‘Vejo, no mínimo, mais dois anos de reestruturações', diz Ricardo K.


Das médias e grandes empresas brasileiras, 60% não conseguem pagar o juro das dívidas, diz o reestruturador

Por Monica Scaramuzzo
Aeroportos e construção são frágeis, diz Ricardo K. Foto: Marcio Fernandes/Estadão

Um dos maiores reestruturadores de empresas do País, Ricardo Knoepfelmacher, conhecido com Ricardo K., vê 2017 ainda muito sombrio para muitas companhias. À frente de grandes reestruturações, como a do Grupo X, do empresário Eike Batista, e atualmente a de grupos como PDG, Bombril e Estaleiro Enseada, K. diz que o pior ainda não passou. 

Segundo ele, das 800 médias e grandes empresas brasileiras, cerca de 60% não conseguem pagar o juro de suas dívidas com a atual geração de caixa. 

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Leia abaixo os principais trechos da entrevista. 

A crise golpeou grandes grupos em 2016, muitos deles estão em reestruturação e outros entraram em recuperação judicial. O ano de 2016 foi de muita turbulência política e insegurança. Também foi de quase um colapso de toda parte de infraestrutura do Brasil porque praticamente todas as empresas do setor foram alcançadas pela Operação Lava Jato. Isso criou um apagão. Muitas estavam alavancadas, sem capital próprio. Esse cenário persistirá no primeiro semestre de 2017. Acredito que a recuperação da economia tem de passar pelas obras necessárias de infraestrutura, como água, esgoto, portos e aeroportos, que precisam de investimentos.

O sr. acredita que a Lava Jato agravará mais a crise? A Lava Jato mostra que tem fôlego e ainda vai ser um processo longo (com novas delações). Esse momento de transição traz impactos, sob o ponto de vista do investidor internacional. Por outro lado, acredito que muita coisa vá melhorar. Acho que vai abrir espaço para empresas médias que não estão contaminadas (pelas investigações) para que consigam entrar em grandes obras.

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Muitas das empresas nacionais vão mudar de controlador? Há muito investidor estrangeiro olhando o Brasil. No caso das construtoras, o mais importante é o acervo técnico. Vão participar de obras no Brasil as empresas consideradas idôneas que estavam adormecidas. Boa parte das grandes empreiteiras vai encolher.

Muitas empresas ainda serão reestruturadas em 2017? Sim. O problema hoje é que, se pegar as 800 médias e grandes empresas brasileiras, cerca de 60% delas não conseguem, com sua geração de caixa, pagar o juro de sua dívida. Em nossos estudos setoriais continuamos vendo fragilidade nos setores sucroalcooleiro, varejo, aéreo, imobiliário. São pelo menos mais dois anos de problemas para alguns setores.

Muitas delas vão entrar em recuperação judicial? Não precisará na maior parte dos casos. Uma recuperação só funciona bem quando é usada como método de proteção contra um credor descontrolado, que ameaça executar uma empresa que pode colapsar. Já a recuperação como instrumento protelatório, somos contra. Acho que, em alguns casos, os empresários esperam demais para pedir ajuda. 

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Vê fragilidade no setor de infraestrutura? E nas concessões? Sem dúvida. As concessões menos afetadas são as de rodovias, mais antigas e com boa parte dos investimentos já feito. Fora isso, todas estão sofrendo. Tem a de aeroportos, onde não há dinheiro para pagar concessões. As empresas envolvidas na Lava Jato não têm liberação de empréstimo do BNDES. Vejo boa parte das concessões, como portos, aeroportos e água e saneamento, como problemáticas. Do lado das construções, também sofrem porque não tem quem faça as grandes obras. As empreiteiras tinham crédito abundante. Hoje não mais. Essa escassez faz com que as obras tenham de ser relicitadas, o que atrasa investimentos. Há concessões que precisam ser revistas porque se deterioraram.

Qual seria a solução, então? O governo tem de entender que ele é um grande indutor para infraestrutura. E tem, sim, um papel importante. Temos um governo interino de dois anos que tem o desafio de gerar a estabilidade. Muitas iniciativas já começaram a ser feitas. Mas tem de conversar com as concessionárias, mesmo que seja para um reequilíbrio de contrato e dar extensão do prazo para pagamento de outorga, por exemplo. 

Qual o papel do BNDES nesse novo cenário? A única coisa que tem de evitar agora é uma contaminação ideológica do BNDES. É importante que o BNDES, que tem um dos melhores quadros técnicos do Brasil, consiga tirar o que não foi bem feito e criar aí políticas de apoio. Tem de tomar cuidado para não desconstruir o que estava dando certo e para fomentar as coisas que precisam ser apoiadas. A linha de apoio a empresas em recuperação judicial é importante.

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Então, a crise ainda perdura? Nos próximos dois a três anos, as empresas vão se manter endividadas. Há empresas que estão boas e saudáveis, mas que têm problema de balanço, de estrutura de capital, reduzir o endividamento. 

O pior já passou? Depende. Do ponto de vista dos grandes casos emblemáticos – Grupo X, Odebrecht, Oi – as questões já estão postas. Em termos de volume financeiro, de casos grandes, o pior já passou. Mas todos achavam que iria ter uma recuperação mais rápida (da recessão). Mas a crise política trouxe um grau de incerteza que travou investimentos. Também vejo, no mínimo, mais dois anos de reestruturação de dívida. Há uma miríade de casos, de médias e grandes reestruturações de dívidas, entre R$ 2 bilhões a R$ 10 bilhões, que vão aparecer ao longo de 2017. Nesses casos, o pior ainda não passou

Aeroportos e construção são frágeis, diz Ricardo K. Foto: Marcio Fernandes/Estadão

Um dos maiores reestruturadores de empresas do País, Ricardo Knoepfelmacher, conhecido com Ricardo K., vê 2017 ainda muito sombrio para muitas companhias. À frente de grandes reestruturações, como a do Grupo X, do empresário Eike Batista, e atualmente a de grupos como PDG, Bombril e Estaleiro Enseada, K. diz que o pior ainda não passou. 

Segundo ele, das 800 médias e grandes empresas brasileiras, cerca de 60% não conseguem pagar o juro de suas dívidas com a atual geração de caixa. 

Leia abaixo os principais trechos da entrevista. 

A crise golpeou grandes grupos em 2016, muitos deles estão em reestruturação e outros entraram em recuperação judicial. O ano de 2016 foi de muita turbulência política e insegurança. Também foi de quase um colapso de toda parte de infraestrutura do Brasil porque praticamente todas as empresas do setor foram alcançadas pela Operação Lava Jato. Isso criou um apagão. Muitas estavam alavancadas, sem capital próprio. Esse cenário persistirá no primeiro semestre de 2017. Acredito que a recuperação da economia tem de passar pelas obras necessárias de infraestrutura, como água, esgoto, portos e aeroportos, que precisam de investimentos.

O sr. acredita que a Lava Jato agravará mais a crise? A Lava Jato mostra que tem fôlego e ainda vai ser um processo longo (com novas delações). Esse momento de transição traz impactos, sob o ponto de vista do investidor internacional. Por outro lado, acredito que muita coisa vá melhorar. Acho que vai abrir espaço para empresas médias que não estão contaminadas (pelas investigações) para que consigam entrar em grandes obras.

Muitas das empresas nacionais vão mudar de controlador? Há muito investidor estrangeiro olhando o Brasil. No caso das construtoras, o mais importante é o acervo técnico. Vão participar de obras no Brasil as empresas consideradas idôneas que estavam adormecidas. Boa parte das grandes empreiteiras vai encolher.

Muitas empresas ainda serão reestruturadas em 2017? Sim. O problema hoje é que, se pegar as 800 médias e grandes empresas brasileiras, cerca de 60% delas não conseguem, com sua geração de caixa, pagar o juro de sua dívida. Em nossos estudos setoriais continuamos vendo fragilidade nos setores sucroalcooleiro, varejo, aéreo, imobiliário. São pelo menos mais dois anos de problemas para alguns setores.

Muitas delas vão entrar em recuperação judicial? Não precisará na maior parte dos casos. Uma recuperação só funciona bem quando é usada como método de proteção contra um credor descontrolado, que ameaça executar uma empresa que pode colapsar. Já a recuperação como instrumento protelatório, somos contra. Acho que, em alguns casos, os empresários esperam demais para pedir ajuda. 

Vê fragilidade no setor de infraestrutura? E nas concessões? Sem dúvida. As concessões menos afetadas são as de rodovias, mais antigas e com boa parte dos investimentos já feito. Fora isso, todas estão sofrendo. Tem a de aeroportos, onde não há dinheiro para pagar concessões. As empresas envolvidas na Lava Jato não têm liberação de empréstimo do BNDES. Vejo boa parte das concessões, como portos, aeroportos e água e saneamento, como problemáticas. Do lado das construções, também sofrem porque não tem quem faça as grandes obras. As empreiteiras tinham crédito abundante. Hoje não mais. Essa escassez faz com que as obras tenham de ser relicitadas, o que atrasa investimentos. Há concessões que precisam ser revistas porque se deterioraram.

Qual seria a solução, então? O governo tem de entender que ele é um grande indutor para infraestrutura. E tem, sim, um papel importante. Temos um governo interino de dois anos que tem o desafio de gerar a estabilidade. Muitas iniciativas já começaram a ser feitas. Mas tem de conversar com as concessionárias, mesmo que seja para um reequilíbrio de contrato e dar extensão do prazo para pagamento de outorga, por exemplo. 

Qual o papel do BNDES nesse novo cenário? A única coisa que tem de evitar agora é uma contaminação ideológica do BNDES. É importante que o BNDES, que tem um dos melhores quadros técnicos do Brasil, consiga tirar o que não foi bem feito e criar aí políticas de apoio. Tem de tomar cuidado para não desconstruir o que estava dando certo e para fomentar as coisas que precisam ser apoiadas. A linha de apoio a empresas em recuperação judicial é importante.

Então, a crise ainda perdura? Nos próximos dois a três anos, as empresas vão se manter endividadas. Há empresas que estão boas e saudáveis, mas que têm problema de balanço, de estrutura de capital, reduzir o endividamento. 

O pior já passou? Depende. Do ponto de vista dos grandes casos emblemáticos – Grupo X, Odebrecht, Oi – as questões já estão postas. Em termos de volume financeiro, de casos grandes, o pior já passou. Mas todos achavam que iria ter uma recuperação mais rápida (da recessão). Mas a crise política trouxe um grau de incerteza que travou investimentos. Também vejo, no mínimo, mais dois anos de reestruturação de dívida. Há uma miríade de casos, de médias e grandes reestruturações de dívidas, entre R$ 2 bilhões a R$ 10 bilhões, que vão aparecer ao longo de 2017. Nesses casos, o pior ainda não passou

Aeroportos e construção são frágeis, diz Ricardo K. Foto: Marcio Fernandes/Estadão

Um dos maiores reestruturadores de empresas do País, Ricardo Knoepfelmacher, conhecido com Ricardo K., vê 2017 ainda muito sombrio para muitas companhias. À frente de grandes reestruturações, como a do Grupo X, do empresário Eike Batista, e atualmente a de grupos como PDG, Bombril e Estaleiro Enseada, K. diz que o pior ainda não passou. 

Segundo ele, das 800 médias e grandes empresas brasileiras, cerca de 60% não conseguem pagar o juro de suas dívidas com a atual geração de caixa. 

Leia abaixo os principais trechos da entrevista. 

A crise golpeou grandes grupos em 2016, muitos deles estão em reestruturação e outros entraram em recuperação judicial. O ano de 2016 foi de muita turbulência política e insegurança. Também foi de quase um colapso de toda parte de infraestrutura do Brasil porque praticamente todas as empresas do setor foram alcançadas pela Operação Lava Jato. Isso criou um apagão. Muitas estavam alavancadas, sem capital próprio. Esse cenário persistirá no primeiro semestre de 2017. Acredito que a recuperação da economia tem de passar pelas obras necessárias de infraestrutura, como água, esgoto, portos e aeroportos, que precisam de investimentos.

O sr. acredita que a Lava Jato agravará mais a crise? A Lava Jato mostra que tem fôlego e ainda vai ser um processo longo (com novas delações). Esse momento de transição traz impactos, sob o ponto de vista do investidor internacional. Por outro lado, acredito que muita coisa vá melhorar. Acho que vai abrir espaço para empresas médias que não estão contaminadas (pelas investigações) para que consigam entrar em grandes obras.

Muitas das empresas nacionais vão mudar de controlador? Há muito investidor estrangeiro olhando o Brasil. No caso das construtoras, o mais importante é o acervo técnico. Vão participar de obras no Brasil as empresas consideradas idôneas que estavam adormecidas. Boa parte das grandes empreiteiras vai encolher.

Muitas empresas ainda serão reestruturadas em 2017? Sim. O problema hoje é que, se pegar as 800 médias e grandes empresas brasileiras, cerca de 60% delas não conseguem, com sua geração de caixa, pagar o juro de sua dívida. Em nossos estudos setoriais continuamos vendo fragilidade nos setores sucroalcooleiro, varejo, aéreo, imobiliário. São pelo menos mais dois anos de problemas para alguns setores.

Muitas delas vão entrar em recuperação judicial? Não precisará na maior parte dos casos. Uma recuperação só funciona bem quando é usada como método de proteção contra um credor descontrolado, que ameaça executar uma empresa que pode colapsar. Já a recuperação como instrumento protelatório, somos contra. Acho que, em alguns casos, os empresários esperam demais para pedir ajuda. 

Vê fragilidade no setor de infraestrutura? E nas concessões? Sem dúvida. As concessões menos afetadas são as de rodovias, mais antigas e com boa parte dos investimentos já feito. Fora isso, todas estão sofrendo. Tem a de aeroportos, onde não há dinheiro para pagar concessões. As empresas envolvidas na Lava Jato não têm liberação de empréstimo do BNDES. Vejo boa parte das concessões, como portos, aeroportos e água e saneamento, como problemáticas. Do lado das construções, também sofrem porque não tem quem faça as grandes obras. As empreiteiras tinham crédito abundante. Hoje não mais. Essa escassez faz com que as obras tenham de ser relicitadas, o que atrasa investimentos. Há concessões que precisam ser revistas porque se deterioraram.

Qual seria a solução, então? O governo tem de entender que ele é um grande indutor para infraestrutura. E tem, sim, um papel importante. Temos um governo interino de dois anos que tem o desafio de gerar a estabilidade. Muitas iniciativas já começaram a ser feitas. Mas tem de conversar com as concessionárias, mesmo que seja para um reequilíbrio de contrato e dar extensão do prazo para pagamento de outorga, por exemplo. 

Qual o papel do BNDES nesse novo cenário? A única coisa que tem de evitar agora é uma contaminação ideológica do BNDES. É importante que o BNDES, que tem um dos melhores quadros técnicos do Brasil, consiga tirar o que não foi bem feito e criar aí políticas de apoio. Tem de tomar cuidado para não desconstruir o que estava dando certo e para fomentar as coisas que precisam ser apoiadas. A linha de apoio a empresas em recuperação judicial é importante.

Então, a crise ainda perdura? Nos próximos dois a três anos, as empresas vão se manter endividadas. Há empresas que estão boas e saudáveis, mas que têm problema de balanço, de estrutura de capital, reduzir o endividamento. 

O pior já passou? Depende. Do ponto de vista dos grandes casos emblemáticos – Grupo X, Odebrecht, Oi – as questões já estão postas. Em termos de volume financeiro, de casos grandes, o pior já passou. Mas todos achavam que iria ter uma recuperação mais rápida (da recessão). Mas a crise política trouxe um grau de incerteza que travou investimentos. Também vejo, no mínimo, mais dois anos de reestruturação de dívida. Há uma miríade de casos, de médias e grandes reestruturações de dívidas, entre R$ 2 bilhões a R$ 10 bilhões, que vão aparecer ao longo de 2017. Nesses casos, o pior ainda não passou

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