The Economist: Trumponomics não seria tão ruim quanto a maioria espera


A oposição aos planos de Donald Trump viria de todos os ângulos

Por Redação

Nos mercados, isso é conhecido como “Trump trade”, uma aposta de que o retorno de Donald Trump à Casa Branca traria mais inflação e taxas de juros mais altas. Muitas das principais políticas de Trump apontam nessa direção: as tarifas aumentariam os custos de importação, as deportações de imigrantes poderiam aumentar os salários e os cortes de impostos financiados pelo déficit estimulariam a economia. Em meio a uma inflação crescente, o Federal Reserve teria pouca escolha a não ser optar por taxas mais altas.

Na esteira da calamidade que foi o desempenho de Joe Biden no debate com Trump em 27 de junho, houve uma prévia desse fenômeno. À medida que os investidores se deparavam com a probabilidade de que Trump chegasse à presidência, eles venderam títulos do Tesouro, o que levou a um breve aumento nos rendimentos. O grande temor é que algo muito pior possa acontecer. Se Trump brigasse com o Fed em relação às taxas, ele poderia semear dúvidas sobre a independência do Banco Central, minando a confiança nos mercados americanos e no dólar. Esse é o cenário de pesadelo econômico para um segundo governo Trump.

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Mas, como em qualquer pesadelo, o bicho-papão do Trumponomics pode ser mais terrível do que a realidade. Trump e seus assessores têm muitas ideias temerárias. Eles também têm algumas ideias decentes. E sua capacidade de implementar políticas prejudiciais será limitada, com o Congresso, as instituições e os mercados dos EUA servindo de controle.

Trump aprimorou sua agenda em discursos e entrevistas e, em 8 de julho, ela foi consagrada pelos republicanos como a plataforma eleitoral do partido. Três elementos se destacam. O primeiro é a desregulamentação, um elemento básico para os republicanos. Em contraste com 2017, quando ele e seus assessores estavam mal preparados para a presidência, desta vez eles alinharam pessoal e políticas. Trump não perderá muito tempo para rescindir muitas das regras ambientais do governo Biden, flexibilizando as restrições de perfuração para as empresas de petróleo e pressionando os órgãos federais a cortar gastos. Ele prometeu, como em sua primeira presidência, eliminar duas regulamentações para cada uma emitida.

Donald Trump será o candidato do Partido Republicano para as eleições nos Estados Unidos e tem boas chances de ser eleito Foto: Rebecca Blackwell/AP
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Mas grande parte disso é marketing. O número de restrições no Código de Regulamentações Federais, um indicador da intensidade da regulamentação nos Estados Unidos, permaneceu basicamente inalterado durante o governo de Trump. Além disso, seu governo foi impedido de fazer mais pelos tribunais. Ele não obteve sucesso em quase 80% dos litígios sobre o uso de agências federais, de acordo com o Institute for Policy Integrity, um grupo de pesquisa. O banco Goldman Sachs avalia que o impacto de toda a desregulamentação do primeiro governo Trump foi, em última análise, insignificante para a economia em geral - um resultado que provavelmente se repetirá.

Com relação aos impostos, Trump pode, de certa forma, ser visto como um candidato de continuidade. A ação se concentrará na iminente expiração de grande parte do Tax Cuts and Jobs Act (TCJA), o pacote de Trump de 2017. A redução dos impostos corporativos da TCJA era permanente, mas grande parte do restante da lei, incluindo cortes no imposto de renda de pessoas físicas, expirará no final de 2025. O principal objetivo de Trump é tornar esses cortes permanentes.

Isso não será simples porque, para aprovar o projeto de lei no Congresso, os republicanos precisarão pagar o custo da prorrogação dos cortes, cerca de US$ 4,5 trilhões na próxima década. Mas Trump tem opções. Uma parte da receita pode vir das tarifas, que podem gerar US$ 3 trilhões ao longo da década. Também há dinheiro para reverter algumas das políticas de Joe Biden.

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Espera-se que o custo da Lei de Redução da Inflação, o pacote de subsídios climáticos de Biden, chegue a cerca de US$ 1 trilhão. Os republicanos podem eliminar alguns créditos fiscais, começando com descontos para veículos elétricos. Trump também sugeriu que pode desfazer os cancelamentos de dívidas estudantis de Biden, que devem custar US$ 1 trilhão.

As outras ideias de impostos de Trump são mais modestas. Ele falou em cortar um ponto porcentual da alíquota do imposto corporativo, para reduzi-la para 20% (ele gosta de números redondos). Sua proposta mais ousada é tornar a gorjeta isenta de impostos. Os legisladores teriam que elaborar essa isenção com cuidado, caso contrário, todos poderiam exigir pagamentos como gratificações.

Sem compensar a receita ou os cortes de gastos, todo corte de impostos piorará o déficit dos Estados Unidos, um risco para Trump. Mas não que Biden tenha sido um modelo de retidão fiscal: o déficit federal está a caminho de atingir um alto índice de 7% do PIB este ano.

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O homem das tarifas, parte dois

A estratégia econômica pela qual Trump é mais famoso, especialmente fora dos Estados Unidos, é seu protecionismo. Ele tem sido claro sobre o que pretende fazer, almejando uma tarifa universal de 10% sobre todas as importações para os Estados Unidos e uma taxa de 60% sobre os produtos fabricados na China. Ele também quer um afastamento maior da China.

Não há dúvidas sobre as consequências globais se Trump cumprir sua panóplia de políticas comerciais “America-first”. Ele seria capaz de fazer isso? Na ala tradicional do Partido Republicano, ainda há resistência às tarifas. Se Trump decidir tirar o Congresso da jogada, ele poderá declarar uma emergência de segurança nacional, o que lhe daria poderes especiais. Isso, no entanto, pode ser derrubado nos tribunais.

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Tarifas mais altas sobre a China seriam mais viáveis, uma vez que a Casa Branca poderia pegar carona em medidas existentes. Ela poderia, por exemplo, concluir que a China não cumpriu um acordo assinado com Trump em 2020, o que seria fácil de demonstrar. A repressão ao redirecionamento das exportações chinesas por meio de outros países seria mais difícil sem a cooperação de governos estrangeiros, o que Trump teve dificuldade em obter no passado.

Além disso, mesmo dentro da Casa Branca de Trump, é bem possível que haja oposição às suas políticas comerciais mais agressivas. Falcões como Peter Navarro, um consultor econômico, têm sido os mais volúveis, mas Trump gosta de montar uma equipe com rivais, permitindo que ele julgue entre opiniões contrastantes. É possível que ele nomeie novamente um veterano de Wall Street como seu secretário do Tesouro, e essa figura seria um contrapeso para os protecionistas incendiários.

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A agenda de Trump enfrentará outros obstáculos. Ele quer começar com o pé direito, mas seu primeiro ano no cargo apresenta um calendário legislativo denso. O teto da dívida será restabelecido em 2 de janeiro, forçando a Casa Branca a entrar em negociações com o Congresso. Outro prazo se aproxima no final de abril, quando o Congresso terá de fazer cortes drásticos se não tiver elaborado um novo orçamento. Durante todo esse tempo, o relógio estará correndo para os cortes de impostos de Trump. Se os democratas conseguirem ganhar a Câmara, todas essas negociações serão muito mais difíceis.

Trump fará ainda menos progressos na reformulação do Fed. Os investidores temem que ele queira influenciar as decisões sobre as taxas do Banco Central. No entanto, é difícil colocar esse desejo em prática. Sua primeira chance de nomear um novo presidente do FED será em 2026, quando ele poderá nomear um substituto para Jerome Powell. Porém, a diretoria do Fed é composta por sete membros e todas as indicações devem passar pelo Senado, que anteriormente bloqueou dois dos quatro indicados por Trump. Se ele tentasse demitir Powell, as pessoas de dentro do Fed acham que ele teria em mãos outra briga legal impossível de ser vencida.

Talvez o maior dano de curto prazo que Trump possa infligir à economia dos Estados Unidos seja por meio de sua política de imigração. Impedir “a invasão”, como ele a chama, consumirá seu governo. Os milhões de pessoas que entraram no país nos últimos anos foram vitais para sustentar o crescimento econômico e controlar a inflação.

A interrupção da migração seria um choque para o mercado de trabalho. No entanto, como acontece com outras políticas trumpistas, haverá resistência a cada passo do caminho, com os tribunais derrubando as ordens de deportação, os Estados democratas se recusando a cooperar e as empresas fazendo lobby para evitar essa mão-de-ferro.

Em meio a tudo isso, o mundo financeiro também controlaria Trump. Ele é sensível ao mercado de ações, inclusive atribuindo sua boa performance no início deste ano às expectativas de sua vitória. Se as ações caíssem ou os rendimentos aumentassem quando Trump atacasse seu último alvo - seja o Fed, os imigrantes ou o comércio exterior - isso chamaria sua atenção.

Não se trata de ser otimista com relação ao domínio de Trump sobre a política americana. Há um risco de que seu segundo mandato saia do controle. Os freios para seus excessos não são automáticos e seria necessário que as pessoas fossem contra ele no Partido Republicano, nos tribunais e na sociedade em geral. Mas isso deve acontecer, o que manteria o pior da Trumponomics sob controle. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Nos mercados, isso é conhecido como “Trump trade”, uma aposta de que o retorno de Donald Trump à Casa Branca traria mais inflação e taxas de juros mais altas. Muitas das principais políticas de Trump apontam nessa direção: as tarifas aumentariam os custos de importação, as deportações de imigrantes poderiam aumentar os salários e os cortes de impostos financiados pelo déficit estimulariam a economia. Em meio a uma inflação crescente, o Federal Reserve teria pouca escolha a não ser optar por taxas mais altas.

Na esteira da calamidade que foi o desempenho de Joe Biden no debate com Trump em 27 de junho, houve uma prévia desse fenômeno. À medida que os investidores se deparavam com a probabilidade de que Trump chegasse à presidência, eles venderam títulos do Tesouro, o que levou a um breve aumento nos rendimentos. O grande temor é que algo muito pior possa acontecer. Se Trump brigasse com o Fed em relação às taxas, ele poderia semear dúvidas sobre a independência do Banco Central, minando a confiança nos mercados americanos e no dólar. Esse é o cenário de pesadelo econômico para um segundo governo Trump.

Mas, como em qualquer pesadelo, o bicho-papão do Trumponomics pode ser mais terrível do que a realidade. Trump e seus assessores têm muitas ideias temerárias. Eles também têm algumas ideias decentes. E sua capacidade de implementar políticas prejudiciais será limitada, com o Congresso, as instituições e os mercados dos EUA servindo de controle.

Trump aprimorou sua agenda em discursos e entrevistas e, em 8 de julho, ela foi consagrada pelos republicanos como a plataforma eleitoral do partido. Três elementos se destacam. O primeiro é a desregulamentação, um elemento básico para os republicanos. Em contraste com 2017, quando ele e seus assessores estavam mal preparados para a presidência, desta vez eles alinharam pessoal e políticas. Trump não perderá muito tempo para rescindir muitas das regras ambientais do governo Biden, flexibilizando as restrições de perfuração para as empresas de petróleo e pressionando os órgãos federais a cortar gastos. Ele prometeu, como em sua primeira presidência, eliminar duas regulamentações para cada uma emitida.

Donald Trump será o candidato do Partido Republicano para as eleições nos Estados Unidos e tem boas chances de ser eleito Foto: Rebecca Blackwell/AP

Mas grande parte disso é marketing. O número de restrições no Código de Regulamentações Federais, um indicador da intensidade da regulamentação nos Estados Unidos, permaneceu basicamente inalterado durante o governo de Trump. Além disso, seu governo foi impedido de fazer mais pelos tribunais. Ele não obteve sucesso em quase 80% dos litígios sobre o uso de agências federais, de acordo com o Institute for Policy Integrity, um grupo de pesquisa. O banco Goldman Sachs avalia que o impacto de toda a desregulamentação do primeiro governo Trump foi, em última análise, insignificante para a economia em geral - um resultado que provavelmente se repetirá.

Com relação aos impostos, Trump pode, de certa forma, ser visto como um candidato de continuidade. A ação se concentrará na iminente expiração de grande parte do Tax Cuts and Jobs Act (TCJA), o pacote de Trump de 2017. A redução dos impostos corporativos da TCJA era permanente, mas grande parte do restante da lei, incluindo cortes no imposto de renda de pessoas físicas, expirará no final de 2025. O principal objetivo de Trump é tornar esses cortes permanentes.

Isso não será simples porque, para aprovar o projeto de lei no Congresso, os republicanos precisarão pagar o custo da prorrogação dos cortes, cerca de US$ 4,5 trilhões na próxima década. Mas Trump tem opções. Uma parte da receita pode vir das tarifas, que podem gerar US$ 3 trilhões ao longo da década. Também há dinheiro para reverter algumas das políticas de Joe Biden.

Espera-se que o custo da Lei de Redução da Inflação, o pacote de subsídios climáticos de Biden, chegue a cerca de US$ 1 trilhão. Os republicanos podem eliminar alguns créditos fiscais, começando com descontos para veículos elétricos. Trump também sugeriu que pode desfazer os cancelamentos de dívidas estudantis de Biden, que devem custar US$ 1 trilhão.

As outras ideias de impostos de Trump são mais modestas. Ele falou em cortar um ponto porcentual da alíquota do imposto corporativo, para reduzi-la para 20% (ele gosta de números redondos). Sua proposta mais ousada é tornar a gorjeta isenta de impostos. Os legisladores teriam que elaborar essa isenção com cuidado, caso contrário, todos poderiam exigir pagamentos como gratificações.

Sem compensar a receita ou os cortes de gastos, todo corte de impostos piorará o déficit dos Estados Unidos, um risco para Trump. Mas não que Biden tenha sido um modelo de retidão fiscal: o déficit federal está a caminho de atingir um alto índice de 7% do PIB este ano.

O homem das tarifas, parte dois

A estratégia econômica pela qual Trump é mais famoso, especialmente fora dos Estados Unidos, é seu protecionismo. Ele tem sido claro sobre o que pretende fazer, almejando uma tarifa universal de 10% sobre todas as importações para os Estados Unidos e uma taxa de 60% sobre os produtos fabricados na China. Ele também quer um afastamento maior da China.

Não há dúvidas sobre as consequências globais se Trump cumprir sua panóplia de políticas comerciais “America-first”. Ele seria capaz de fazer isso? Na ala tradicional do Partido Republicano, ainda há resistência às tarifas. Se Trump decidir tirar o Congresso da jogada, ele poderá declarar uma emergência de segurança nacional, o que lhe daria poderes especiais. Isso, no entanto, pode ser derrubado nos tribunais.

Tarifas mais altas sobre a China seriam mais viáveis, uma vez que a Casa Branca poderia pegar carona em medidas existentes. Ela poderia, por exemplo, concluir que a China não cumpriu um acordo assinado com Trump em 2020, o que seria fácil de demonstrar. A repressão ao redirecionamento das exportações chinesas por meio de outros países seria mais difícil sem a cooperação de governos estrangeiros, o que Trump teve dificuldade em obter no passado.

Além disso, mesmo dentro da Casa Branca de Trump, é bem possível que haja oposição às suas políticas comerciais mais agressivas. Falcões como Peter Navarro, um consultor econômico, têm sido os mais volúveis, mas Trump gosta de montar uma equipe com rivais, permitindo que ele julgue entre opiniões contrastantes. É possível que ele nomeie novamente um veterano de Wall Street como seu secretário do Tesouro, e essa figura seria um contrapeso para os protecionistas incendiários.

A agenda de Trump enfrentará outros obstáculos. Ele quer começar com o pé direito, mas seu primeiro ano no cargo apresenta um calendário legislativo denso. O teto da dívida será restabelecido em 2 de janeiro, forçando a Casa Branca a entrar em negociações com o Congresso. Outro prazo se aproxima no final de abril, quando o Congresso terá de fazer cortes drásticos se não tiver elaborado um novo orçamento. Durante todo esse tempo, o relógio estará correndo para os cortes de impostos de Trump. Se os democratas conseguirem ganhar a Câmara, todas essas negociações serão muito mais difíceis.

Trump fará ainda menos progressos na reformulação do Fed. Os investidores temem que ele queira influenciar as decisões sobre as taxas do Banco Central. No entanto, é difícil colocar esse desejo em prática. Sua primeira chance de nomear um novo presidente do FED será em 2026, quando ele poderá nomear um substituto para Jerome Powell. Porém, a diretoria do Fed é composta por sete membros e todas as indicações devem passar pelo Senado, que anteriormente bloqueou dois dos quatro indicados por Trump. Se ele tentasse demitir Powell, as pessoas de dentro do Fed acham que ele teria em mãos outra briga legal impossível de ser vencida.

Talvez o maior dano de curto prazo que Trump possa infligir à economia dos Estados Unidos seja por meio de sua política de imigração. Impedir “a invasão”, como ele a chama, consumirá seu governo. Os milhões de pessoas que entraram no país nos últimos anos foram vitais para sustentar o crescimento econômico e controlar a inflação.

A interrupção da migração seria um choque para o mercado de trabalho. No entanto, como acontece com outras políticas trumpistas, haverá resistência a cada passo do caminho, com os tribunais derrubando as ordens de deportação, os Estados democratas se recusando a cooperar e as empresas fazendo lobby para evitar essa mão-de-ferro.

Em meio a tudo isso, o mundo financeiro também controlaria Trump. Ele é sensível ao mercado de ações, inclusive atribuindo sua boa performance no início deste ano às expectativas de sua vitória. Se as ações caíssem ou os rendimentos aumentassem quando Trump atacasse seu último alvo - seja o Fed, os imigrantes ou o comércio exterior - isso chamaria sua atenção.

Não se trata de ser otimista com relação ao domínio de Trump sobre a política americana. Há um risco de que seu segundo mandato saia do controle. Os freios para seus excessos não são automáticos e seria necessário que as pessoas fossem contra ele no Partido Republicano, nos tribunais e na sociedade em geral. Mas isso deve acontecer, o que manteria o pior da Trumponomics sob controle. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Nos mercados, isso é conhecido como “Trump trade”, uma aposta de que o retorno de Donald Trump à Casa Branca traria mais inflação e taxas de juros mais altas. Muitas das principais políticas de Trump apontam nessa direção: as tarifas aumentariam os custos de importação, as deportações de imigrantes poderiam aumentar os salários e os cortes de impostos financiados pelo déficit estimulariam a economia. Em meio a uma inflação crescente, o Federal Reserve teria pouca escolha a não ser optar por taxas mais altas.

Na esteira da calamidade que foi o desempenho de Joe Biden no debate com Trump em 27 de junho, houve uma prévia desse fenômeno. À medida que os investidores se deparavam com a probabilidade de que Trump chegasse à presidência, eles venderam títulos do Tesouro, o que levou a um breve aumento nos rendimentos. O grande temor é que algo muito pior possa acontecer. Se Trump brigasse com o Fed em relação às taxas, ele poderia semear dúvidas sobre a independência do Banco Central, minando a confiança nos mercados americanos e no dólar. Esse é o cenário de pesadelo econômico para um segundo governo Trump.

Mas, como em qualquer pesadelo, o bicho-papão do Trumponomics pode ser mais terrível do que a realidade. Trump e seus assessores têm muitas ideias temerárias. Eles também têm algumas ideias decentes. E sua capacidade de implementar políticas prejudiciais será limitada, com o Congresso, as instituições e os mercados dos EUA servindo de controle.

Trump aprimorou sua agenda em discursos e entrevistas e, em 8 de julho, ela foi consagrada pelos republicanos como a plataforma eleitoral do partido. Três elementos se destacam. O primeiro é a desregulamentação, um elemento básico para os republicanos. Em contraste com 2017, quando ele e seus assessores estavam mal preparados para a presidência, desta vez eles alinharam pessoal e políticas. Trump não perderá muito tempo para rescindir muitas das regras ambientais do governo Biden, flexibilizando as restrições de perfuração para as empresas de petróleo e pressionando os órgãos federais a cortar gastos. Ele prometeu, como em sua primeira presidência, eliminar duas regulamentações para cada uma emitida.

Donald Trump será o candidato do Partido Republicano para as eleições nos Estados Unidos e tem boas chances de ser eleito Foto: Rebecca Blackwell/AP

Mas grande parte disso é marketing. O número de restrições no Código de Regulamentações Federais, um indicador da intensidade da regulamentação nos Estados Unidos, permaneceu basicamente inalterado durante o governo de Trump. Além disso, seu governo foi impedido de fazer mais pelos tribunais. Ele não obteve sucesso em quase 80% dos litígios sobre o uso de agências federais, de acordo com o Institute for Policy Integrity, um grupo de pesquisa. O banco Goldman Sachs avalia que o impacto de toda a desregulamentação do primeiro governo Trump foi, em última análise, insignificante para a economia em geral - um resultado que provavelmente se repetirá.

Com relação aos impostos, Trump pode, de certa forma, ser visto como um candidato de continuidade. A ação se concentrará na iminente expiração de grande parte do Tax Cuts and Jobs Act (TCJA), o pacote de Trump de 2017. A redução dos impostos corporativos da TCJA era permanente, mas grande parte do restante da lei, incluindo cortes no imposto de renda de pessoas físicas, expirará no final de 2025. O principal objetivo de Trump é tornar esses cortes permanentes.

Isso não será simples porque, para aprovar o projeto de lei no Congresso, os republicanos precisarão pagar o custo da prorrogação dos cortes, cerca de US$ 4,5 trilhões na próxima década. Mas Trump tem opções. Uma parte da receita pode vir das tarifas, que podem gerar US$ 3 trilhões ao longo da década. Também há dinheiro para reverter algumas das políticas de Joe Biden.

Espera-se que o custo da Lei de Redução da Inflação, o pacote de subsídios climáticos de Biden, chegue a cerca de US$ 1 trilhão. Os republicanos podem eliminar alguns créditos fiscais, começando com descontos para veículos elétricos. Trump também sugeriu que pode desfazer os cancelamentos de dívidas estudantis de Biden, que devem custar US$ 1 trilhão.

As outras ideias de impostos de Trump são mais modestas. Ele falou em cortar um ponto porcentual da alíquota do imposto corporativo, para reduzi-la para 20% (ele gosta de números redondos). Sua proposta mais ousada é tornar a gorjeta isenta de impostos. Os legisladores teriam que elaborar essa isenção com cuidado, caso contrário, todos poderiam exigir pagamentos como gratificações.

Sem compensar a receita ou os cortes de gastos, todo corte de impostos piorará o déficit dos Estados Unidos, um risco para Trump. Mas não que Biden tenha sido um modelo de retidão fiscal: o déficit federal está a caminho de atingir um alto índice de 7% do PIB este ano.

O homem das tarifas, parte dois

A estratégia econômica pela qual Trump é mais famoso, especialmente fora dos Estados Unidos, é seu protecionismo. Ele tem sido claro sobre o que pretende fazer, almejando uma tarifa universal de 10% sobre todas as importações para os Estados Unidos e uma taxa de 60% sobre os produtos fabricados na China. Ele também quer um afastamento maior da China.

Não há dúvidas sobre as consequências globais se Trump cumprir sua panóplia de políticas comerciais “America-first”. Ele seria capaz de fazer isso? Na ala tradicional do Partido Republicano, ainda há resistência às tarifas. Se Trump decidir tirar o Congresso da jogada, ele poderá declarar uma emergência de segurança nacional, o que lhe daria poderes especiais. Isso, no entanto, pode ser derrubado nos tribunais.

Tarifas mais altas sobre a China seriam mais viáveis, uma vez que a Casa Branca poderia pegar carona em medidas existentes. Ela poderia, por exemplo, concluir que a China não cumpriu um acordo assinado com Trump em 2020, o que seria fácil de demonstrar. A repressão ao redirecionamento das exportações chinesas por meio de outros países seria mais difícil sem a cooperação de governos estrangeiros, o que Trump teve dificuldade em obter no passado.

Além disso, mesmo dentro da Casa Branca de Trump, é bem possível que haja oposição às suas políticas comerciais mais agressivas. Falcões como Peter Navarro, um consultor econômico, têm sido os mais volúveis, mas Trump gosta de montar uma equipe com rivais, permitindo que ele julgue entre opiniões contrastantes. É possível que ele nomeie novamente um veterano de Wall Street como seu secretário do Tesouro, e essa figura seria um contrapeso para os protecionistas incendiários.

A agenda de Trump enfrentará outros obstáculos. Ele quer começar com o pé direito, mas seu primeiro ano no cargo apresenta um calendário legislativo denso. O teto da dívida será restabelecido em 2 de janeiro, forçando a Casa Branca a entrar em negociações com o Congresso. Outro prazo se aproxima no final de abril, quando o Congresso terá de fazer cortes drásticos se não tiver elaborado um novo orçamento. Durante todo esse tempo, o relógio estará correndo para os cortes de impostos de Trump. Se os democratas conseguirem ganhar a Câmara, todas essas negociações serão muito mais difíceis.

Trump fará ainda menos progressos na reformulação do Fed. Os investidores temem que ele queira influenciar as decisões sobre as taxas do Banco Central. No entanto, é difícil colocar esse desejo em prática. Sua primeira chance de nomear um novo presidente do FED será em 2026, quando ele poderá nomear um substituto para Jerome Powell. Porém, a diretoria do Fed é composta por sete membros e todas as indicações devem passar pelo Senado, que anteriormente bloqueou dois dos quatro indicados por Trump. Se ele tentasse demitir Powell, as pessoas de dentro do Fed acham que ele teria em mãos outra briga legal impossível de ser vencida.

Talvez o maior dano de curto prazo que Trump possa infligir à economia dos Estados Unidos seja por meio de sua política de imigração. Impedir “a invasão”, como ele a chama, consumirá seu governo. Os milhões de pessoas que entraram no país nos últimos anos foram vitais para sustentar o crescimento econômico e controlar a inflação.

A interrupção da migração seria um choque para o mercado de trabalho. No entanto, como acontece com outras políticas trumpistas, haverá resistência a cada passo do caminho, com os tribunais derrubando as ordens de deportação, os Estados democratas se recusando a cooperar e as empresas fazendo lobby para evitar essa mão-de-ferro.

Em meio a tudo isso, o mundo financeiro também controlaria Trump. Ele é sensível ao mercado de ações, inclusive atribuindo sua boa performance no início deste ano às expectativas de sua vitória. Se as ações caíssem ou os rendimentos aumentassem quando Trump atacasse seu último alvo - seja o Fed, os imigrantes ou o comércio exterior - isso chamaria sua atenção.

Não se trata de ser otimista com relação ao domínio de Trump sobre a política americana. Há um risco de que seu segundo mandato saia do controle. Os freios para seus excessos não são automáticos e seria necessário que as pessoas fossem contra ele no Partido Republicano, nos tribunais e na sociedade em geral. Mas isso deve acontecer, o que manteria o pior da Trumponomics sob controle. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Nos mercados, isso é conhecido como “Trump trade”, uma aposta de que o retorno de Donald Trump à Casa Branca traria mais inflação e taxas de juros mais altas. Muitas das principais políticas de Trump apontam nessa direção: as tarifas aumentariam os custos de importação, as deportações de imigrantes poderiam aumentar os salários e os cortes de impostos financiados pelo déficit estimulariam a economia. Em meio a uma inflação crescente, o Federal Reserve teria pouca escolha a não ser optar por taxas mais altas.

Na esteira da calamidade que foi o desempenho de Joe Biden no debate com Trump em 27 de junho, houve uma prévia desse fenômeno. À medida que os investidores se deparavam com a probabilidade de que Trump chegasse à presidência, eles venderam títulos do Tesouro, o que levou a um breve aumento nos rendimentos. O grande temor é que algo muito pior possa acontecer. Se Trump brigasse com o Fed em relação às taxas, ele poderia semear dúvidas sobre a independência do Banco Central, minando a confiança nos mercados americanos e no dólar. Esse é o cenário de pesadelo econômico para um segundo governo Trump.

Mas, como em qualquer pesadelo, o bicho-papão do Trumponomics pode ser mais terrível do que a realidade. Trump e seus assessores têm muitas ideias temerárias. Eles também têm algumas ideias decentes. E sua capacidade de implementar políticas prejudiciais será limitada, com o Congresso, as instituições e os mercados dos EUA servindo de controle.

Trump aprimorou sua agenda em discursos e entrevistas e, em 8 de julho, ela foi consagrada pelos republicanos como a plataforma eleitoral do partido. Três elementos se destacam. O primeiro é a desregulamentação, um elemento básico para os republicanos. Em contraste com 2017, quando ele e seus assessores estavam mal preparados para a presidência, desta vez eles alinharam pessoal e políticas. Trump não perderá muito tempo para rescindir muitas das regras ambientais do governo Biden, flexibilizando as restrições de perfuração para as empresas de petróleo e pressionando os órgãos federais a cortar gastos. Ele prometeu, como em sua primeira presidência, eliminar duas regulamentações para cada uma emitida.

Donald Trump será o candidato do Partido Republicano para as eleições nos Estados Unidos e tem boas chances de ser eleito Foto: Rebecca Blackwell/AP

Mas grande parte disso é marketing. O número de restrições no Código de Regulamentações Federais, um indicador da intensidade da regulamentação nos Estados Unidos, permaneceu basicamente inalterado durante o governo de Trump. Além disso, seu governo foi impedido de fazer mais pelos tribunais. Ele não obteve sucesso em quase 80% dos litígios sobre o uso de agências federais, de acordo com o Institute for Policy Integrity, um grupo de pesquisa. O banco Goldman Sachs avalia que o impacto de toda a desregulamentação do primeiro governo Trump foi, em última análise, insignificante para a economia em geral - um resultado que provavelmente se repetirá.

Com relação aos impostos, Trump pode, de certa forma, ser visto como um candidato de continuidade. A ação se concentrará na iminente expiração de grande parte do Tax Cuts and Jobs Act (TCJA), o pacote de Trump de 2017. A redução dos impostos corporativos da TCJA era permanente, mas grande parte do restante da lei, incluindo cortes no imposto de renda de pessoas físicas, expirará no final de 2025. O principal objetivo de Trump é tornar esses cortes permanentes.

Isso não será simples porque, para aprovar o projeto de lei no Congresso, os republicanos precisarão pagar o custo da prorrogação dos cortes, cerca de US$ 4,5 trilhões na próxima década. Mas Trump tem opções. Uma parte da receita pode vir das tarifas, que podem gerar US$ 3 trilhões ao longo da década. Também há dinheiro para reverter algumas das políticas de Joe Biden.

Espera-se que o custo da Lei de Redução da Inflação, o pacote de subsídios climáticos de Biden, chegue a cerca de US$ 1 trilhão. Os republicanos podem eliminar alguns créditos fiscais, começando com descontos para veículos elétricos. Trump também sugeriu que pode desfazer os cancelamentos de dívidas estudantis de Biden, que devem custar US$ 1 trilhão.

As outras ideias de impostos de Trump são mais modestas. Ele falou em cortar um ponto porcentual da alíquota do imposto corporativo, para reduzi-la para 20% (ele gosta de números redondos). Sua proposta mais ousada é tornar a gorjeta isenta de impostos. Os legisladores teriam que elaborar essa isenção com cuidado, caso contrário, todos poderiam exigir pagamentos como gratificações.

Sem compensar a receita ou os cortes de gastos, todo corte de impostos piorará o déficit dos Estados Unidos, um risco para Trump. Mas não que Biden tenha sido um modelo de retidão fiscal: o déficit federal está a caminho de atingir um alto índice de 7% do PIB este ano.

O homem das tarifas, parte dois

A estratégia econômica pela qual Trump é mais famoso, especialmente fora dos Estados Unidos, é seu protecionismo. Ele tem sido claro sobre o que pretende fazer, almejando uma tarifa universal de 10% sobre todas as importações para os Estados Unidos e uma taxa de 60% sobre os produtos fabricados na China. Ele também quer um afastamento maior da China.

Não há dúvidas sobre as consequências globais se Trump cumprir sua panóplia de políticas comerciais “America-first”. Ele seria capaz de fazer isso? Na ala tradicional do Partido Republicano, ainda há resistência às tarifas. Se Trump decidir tirar o Congresso da jogada, ele poderá declarar uma emergência de segurança nacional, o que lhe daria poderes especiais. Isso, no entanto, pode ser derrubado nos tribunais.

Tarifas mais altas sobre a China seriam mais viáveis, uma vez que a Casa Branca poderia pegar carona em medidas existentes. Ela poderia, por exemplo, concluir que a China não cumpriu um acordo assinado com Trump em 2020, o que seria fácil de demonstrar. A repressão ao redirecionamento das exportações chinesas por meio de outros países seria mais difícil sem a cooperação de governos estrangeiros, o que Trump teve dificuldade em obter no passado.

Além disso, mesmo dentro da Casa Branca de Trump, é bem possível que haja oposição às suas políticas comerciais mais agressivas. Falcões como Peter Navarro, um consultor econômico, têm sido os mais volúveis, mas Trump gosta de montar uma equipe com rivais, permitindo que ele julgue entre opiniões contrastantes. É possível que ele nomeie novamente um veterano de Wall Street como seu secretário do Tesouro, e essa figura seria um contrapeso para os protecionistas incendiários.

A agenda de Trump enfrentará outros obstáculos. Ele quer começar com o pé direito, mas seu primeiro ano no cargo apresenta um calendário legislativo denso. O teto da dívida será restabelecido em 2 de janeiro, forçando a Casa Branca a entrar em negociações com o Congresso. Outro prazo se aproxima no final de abril, quando o Congresso terá de fazer cortes drásticos se não tiver elaborado um novo orçamento. Durante todo esse tempo, o relógio estará correndo para os cortes de impostos de Trump. Se os democratas conseguirem ganhar a Câmara, todas essas negociações serão muito mais difíceis.

Trump fará ainda menos progressos na reformulação do Fed. Os investidores temem que ele queira influenciar as decisões sobre as taxas do Banco Central. No entanto, é difícil colocar esse desejo em prática. Sua primeira chance de nomear um novo presidente do FED será em 2026, quando ele poderá nomear um substituto para Jerome Powell. Porém, a diretoria do Fed é composta por sete membros e todas as indicações devem passar pelo Senado, que anteriormente bloqueou dois dos quatro indicados por Trump. Se ele tentasse demitir Powell, as pessoas de dentro do Fed acham que ele teria em mãos outra briga legal impossível de ser vencida.

Talvez o maior dano de curto prazo que Trump possa infligir à economia dos Estados Unidos seja por meio de sua política de imigração. Impedir “a invasão”, como ele a chama, consumirá seu governo. Os milhões de pessoas que entraram no país nos últimos anos foram vitais para sustentar o crescimento econômico e controlar a inflação.

A interrupção da migração seria um choque para o mercado de trabalho. No entanto, como acontece com outras políticas trumpistas, haverá resistência a cada passo do caminho, com os tribunais derrubando as ordens de deportação, os Estados democratas se recusando a cooperar e as empresas fazendo lobby para evitar essa mão-de-ferro.

Em meio a tudo isso, o mundo financeiro também controlaria Trump. Ele é sensível ao mercado de ações, inclusive atribuindo sua boa performance no início deste ano às expectativas de sua vitória. Se as ações caíssem ou os rendimentos aumentassem quando Trump atacasse seu último alvo - seja o Fed, os imigrantes ou o comércio exterior - isso chamaria sua atenção.

Não se trata de ser otimista com relação ao domínio de Trump sobre a política americana. Há um risco de que seu segundo mandato saia do controle. Os freios para seus excessos não são automáticos e seria necessário que as pessoas fossem contra ele no Partido Republicano, nos tribunais e na sociedade em geral. Mas isso deve acontecer, o que manteria o pior da Trumponomics sob controle. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Nos mercados, isso é conhecido como “Trump trade”, uma aposta de que o retorno de Donald Trump à Casa Branca traria mais inflação e taxas de juros mais altas. Muitas das principais políticas de Trump apontam nessa direção: as tarifas aumentariam os custos de importação, as deportações de imigrantes poderiam aumentar os salários e os cortes de impostos financiados pelo déficit estimulariam a economia. Em meio a uma inflação crescente, o Federal Reserve teria pouca escolha a não ser optar por taxas mais altas.

Na esteira da calamidade que foi o desempenho de Joe Biden no debate com Trump em 27 de junho, houve uma prévia desse fenômeno. À medida que os investidores se deparavam com a probabilidade de que Trump chegasse à presidência, eles venderam títulos do Tesouro, o que levou a um breve aumento nos rendimentos. O grande temor é que algo muito pior possa acontecer. Se Trump brigasse com o Fed em relação às taxas, ele poderia semear dúvidas sobre a independência do Banco Central, minando a confiança nos mercados americanos e no dólar. Esse é o cenário de pesadelo econômico para um segundo governo Trump.

Mas, como em qualquer pesadelo, o bicho-papão do Trumponomics pode ser mais terrível do que a realidade. Trump e seus assessores têm muitas ideias temerárias. Eles também têm algumas ideias decentes. E sua capacidade de implementar políticas prejudiciais será limitada, com o Congresso, as instituições e os mercados dos EUA servindo de controle.

Trump aprimorou sua agenda em discursos e entrevistas e, em 8 de julho, ela foi consagrada pelos republicanos como a plataforma eleitoral do partido. Três elementos se destacam. O primeiro é a desregulamentação, um elemento básico para os republicanos. Em contraste com 2017, quando ele e seus assessores estavam mal preparados para a presidência, desta vez eles alinharam pessoal e políticas. Trump não perderá muito tempo para rescindir muitas das regras ambientais do governo Biden, flexibilizando as restrições de perfuração para as empresas de petróleo e pressionando os órgãos federais a cortar gastos. Ele prometeu, como em sua primeira presidência, eliminar duas regulamentações para cada uma emitida.

Donald Trump será o candidato do Partido Republicano para as eleições nos Estados Unidos e tem boas chances de ser eleito Foto: Rebecca Blackwell/AP

Mas grande parte disso é marketing. O número de restrições no Código de Regulamentações Federais, um indicador da intensidade da regulamentação nos Estados Unidos, permaneceu basicamente inalterado durante o governo de Trump. Além disso, seu governo foi impedido de fazer mais pelos tribunais. Ele não obteve sucesso em quase 80% dos litígios sobre o uso de agências federais, de acordo com o Institute for Policy Integrity, um grupo de pesquisa. O banco Goldman Sachs avalia que o impacto de toda a desregulamentação do primeiro governo Trump foi, em última análise, insignificante para a economia em geral - um resultado que provavelmente se repetirá.

Com relação aos impostos, Trump pode, de certa forma, ser visto como um candidato de continuidade. A ação se concentrará na iminente expiração de grande parte do Tax Cuts and Jobs Act (TCJA), o pacote de Trump de 2017. A redução dos impostos corporativos da TCJA era permanente, mas grande parte do restante da lei, incluindo cortes no imposto de renda de pessoas físicas, expirará no final de 2025. O principal objetivo de Trump é tornar esses cortes permanentes.

Isso não será simples porque, para aprovar o projeto de lei no Congresso, os republicanos precisarão pagar o custo da prorrogação dos cortes, cerca de US$ 4,5 trilhões na próxima década. Mas Trump tem opções. Uma parte da receita pode vir das tarifas, que podem gerar US$ 3 trilhões ao longo da década. Também há dinheiro para reverter algumas das políticas de Joe Biden.

Espera-se que o custo da Lei de Redução da Inflação, o pacote de subsídios climáticos de Biden, chegue a cerca de US$ 1 trilhão. Os republicanos podem eliminar alguns créditos fiscais, começando com descontos para veículos elétricos. Trump também sugeriu que pode desfazer os cancelamentos de dívidas estudantis de Biden, que devem custar US$ 1 trilhão.

As outras ideias de impostos de Trump são mais modestas. Ele falou em cortar um ponto porcentual da alíquota do imposto corporativo, para reduzi-la para 20% (ele gosta de números redondos). Sua proposta mais ousada é tornar a gorjeta isenta de impostos. Os legisladores teriam que elaborar essa isenção com cuidado, caso contrário, todos poderiam exigir pagamentos como gratificações.

Sem compensar a receita ou os cortes de gastos, todo corte de impostos piorará o déficit dos Estados Unidos, um risco para Trump. Mas não que Biden tenha sido um modelo de retidão fiscal: o déficit federal está a caminho de atingir um alto índice de 7% do PIB este ano.

O homem das tarifas, parte dois

A estratégia econômica pela qual Trump é mais famoso, especialmente fora dos Estados Unidos, é seu protecionismo. Ele tem sido claro sobre o que pretende fazer, almejando uma tarifa universal de 10% sobre todas as importações para os Estados Unidos e uma taxa de 60% sobre os produtos fabricados na China. Ele também quer um afastamento maior da China.

Não há dúvidas sobre as consequências globais se Trump cumprir sua panóplia de políticas comerciais “America-first”. Ele seria capaz de fazer isso? Na ala tradicional do Partido Republicano, ainda há resistência às tarifas. Se Trump decidir tirar o Congresso da jogada, ele poderá declarar uma emergência de segurança nacional, o que lhe daria poderes especiais. Isso, no entanto, pode ser derrubado nos tribunais.

Tarifas mais altas sobre a China seriam mais viáveis, uma vez que a Casa Branca poderia pegar carona em medidas existentes. Ela poderia, por exemplo, concluir que a China não cumpriu um acordo assinado com Trump em 2020, o que seria fácil de demonstrar. A repressão ao redirecionamento das exportações chinesas por meio de outros países seria mais difícil sem a cooperação de governos estrangeiros, o que Trump teve dificuldade em obter no passado.

Além disso, mesmo dentro da Casa Branca de Trump, é bem possível que haja oposição às suas políticas comerciais mais agressivas. Falcões como Peter Navarro, um consultor econômico, têm sido os mais volúveis, mas Trump gosta de montar uma equipe com rivais, permitindo que ele julgue entre opiniões contrastantes. É possível que ele nomeie novamente um veterano de Wall Street como seu secretário do Tesouro, e essa figura seria um contrapeso para os protecionistas incendiários.

A agenda de Trump enfrentará outros obstáculos. Ele quer começar com o pé direito, mas seu primeiro ano no cargo apresenta um calendário legislativo denso. O teto da dívida será restabelecido em 2 de janeiro, forçando a Casa Branca a entrar em negociações com o Congresso. Outro prazo se aproxima no final de abril, quando o Congresso terá de fazer cortes drásticos se não tiver elaborado um novo orçamento. Durante todo esse tempo, o relógio estará correndo para os cortes de impostos de Trump. Se os democratas conseguirem ganhar a Câmara, todas essas negociações serão muito mais difíceis.

Trump fará ainda menos progressos na reformulação do Fed. Os investidores temem que ele queira influenciar as decisões sobre as taxas do Banco Central. No entanto, é difícil colocar esse desejo em prática. Sua primeira chance de nomear um novo presidente do FED será em 2026, quando ele poderá nomear um substituto para Jerome Powell. Porém, a diretoria do Fed é composta por sete membros e todas as indicações devem passar pelo Senado, que anteriormente bloqueou dois dos quatro indicados por Trump. Se ele tentasse demitir Powell, as pessoas de dentro do Fed acham que ele teria em mãos outra briga legal impossível de ser vencida.

Talvez o maior dano de curto prazo que Trump possa infligir à economia dos Estados Unidos seja por meio de sua política de imigração. Impedir “a invasão”, como ele a chama, consumirá seu governo. Os milhões de pessoas que entraram no país nos últimos anos foram vitais para sustentar o crescimento econômico e controlar a inflação.

A interrupção da migração seria um choque para o mercado de trabalho. No entanto, como acontece com outras políticas trumpistas, haverá resistência a cada passo do caminho, com os tribunais derrubando as ordens de deportação, os Estados democratas se recusando a cooperar e as empresas fazendo lobby para evitar essa mão-de-ferro.

Em meio a tudo isso, o mundo financeiro também controlaria Trump. Ele é sensível ao mercado de ações, inclusive atribuindo sua boa performance no início deste ano às expectativas de sua vitória. Se as ações caíssem ou os rendimentos aumentassem quando Trump atacasse seu último alvo - seja o Fed, os imigrantes ou o comércio exterior - isso chamaria sua atenção.

Não se trata de ser otimista com relação ao domínio de Trump sobre a política americana. Há um risco de que seu segundo mandato saia do controle. Os freios para seus excessos não são automáticos e seria necessário que as pessoas fossem contra ele no Partido Republicano, nos tribunais e na sociedade em geral. Mas isso deve acontecer, o que manteria o pior da Trumponomics sob controle. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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