Opinião|‘Formação continuada do professor em equidade racial pode evitar injustiças na escola’


Pesquisadora defende a criação de um programa de enfrentamento ao racismo na educação

Por Luana Tolentino

As atitudes e práticas racistas no ambiente escolar deixam profundas marcas em suas vítimas, quase sempre subterraneamente, mas há indicadores que as revelam de forma escancarada.

Na semana passada, o Observatório da Branquitude, organização que pesquisa as desigualdades raciais no Brasil, divulgou dados que evidenciam o quanto o racismo estrutura, contamina as relações sociais e as instituições no Brasil. A partir de informações do Censo Escolar 2021, a entidade aponta que as escolas públicas com maioria de estudantes negros possuem estrutura mais precária se comparadas às unidades de ensino com presença predominante de estudantes brancos.

Em mais da metade das escolas frequentadas principalmente por estudantes pretos e pardos, segundo o levantamento, crianças, jovens e adultos não têm acesso a bibliotecas, laboratórios de informática e quadras poliesportivas.

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Existem estabelecimentos de ensino, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, com esse mesmo perfil racial, onde encontram-se casos inomináveis, que ferem de morte, inclusive, os Direitos Humanos. Em 13 deles, não há coleta de lixo, rede de esgoto e água potável.

A professora e escritora Luana Tolentino defende a promoção continuada dos profissionais de educação para o combate das injustiças raciais nos ambientes escolares Foto: Crédito: Washington Alves/Estadão

Esses números me fizeram lembrar da minha caminhada como professora de História da Educação Básica. Ao longo de mais de uma década, percorri salas de aula situadas em territórios formados majoritariamente por pessoas de pele preta, sobretudo nos municípios de Ribeirão das Neves e Vespasiano (MG), presentes na lista dos mais pobres do país.

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Minha experiência docente se deu em espaços nos quais desde “cedo se aprende que só a custo de muita teimosia se consegue tecer a vida (...) com carência, com ameaça, com desespero, com ofensa e dor”, conforme pontuou o educador Paulo Freire.

A exemplo do que foi apresentado pelo Observatório da Branquitude, nessa jornada, vi um total desprezo por parte do Estado em relação àqueles que tentavam exercer o direito de ingressar e permanecer na escola.

Vi espaços escolares com bibliotecas fechadas. Vi professores sem acesso a itens básicos, como folhas para ministrar atividades aos alunos. Vi quadras inacabadas. Vi salas insalubres, sem ventilação adequada. Vi laboratórios de informática cujos computadores tinham programas defasados, o que impedia a sua utilização. Vi profissionais reféns de contratos de trabalho provisórios, o que impunha aos estudantes longos períodos sem aula e, consequentemente, chances remotas de estabelecer vínculos com os professores e o acesso à educação de qualidade.

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Nessas memórias, entristece-me lembrar que alguns colegas de jornada incorporavam a “política institucional racista” do Estado de que para os negros pode-se ofertar uma educação insuficiente e rudimentar.

Além da desqualificação dos alunos e de suas famílias em razão da cor da pele, eram muito comuns práticas de ensino orientadas pela descrença no potencial dos meninos e meninas com os quais convivíamos diariamente, como também naquilo que eles poderiam viver, aprender e ensinar.

Jamais vou me esquecer da diretora que deixava os livros de literatura trancados em um armário “para que os alunos não colocassem as mãos”, como ela mesma ressaltava.

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Nesse contexto que deveria causar vergonha e mobilizar toda a sociedade em torno da luta antirracista, não resta dúvida de que, infelizmente, muitas vezes a escola atua como um instrumento de perpetuação da injustiça racial.

Dada a gravidade da situação, é urgente que os ministérios da Educação, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos se pronunciem, construam um plano de enfrentamento ao racismo na educação, que inclua investimentos na melhoria das unidades escolares, bem como na formação continuada de professores para promoção de equidade racial. Estamos falando de um processo de negação de direitos que impede uma trajetória ascendente de crianças e jovens negros.

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No interior das escolas, também é fundamental que os profissionais da educação se insurjam contra a perversidade do racismo, colocando em prática o que determina a Lei 10.639, que em 2003 tornou obrigatório o ensino da História e da Cultura Africana e Afro-brasileira em instituições de ensino públicas e privadas.

Faz-se necessário (re) pensar currículos, práticas pedagógicas, ações e discursos, com o envolvimento das famílias dos estudantes, de modo que o ambiente escolar seja um espaço de felicidade e realização para todos e todas que lá estão.

Os dados apresentados pelo Observatório da Branquitude mostram que, dentre várias coisas, o racismo consiste em uma máquina potente de moer talentos e de matar o futuro. Não se pode pensar em um país verdadeiramente democrático enquanto o acesso à educação de qualidade for definido pela cor da pele. É preciso dar um basta a essa situação criminosa. E tem de ser agora.

As atitudes e práticas racistas no ambiente escolar deixam profundas marcas em suas vítimas, quase sempre subterraneamente, mas há indicadores que as revelam de forma escancarada.

Na semana passada, o Observatório da Branquitude, organização que pesquisa as desigualdades raciais no Brasil, divulgou dados que evidenciam o quanto o racismo estrutura, contamina as relações sociais e as instituições no Brasil. A partir de informações do Censo Escolar 2021, a entidade aponta que as escolas públicas com maioria de estudantes negros possuem estrutura mais precária se comparadas às unidades de ensino com presença predominante de estudantes brancos.

Em mais da metade das escolas frequentadas principalmente por estudantes pretos e pardos, segundo o levantamento, crianças, jovens e adultos não têm acesso a bibliotecas, laboratórios de informática e quadras poliesportivas.

Existem estabelecimentos de ensino, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, com esse mesmo perfil racial, onde encontram-se casos inomináveis, que ferem de morte, inclusive, os Direitos Humanos. Em 13 deles, não há coleta de lixo, rede de esgoto e água potável.

A professora e escritora Luana Tolentino defende a promoção continuada dos profissionais de educação para o combate das injustiças raciais nos ambientes escolares Foto: Crédito: Washington Alves/Estadão

Esses números me fizeram lembrar da minha caminhada como professora de História da Educação Básica. Ao longo de mais de uma década, percorri salas de aula situadas em territórios formados majoritariamente por pessoas de pele preta, sobretudo nos municípios de Ribeirão das Neves e Vespasiano (MG), presentes na lista dos mais pobres do país.

Minha experiência docente se deu em espaços nos quais desde “cedo se aprende que só a custo de muita teimosia se consegue tecer a vida (...) com carência, com ameaça, com desespero, com ofensa e dor”, conforme pontuou o educador Paulo Freire.

A exemplo do que foi apresentado pelo Observatório da Branquitude, nessa jornada, vi um total desprezo por parte do Estado em relação àqueles que tentavam exercer o direito de ingressar e permanecer na escola.

Vi espaços escolares com bibliotecas fechadas. Vi professores sem acesso a itens básicos, como folhas para ministrar atividades aos alunos. Vi quadras inacabadas. Vi salas insalubres, sem ventilação adequada. Vi laboratórios de informática cujos computadores tinham programas defasados, o que impedia a sua utilização. Vi profissionais reféns de contratos de trabalho provisórios, o que impunha aos estudantes longos períodos sem aula e, consequentemente, chances remotas de estabelecer vínculos com os professores e o acesso à educação de qualidade.

Nessas memórias, entristece-me lembrar que alguns colegas de jornada incorporavam a “política institucional racista” do Estado de que para os negros pode-se ofertar uma educação insuficiente e rudimentar.

Além da desqualificação dos alunos e de suas famílias em razão da cor da pele, eram muito comuns práticas de ensino orientadas pela descrença no potencial dos meninos e meninas com os quais convivíamos diariamente, como também naquilo que eles poderiam viver, aprender e ensinar.

Jamais vou me esquecer da diretora que deixava os livros de literatura trancados em um armário “para que os alunos não colocassem as mãos”, como ela mesma ressaltava.

Nesse contexto que deveria causar vergonha e mobilizar toda a sociedade em torno da luta antirracista, não resta dúvida de que, infelizmente, muitas vezes a escola atua como um instrumento de perpetuação da injustiça racial.

Dada a gravidade da situação, é urgente que os ministérios da Educação, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos se pronunciem, construam um plano de enfrentamento ao racismo na educação, que inclua investimentos na melhoria das unidades escolares, bem como na formação continuada de professores para promoção de equidade racial. Estamos falando de um processo de negação de direitos que impede uma trajetória ascendente de crianças e jovens negros.

No interior das escolas, também é fundamental que os profissionais da educação se insurjam contra a perversidade do racismo, colocando em prática o que determina a Lei 10.639, que em 2003 tornou obrigatório o ensino da História e da Cultura Africana e Afro-brasileira em instituições de ensino públicas e privadas.

Faz-se necessário (re) pensar currículos, práticas pedagógicas, ações e discursos, com o envolvimento das famílias dos estudantes, de modo que o ambiente escolar seja um espaço de felicidade e realização para todos e todas que lá estão.

Os dados apresentados pelo Observatório da Branquitude mostram que, dentre várias coisas, o racismo consiste em uma máquina potente de moer talentos e de matar o futuro. Não se pode pensar em um país verdadeiramente democrático enquanto o acesso à educação de qualidade for definido pela cor da pele. É preciso dar um basta a essa situação criminosa. E tem de ser agora.

As atitudes e práticas racistas no ambiente escolar deixam profundas marcas em suas vítimas, quase sempre subterraneamente, mas há indicadores que as revelam de forma escancarada.

Na semana passada, o Observatório da Branquitude, organização que pesquisa as desigualdades raciais no Brasil, divulgou dados que evidenciam o quanto o racismo estrutura, contamina as relações sociais e as instituições no Brasil. A partir de informações do Censo Escolar 2021, a entidade aponta que as escolas públicas com maioria de estudantes negros possuem estrutura mais precária se comparadas às unidades de ensino com presença predominante de estudantes brancos.

Em mais da metade das escolas frequentadas principalmente por estudantes pretos e pardos, segundo o levantamento, crianças, jovens e adultos não têm acesso a bibliotecas, laboratórios de informática e quadras poliesportivas.

Existem estabelecimentos de ensino, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, com esse mesmo perfil racial, onde encontram-se casos inomináveis, que ferem de morte, inclusive, os Direitos Humanos. Em 13 deles, não há coleta de lixo, rede de esgoto e água potável.

A professora e escritora Luana Tolentino defende a promoção continuada dos profissionais de educação para o combate das injustiças raciais nos ambientes escolares Foto: Crédito: Washington Alves/Estadão

Esses números me fizeram lembrar da minha caminhada como professora de História da Educação Básica. Ao longo de mais de uma década, percorri salas de aula situadas em territórios formados majoritariamente por pessoas de pele preta, sobretudo nos municípios de Ribeirão das Neves e Vespasiano (MG), presentes na lista dos mais pobres do país.

Minha experiência docente se deu em espaços nos quais desde “cedo se aprende que só a custo de muita teimosia se consegue tecer a vida (...) com carência, com ameaça, com desespero, com ofensa e dor”, conforme pontuou o educador Paulo Freire.

A exemplo do que foi apresentado pelo Observatório da Branquitude, nessa jornada, vi um total desprezo por parte do Estado em relação àqueles que tentavam exercer o direito de ingressar e permanecer na escola.

Vi espaços escolares com bibliotecas fechadas. Vi professores sem acesso a itens básicos, como folhas para ministrar atividades aos alunos. Vi quadras inacabadas. Vi salas insalubres, sem ventilação adequada. Vi laboratórios de informática cujos computadores tinham programas defasados, o que impedia a sua utilização. Vi profissionais reféns de contratos de trabalho provisórios, o que impunha aos estudantes longos períodos sem aula e, consequentemente, chances remotas de estabelecer vínculos com os professores e o acesso à educação de qualidade.

Nessas memórias, entristece-me lembrar que alguns colegas de jornada incorporavam a “política institucional racista” do Estado de que para os negros pode-se ofertar uma educação insuficiente e rudimentar.

Além da desqualificação dos alunos e de suas famílias em razão da cor da pele, eram muito comuns práticas de ensino orientadas pela descrença no potencial dos meninos e meninas com os quais convivíamos diariamente, como também naquilo que eles poderiam viver, aprender e ensinar.

Jamais vou me esquecer da diretora que deixava os livros de literatura trancados em um armário “para que os alunos não colocassem as mãos”, como ela mesma ressaltava.

Nesse contexto que deveria causar vergonha e mobilizar toda a sociedade em torno da luta antirracista, não resta dúvida de que, infelizmente, muitas vezes a escola atua como um instrumento de perpetuação da injustiça racial.

Dada a gravidade da situação, é urgente que os ministérios da Educação, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos se pronunciem, construam um plano de enfrentamento ao racismo na educação, que inclua investimentos na melhoria das unidades escolares, bem como na formação continuada de professores para promoção de equidade racial. Estamos falando de um processo de negação de direitos que impede uma trajetória ascendente de crianças e jovens negros.

No interior das escolas, também é fundamental que os profissionais da educação se insurjam contra a perversidade do racismo, colocando em prática o que determina a Lei 10.639, que em 2003 tornou obrigatório o ensino da História e da Cultura Africana e Afro-brasileira em instituições de ensino públicas e privadas.

Faz-se necessário (re) pensar currículos, práticas pedagógicas, ações e discursos, com o envolvimento das famílias dos estudantes, de modo que o ambiente escolar seja um espaço de felicidade e realização para todos e todas que lá estão.

Os dados apresentados pelo Observatório da Branquitude mostram que, dentre várias coisas, o racismo consiste em uma máquina potente de moer talentos e de matar o futuro. Não se pode pensar em um país verdadeiramente democrático enquanto o acesso à educação de qualidade for definido pela cor da pele. É preciso dar um basta a essa situação criminosa. E tem de ser agora.

As atitudes e práticas racistas no ambiente escolar deixam profundas marcas em suas vítimas, quase sempre subterraneamente, mas há indicadores que as revelam de forma escancarada.

Na semana passada, o Observatório da Branquitude, organização que pesquisa as desigualdades raciais no Brasil, divulgou dados que evidenciam o quanto o racismo estrutura, contamina as relações sociais e as instituições no Brasil. A partir de informações do Censo Escolar 2021, a entidade aponta que as escolas públicas com maioria de estudantes negros possuem estrutura mais precária se comparadas às unidades de ensino com presença predominante de estudantes brancos.

Em mais da metade das escolas frequentadas principalmente por estudantes pretos e pardos, segundo o levantamento, crianças, jovens e adultos não têm acesso a bibliotecas, laboratórios de informática e quadras poliesportivas.

Existem estabelecimentos de ensino, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, com esse mesmo perfil racial, onde encontram-se casos inomináveis, que ferem de morte, inclusive, os Direitos Humanos. Em 13 deles, não há coleta de lixo, rede de esgoto e água potável.

A professora e escritora Luana Tolentino defende a promoção continuada dos profissionais de educação para o combate das injustiças raciais nos ambientes escolares Foto: Crédito: Washington Alves/Estadão

Esses números me fizeram lembrar da minha caminhada como professora de História da Educação Básica. Ao longo de mais de uma década, percorri salas de aula situadas em territórios formados majoritariamente por pessoas de pele preta, sobretudo nos municípios de Ribeirão das Neves e Vespasiano (MG), presentes na lista dos mais pobres do país.

Minha experiência docente se deu em espaços nos quais desde “cedo se aprende que só a custo de muita teimosia se consegue tecer a vida (...) com carência, com ameaça, com desespero, com ofensa e dor”, conforme pontuou o educador Paulo Freire.

A exemplo do que foi apresentado pelo Observatório da Branquitude, nessa jornada, vi um total desprezo por parte do Estado em relação àqueles que tentavam exercer o direito de ingressar e permanecer na escola.

Vi espaços escolares com bibliotecas fechadas. Vi professores sem acesso a itens básicos, como folhas para ministrar atividades aos alunos. Vi quadras inacabadas. Vi salas insalubres, sem ventilação adequada. Vi laboratórios de informática cujos computadores tinham programas defasados, o que impedia a sua utilização. Vi profissionais reféns de contratos de trabalho provisórios, o que impunha aos estudantes longos períodos sem aula e, consequentemente, chances remotas de estabelecer vínculos com os professores e o acesso à educação de qualidade.

Nessas memórias, entristece-me lembrar que alguns colegas de jornada incorporavam a “política institucional racista” do Estado de que para os negros pode-se ofertar uma educação insuficiente e rudimentar.

Além da desqualificação dos alunos e de suas famílias em razão da cor da pele, eram muito comuns práticas de ensino orientadas pela descrença no potencial dos meninos e meninas com os quais convivíamos diariamente, como também naquilo que eles poderiam viver, aprender e ensinar.

Jamais vou me esquecer da diretora que deixava os livros de literatura trancados em um armário “para que os alunos não colocassem as mãos”, como ela mesma ressaltava.

Nesse contexto que deveria causar vergonha e mobilizar toda a sociedade em torno da luta antirracista, não resta dúvida de que, infelizmente, muitas vezes a escola atua como um instrumento de perpetuação da injustiça racial.

Dada a gravidade da situação, é urgente que os ministérios da Educação, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos se pronunciem, construam um plano de enfrentamento ao racismo na educação, que inclua investimentos na melhoria das unidades escolares, bem como na formação continuada de professores para promoção de equidade racial. Estamos falando de um processo de negação de direitos que impede uma trajetória ascendente de crianças e jovens negros.

No interior das escolas, também é fundamental que os profissionais da educação se insurjam contra a perversidade do racismo, colocando em prática o que determina a Lei 10.639, que em 2003 tornou obrigatório o ensino da História e da Cultura Africana e Afro-brasileira em instituições de ensino públicas e privadas.

Faz-se necessário (re) pensar currículos, práticas pedagógicas, ações e discursos, com o envolvimento das famílias dos estudantes, de modo que o ambiente escolar seja um espaço de felicidade e realização para todos e todas que lá estão.

Os dados apresentados pelo Observatório da Branquitude mostram que, dentre várias coisas, o racismo consiste em uma máquina potente de moer talentos e de matar o futuro. Não se pode pensar em um país verdadeiramente democrático enquanto o acesso à educação de qualidade for definido pela cor da pele. É preciso dar um basta a essa situação criminosa. E tem de ser agora.

As atitudes e práticas racistas no ambiente escolar deixam profundas marcas em suas vítimas, quase sempre subterraneamente, mas há indicadores que as revelam de forma escancarada.

Na semana passada, o Observatório da Branquitude, organização que pesquisa as desigualdades raciais no Brasil, divulgou dados que evidenciam o quanto o racismo estrutura, contamina as relações sociais e as instituições no Brasil. A partir de informações do Censo Escolar 2021, a entidade aponta que as escolas públicas com maioria de estudantes negros possuem estrutura mais precária se comparadas às unidades de ensino com presença predominante de estudantes brancos.

Em mais da metade das escolas frequentadas principalmente por estudantes pretos e pardos, segundo o levantamento, crianças, jovens e adultos não têm acesso a bibliotecas, laboratórios de informática e quadras poliesportivas.

Existem estabelecimentos de ensino, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, com esse mesmo perfil racial, onde encontram-se casos inomináveis, que ferem de morte, inclusive, os Direitos Humanos. Em 13 deles, não há coleta de lixo, rede de esgoto e água potável.

A professora e escritora Luana Tolentino defende a promoção continuada dos profissionais de educação para o combate das injustiças raciais nos ambientes escolares Foto: Crédito: Washington Alves/Estadão

Esses números me fizeram lembrar da minha caminhada como professora de História da Educação Básica. Ao longo de mais de uma década, percorri salas de aula situadas em territórios formados majoritariamente por pessoas de pele preta, sobretudo nos municípios de Ribeirão das Neves e Vespasiano (MG), presentes na lista dos mais pobres do país.

Minha experiência docente se deu em espaços nos quais desde “cedo se aprende que só a custo de muita teimosia se consegue tecer a vida (...) com carência, com ameaça, com desespero, com ofensa e dor”, conforme pontuou o educador Paulo Freire.

A exemplo do que foi apresentado pelo Observatório da Branquitude, nessa jornada, vi um total desprezo por parte do Estado em relação àqueles que tentavam exercer o direito de ingressar e permanecer na escola.

Vi espaços escolares com bibliotecas fechadas. Vi professores sem acesso a itens básicos, como folhas para ministrar atividades aos alunos. Vi quadras inacabadas. Vi salas insalubres, sem ventilação adequada. Vi laboratórios de informática cujos computadores tinham programas defasados, o que impedia a sua utilização. Vi profissionais reféns de contratos de trabalho provisórios, o que impunha aos estudantes longos períodos sem aula e, consequentemente, chances remotas de estabelecer vínculos com os professores e o acesso à educação de qualidade.

Nessas memórias, entristece-me lembrar que alguns colegas de jornada incorporavam a “política institucional racista” do Estado de que para os negros pode-se ofertar uma educação insuficiente e rudimentar.

Além da desqualificação dos alunos e de suas famílias em razão da cor da pele, eram muito comuns práticas de ensino orientadas pela descrença no potencial dos meninos e meninas com os quais convivíamos diariamente, como também naquilo que eles poderiam viver, aprender e ensinar.

Jamais vou me esquecer da diretora que deixava os livros de literatura trancados em um armário “para que os alunos não colocassem as mãos”, como ela mesma ressaltava.

Nesse contexto que deveria causar vergonha e mobilizar toda a sociedade em torno da luta antirracista, não resta dúvida de que, infelizmente, muitas vezes a escola atua como um instrumento de perpetuação da injustiça racial.

Dada a gravidade da situação, é urgente que os ministérios da Educação, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos se pronunciem, construam um plano de enfrentamento ao racismo na educação, que inclua investimentos na melhoria das unidades escolares, bem como na formação continuada de professores para promoção de equidade racial. Estamos falando de um processo de negação de direitos que impede uma trajetória ascendente de crianças e jovens negros.

No interior das escolas, também é fundamental que os profissionais da educação se insurjam contra a perversidade do racismo, colocando em prática o que determina a Lei 10.639, que em 2003 tornou obrigatório o ensino da História e da Cultura Africana e Afro-brasileira em instituições de ensino públicas e privadas.

Faz-se necessário (re) pensar currículos, práticas pedagógicas, ações e discursos, com o envolvimento das famílias dos estudantes, de modo que o ambiente escolar seja um espaço de felicidade e realização para todos e todas que lá estão.

Os dados apresentados pelo Observatório da Branquitude mostram que, dentre várias coisas, o racismo consiste em uma máquina potente de moer talentos e de matar o futuro. Não se pode pensar em um país verdadeiramente democrático enquanto o acesso à educação de qualidade for definido pela cor da pele. É preciso dar um basta a essa situação criminosa. E tem de ser agora.

Opinião por Luana Tolentino

Pesquisadora do Núcleo de Estados Interdisciplinares da Alteridade da UFMG, professora de História e autora do livro 'Sobrevivendo ao racismo: memórias, cartas e o cotidiano na discriminação no Brasil'

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