RIO - O comércio varejista brasileiro manteve a trajetória de aquecimento em maio. O volume vendido cresceu 1,2% em relação a abril, inaugurando um novo patamar recorde, segundo os dados da Pesquisa Mensal de Comércio, divulgados nesta quinta-feira, 11, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O volume de vendas do varejo chegou a maio em patamar 9,8% acima do nível de fevereiro de 2020, no pré-pandemia. No varejo ampliado, que inclui as atividades de veículos e material de construção, as vendas operam 5,9% acima do pré-pandemia
“O último resultado negativo foi em dezembro de 2023 (-0,7%). A última vez que o varejo teve cinco resultados positivos seguidos foi lá em 2020, logo depois do choque da pandemia”, apontou Cristiano Santos, gerente da pesquisa do IBGE. “É um resultado bastante forte do comércio varejista neste ano de 2024 até aqui.”
O resultado de maio superou as estimativas mais otimistas dos analistas ouvidos pelo Projeções Broadcast, que esperavam desde uma queda de 2,0% até uma alta de 0,7% nas vendas, com mediana negativa de 0,5%. A surpresa deve ser um ponto de cautela para o Banco Central na condução da política monetária, avaliou o economista Pedro Crispim, da gestora de patrimônio G5 Partners.
“Além da desancoragem das expectativas de inflação, a questão fiscal e a depreciação do câmbio, temos uma economia bastante aquecida, o que coloca uma pressão adicional para o Banco Central”, avaliou Crispim, destacando, por outro lado, que a inflação mantém uma dinâmica benigna no curto prazo. “Será que com uma atividade mais aquecida a inflação pode ser mais alta e ter mais dificuldades para convergir para a meta? Ou estamos diante da possibilidade de poder rodar com um consumo mais forte e uma inflação capaz de convergir para meta?”, questionou o economista, pra quem “essa é a grande incógnita do mercado”.
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Emprego e crédito
O bom desempenho do comércio varejista nos primeiros meses de 2024 tem sido impulsionado pela maior concessão de crédito a pessoas físicas e pelo aquecimento do mercado de trabalho, com aumentos sucessivos no número de pessoas trabalhando e na massa de salários em circulação na economia, apontou Cristiano Santos, do IBGE.
“O consumo vem pautado pela expansão do crédito e por esse crescimento no número de pessoas ocupadas e na massa de rendimentos reais”, afirmou Santos.
O IBGE aponta que o momento favorável é sustentado pelas vendas nos setores de supermercados e farmacêutico. Ambas as atividades também funcionam no ápice de suas séries históricas. Os supermercados acumularam um ganho de 2,6% nos dois últimos meses de avanços seguidos, enquanto os farmacêuticos somam uma expansão de 12,6% em quatro meses de aumentos consecutivos. Há recuperação também no segmento de outros artigos de uso pessoal e doméstico, que inclui as lojas de departamento.
“O varejo tem um protagonismo também de outros artigos de uso pessoal e doméstico, que em 2023 sofreu, principalmente, com o fechamento de lojas”, disse o pesquisador do IBGE. “Ao longo deste ano de 2024, a atividade tem se recuperado.”
Na passagem de abril para maio, na série que desconta influências sazonais, houve crescimento em cinco das oito atividades pesquisadas: vestuário e calçados (2,0%), outros artigos de uso pessoal e doméstico (1,6%), supermercados (0,7%), artigos farmacêuticos e de perfumaria (0,2%) e livros e papelaria (0,2%). Os setores no negativo foram: móveis e eletrodomésticos (-1,2%), combustíveis (-2,5%) e equipamentos para informática e comunicação (-8,5%).
Quanto ao varejo ampliado - que inclui as atividades de material de construção, veículos e atacado alimentício -, as vendas cresceram 0,8% em maio ante abril. Houve recuos em veículos (-2,3%) e material de construção (-3,5%), mas o atacado especializado em produtos alimentícios cresceu 0,8%.
O impacto das enchentes
Em meio ao desastre climático que afetou o Rio Grande do Sul, a aquisição de produtos para doações e as compras emergenciais elevaram o volume vendido pelo comércio varejista na região, afirmou Cristiano Santos, gerente da pesquisa do IBGE.
As vendas no varejo cresceram 1,8% no Rio Grande do Sul em maio ante abril, desempenho acima da média nacional (1,2%).
“Supermercado teve efeito de compras emergenciais”, explicou Santos. “Teve doações e também uma demanda maior. As pessoas que vão ao mercado, vão fazer compras, sabendo que pode ter algum desabastecimento”, completou.
O resultado local foi impulsionado pelos ramos de supermercados, vestuário e calçados e móveis e eletrodomésticos, embora tenha sido registrado aumento também em artigos farmacêuticos.
“Teve efeito de doações que foram efetivadas no estado, e isso acaba se espalhando um pouco também, tem esse efeito nos outros estados, mas esse é mais difícil de mensurar”, disse Santos.
Já as vendas no varejo ampliado recuaram 2,8% no Rio Grande do Sul em maio ante abril (ante crescimento de 0,8% na média nacional).
“As enchentes do Rio Grande do Sul parecem ter tido efeito maior e mais localizado sobre a indústria e, possivelmente, sobre o setor de serviços da região em maio, enquanto as vendas no varejo foram menos afetadas (possivelmente em função de um efeito estocagem). De maneira geral, o dado de hoje (quinta-feira, 11) confirma que a atividade segue forte, indicando que, até o momento, a tragédia no Sul do país não afetou as perspectivas de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) agregado no ano”, concluiu a economista Marina Garrido, do departamento de Pesquisa Macroeconômica do Itaú, em relatório. /Com Gabriela Jucá