Grandes nomes do mundo corporativo como Pedro Wongtschowski, Candido Bracher, Denis Minev, Pedro Bueno e Guilherme Leal estão envolvidos em uma iniciativa para alavancar o desenvolvimento de ciência e tecnologia voltada para a bioeconomia na Amazônia, em um projeto liderado pelos institutos Arapyaú e Agni. A leitura dos empresários e executivos é que não haverá desenvolvimento econômico sustentável na região sem pesquisa e inovação.
Batizada de “Estratégia para fortalecer ciência, tecnologia e inovação em bioeconomia na Amazônia”, a iniciativa está em andamento desde o ano passado, quando mais de 70 entrevistas foram realizadas com pesquisadores que vivem na região para se ter um diagnóstico da situação.
“A conclusão dessa parte inicial do projeto é que os elos estão desconectados. É preciso reforçar pontes. Há diversas agências de fomento atuando na região, mas muitas não se relacionam com as comunidades locais. É preciso conectar o conhecimento”, diz Lívia Menezes Pagotto, gerente do Instituto Arapyaú (instituição filantrópica criada por Guilherme Leal, cofundador da Natura).
Segundo ela, muitas das pesquisas desenvolvidas na região não refletem a realizada da Amazônia e, portanto, não podem ser usadas como soluções por empresas e empreendedores que trabalham com bioeconomia.
A ideia de criar o projeto surgiu em 2022, em uma conversa entre Leal e Pedro Bueno (CEO do grupo de saúde Dasa), que viram a necessidade de o setor privado apoiar a ciência e a tecnologia aplicada à bioeconomia.
No ano seguinte, profissionais dos institutos filantrópicos dos empresários (o Agni é uma iniciativa de Bueno) se reuniram de duas a três vezes por semana para colocar o programa em pé. Além das 70 entrevistas realizadas com pesquisadores, duas viagens à Amazónia foram feitas para mapear os gargalos do desenvolvimento tecnológico na região.
Referência na área de inovação, o ex-presidente do conselho de administração do Grupo Ultra Pedro Wongtschowski faz parte de um grupo consultivo criado para orientar as atividades da iniciativa. O executivo afirma que, hoje, a maioria das instituições públicas de ciência e tecnologia da Amazônia Legal não tem condições ideais de funcionamento.
Wongtschowski destaca o caso do herbário do Instituto Nacional de Pesquisas Amazônicas (Inpa), que abriga uma das maiores coleções de plantas da Amazônia, mas conta com uma estrutura antiga. “O pessoal desliga o ar condicionado lá à noite porque tem medo que aconteça um curto circuito que provoque um incêndio. Mas, sem ar, fungos podem destruir o acervo”, diz ele, que, entre outras funções, é presidente do conselho superior de inovação e competitividade da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e membro do conselho superior da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).
Segundo o executivo, outro entrave para o avanço da pesquisa e inovação na região é a retenção de pesquisadores. “Jovens promissores têm ido embora. Precisamos criar um ecossistema de inovação para as pessoas ficarem lá. Estamos analisando como fazer isso.”
Wongtschowski tem participado de reuniões periódicas sobre o tema e ajudado no desenvolvimento de propostas. Ele diz estar “convencido” de que há dinheiro para alavancar a ciência na Amazônia, mas que é preciso criar os projetos e a governança adequada para atrair recursos.
O membro do conselho de administração do Itaú e CEO do banco entre 2017 e 2021, Candido Bracher, também faz parte do grupo consultivo criado para orientar a iniciativa. Para ele, o desenvolvimento de pesquisa e inovação na bioeconomia da Amazônia deve resultar em empregos e maior atividade econômica.
“Você não sustenta baixos níveis de desmatamento apoiado exclusivamente na aplicação da legislação ambiental. Esse desenvolvimento de ciência na Amazônia é um esforço para criar riqueza econômica na região, de modo a tornar sustentável a proteção da floresta.”
Bracher destaca que as pesquisas feitas na região precisam identificar problemas das atividades econômicas locais e encontrar soluções através de conhecimento tecnológico gerado na Amazônia. “Ao invés de fazer pesquisa e depois distribuir o resultado, você procura mapear onde está a demanda por pesquisa.”
O presidente da Lojas Bemol (rede de varejo com atuação no Norte do País), Denis Minev, também faz parte do grupo consultivo do programa. Segundo ele, seria um “crime” transformar a região amazônica em um “armazém de carbono, mesmo porque essa alternativa não interessa a população local”. “Se a gente quer ter algo que atraia todos, a ciência e a tecnologia têm de estar no cerne.”
Minev destaca que projetos brasileiros como o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) são exemplos do que precisa ser feito e de como a inovação pode transformar a economia. “Todo mundo reconhece que a Amazônia é um patrimônio da biodiversidade. Mas ela não tem gerado os benefícios que pode gerar, porque não temos investido em pesquisa com a pujança que deveríamos”, diz. “Em alguns momentos, como quando o ITA foi criado, o Brasil foi arrojado, ambicioso e decidido a fazer algo. Na Amazônia, ainda não adotamos essa postura.”
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Próximos passos
Após ter realizado um diagnóstico da atual situação dos centros de pesquisa existentes na Amazônia, a iniciativa pretende levar para Brasília um conjunto de atos e instrumentos normativos, como projetos de lei, reforço de decretos e sugestões de governança, para desenvolvimento de pesquisa e ciência na região. As propostas serão apresentadas na 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, que acontecerá em junho.
De acordo com Pagotto, do Instituto Arapyaú, o próximo passo do programa é levantar recursos por meio de filantropia para realizar uma pesquisa que possa trazer soluções tecnológicas para uma atividade econômica da região amazônica. Entre as atividades possíveis estão cultivo de cacau, desenvolvimento de fármacos ou cosméticos, produção de “superalimentos” (alimentos com grande concentração de vitaminas, proteínas, minerais e fibras) e geração de energia através de biomassa, entre outros.
Após a conclusão desse experimento, a iniciativa deve difundir os conhecimentos adquiridos para que outras instituições possam replicar experiências semelhantes. “A ideia não é impor soluções para os territórios. Mas trabalhar a partir do que já existe lá. A Amazônia tem especificidades e muitas políticas nacionais não são adequadas a ela”, diz Pagotto.