Entidades estudantis entraram nesta quarta-feira, 7, com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para exigir que seja suspenso o decreto presidencial que impede o pagamento de bolsas de mestrado, doutorado e residência médica no País. Como revelou o Estadão, o Ministério da Educação (MEC) teve seu caixa zerado e não tem como pagar mais de 200 mil estudantes em dezembro.
Os advogados das três entidades, União Nacional dos Estudantes (UNE), Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) e União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), alegam na peça à Justiça que o alunos precisam das bolsas para subsistência. Um dos requisitos é que o estudante contemplado não tenha outra atividade remunerada.
“É a única fonte de renda desses alunos, eles precisam do dinheiro para pagar alimentação, aluguel, transporte”, diz Rogean Vinícius Santos Soares, presidente da ANPG. “O aluno passa por seleção, dedica seu tempo para pesquisa e desenvolvimento do País e o Estado financia. Ele está cumprindo a parte dele, a bolsa não pode ser cortada de repente”, completa o advogado Humberto Fabretti, que representa as três entidades.
As bolsas deveriam ter sido pagas até esta quarta, que é o quinto dia útil do mês. As bolsas de mestrado têm valor mensal de R$ 1500 e as de doutorado, de R$ 2.200, há anos sem reajuste. A residência médica paga R$ 4106.
O Ministério da Economia divulgou nota na segunda-feira dizendo que “verificou-se um incremento atípico e acima do esperado das despesas obrigatórias com benefícios previdenciários” em 2022, o que pressionou o teto de gastos. Assim, “despesas importantes que seriam realizadas neste ano ou no começo de 2023 não poderão mais ser empenhadas e praticamente todas as despesas discricionárias que seriam pagas em dezembro estão suspensas”. Estão asseguradas apenas as despesas obrigatórias, como folha de pagamento de servidores, aposentadorias, pensões e benefícios. As bolsas não entram nesse grupo.
Na terça-feira, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), vinculada ao Ministério da Educação (MEC), divulgou nota dizendo que os cortes orçamentários promovidos pelo governo federal impõem “severa asfixia” ao órgão, que vê comprometido o pagamento de mais de 200 mil bolsas. A Capes detalhou os efeitos de dois contingenciamentos impostos pelo Ministério da Economia e disse ter sido surpreendida com a edição de um decreto que “zerou por completo a autorização para desembolsos financeiros durante o mês de dezembro”.
A informação sobre a impossibilidade do pagamento das bolsas foi passada à equipe de transição do governo eleito na segunda-feira. Segundo Henrique Paim, coordenador da área de educação, o próprio ministro Victor Godoy se mostrou preocupado na reunião.
Os 14 mil médicos residentes que atuam em hospitais universitários federais têm um custo de R$ 65 milhões. Neles estão incluídos, por exemplo, os que trabalham no Hospital São Paulo, na capital, ligado à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e outros dezenas de hospitais universitários. Na Capes, são cerca de 200 mil, entre estudantes de mestrado, doutorado e pós doutorado no Brasil e exterior, além de bolsas de formação de professores e residência pedagógica.
Na Universidade de São Paulo (USP), os restaurantes foram liberados gratuitamente para todos os pós-graduandos, após os cortes das bolsas.
Como é um decreto do presidente Jair Bolsonaro (PL), o mandado de segurança, usado quando se impede um direito líquido e certo, será encaminhado ao STF. A expectativa das entidades é que o dinheiro seja liberado até o fim da semana.
Na ação, os advogados sustentam que é “evidente a violação a direito adquirido dos bolsistas que já firmaram Termo de Compromisso com o próprio ente público”, além de abuso de poder. Dizem que muitos dos bolsistas só têm essa renda para pagar aluguéis, por exemplo, ou se alimentar. E que o governo poderia fazer cortes em bolsas futuras, mas nunca para as que já foram concedidas. A peça é assinada por Fabretti e Fernanda Massad, ambos sócios do Fabretti, Tolentino, Massad e Matos Advogados.
O MEC chegou a empenhar os recursos mas não há caixa para fazer os pagamentos. “Isso retirou da Capes a capacidade de desembolso de todo e qualquer valor - ainda que previamente empenhado - o que a impedirá de honrar os compromissos por ela assumidos, desde a manutenção administrativa da entidade até o pagamento das mais de 200 mil bolsas”, informou o órgão.
A Capes diz ter cobrado das autoridades a “imediata desobstrução dos recursos financeiros essenciais”, “sem o que a entidade e seus bolsistas já começam a sofrer severa asfixia”. “As providências solicitadas se impõem não apenas para assegurar a regularidade do funcionamento institucional da Capes, mas, principalmente, para conferir tratamento digno à ciência e a seus pesquisadores”, acrescentou.
Em nota, as entidades que compõem a Iniciativa para Ciência e Tecnologia no Parlamento Brasileiro – ICTP.Br classificaram como “muito grave a situação” do País. O texto - assinado por entidades como a Andifes, a associação dos reitores das universidades federais, e a Academia Brasileira de Ciências, a ABC- destaca que vários programas têm sido “interrompidos pela completa falta de planejamento e provisão do governo federal”.