Transição no BC pode começar mais cedo e Campos Neto fala em processo suave e colaborativo


Conversas correm a passos largos, ainda que não haja decisão tomada; Galípolo é favorito à sucessão, mas novos nomes já circulam nos bastidores

Por Bianca Lima e Mariana Carneiro
Atualização:

BRASÍLIA – As conversas sobre a sucessão no Banco Central já correm a passos largos e envolvem o presidente Roberto Campos Neto, que vem sugerindo nos bastidores mais tempo para se concretizar a troca de comando na instituição – ou seja, que o anúncio do novo nome seja feito mais cedo. O mandato dele se encerra em 31 de dezembro, na primeira substituição sob o sistema de mandatos fixos no BC, iniciado em 2021. A indicação cabe ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Em conversas reservadas, Campos Neto vem defendendo que o sucessor escolhido deve sair a tempo de as sabatinas, feitas pelo Senado, ocorrerem ainda em 2024, o que fixa como data limite os meses de outubro ou novembro. Seus interlocutores, porém, afirmam que o presidente do BC já trabalha com um prazo mais alongado e pretende dedicar todo o segundo semestre para uma transição “suave e colaborativa”.

Em conversas reservadas, Campos Neto vem defendendo que o nome do sucessor deve sair a tempo de as sabatinas, feitas pelo Senado, ocorrerem ainda em 2024. Foto: Alex Silva / Estadão
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Na Faria Lima, a troca de comando no BC já é assunto desde o ano passado, quando Lula abriu fogo contra Campos Neto pela elevada taxa de juros em vigor (13,75% ao ano, à época). O início do ciclo de cortes, em agosto, arrefeceu as críticas, que voltaram mais recentemente em falas da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e do ministro do Trabalho, Luiz Marinho.

O temor dos analistas não se dá tanto pelos efeitos que isso poderia trazer ao atual presidente do BC, mas sobre capacidade do próximo ocupante do cargo de resistir às pressões do Palácio do Planalto e do PT. Campos Neto já demonstrou independência; restará ao sucessor provar a sua ao mercado.

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O favorito à sucessão ainda é Gabriel Galípolo, economista que dirigiu o Banco Fator e que chegou à campanha eleitoral de Lula, em 2022, pelas mãos do PT – ele acompanhou Gleisi Hoffmann em eventos com investidores e analistas, como uma espécie de porta-voz econômico da petista.

Na montagem do governo, Galípolo acabou assumindo a posição de número 2 do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não sem antes ter sido cogitado para cargos em voo solo, como a presidência do BNDES.

O contato direto que estabeleceu com Lula, tanto na campanha quanto no governo, gabaritaram o economista para a indicação ao cargo de diretor de Política Monetária do BC, em maio do ano passado, ainda que sua trajetória profissional não tenha proximidade com o tema.

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Naquele momento, sedimentou-se em Brasília a análise de que o indicado foi colocado no posto por Lula com vistas à sucessão de Campos Neto. Mas não só isso: como um fiscal da conduta do atual presidente do BC – visto, pelos aliados de Lula, como um bolsonarista infiltrado.

Os acontecimentos que se sucederam – a concordância de Galípolo com as decisões de Campos Neto e da diretoria do BC – não passaram despercebidos aos olhos de setores do PT. Eles se perguntam como “um dos nossos homens” não se opôs ao projeto de autonomia financeira da instituição, que ganhou vida no Senado; nem registrou divergências sobre posições consideradas conservadoras na condução dos juros.

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Em entrevista à Folha no início de março, Campos Neto revelou que o apoio à proposta de autonomia financeira do BC é unânime na diretoria. Boa parte do PT já demonstrou ser contra a ideia, que também enfrenta resistência no Tesouro Nacional e no Ministério da Gestão, de Esther Dweck – que veem obstáculos em questões técnicas, como o impacto na dívida pública e em como dar autonomia à uma autarquia com tantas atribuições de Estado.

Um relatório deverá ser apresentado pelo senador Plínio Valério (PSDB-AM). Campos Neto se envolveu diretamente na discussão do texto, mas vem sendo aconselhado a se distanciar, uma vez que o debate não deve ser concluído no seu mandato. E os eventuais benefícios – ou seja, a capacidade de contratar e reter técnicos de boa qualidade – também ficarão para o próximo presidente.

Gabriel Galípolo ainda é o favorito na bolsa de apostas para substituir Campos Neto. Foto: Fespsp
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O tempo fechou e Galípolo aparentemente entendeu o recado. Nas últimas semanas, apareceu em dois eventos seguidos do PT na capital: o aniversário do ex-ministro José Dirceu e o de Paulo Pimenta, secretário de Comunicação do Planalto.

Nas conversas com políticos do partido, segundo apurou o Estadão, não faltaram perguntas sobre inflação e sua relação com a taxa de juros. Nem os petistas nem o presidente estão satisfeitos com o atual patamar da Selic (10,75% ao ano).

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Galípolo não se manifestou publicamente sobre a autonomia financeira do BC. Mas em conversas reservadas, segundo relatos, tem dito que a discussão foi precipitada, que precisaria envolver os servidores do banco, o governo e o Legislativo, e que há impacto na contabilidade pública que deve ser considerado.

O presidente do conselho de administração da Jive Investments, Luiz Fernando Figueiredo, que foi diretor do BC entre 1999 e 2003, avalia que a narrativa do PT não tem se confirmado na prática. Ele cita como exemplo a decisão de Lula, no ano passado, de ter mantido a meta de inflação em 3% – Galípolo atuou diretamente para convencer o presidente na ocasião.

“Temos dúvida, claro que temos dúvida, a gente não sabe quem será a pessoa (que substituirá Campos Neto). Mas o que temos de indícios, até agora, não são ruins”, disse Figueiredo. “Tem prevalecido o bom senso em atitudes concretas: a meta de inflação, as contratações para a diretoria do BC, a própria relação do Roberto Campos com o Haddad. Os indícios são positivos. Há dúvida, sim. E ela existe principalmente porque há uma narrativa do presidente que tem gerado desconforto.”

O economista atribui esse desconforto às falas intervencionistas de Lula, que provocaram a desvalorização de ações de empresas estatais, como a Petrobras, e de privatizadas, como a Vale e a Eletrobras. Segundo ele, investidores estrangeiros já tiraram R$ 22 bilhões do País neste ano, em grande medida, como resposta ao avanço de Brasília sobre as empresas.

Em entrevista recente ao Estadão, o economista José Júlio Senna, ex-diretor do BC (1985) e hoje chefe do Centro de Estudos Monetários do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas, disse que as incertezas sobre a troca no BC se somam às dúvidas sobre a política fiscal. E que isso interfere na percepção de investidores sobre os indicadores da economia.

“Ainda não temos confiança plena de que as contas públicas estarão bem equilibradas lá na frente. Outro ponto é a incerteza relacionada com a troca de comando do Banco Central no final do ano. Não estou entrando no mérito sobre as qualificações dos indivíduos. Mas os analistas de mercado não têm segurança sobre a continuidade da política monetária”, disse Senna.

“Essas incertezas fazem com que as expectativas (de inflação) fiquem em 3,5%. Esse é um grande obstáculo à redução dos juros. Se as expectativas não convergem, o BC tem que praticar uma política monetária mais apertada.”

A equipe econômica ainda não vê interferência da sucessão no BC no preço dos ativos, como por exemplo uma demanda maior por títulos vinculados à inflação. Ainda que o assunto tenha varrido o mercado financeiro, a avaliação é que, apesar dos discursos, o investidor não vê um futuro de leniência com os índices de preço.

A turbulência tende a aumentar nos próximos meses, com a proximidade do fim do mandato de Campos Neto e a constatação de que, além dele, outros dois diretores serão substituídos – no fim do ano vencem os mandatos de Carolina Barros, diretora de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta, e de Otávio Damaso, diretor de Regulação.

Dessa forma, um terço da diretoria – que é formada por oito membros mais o presidente – será mudado. Os indicados de Lula – ou “os nossos”, na definição petista – passarão então a ser maioria no conselho.

Embora favorito e próximo de Haddad, Galípolo passou a concorrer com outros nomes que circulam nas conversas de bastidor. O experiente economista Marcelo Kayath, que foi diretor do Credit Suisse e é amigo do ministro, é um deles.

A pesquisa Genial/Quest com analistas do mercado financeiro divulgada no último dia 20 apontou que, pelo menos para os eleitores da Faria Lima, o diretor de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos, Paulo Picchetti, é o preferido para a vaga.

Ele apareceu à frente de Galípolo e Kayath na pergunta sobre quem deveria ser o indicado para o lugar de Campos Neto. O único eleitor dessa sucessão, porém, é o presidente Lula, que tem a atribuição legal de indicar o novo presidente do BC.

Procurados, Campos Neto, Haddad e Galípolo não se manifestaram. Kayath afirmou que não vai comentar.

BRASÍLIA – As conversas sobre a sucessão no Banco Central já correm a passos largos e envolvem o presidente Roberto Campos Neto, que vem sugerindo nos bastidores mais tempo para se concretizar a troca de comando na instituição – ou seja, que o anúncio do novo nome seja feito mais cedo. O mandato dele se encerra em 31 de dezembro, na primeira substituição sob o sistema de mandatos fixos no BC, iniciado em 2021. A indicação cabe ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Em conversas reservadas, Campos Neto vem defendendo que o sucessor escolhido deve sair a tempo de as sabatinas, feitas pelo Senado, ocorrerem ainda em 2024, o que fixa como data limite os meses de outubro ou novembro. Seus interlocutores, porém, afirmam que o presidente do BC já trabalha com um prazo mais alongado e pretende dedicar todo o segundo semestre para uma transição “suave e colaborativa”.

Em conversas reservadas, Campos Neto vem defendendo que o nome do sucessor deve sair a tempo de as sabatinas, feitas pelo Senado, ocorrerem ainda em 2024. Foto: Alex Silva / Estadão

Na Faria Lima, a troca de comando no BC já é assunto desde o ano passado, quando Lula abriu fogo contra Campos Neto pela elevada taxa de juros em vigor (13,75% ao ano, à época). O início do ciclo de cortes, em agosto, arrefeceu as críticas, que voltaram mais recentemente em falas da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e do ministro do Trabalho, Luiz Marinho.

O temor dos analistas não se dá tanto pelos efeitos que isso poderia trazer ao atual presidente do BC, mas sobre capacidade do próximo ocupante do cargo de resistir às pressões do Palácio do Planalto e do PT. Campos Neto já demonstrou independência; restará ao sucessor provar a sua ao mercado.

O favorito à sucessão ainda é Gabriel Galípolo, economista que dirigiu o Banco Fator e que chegou à campanha eleitoral de Lula, em 2022, pelas mãos do PT – ele acompanhou Gleisi Hoffmann em eventos com investidores e analistas, como uma espécie de porta-voz econômico da petista.

Na montagem do governo, Galípolo acabou assumindo a posição de número 2 do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não sem antes ter sido cogitado para cargos em voo solo, como a presidência do BNDES.

O contato direto que estabeleceu com Lula, tanto na campanha quanto no governo, gabaritaram o economista para a indicação ao cargo de diretor de Política Monetária do BC, em maio do ano passado, ainda que sua trajetória profissional não tenha proximidade com o tema.

Naquele momento, sedimentou-se em Brasília a análise de que o indicado foi colocado no posto por Lula com vistas à sucessão de Campos Neto. Mas não só isso: como um fiscal da conduta do atual presidente do BC – visto, pelos aliados de Lula, como um bolsonarista infiltrado.

Os acontecimentos que se sucederam – a concordância de Galípolo com as decisões de Campos Neto e da diretoria do BC – não passaram despercebidos aos olhos de setores do PT. Eles se perguntam como “um dos nossos homens” não se opôs ao projeto de autonomia financeira da instituição, que ganhou vida no Senado; nem registrou divergências sobre posições consideradas conservadoras na condução dos juros.

Em entrevista à Folha no início de março, Campos Neto revelou que o apoio à proposta de autonomia financeira do BC é unânime na diretoria. Boa parte do PT já demonstrou ser contra a ideia, que também enfrenta resistência no Tesouro Nacional e no Ministério da Gestão, de Esther Dweck – que veem obstáculos em questões técnicas, como o impacto na dívida pública e em como dar autonomia à uma autarquia com tantas atribuições de Estado.

Um relatório deverá ser apresentado pelo senador Plínio Valério (PSDB-AM). Campos Neto se envolveu diretamente na discussão do texto, mas vem sendo aconselhado a se distanciar, uma vez que o debate não deve ser concluído no seu mandato. E os eventuais benefícios – ou seja, a capacidade de contratar e reter técnicos de boa qualidade – também ficarão para o próximo presidente.

Gabriel Galípolo ainda é o favorito na bolsa de apostas para substituir Campos Neto. Foto: Fespsp

O tempo fechou e Galípolo aparentemente entendeu o recado. Nas últimas semanas, apareceu em dois eventos seguidos do PT na capital: o aniversário do ex-ministro José Dirceu e o de Paulo Pimenta, secretário de Comunicação do Planalto.

Nas conversas com políticos do partido, segundo apurou o Estadão, não faltaram perguntas sobre inflação e sua relação com a taxa de juros. Nem os petistas nem o presidente estão satisfeitos com o atual patamar da Selic (10,75% ao ano).

Galípolo não se manifestou publicamente sobre a autonomia financeira do BC. Mas em conversas reservadas, segundo relatos, tem dito que a discussão foi precipitada, que precisaria envolver os servidores do banco, o governo e o Legislativo, e que há impacto na contabilidade pública que deve ser considerado.

O presidente do conselho de administração da Jive Investments, Luiz Fernando Figueiredo, que foi diretor do BC entre 1999 e 2003, avalia que a narrativa do PT não tem se confirmado na prática. Ele cita como exemplo a decisão de Lula, no ano passado, de ter mantido a meta de inflação em 3% – Galípolo atuou diretamente para convencer o presidente na ocasião.

“Temos dúvida, claro que temos dúvida, a gente não sabe quem será a pessoa (que substituirá Campos Neto). Mas o que temos de indícios, até agora, não são ruins”, disse Figueiredo. “Tem prevalecido o bom senso em atitudes concretas: a meta de inflação, as contratações para a diretoria do BC, a própria relação do Roberto Campos com o Haddad. Os indícios são positivos. Há dúvida, sim. E ela existe principalmente porque há uma narrativa do presidente que tem gerado desconforto.”

O economista atribui esse desconforto às falas intervencionistas de Lula, que provocaram a desvalorização de ações de empresas estatais, como a Petrobras, e de privatizadas, como a Vale e a Eletrobras. Segundo ele, investidores estrangeiros já tiraram R$ 22 bilhões do País neste ano, em grande medida, como resposta ao avanço de Brasília sobre as empresas.

Em entrevista recente ao Estadão, o economista José Júlio Senna, ex-diretor do BC (1985) e hoje chefe do Centro de Estudos Monetários do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas, disse que as incertezas sobre a troca no BC se somam às dúvidas sobre a política fiscal. E que isso interfere na percepção de investidores sobre os indicadores da economia.

“Ainda não temos confiança plena de que as contas públicas estarão bem equilibradas lá na frente. Outro ponto é a incerteza relacionada com a troca de comando do Banco Central no final do ano. Não estou entrando no mérito sobre as qualificações dos indivíduos. Mas os analistas de mercado não têm segurança sobre a continuidade da política monetária”, disse Senna.

“Essas incertezas fazem com que as expectativas (de inflação) fiquem em 3,5%. Esse é um grande obstáculo à redução dos juros. Se as expectativas não convergem, o BC tem que praticar uma política monetária mais apertada.”

A equipe econômica ainda não vê interferência da sucessão no BC no preço dos ativos, como por exemplo uma demanda maior por títulos vinculados à inflação. Ainda que o assunto tenha varrido o mercado financeiro, a avaliação é que, apesar dos discursos, o investidor não vê um futuro de leniência com os índices de preço.

A turbulência tende a aumentar nos próximos meses, com a proximidade do fim do mandato de Campos Neto e a constatação de que, além dele, outros dois diretores serão substituídos – no fim do ano vencem os mandatos de Carolina Barros, diretora de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta, e de Otávio Damaso, diretor de Regulação.

Dessa forma, um terço da diretoria – que é formada por oito membros mais o presidente – será mudado. Os indicados de Lula – ou “os nossos”, na definição petista – passarão então a ser maioria no conselho.

Embora favorito e próximo de Haddad, Galípolo passou a concorrer com outros nomes que circulam nas conversas de bastidor. O experiente economista Marcelo Kayath, que foi diretor do Credit Suisse e é amigo do ministro, é um deles.

A pesquisa Genial/Quest com analistas do mercado financeiro divulgada no último dia 20 apontou que, pelo menos para os eleitores da Faria Lima, o diretor de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos, Paulo Picchetti, é o preferido para a vaga.

Ele apareceu à frente de Galípolo e Kayath na pergunta sobre quem deveria ser o indicado para o lugar de Campos Neto. O único eleitor dessa sucessão, porém, é o presidente Lula, que tem a atribuição legal de indicar o novo presidente do BC.

Procurados, Campos Neto, Haddad e Galípolo não se manifestaram. Kayath afirmou que não vai comentar.

BRASÍLIA – As conversas sobre a sucessão no Banco Central já correm a passos largos e envolvem o presidente Roberto Campos Neto, que vem sugerindo nos bastidores mais tempo para se concretizar a troca de comando na instituição – ou seja, que o anúncio do novo nome seja feito mais cedo. O mandato dele se encerra em 31 de dezembro, na primeira substituição sob o sistema de mandatos fixos no BC, iniciado em 2021. A indicação cabe ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Em conversas reservadas, Campos Neto vem defendendo que o sucessor escolhido deve sair a tempo de as sabatinas, feitas pelo Senado, ocorrerem ainda em 2024, o que fixa como data limite os meses de outubro ou novembro. Seus interlocutores, porém, afirmam que o presidente do BC já trabalha com um prazo mais alongado e pretende dedicar todo o segundo semestre para uma transição “suave e colaborativa”.

Em conversas reservadas, Campos Neto vem defendendo que o nome do sucessor deve sair a tempo de as sabatinas, feitas pelo Senado, ocorrerem ainda em 2024. Foto: Alex Silva / Estadão

Na Faria Lima, a troca de comando no BC já é assunto desde o ano passado, quando Lula abriu fogo contra Campos Neto pela elevada taxa de juros em vigor (13,75% ao ano, à época). O início do ciclo de cortes, em agosto, arrefeceu as críticas, que voltaram mais recentemente em falas da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e do ministro do Trabalho, Luiz Marinho.

O temor dos analistas não se dá tanto pelos efeitos que isso poderia trazer ao atual presidente do BC, mas sobre capacidade do próximo ocupante do cargo de resistir às pressões do Palácio do Planalto e do PT. Campos Neto já demonstrou independência; restará ao sucessor provar a sua ao mercado.

O favorito à sucessão ainda é Gabriel Galípolo, economista que dirigiu o Banco Fator e que chegou à campanha eleitoral de Lula, em 2022, pelas mãos do PT – ele acompanhou Gleisi Hoffmann em eventos com investidores e analistas, como uma espécie de porta-voz econômico da petista.

Na montagem do governo, Galípolo acabou assumindo a posição de número 2 do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não sem antes ter sido cogitado para cargos em voo solo, como a presidência do BNDES.

O contato direto que estabeleceu com Lula, tanto na campanha quanto no governo, gabaritaram o economista para a indicação ao cargo de diretor de Política Monetária do BC, em maio do ano passado, ainda que sua trajetória profissional não tenha proximidade com o tema.

Naquele momento, sedimentou-se em Brasília a análise de que o indicado foi colocado no posto por Lula com vistas à sucessão de Campos Neto. Mas não só isso: como um fiscal da conduta do atual presidente do BC – visto, pelos aliados de Lula, como um bolsonarista infiltrado.

Os acontecimentos que se sucederam – a concordância de Galípolo com as decisões de Campos Neto e da diretoria do BC – não passaram despercebidos aos olhos de setores do PT. Eles se perguntam como “um dos nossos homens” não se opôs ao projeto de autonomia financeira da instituição, que ganhou vida no Senado; nem registrou divergências sobre posições consideradas conservadoras na condução dos juros.

Em entrevista à Folha no início de março, Campos Neto revelou que o apoio à proposta de autonomia financeira do BC é unânime na diretoria. Boa parte do PT já demonstrou ser contra a ideia, que também enfrenta resistência no Tesouro Nacional e no Ministério da Gestão, de Esther Dweck – que veem obstáculos em questões técnicas, como o impacto na dívida pública e em como dar autonomia à uma autarquia com tantas atribuições de Estado.

Um relatório deverá ser apresentado pelo senador Plínio Valério (PSDB-AM). Campos Neto se envolveu diretamente na discussão do texto, mas vem sendo aconselhado a se distanciar, uma vez que o debate não deve ser concluído no seu mandato. E os eventuais benefícios – ou seja, a capacidade de contratar e reter técnicos de boa qualidade – também ficarão para o próximo presidente.

Gabriel Galípolo ainda é o favorito na bolsa de apostas para substituir Campos Neto. Foto: Fespsp

O tempo fechou e Galípolo aparentemente entendeu o recado. Nas últimas semanas, apareceu em dois eventos seguidos do PT na capital: o aniversário do ex-ministro José Dirceu e o de Paulo Pimenta, secretário de Comunicação do Planalto.

Nas conversas com políticos do partido, segundo apurou o Estadão, não faltaram perguntas sobre inflação e sua relação com a taxa de juros. Nem os petistas nem o presidente estão satisfeitos com o atual patamar da Selic (10,75% ao ano).

Galípolo não se manifestou publicamente sobre a autonomia financeira do BC. Mas em conversas reservadas, segundo relatos, tem dito que a discussão foi precipitada, que precisaria envolver os servidores do banco, o governo e o Legislativo, e que há impacto na contabilidade pública que deve ser considerado.

O presidente do conselho de administração da Jive Investments, Luiz Fernando Figueiredo, que foi diretor do BC entre 1999 e 2003, avalia que a narrativa do PT não tem se confirmado na prática. Ele cita como exemplo a decisão de Lula, no ano passado, de ter mantido a meta de inflação em 3% – Galípolo atuou diretamente para convencer o presidente na ocasião.

“Temos dúvida, claro que temos dúvida, a gente não sabe quem será a pessoa (que substituirá Campos Neto). Mas o que temos de indícios, até agora, não são ruins”, disse Figueiredo. “Tem prevalecido o bom senso em atitudes concretas: a meta de inflação, as contratações para a diretoria do BC, a própria relação do Roberto Campos com o Haddad. Os indícios são positivos. Há dúvida, sim. E ela existe principalmente porque há uma narrativa do presidente que tem gerado desconforto.”

O economista atribui esse desconforto às falas intervencionistas de Lula, que provocaram a desvalorização de ações de empresas estatais, como a Petrobras, e de privatizadas, como a Vale e a Eletrobras. Segundo ele, investidores estrangeiros já tiraram R$ 22 bilhões do País neste ano, em grande medida, como resposta ao avanço de Brasília sobre as empresas.

Em entrevista recente ao Estadão, o economista José Júlio Senna, ex-diretor do BC (1985) e hoje chefe do Centro de Estudos Monetários do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas, disse que as incertezas sobre a troca no BC se somam às dúvidas sobre a política fiscal. E que isso interfere na percepção de investidores sobre os indicadores da economia.

“Ainda não temos confiança plena de que as contas públicas estarão bem equilibradas lá na frente. Outro ponto é a incerteza relacionada com a troca de comando do Banco Central no final do ano. Não estou entrando no mérito sobre as qualificações dos indivíduos. Mas os analistas de mercado não têm segurança sobre a continuidade da política monetária”, disse Senna.

“Essas incertezas fazem com que as expectativas (de inflação) fiquem em 3,5%. Esse é um grande obstáculo à redução dos juros. Se as expectativas não convergem, o BC tem que praticar uma política monetária mais apertada.”

A equipe econômica ainda não vê interferência da sucessão no BC no preço dos ativos, como por exemplo uma demanda maior por títulos vinculados à inflação. Ainda que o assunto tenha varrido o mercado financeiro, a avaliação é que, apesar dos discursos, o investidor não vê um futuro de leniência com os índices de preço.

A turbulência tende a aumentar nos próximos meses, com a proximidade do fim do mandato de Campos Neto e a constatação de que, além dele, outros dois diretores serão substituídos – no fim do ano vencem os mandatos de Carolina Barros, diretora de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta, e de Otávio Damaso, diretor de Regulação.

Dessa forma, um terço da diretoria – que é formada por oito membros mais o presidente – será mudado. Os indicados de Lula – ou “os nossos”, na definição petista – passarão então a ser maioria no conselho.

Embora favorito e próximo de Haddad, Galípolo passou a concorrer com outros nomes que circulam nas conversas de bastidor. O experiente economista Marcelo Kayath, que foi diretor do Credit Suisse e é amigo do ministro, é um deles.

A pesquisa Genial/Quest com analistas do mercado financeiro divulgada no último dia 20 apontou que, pelo menos para os eleitores da Faria Lima, o diretor de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos, Paulo Picchetti, é o preferido para a vaga.

Ele apareceu à frente de Galípolo e Kayath na pergunta sobre quem deveria ser o indicado para o lugar de Campos Neto. O único eleitor dessa sucessão, porém, é o presidente Lula, que tem a atribuição legal de indicar o novo presidente do BC.

Procurados, Campos Neto, Haddad e Galípolo não se manifestaram. Kayath afirmou que não vai comentar.

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