quanto mais apertada é política monetária. Se estamos com uma crise de crédito, e o BC não faz nada, mantém os juros lá na altura ou até sobe os juros, obviamente, a crise vai ser pior. Muitos economistas acreditam, eu acho que isso é uma falácia, que existe uma independência de instrumento. Para crise de crédito, faz gestão de liquidez e medidas macroprudenciais (que envolvem regras de prudência bancária). E a política de juros cuida da inflação. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, e toca-se isso separadamente. Isso, na prática, nunca funciona assim. Quando essas crises acontecem, podemos discutir vários casos históricos, não dá para separar. Você separa essas coisas em tempos normais, mas quando a crise bate, elas se juntam.

A preocupação com o mercado de crédito no Brasil deveria aumentar, diante dos problemas nos EUA e na Europa?

Tem dois canais. O primeiro canal é história, que a gente já viu 500 vezes também: quando o americano pega resfriado, a galera aqui pega pneumonia. Segundo, se você tá sentado num banco hoje no Brasil, com todos os nossos problemas, e está vendo aquela crise lá fora, você vai querer tomar mais risco na sua carteira de crédito ou menos risco? Não tem nada a ver diretamente, mas você está olhando as telas, vê os bancos despencando e possível recessão nos Estados Unidos, vai aumentar a concessão de crédito? Lógico que não. Talvez seja algo neutro em alguns casos, mas, se tiver algum impacto, vai ser negativo. E, se a coisa piorar lá, esse impacto vai ser maior, mesmo reconhecendo que nosso sistema bancário é muito mais sólido e bem regulado do que o americano.

O choque de crédito doméstico no Brasil é grave o suficiente para virar um problema?

Lógico. O ponto de partida desse choque não é bom. Quando essas coisas acontecem, essas surpresas, a primeira pergunta é a seguinte: qual o espaço de resposta, em termos de política econômica? O espaço de resposta da política monetária é muito restringido porque a inflação está alta. A primeira coisa negativa está aí. Não é que a inflação está baixa e tenho espaço para cortar os juros rapidamente. Talvez tenha que cortar juros, mas não é uma decisão fácil, é muito difícil, porque tem o contraponto da inflação. A própria oscilação excessiva da Selic, que, dois anos atrás, estava em 2%, causou um sobre-endividamento do sistema. Baixar a taxa para 2% foi um erro. Teve uma explosão de fundos de crédito e de emissões (de títulos de dívida). Houve um sobre-endividamento em função da taxa muito baixa, aí a taxa explode para 13%. É um problema. Essa crise de crédito está encomendada pelo ciclo monetário, o BC deveria reconhecer isso, que tem um pouco de culpa no cartório. Com o externo, complica a coisa ainda mais. É uma fase de negação. É muito complicado que essa negação talvez esteja sendo alimentada pela questão política e as críticas que eles (os diretores do Copom) vêm sofrendo.

Seu curso como visitante na Universidade Georgetown, nos EUA, é sobre os impactos da ascensão da China nas finanças globais. Essa ascensão afeta de alguma forma a crise de crédito atual?

Esse curso está resumido no livro que publiquei em 2019. A tese é que a China teve um papel muito importante naquilo que levou a grande crise de 2008. A China transferiu poupança da sua economia para o mundo desenvolvido, especialmente para os Estados Unidos, mas também para a Europa. Essa transferência foi utilizada para alimentar uma grande bolha imobiliária de crédito, que criou uma fragilidade financeira. Quando o chinês transferiu poupança para os EUA, ele comprou treasuries (como são conhecidos os títulos da dívida pública americana). Se essas treasuries tivessem sido utilizadas para financiar um déficit fiscal maior, não teria tido fragilidade financeira, porque quem estaria usando o dinheiro, no caso o governo americano, teria o passivo. Só que quem tinha demanda por poupança não era o governo americano, era o consumidor americano, que queria consumir mais e comprar casas. Então, foi preciso transformar essa poupança, que foi primeiro investida em treasuries, que estavam no balanço do banco central da China, cujas reservas chegaram a US$ 5 trilhões, em seu auge, em crédito imobiliário. Então, tinha que colocar nesse circuito um agente que fizesse a transformação do ativo treasury para o ativo crédito imobiliário. Esse agente foi o shadow banking. É a transformação de algo que não tinha risco de crédito para algo que tinha risco de crédito. Esse shadow banking ficou com o risco de crédito em seus balanços. A China deu a poupança, mas não ficou com o risco de crédito. O risco de crédito ficou com os bancos de investimento, os fundos de hedge, surgiu toda aquela sopa de novos instrumentos (financeiros). Toda essa coisa complexa era para fazer só uma coisa: pegar a poupança chinesa e transferir para o consumidor americano e ficar com o risco de crédito do consumidor americano. Foram esses agentes do meio que começaram a operar com muita alavancagem e gerou a fragilidade que levou à crise. O que levou à crise? Os preços dos imóveis começaram a cair. Não por acaso, essa queda foi causada por um aperto de política monetária. Há paralelos com hoje? Certamente há, mas não é a mesma coisa.

Da crise de 2008 para cá, o que mudou?

A China parou de ser a provedora de poupança para os Estados Unidos. Nesse sentido, ela não é mais um grande jogador. O nível de reservas da China caiu, foi de US$ 5 trilhões para US$ 3 trilhões. Ela mesma entrou em crise em 2015, o que de fato foi um grande problema para o Brasil. Agora, a influência dela não é a mesma daquela época.

Os eventos geopolíticos recentes, como a guerra na Ucrânia e a aproximação da China com a Rússia, podem afetar o sistema financeiro global?

O grande drama daqueles dez anos foi o mau ajustamento da economia global à entrada da China. O mundo não soube se ajustar à entrada da China. Do lado do Brasil, tivemos aquele bom período e apostamos que aquilo nunca ia acabar. Tomamos várias decisões, de expansões de políticas fiscais, como se aquilo fosse para sempre, e acabou não sendo. Era consenso na época que a economia brasileira ia crescer 4% ao ano. Até o FMI (Fundo Monetário Internacional) falava isso. Aí descobrimos que, com a crise financeira e seus impactos na China, de repente, o Brasil é uma economia que cresce 2% ao ano. Esse de 4% para 2% impacta muita coisa, demora muito tempo para fazer o ajuste. Se, naquele período, houve um mau ajuste à entrada da China, agora estamos vivendo o período da saída da China, de certa maneira, em função da geopolítica. Essa desglobalização. Isso cria certas oportunidades, não é necessariamente totalmente negativo, porque a entrada da China teve um lado negativo, dizimou a indústria em muitos países, porque os caras simplesmente eram muito mais competitivos. Então, essa questão, por exemplo, de ter uma janela de reindustrialização é verdade. Agora, como o Brasil, com todas as suas limitações, vai se aproveitar disso? O grande drama, que tem um lado militar também, é uma certa separação, zonas de influência diferentes, estamos vendo isso no setor de tecnologia. Vamos ver se o Brasil consegue ter mais sucesso, cometemos muitos erros na entrada, vamos ver se conseguimos errar menos na saída (da China nas finanças globais).

A viagem oficial do presidente Lula à China, com foco comercial, é importante então?

O Brasil não tem, necessariamente, que entrar na canoa americana. Se olharmos o pós-guerra, os países que tiveram sucesso, como Coreia do Sul e Japão, eram países que diziam o seguinte: Estados Unidos, vocês querem que eu fique na sua órbita? Vocês têm que me ajudar economicamente, permitir que eu siga uma política de exportações e manter seu mercado aberto. A história de países que conseguiram se industrializar foi essa. Nós não fizemos isso nos anos 1950 e 1960, não só o Brasil, a América Latina inteira. Fizemos o contrário. Ficamos na órbita americana, mas não cobramos nada em troca. Fizemos a idiotice da substituição das importações, não aproveitamos para nos integrar na economia global e nossa grande tragédia foi essa. Agora, a mesma coisa: como o Brasil pode se colocar para tentar se aproveitar dessa divisão? Acho que é jogar dos dois lados, jogar do lado chinês, jogar do lado americano, pega uma coisa aqui, pega uma coisa lá, para tirar o melhor negócio possível dos dois. Não é escolher um lado. Temos que ter a capacidade de fazer isso, se vamos ter ou não, não sei. Brasília não inspira muita confiança.

RIO - A possibilidade de uma crise de crédito é “grave o suficiente” para esfriar ainda mais a economia brasileira, mas o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) perdeu a oportunidade de incorporar esse cenário nos cálculos que definem o nível da taxa básica de juros (Selic), avalia o economista Tony Volpon, que ocupou uma cadeira no órgão, como diretor de Assuntos Internacionais, de 2015 a 2016.

Na última quarta-feira, 22, o Copom anunciou a decisão de manter a Selic em 13,75% ao ano, nível no qual a taxa está estacionada desde agosto do ano passado. O objetivo é arrefecer a demanda, para segurar a inflação elevada e minar as perspectivas de que os preços seguirão pressionados no médio prazo, em parte por causa das incertezas em relação ao reequilíbrio das contas do governo, que deverão fechar no vermelho este ano.

No comunicado sobre a decisão, o Copom citou os problemas de crédito em dois trechos. Para sustentar que o “ambiente externo se deteriorou”, os diretores do BC disseram que “os episódios envolvendo bancos nos EUA e na Europa elevaram a incerteza e a volatilidade dos mercados e requerem monitoramento”, numa referência à quebra do Silicon Valley Bank e aos problemas do Credit Suisse.

E, ao listar os “riscos de baixa” para a inflação no médio prazo, incluíram a possibilidade de haver “uma desaceleração na concessão doméstica de crédito” maior do que a esperada, por causa da combinação de endividamento e inadimplência elevados com alguma retração dos bancos após a revelação do escândalo contábil da Lojas Americanas.

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Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central, vê “negação” em comunicado da reunião do Copom que manteve a taxa básica de juro em 13,75%

Para Volpon, é pouco. Em artigos e manifestações recentes, o ex-diretor do BC, que já ocupou posições em instituições financeiras como Nomura, UBS e WHG, tem demonstrado mais preocupação do que a média dos analistas, identificando um padrão nas crises ao longo da história, em que eventos financeiros servem de gatilho para recessões. Esse padrão pode ser dividido em fases. Num primeiro momento, BCs e autoridades econômicas tendem a negar a crise. Segundo Volpon, o comunicado da última quarta-feira, 22, deixa o BC ainda na fase de “negação”.

Segundo Volpon, diretores do Copom estão tendo uma leitura muito mecânica do boletim Focus; '(O comitê) não está vendo todo o jogo, está vendo a bola à sua frente a acabou'  Foto: Dida Sampaio/Estadão

Às vésperas da viagem presidencial à China, o economista – que dará um curso, como professor visitante da Universidade Georgetown, nos EUA, sobre os impactos da ascensão chinesa no sistema financeiro global – vê oportunidades para o Brasil diante dos recentes movimentos geopolíticos. A dúvida é se o País saberá aproveitá-las. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Como o BC considerou o risco de crise de crédito na última reunião do Copom, na quarta-feira passada?

Para entender o Copom, é muito bom comparar com o Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA, que também anunciou decisão sobre juros na quarta-feira, 22). Os dois saíram no mesmo dia, os dois estão enfrentando uma inflação que está bem acima do desejado, os dois têm um problema com o mercado de crédito, diferentes, mas que passa por algum tipo de credit crunch (travamento de crédito). O que o Fed fez? O (presidente do Fed, Jerome) Powell foi muito pragmático, saiu um pouco da negação (da crise de crédito). Ele incorporou essa novidade. Mudou a decisão dele. Ele claramente disse que, em função de certo repique econômico no início do ano, estava projetando uma alta de juro maior e, agora, essa questão do crédito é equivalente a um aperto monetário adicional. Portanto, não vai subir os juros tanto. Então, o Fed incorporou a novidade, o chamado “choque exógeno” (que se produz no exterior ou fora de um sistema), na decisão dele. O nosso Copom, pelo comunicado de quarta-feira, reconheceu o fato, mas não o incorporou. Ele meio que empatou o jogo: colocou a questão do crédito como sendo um fator negativo, baixista de inflação, e colocou a desancoragem das expectativas (de inflação) como sendo positivo. Um empata o outro, não mudou nada.

E qual desses fatores que o BC tratou forma ‘empatada’ importa mais?

O (Boletim) Focus (relatório do BC que coleta projeções de analistas de mercado) não mente, abriu (aumentou) bastante a expectativa de inflação, mas eles (os diretores que formam o Copom) estão tendo uma leitura muito mecânica do Focus. Pega o Focus, coloca no modelo, roda o modelo e pronto. Então, não posso baixar juros este ano inteiro, em função dessa alta de expectativas. Já a questão do crédito é muito mais difícil de colocar no modelo. Em vez de reconhecer que é algo importante, mas difícil de quantificar, ele (o Copom) se gruda naquilo que é mais fácil de quantificar. Se fosse um pouco menos técnico e tivesse mais visão de jogo... Ele está sendo muito estreito na perspectiva. Não está vendo o todo, não está vendo todo o jogo, está vendo a bola à sua frente a acabou. Foi o que o Powell fez: ele disse que tem essa coisa aqui, não sei muito como medir, mas sei que é importante, e ela pode ser bem importante.

Antes mesmo dos problemas com o Silicon Valley Bank, nos EUA, e com o Credit Suisse, na Europa, o Ministério da Fazenda já vinha demonstrando, publicamente, preocupação com o mercado de crédito no Brasil. O governo está mais preocupado do que o BC?

Não diria que estamos tendo uma crise de crédito como está tendo nos Estados Unidos. Lá, é um pouco mais complicado. Entendo que o Powell deveria estar mais preocupado do que o (presidente do BC do Brasil, Roberto) Campos Neto. O BC parece que vai primeiro querer ver o impacto na atividade, para precificar (incluir nos preços, ou seja, nos cálculos) isso na sua decisão, mas ele tinha que ser prospectivo. Se for esperar o impacto na atividade, já contratou a recessão. Aí, vai cortar juros depois? Fica atrasado. O BC deveria ter comprado “opcionalidade” (ter mais de uma opção). O BC sempre está tomando decisões em situações de incerteza. É inerente ao processo, mas quando a incerteza está muito maior do que o normal, você deve ficar com a cabeça mais aberta e sinalizar que, olha, dependendo do que acontecer, estou aberto para ir nessa direção ou naquela. E o BC não fez isso (na quarta-feira, 22). Fecharam a porta a qualquer movimento possível de corte de juros mais célere. Inclusive na reunião de maio. Obviamente, a realidade pode se impor. Se, realmente, a economia caminhar para uma recessão, seja aqui seja lá fora, se o Fed cortar juros também, eles vão acabar seguindo. Visão de jogo é ficar aberto.

Se o governo tem uma visão diferente do BC, pode querer tomar medidas para compensar a inação do BC, caso o problema de crédito piore?

Isso é outro problema. Tivemos um grande período ruim de políticas “parafiscais” (medidas que envolvem gastos públicos que não passam pelo Orçamento, como o crédito do BNDES ou saques do FGTS) com a (ex-presidente) Dilma (Rousseff). No primeiro mandato (de Dilma), especialmente, já que o (ex-ministro da Fazenda Joaquim) Levy começou a desmontar isso quando ele chegou (no segundo governo Dilma, em 2015). Independentemente de ter independência formal e de ter certa cobertura, já que é muito improvável que esse Senado aceite qualquer movimento por parte do governo para destituir o Roberto Campos Neto, o BC deveria, ainda assim, para resguardar a credibilidade da instituição e o apoio político à autonomia, tentar entrar num jogo cooperativo com o governo. Especialmente com a parte do governo que está querendo. Na minha leitura, o (ministro da Fazenda, Fernando) Haddad está querendo ter um jogo cooperativo com BC. Está tentando, está recebendo muita crítica no governo, mas acho que ele está tentando. E o BC, me parece que não. Talvez eu esteja errado nisso, talvez o Roberto Campos fique no WhatsApp tentando explicar o que ele está fazendo para o Haddad o tempo inteiro. Mas a impressão que me dá, de fora, e eu posso estar errado, é que não tem muita comunicação. É uma comunicação de bastidor.

Há espaço para cortar os juros?

Claramente, é totalmente razoável, reconhecendo níveis de incerteza e a totalidade da situação, dizer, como Powell fez, que sentiu o baque, vou mudar o que vou fazer, mas tem que ver. Nós já fizemos a nossa alta, já temos uma política (monetária) extremamente contracionista. Então, o BC poderia dizer que tem um choque negativo, que é a questão do crédito, que tem uma incerteza fiscal, que tem que ser sanada, que sabe que o Focus é poluído por isso e pela discussão sobre qual será a meta (de inflação). O BC tem que ter visão mais holística: entende que tem a poluição, entende que tem esse choque, então, pode dizer que, talvez, lá para maio ou junho, não tenha que ter uma política tão contracionista. Pode ter uma política menos contracionista, mas ainda contracionista, porque tem um problema inflacionário, a inflação corrente está muito alta, não tem discussão sobre isso, mas não preciso ter esse nível de contração, porque, como disse o Powell ontem, esse choque de crédito é equivalente a um aumento de juros.

Por que o choque de crédito é equivalente a um aumento de juros?

As duas coisas têm o mesmo efeito sobre a demanda. Então, se acontece uma coisa inesperada, uma surpresa, no jargão, um choque exógeno, que diminui o nível da demanda agregada, que é o que está acontecendo tanto aqui quanto lá fora, isso substitui os juros. O BC estava achando o nível de juros adequado, antes do choque. Vamos ler a última ata e comunicado da última reunião: (o BC disse) estou com juros adequados, mas tem uma possibilidade de ter que subir os juros ainda mais. Aí tem esse choque. Em vez de ele dizer que o choque, pelo menos, faria admitir que é muito improvável que tenha que aumentar os juros ainda mais, que aquela famosa frase no final do comunicado, que ele manteve. Muita gente estava achando que o BC ia tirar essa frase, que seria um reconhecimento de que tem esse fator negativo sobre a demanda.

Por que o choque de crédito contém a demanda?

É a mesma lógica do aumento dos juros, o dinheiro fica mais caro, você vai lá pedir um empréstimo, e o banco nega.

Os juros altos pioram o choque de crédito?

Primeiro, uma crise endógena de crédito, como está ocorrendo, será tanto pior quanto mais apertada é política monetária. Se estamos com uma crise de crédito, e o BC não faz nada, mantém os juros lá na altura ou até sobe os juros, obviamente, a crise vai ser pior. Muitos economistas acreditam, eu acho que isso é uma falácia, que existe uma independência de instrumento. Para crise de crédito, faz gestão de liquidez e medidas macroprudenciais (que envolvem regras de prudência bancária). E a política de juros cuida da inflação. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, e toca-se isso separadamente. Isso, na prática, nunca funciona assim. Quando essas crises acontecem, podemos discutir vários casos históricos, não dá para separar. Você separa essas coisas em tempos normais, mas quando a crise bate, elas se juntam.

A preocupação com o mercado de crédito no Brasil deveria aumentar, diante dos problemas nos EUA e na Europa?

Tem dois canais. O primeiro canal é história, que a gente já viu 500 vezes também: quando o americano pega resfriado, a galera aqui pega pneumonia. Segundo, se você tá sentado num banco hoje no Brasil, com todos os nossos problemas, e está vendo aquela crise lá fora, você vai querer tomar mais risco na sua carteira de crédito ou menos risco? Não tem nada a ver diretamente, mas você está olhando as telas, vê os bancos despencando e possível recessão nos Estados Unidos, vai aumentar a concessão de crédito? Lógico que não. Talvez seja algo neutro em alguns casos, mas, se tiver algum impacto, vai ser negativo. E, se a coisa piorar lá, esse impacto vai ser maior, mesmo reconhecendo que nosso sistema bancário é muito mais sólido e bem regulado do que o americano.

O choque de crédito doméstico no Brasil é grave o suficiente para virar um problema?

Lógico. O ponto de partida desse choque não é bom. Quando essas coisas acontecem, essas surpresas, a primeira pergunta é a seguinte: qual o espaço de resposta, em termos de política econômica? O espaço de resposta da política monetária é muito restringido porque a inflação está alta. A primeira coisa negativa está aí. Não é que a inflação está baixa e tenho espaço para cortar os juros rapidamente. Talvez tenha que cortar juros, mas não é uma decisão fácil, é muito difícil, porque tem o contraponto da inflação. A própria oscilação excessiva da Selic, que, dois anos atrás, estava em 2%, causou um sobre-endividamento do sistema. Baixar a taxa para 2% foi um erro. Teve uma explosão de fundos de crédito e de emissões (de títulos de dívida). Houve um sobre-endividamento em função da taxa muito baixa, aí a taxa explode para 13%. É um problema. Essa crise de crédito está encomendada pelo ciclo monetário, o BC deveria reconhecer isso, que tem um pouco de culpa no cartório. Com o externo, complica a coisa ainda mais. É uma fase de negação. É muito complicado que essa negação talvez esteja sendo alimentada pela questão política e as críticas que eles (os diretores do Copom) vêm sofrendo.

Seu curso como visitante na Universidade Georgetown, nos EUA, é sobre os impactos da ascensão da China nas finanças globais. Essa ascensão afeta de alguma forma a crise de crédito atual?

Esse curso está resumido no livro que publiquei em 2019. A tese é que a China teve um papel muito importante naquilo que levou a grande crise de 2008. A China transferiu poupança da sua economia para o mundo desenvolvido, especialmente para os Estados Unidos, mas também para a Europa. Essa transferência foi utilizada para alimentar uma grande bolha imobiliária de crédito, que criou uma fragilidade financeira. Quando o chinês transferiu poupança para os EUA, ele comprou treasuries (como são conhecidos os títulos da dívida pública americana). Se essas treasuries tivessem sido utilizadas para financiar um déficit fiscal maior, não teria tido fragilidade financeira, porque quem estaria usando o dinheiro, no caso o governo americano, teria o passivo. Só que quem tinha demanda por poupança não era o governo americano, era o consumidor americano, que queria consumir mais e comprar casas. Então, foi preciso transformar essa poupança, que foi primeiro investida em treasuries, que estavam no balanço do banco central da China, cujas reservas chegaram a US$ 5 trilhões, em seu auge, em crédito imobiliário. Então, tinha que colocar nesse circuito um agente que fizesse a transformação do ativo treasury para o ativo crédito imobiliário. Esse agente foi o shadow banking. É a transformação de algo que não tinha risco de crédito para algo que tinha risco de crédito. Esse shadow banking ficou com o risco de crédito em seus balanços. A China deu a poupança, mas não ficou com o risco de crédito. O risco de crédito ficou com os bancos de investimento, os fundos de hedge, surgiu toda aquela sopa de novos instrumentos (financeiros). Toda essa coisa complexa era para fazer só uma coisa: pegar a poupança chinesa e transferir para o consumidor americano e ficar com o risco de crédito do consumidor americano. Foram esses agentes do meio que começaram a operar com muita alavancagem e gerou a fragilidade que levou à crise. O que levou à crise? Os preços dos imóveis começaram a cair. Não por acaso, essa queda foi causada por um aperto de política monetária. Há paralelos com hoje? Certamente há, mas não é a mesma coisa.

Da crise de 2008 para cá, o que mudou?

A China parou de ser a provedora de poupança para os Estados Unidos. Nesse sentido, ela não é mais um grande jogador. O nível de reservas da China caiu, foi de US$ 5 trilhões para US$ 3 trilhões. Ela mesma entrou em crise em 2015, o que de fato foi um grande problema para o Brasil. Agora, a influência dela não é a mesma daquela época.

Os eventos geopolíticos recentes, como a guerra na Ucrânia e a aproximação da China com a Rússia, podem afetar o sistema financeiro global?

O grande drama daqueles dez anos foi o mau ajustamento da economia global à entrada da China. O mundo não soube se ajustar à entrada da China. Do lado do Brasil, tivemos aquele bom período e apostamos que aquilo nunca ia acabar. Tomamos várias decisões, de expansões de políticas fiscais, como se aquilo fosse para sempre, e acabou não sendo. Era consenso na época que a economia brasileira ia crescer 4% ao ano. Até o FMI (Fundo Monetário Internacional) falava isso. Aí descobrimos que, com a crise financeira e seus impactos na China, de repente, o Brasil é uma economia que cresce 2% ao ano. Esse de 4% para 2% impacta muita coisa, demora muito tempo para fazer o ajuste. Se, naquele período, houve um mau ajuste à entrada da China, agora estamos vivendo o período da saída da China, de certa maneira, em função da geopolítica. Essa desglobalização. Isso cria certas oportunidades, não é necessariamente totalmente negativo, porque a entrada da China teve um lado negativo, dizimou a indústria em muitos países, porque os caras simplesmente eram muito mais competitivos. Então, essa questão, por exemplo, de ter uma janela de reindustrialização é verdade. Agora, como o Brasil, com todas as suas limitações, vai se aproveitar disso? O grande drama, que tem um lado militar também, é uma certa separação, zonas de influência diferentes, estamos vendo isso no setor de tecnologia. Vamos ver se o Brasil consegue ter mais sucesso, cometemos muitos erros na entrada, vamos ver se conseguimos errar menos na saída (da China nas finanças globais).

A viagem oficial do presidente Lula à China, com foco comercial, é importante então?

O Brasil não tem, necessariamente, que entrar na canoa americana. Se olharmos o pós-guerra, os países que tiveram sucesso, como Coreia do Sul e Japão, eram países que diziam o seguinte: Estados Unidos, vocês querem que eu fique na sua órbita? Vocês têm que me ajudar economicamente, permitir que eu siga uma política de exportações e manter seu mercado aberto. A história de países que conseguiram se industrializar foi essa. Nós não fizemos isso nos anos 1950 e 1960, não só o Brasil, a América Latina inteira. Fizemos o contrário. Ficamos na órbita americana, mas não cobramos nada em troca. Fizemos a idiotice da substituição das importações, não aproveitamos para nos integrar na economia global e nossa grande tragédia foi essa. Agora, a mesma coisa: como o Brasil pode se colocar para tentar se aproveitar dessa divisão? Acho que é jogar dos dois lados, jogar do lado chinês, jogar do lado americano, pega uma coisa aqui, pega uma coisa lá, para tirar o melhor negócio possível dos dois. Não é escolher um lado. Temos que ter a capacidade de fazer isso, se vamos ter ou não, não sei. Brasília não inspira muita confiança.

RIO - A possibilidade de uma crise de crédito é “grave o suficiente” para esfriar ainda mais a economia brasileira, mas o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) perdeu a oportunidade de incorporar esse cenário nos cálculos que definem o nível da taxa básica de juros (Selic), avalia o economista Tony Volpon, que ocupou uma cadeira no órgão, como diretor de Assuntos Internacionais, de 2015 a 2016.

Na última quarta-feira, 22, o Copom anunciou a decisão de manter a Selic em 13,75% ao ano, nível no qual a taxa está estacionada desde agosto do ano passado. O objetivo é arrefecer a demanda, para segurar a inflação elevada e minar as perspectivas de que os preços seguirão pressionados no médio prazo, em parte por causa das incertezas em relação ao reequilíbrio das contas do governo, que deverão fechar no vermelho este ano.

No comunicado sobre a decisão, o Copom citou os problemas de crédito em dois trechos. Para sustentar que o “ambiente externo se deteriorou”, os diretores do BC disseram que “os episódios envolvendo bancos nos EUA e na Europa elevaram a incerteza e a volatilidade dos mercados e requerem monitoramento”, numa referência à quebra do Silicon Valley Bank e aos problemas do Credit Suisse.

E, ao listar os “riscos de baixa” para a inflação no médio prazo, incluíram a possibilidade de haver “uma desaceleração na concessão doméstica de crédito” maior do que a esperada, por causa da combinação de endividamento e inadimplência elevados com alguma retração dos bancos após a revelação do escândalo contábil da Lojas Americanas.

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Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central, vê “negação” em comunicado da reunião do Copom que manteve a taxa básica de juro em 13,75%

Para Volpon, é pouco. Em artigos e manifestações recentes, o ex-diretor do BC, que já ocupou posições em instituições financeiras como Nomura, UBS e WHG, tem demonstrado mais preocupação do que a média dos analistas, identificando um padrão nas crises ao longo da história, em que eventos financeiros servem de gatilho para recessões. Esse padrão pode ser dividido em fases. Num primeiro momento, BCs e autoridades econômicas tendem a negar a crise. Segundo Volpon, o comunicado da última quarta-feira, 22, deixa o BC ainda na fase de “negação”.

Segundo Volpon, diretores do Copom estão tendo uma leitura muito mecânica do boletim Focus; '(O comitê) não está vendo todo o jogo, está vendo a bola à sua frente a acabou'  Foto: Dida Sampaio/Estadão

Às vésperas da viagem presidencial à China, o economista – que dará um curso, como professor visitante da Universidade Georgetown, nos EUA, sobre os impactos da ascensão chinesa no sistema financeiro global – vê oportunidades para o Brasil diante dos recentes movimentos geopolíticos. A dúvida é se o País saberá aproveitá-las. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Como o BC considerou o risco de crise de crédito na última reunião do Copom, na quarta-feira passada?

Para entender o Copom, é muito bom comparar com o Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA, que também anunciou decisão sobre juros na quarta-feira, 22). Os dois saíram no mesmo dia, os dois estão enfrentando uma inflação que está bem acima do desejado, os dois têm um problema com o mercado de crédito, diferentes, mas que passa por algum tipo de credit crunch (travamento de crédito). O que o Fed fez? O (presidente do Fed, Jerome) Powell foi muito pragmático, saiu um pouco da negação (da crise de crédito). Ele incorporou essa novidade. Mudou a decisão dele. Ele claramente disse que, em função de certo repique econômico no início do ano, estava projetando uma alta de juro maior e, agora, essa questão do crédito é equivalente a um aperto monetário adicional. Portanto, não vai subir os juros tanto. Então, o Fed incorporou a novidade, o chamado “choque exógeno” (que se produz no exterior ou fora de um sistema), na decisão dele. O nosso Copom, pelo comunicado de quarta-feira, reconheceu o fato, mas não o incorporou. Ele meio que empatou o jogo: colocou a questão do crédito como sendo um fator negativo, baixista de inflação, e colocou a desancoragem das expectativas (de inflação) como sendo positivo. Um empata o outro, não mudou nada.

E qual desses fatores que o BC tratou forma ‘empatada’ importa mais?

O (Boletim) Focus (relatório do BC que coleta projeções de analistas de mercado) não mente, abriu (aumentou) bastante a expectativa de inflação, mas eles (os diretores que formam o Copom) estão tendo uma leitura muito mecânica do Focus. Pega o Focus, coloca no modelo, roda o modelo e pronto. Então, não posso baixar juros este ano inteiro, em função dessa alta de expectativas. Já a questão do crédito é muito mais difícil de colocar no modelo. Em vez de reconhecer que é algo importante, mas difícil de quantificar, ele (o Copom) se gruda naquilo que é mais fácil de quantificar. Se fosse um pouco menos técnico e tivesse mais visão de jogo... Ele está sendo muito estreito na perspectiva. Não está vendo o todo, não está vendo todo o jogo, está vendo a bola à sua frente a acabou. Foi o que o Powell fez: ele disse que tem essa coisa aqui, não sei muito como medir, mas sei que é importante, e ela pode ser bem importante.

Antes mesmo dos problemas com o Silicon Valley Bank, nos EUA, e com o Credit Suisse, na Europa, o Ministério da Fazenda já vinha demonstrando, publicamente, preocupação com o mercado de crédito no Brasil. O governo está mais preocupado do que o BC?

Não diria que estamos tendo uma crise de crédito como está tendo nos Estados Unidos. Lá, é um pouco mais complicado. Entendo que o Powell deveria estar mais preocupado do que o (presidente do BC do Brasil, Roberto) Campos Neto. O BC parece que vai primeiro querer ver o impacto na atividade, para precificar (incluir nos preços, ou seja, nos cálculos) isso na sua decisão, mas ele tinha que ser prospectivo. Se for esperar o impacto na atividade, já contratou a recessão. Aí, vai cortar juros depois? Fica atrasado. O BC deveria ter comprado “opcionalidade” (ter mais de uma opção). O BC sempre está tomando decisões em situações de incerteza. É inerente ao processo, mas quando a incerteza está muito maior do que o normal, você deve ficar com a cabeça mais aberta e sinalizar que, olha, dependendo do que acontecer, estou aberto para ir nessa direção ou naquela. E o BC não fez isso (na quarta-feira, 22). Fecharam a porta a qualquer movimento possível de corte de juros mais célere. Inclusive na reunião de maio. Obviamente, a realidade pode se impor. Se, realmente, a economia caminhar para uma recessão, seja aqui seja lá fora, se o Fed cortar juros também, eles vão acabar seguindo. Visão de jogo é ficar aberto.

Se o governo tem uma visão diferente do BC, pode querer tomar medidas para compensar a inação do BC, caso o problema de crédito piore?

Isso é outro problema. Tivemos um grande período ruim de políticas “parafiscais” (medidas que envolvem gastos públicos que não passam pelo Orçamento, como o crédito do BNDES ou saques do FGTS) com a (ex-presidente) Dilma (Rousseff). No primeiro mandato (de Dilma), especialmente, já que o (ex-ministro da Fazenda Joaquim) Levy começou a desmontar isso quando ele chegou (no segundo governo Dilma, em 2015). Independentemente de ter independência formal e de ter certa cobertura, já que é muito improvável que esse Senado aceite qualquer movimento por parte do governo para destituir o Roberto Campos Neto, o BC deveria, ainda assim, para resguardar a credibilidade da instituição e o apoio político à autonomia, tentar entrar num jogo cooperativo com o governo. Especialmente com a parte do governo que está querendo. Na minha leitura, o (ministro da Fazenda, Fernando) Haddad está querendo ter um jogo cooperativo com BC. Está tentando, está recebendo muita crítica no governo, mas acho que ele está tentando. E o BC, me parece que não. Talvez eu esteja errado nisso, talvez o Roberto Campos fique no WhatsApp tentando explicar o que ele está fazendo para o Haddad o tempo inteiro. Mas a impressão que me dá, de fora, e eu posso estar errado, é que não tem muita comunicação. É uma comunicação de bastidor.

Há espaço para cortar os juros?

Claramente, é totalmente razoável, reconhecendo níveis de incerteza e a totalidade da situação, dizer, como Powell fez, que sentiu o baque, vou mudar o que vou fazer, mas tem que ver. Nós já fizemos a nossa alta, já temos uma política (monetária) extremamente contracionista. Então, o BC poderia dizer que tem um choque negativo, que é a questão do crédito, que tem uma incerteza fiscal, que tem que ser sanada, que sabe que o Focus é poluído por isso e pela discussão sobre qual será a meta (de inflação). O BC tem que ter visão mais holística: entende que tem a poluição, entende que tem esse choque, então, pode dizer que, talvez, lá para maio ou junho, não tenha que ter uma política tão contracionista. Pode ter uma política menos contracionista, mas ainda contracionista, porque tem um problema inflacionário, a inflação corrente está muito alta, não tem discussão sobre isso, mas não preciso ter esse nível de contração, porque, como disse o Powell ontem, esse choque de crédito é equivalente a um aumento de juros.

Por que o choque de crédito é equivalente a um aumento de juros?

As duas coisas têm o mesmo efeito sobre a demanda. Então, se acontece uma coisa inesperada, uma surpresa, no jargão, um choque exógeno, que diminui o nível da demanda agregada, que é o que está acontecendo tanto aqui quanto lá fora, isso substitui os juros. O BC estava achando o nível de juros adequado, antes do choque. Vamos ler a última ata e comunicado da última reunião: (o BC disse) estou com juros adequados, mas tem uma possibilidade de ter que subir os juros ainda mais. Aí tem esse choque. Em vez de ele dizer que o choque, pelo menos, faria admitir que é muito improvável que tenha que aumentar os juros ainda mais, que aquela famosa frase no final do comunicado, que ele manteve. Muita gente estava achando que o BC ia tirar essa frase, que seria um reconhecimento de que tem esse fator negativo sobre a demanda.

Por que o choque de crédito contém a demanda?

É a mesma lógica do aumento dos juros, o dinheiro fica mais caro, você vai lá pedir um empréstimo, e o banco nega.

Os juros altos pioram o choque de crédito?

Primeiro, uma crise endógena de crédito, como está ocorrendo, será tanto pior quanto mais apertada é política monetária. Se estamos com uma crise de crédito, e o BC não faz nada, mantém os juros lá na altura ou até sobe os juros, obviamente, a crise vai ser pior. Muitos economistas acreditam, eu acho que isso é uma falácia, que existe uma independência de instrumento. Para crise de crédito, faz gestão de liquidez e medidas macroprudenciais (que envolvem regras de prudência bancária). E a política de juros cuida da inflação. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, e toca-se isso separadamente. Isso, na prática, nunca funciona assim. Quando essas crises acontecem, podemos discutir vários casos históricos, não dá para separar. Você separa essas coisas em tempos normais, mas quando a crise bate, elas se juntam.

A preocupação com o mercado de crédito no Brasil deveria aumentar, diante dos problemas nos EUA e na Europa?

Tem dois canais. O primeiro canal é história, que a gente já viu 500 vezes também: quando o americano pega resfriado, a galera aqui pega pneumonia. Segundo, se você tá sentado num banco hoje no Brasil, com todos os nossos problemas, e está vendo aquela crise lá fora, você vai querer tomar mais risco na sua carteira de crédito ou menos risco? Não tem nada a ver diretamente, mas você está olhando as telas, vê os bancos despencando e possível recessão nos Estados Unidos, vai aumentar a concessão de crédito? Lógico que não. Talvez seja algo neutro em alguns casos, mas, se tiver algum impacto, vai ser negativo. E, se a coisa piorar lá, esse impacto vai ser maior, mesmo reconhecendo que nosso sistema bancário é muito mais sólido e bem regulado do que o americano.

O choque de crédito doméstico no Brasil é grave o suficiente para virar um problema?

Lógico. O ponto de partida desse choque não é bom. Quando essas coisas acontecem, essas surpresas, a primeira pergunta é a seguinte: qual o espaço de resposta, em termos de política econômica? O espaço de resposta da política monetária é muito restringido porque a inflação está alta. A primeira coisa negativa está aí. Não é que a inflação está baixa e tenho espaço para cortar os juros rapidamente. Talvez tenha que cortar juros, mas não é uma decisão fácil, é muito difícil, porque tem o contraponto da inflação. A própria oscilação excessiva da Selic, que, dois anos atrás, estava em 2%, causou um sobre-endividamento do sistema. Baixar a taxa para 2% foi um erro. Teve uma explosão de fundos de crédito e de emissões (de títulos de dívida). Houve um sobre-endividamento em função da taxa muito baixa, aí a taxa explode para 13%. É um problema. Essa crise de crédito está encomendada pelo ciclo monetário, o BC deveria reconhecer isso, que tem um pouco de culpa no cartório. Com o externo, complica a coisa ainda mais. É uma fase de negação. É muito complicado que essa negação talvez esteja sendo alimentada pela questão política e as críticas que eles (os diretores do Copom) vêm sofrendo.

Seu curso como visitante na Universidade Georgetown, nos EUA, é sobre os impactos da ascensão da China nas finanças globais. Essa ascensão afeta de alguma forma a crise de crédito atual?

Esse curso está resumido no livro que publiquei em 2019. A tese é que a China teve um papel muito importante naquilo que levou a grande crise de 2008. A China transferiu poupança da sua economia para o mundo desenvolvido, especialmente para os Estados Unidos, mas também para a Europa. Essa transferência foi utilizada para alimentar uma grande bolha imobiliária de crédito, que criou uma fragilidade financeira. Quando o chinês transferiu poupança para os EUA, ele comprou treasuries (como são conhecidos os títulos da dívida pública americana). Se essas treasuries tivessem sido utilizadas para financiar um déficit fiscal maior, não teria tido fragilidade financeira, porque quem estaria usando o dinheiro, no caso o governo americano, teria o passivo. Só que quem tinha demanda por poupança não era o governo americano, era o consumidor americano, que queria consumir mais e comprar casas. Então, foi preciso transformar essa poupança, que foi primeiro investida em treasuries, que estavam no balanço do banco central da China, cujas reservas chegaram a US$ 5 trilhões, em seu auge, em crédito imobiliário. Então, tinha que colocar nesse circuito um agente que fizesse a transformação do ativo treasury para o ativo crédito imobiliário. Esse agente foi o shadow banking. É a transformação de algo que não tinha risco de crédito para algo que tinha risco de crédito. Esse shadow banking ficou com o risco de crédito em seus balanços. A China deu a poupança, mas não ficou com o risco de crédito. O risco de crédito ficou com os bancos de investimento, os fundos de hedge, surgiu toda aquela sopa de novos instrumentos (financeiros). Toda essa coisa complexa era para fazer só uma coisa: pegar a poupança chinesa e transferir para o consumidor americano e ficar com o risco de crédito do consumidor americano. Foram esses agentes do meio que começaram a operar com muita alavancagem e gerou a fragilidade que levou à crise. O que levou à crise? Os preços dos imóveis começaram a cair. Não por acaso, essa queda foi causada por um aperto de política monetária. Há paralelos com hoje? Certamente há, mas não é a mesma coisa.

Da crise de 2008 para cá, o que mudou?

A China parou de ser a provedora de poupança para os Estados Unidos. Nesse sentido, ela não é mais um grande jogador. O nível de reservas da China caiu, foi de US$ 5 trilhões para US$ 3 trilhões. Ela mesma entrou em crise em 2015, o que de fato foi um grande problema para o Brasil. Agora, a influência dela não é a mesma daquela época.

Os eventos geopolíticos recentes, como a guerra na Ucrânia e a aproximação da China com a Rússia, podem afetar o sistema financeiro global?

O grande drama daqueles dez anos foi o mau ajustamento da economia global à entrada da China. O mundo não soube se ajustar à entrada da China. Do lado do Brasil, tivemos aquele bom período e apostamos que aquilo nunca ia acabar. Tomamos várias decisões, de expansões de políticas fiscais, como se aquilo fosse para sempre, e acabou não sendo. Era consenso na época que a economia brasileira ia crescer 4% ao ano. Até o FMI (Fundo Monetário Internacional) falava isso. Aí descobrimos que, com a crise financeira e seus impactos na China, de repente, o Brasil é uma economia que cresce 2% ao ano. Esse de 4% para 2% impacta muita coisa, demora muito tempo para fazer o ajuste. Se, naquele período, houve um mau ajuste à entrada da China, agora estamos vivendo o período da saída da China, de certa maneira, em função da geopolítica. Essa desglobalização. Isso cria certas oportunidades, não é necessariamente totalmente negativo, porque a entrada da China teve um lado negativo, dizimou a indústria em muitos países, porque os caras simplesmente eram muito mais competitivos. Então, essa questão, por exemplo, de ter uma janela de reindustrialização é verdade. Agora, como o Brasil, com todas as suas limitações, vai se aproveitar disso? O grande drama, que tem um lado militar também, é uma certa separação, zonas de influência diferentes, estamos vendo isso no setor de tecnologia. Vamos ver se o Brasil consegue ter mais sucesso, cometemos muitos erros na entrada, vamos ver se conseguimos errar menos na saída (da China nas finanças globais).

A viagem oficial do presidente Lula à China, com foco comercial, é importante então?

O Brasil não tem, necessariamente, que entrar na canoa americana. Se olharmos o pós-guerra, os países que tiveram sucesso, como Coreia do Sul e Japão, eram países que diziam o seguinte: Estados Unidos, vocês querem que eu fique na sua órbita? Vocês têm que me ajudar economicamente, permitir que eu siga uma política de exportações e manter seu mercado aberto. A história de países que conseguiram se industrializar foi essa. Nós não fizemos isso nos anos 1950 e 1960, não só o Brasil, a América Latina inteira. Fizemos o contrário. Ficamos na órbita americana, mas não cobramos nada em troca. Fizemos a idiotice da substituição das importações, não aproveitamos para nos integrar na economia global e nossa grande tragédia foi essa. Agora, a mesma coisa: como o Brasil pode se colocar para tentar se aproveitar dessa divisão? Acho que é jogar dos dois lados, jogar do lado chinês, jogar do lado americano, pega uma coisa aqui, pega uma coisa lá, para tirar o melhor negócio possível dos dois. Não é escolher um lado. Temos que ter a capacidade de fazer isso, se vamos ter ou não, não sei. Brasília não inspira muita confiança.

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