Com experiência de compra de veículos em leilões, o empresário Antônio Miranda, 51, se aventurou no início deste ano na empreitada de comprar uma casa por esse instrumento. A procura pelo sobrado em Santo André, na região metropolitana de São Paulo, foi feita via internet, assim como o lance que levou ao arremate. “O que me levou a comprar em leilão foi o preço abaixo do valor de mercado. Arrematei um imóvel por R$ 315 mil e agora ele vale R$ 600 mil”, diz Miranda.
Poucos meses depois da aquisição, o imóvel foi liberado. A casa precisou de pintura e consertos no encanamento, mas não foi preciso fazer nenhuma grande reforma nem pagar dívidas da propriedade. “O valor do arremate já pagou todas as dívidas do imóvel, não tive de pagar mais débitos”, diz o empresário.
O caso de Miranda tem se tornado mais comum no Brasil diante da elevada taxa de juros nos últimos anos, que levou ao encarecimento do crédito para financiamento imobiliário.
A aquisição de imóveis por leilão pode parecer uma oportunidade atraente, principalmente pela perspectiva de se adquirir propriedades por valores mais baixos - os descontos sobre o preço normal dos imóveis pode ser de 60% ou até 70%. Contudo, é um processo que exige cautela, pesquisa e preparo para não se transformar em uma grande dor de cabeça.
Se no passado os leilões eram presenciais, hoje em dia a grande maioria acontece via internet. As plataformas que revendem, por exemplo, os imóveis que foram tomados pelos bancos e instituições financeiras por inadimplência são mantidas por empresas como Zuk, Leilão VIP, Resale, BomValor e Sodré Santoro.
Quando uma casa ou apartamento que vai a leilão por inadimplência no pagamento do financiamento imobiliário, o valor obtido na venda é usado para quitar os débitos vinculados ao imóvel, tanto o crédito bancário pendente quanto outras despesas, como condomínio e IPTU. Por isso, o valor mínimo anunciado em um leilão é abaixo do valor de mercado da propriedade.
Dívidas do imóvel, como o condomínio de um apartamento, podem levá-lo a leilão. Além disso, os imóveis também podem ser vendidos via leilão por empresas ou mesmo pessoas físicas. Basta procurar uma plataforma para fazer isso.
Valor da dívida
André Zukerman, CEO da Zuk, uma das maiores empresas do ramo, diz que os maiores descontos, que podem chegar a até 70%, normalmente são em imóveis tomados pelos bancos, que são oferecidos pelo valor da dívida, seguidos pelos imóveis leiloados por dívidas de condomínio, que têm desconto médio de 40% sobre o valor de avaliação.
“Sempre é bacana entrar em um leilão porque há muitas oportunidades de imóveis com preços abaixo do mercado. Se um imóvel vale R$ 100 mil, ele entra no leilão valendo menos. Quem compra um imóvel de leilão para morar faz um bom negócio. No arremate, o valor médio do desconto é entre 20% e 25%”, diz.
No primeiro semestre deste ano, a Zuk promoveu mais de 4 mil lotes, entre casas, apartamentos, terrenos e imóveis comerciais. Segundo Zukerman, a principal fonte de receita da companhia é o percentual do valor do arremate cobrado pela intermediação, que é tipicamente de 5%.
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Com cerca de 80 leilões mensais, a Sodré Santoro é responsável pela intermediação de venda de imóveis, carros, joias, aparelhos de informática e até marcas, como no caso da venda do espólio da Daslu. Leiloeiro oficial da Sodré Santoro, Moacir Di Santi conta que, de modo geral, para os estreantes no universo dos leilões, o mais importante é buscar o máximo de informações antes de fechar o negócio. Ele lembra que um leilão precisa publicar editais e ter os registros junto aos órgãos públicos, entre outras exigências.
Segundo o leiloeiro, muitas pessoas chegam para um primeiro pregão e depois se deparam com as possibilidades financeiras dentro do segmento, o que os transforma em compradores assíduos. “Hoje em dia, uns 85% dos compradores de leilão são costumeiros, porque descobriram um retorno financeiro que não existe em nenhuma outra aplicação”, diz.
Na Resale, dos 7 mil imóveis vendidos desde 2015, quando a empresa foi fundada, um quarto foi por meio de leilões promovidos pela própria empresa e seis a cada dez pessoas nunca haviam comprado dessa forma antes.
Os leilões com liberação mais rápida do imóvel, entre três e seis meses, são os extrajudiciais, normalmente feitos por instituições financeiras para quitação de dívidas de financiamento não pagas. Já os leilões judiciais, como o apartamento do ex-BBB Rafinha, vencedor da oitava edição do programa, localizado em Campinas, pode demorar mais tempo até que o comprador possa, de fato, utilizar a propriedade.
Veja o que levar em consideração na hora de entrar em um leilão para a compra de um imóvel:
Atenção ao edital
Antes de mais nada, a leitura e o entendimento completo do edital são essenciais para não cair em uma cilada. O edital trará informações detalhadas sobre o imóvel e condições de venda, entre outros pontos fundamentais. Se possível, conte com uma assessoria jurídica para compreender todos os pontos.
Dívidas do imóvel
Saber quais dívidas estarão inclusas no valor do arremate é crucial. Muitas vezes, o montante pago pelo imóvel já abrange algumas pendências, mas podem existir dívidas adicionais. Por isso, é essencial verificar de quem será a responsabilidade por quaisquer débitos remanescentes, como impostos ou taxas de condomínio atrasadas.
Estado do Imóvel
Em muitos leilões, não é permitido realizar visitas prévias ao imóvel. Isso pode ser um risco, visto que não se tem uma noção exata do estado de conservação da propriedade.
Mesmo que o preço pareça vantajoso, considere os potenciais custos de reformas que poderão ser necessárias. Pode ser algo simples, como pintura ou troca de piso, ou algo complexo, como reparações em encanamentos, rede elétrica ou telhados.
Valores relativos
É importante também fazer uma uma análise de mercado, estimando os valores de imóveis similares na região. Isso te dará uma ideia mais clara se o desconto oferecido no leilão é realmente vantajoso.
“Em uma avaliação equivocada, perde-se 20% do valor. 5% já vai para o leiloeiro de toda forma. É preciso levar em conta o tempo do dinheiro parado e do custo jurídico para aquisição do imóvel. Após isso, há despesas de condomínio, IPTU e reformas”, diz Marcelo Tapai, sócio do Tapai Advogados e especialista em direito imobiliário.
Processos de desocupação
Se na sua visão tempo é dinheiro, é melhor ficar atento aos riscos da demora na desocupação. Mesmo que a retomada do imóvel seja legalmente garantida, o processo pode ser moroso. Além do tempo, podem existir custos envolvidos em ações judiciais.
Enquanto o imóvel não é desocupado, despesas como IPTU e condomínio ficam sob responsabilidade do comprador e podem reduzir a vantagem financeira obtida em pagar preço abaixo do mercado.
Há ainda situações em que o antigo proprietário, frustrado pela perda, pode causar danos ao imóvel.
Decisão econômica e jurídica
Ao considerar comprar um imóvel em leilão, os especialistas ouvidos pela reportagem recomendam fazer a análise da aquisição tanto do ponto de vista econômico-financeiro quanto jurídico. Com essa visão completa da situação, não devem surgir surpresas e problemas futuros.
Fabio Kielberman, CEO da BomValor, empresa que tem uma plataforma online de leilões, afirma que quem se arrisca na compra de imóveis atraídos apenas pela promessa de preços abaixo do mercado pode acabar se dando mal. “Comprar em leilão é muito vantajoso desde que você saiba o que está fazendo. Se não, a conta pode não fechar. Por exemplo, quem compra para morar e tem urgência, não faz um bom negócio. Pode demorar de 6 meses a um ano para ocorrer a desocupação do imóvel. Quem compra para reformar e vender precisa estimar custos e prazos para não ter prejuízo em vez de lucro”, diz Kielberman.
Imposto de renda
Para quem compra imóvel pensando em revender e ter lucro, é preciso prestar atenção ao imposto de renda sobre o lucro imobiliário, mais conhecido como Imposto de Renda sobre Ganhos de Capital (GCAP).
No caso de um lucro menor do que R$ 5 milhões, o imposto sobre o ganho é de 15%. Até R$ 10 milhões, o percentual sobe para 17,5%. Até os R$ 30 milhões, são 20%, e, por fim, acima de R$ 30 milhões de lucro, o imposto é de 22,5%. / Colaborou Wesley Gonsalves