‘É limitado nos pintar como anticiência’, diz secretário de Tarcísio, que avalia verba para a Fapesp


Em entrevista ao ‘Estadão’, Samuel Kinoshita, da Fazenda, afirma as políticas públicas precisam sempre ser reanalisadas e que as vinculações de recursos, como ocorre também com USP, Unesp e Unicamp, trazem rigidez ao orçamento; para ele, a medida do governo sobre a fundação foi apenas um apontamento do que é previsto na Constituição

Por Renata Cafardo
Atualização:
Foto: FELIPE RAU
Entrevista comSamuel KinoshitaSecretário da Fazenda de São Paulo

O secretário estadual da Fazenda, Samuel Kinoshita, diz que o governo não vai mudar a lei de diretrizes orçamentárias que abre a possibilidade de reduzir em 30% os recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). “Não há compromisso nem para um lado, nem para o outro”, afirma em entrevista ao Estadão, sobre diminuir ou não a verba do órgão.

Para ele, foi feita apenas “uma medida de transparência” orçamentária, remetendo a algo já previsto na Constituição Federal, e as verbas ainda estão sendo analisadas. “Francamente, eu poderia fazer isso hoje. Por que não fiz?” questiona, completando que não entendeu por que houve “tanto ruído”.

Kinoshita argumenta que as muitas vinculações de recursos trazem rigidez ao orçamento e que “as políticas públicas precisam sempre ser reavaliadas”. “A tentativa de narrativa política de ficar pintando eu ou o governador como anticiência, eu acho muito limitada, muito superficial. É importante sempre avaliar e reavaliar os benefícios e os custos elencados de qualquer decisão, isso vale para tudo, inclusive para nossas joias”, diz, referindo-se às três universidades estaduais paulistas, Universidade de São Paulo (USP), Estadual de Campinas (Unicamp) e Estadual Paulista (Unesp).

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A mesma lei de diretrizes orçamentárias (LDO) que prevê a possibilidade de desvincular verbas da Fapesp também havia proposto a redução de parte do orçamento das três universidades públicas paulistas, que têm autonomia financeira desde 1989 e recebem 9,57% da arrecadação do ICMS do Estado. Após reportagem do Estadão e repercussão negativa, o governo voltou atrás dessa decisão.

O secretário da Fazenda de São Paulo, Samuel Kinoshita, afirma que o debate sobre o uso de recursos é bom para sociedade Foto: Felipe Rau/Estadão

Já a Fapesp é financiada por 1% da receita tributária estadual, o que é previsto na Constituição paulista, também desde 1989. A possibilidade de redução de recursos está indicada no artigo 22 da LDO, enviada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) à Assembleia no mês passado, como relevou o Estadão.

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O texto diz que a destinação levaria em conta a partir de 2025, também “os termos” do artigo 76-A do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal. Ele prevê que 30% das receitas de Estados e Distrito Federal relativas a impostos e taxas podem ser desvinculadas até 2032.

Apesar da emenda existir desde 2016, foi a primeira vez que ela foi citada explicitamente na LDO no que refere à Fapesp, o que causou preocupação no meio acadêmico, científico e até entre empresários e industriais.

Com um orçamento de cerca de R$ 2 bilhões, a Fapesp é uma das principais financiadoras da ciência e da inovação no País. Seus recursos vão para 10 mil de bolsas de pesquisadores, laboratórios, centros de inovação tecnológica e startups em áreas como mudança climática, bioenergia, câncer, aviação, agricultura e biodiversidade.

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“Esse é um bom debate, sobre um naco importante de recursos, ele precisa ter uma boa justificativa. Eu tenho certeza que a Fapesp vai trazer bons argumentos. Eu tenho convicção de que a Fapesp faz um bom trabalho”, afirma o secretário.

Veja a seguir os principais trechos da entrevista.

Por que o governo colocou o artigo na lei de diretrizes orçamentárias (LDO) que abre a possibilidade de reduzir em 30% o orçamento da Fapesp?

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É natural que alguns pontos gerem repercussão e percepções diferentes, mas no aspecto da Fapesp, o que eu promovi através da proposta de lei de diretrizes orçamentárias - e estou falando da lei de diretrizes orçamentárias, não do orçamento -, é um ajuste meramente pontual de remissão. Acrescenta-se o artigo 76A, que é basicamente a possibilidade da aplicação da DREM (Desvinculação de Receitas dos Estados e Municípios). É como se fosse um pointer, nós estamos apontando para um ativo da Constituição Federal que viabiliza a possibilidade de aplicação desse dispositivo. Um dispositivo que começou no meio dos anos 90, mudou de nome, mas a ideia de desvincular já estava no Brasil e é aplicada há 30 anos. É um conceito muito importante porque nosso orçamento paulatinamente foi perdendo essa capacidade de ajuste e ele foi ficando cada vez mais obrigatório.

Mas esse dispositivo nunca havia sido colocado explicitamente no que se refere à Fapesp, o que deu a entender que o governo tinha a intenção de usá-lo.

Isso faz parte de uma filosofia de modernização da administração e melhoria da gestão, de contenção de gastos de custeio. Tudo isso está muito concatenado e um ponto importante é a avaliação e reavaliação da política pública praticada, seja na esfera orçamentária, seja na tributária. Estamos evoluindo muito na revisão dos programas, uma revisão constante do orçamento, da política. Então, é sempre legítimo e desejável que esse debate ocorra. E aí você vai falar: ‘Poxa vida, então quer dizer que você já tem uma avaliação da política pública praticada na história orçamentária da Fapesp e já tem uma intenção?’ Não, não há intenção neste momento. Francamente, eu realmente poderia fazer hoje. Por que que eu não fiz?

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O senhor está avaliando ainda o uso dos recursos da Fapesp para entender se há necessidade de redução?

Não, eu não fiz a avaliação da Fapesp. É óbvio que depois desse ruído, até pelos valores que a gente está falando, quer dizer, 1% da receita tributária do Estado de São Paulo é um valor bem significativo. A gente está falando de valores superiores a R$ 2 bilhões. Acho que é bastante dinheiro até no Estado de São Paulo, é dinheiro em qualquer lugar. Sabemos que a Fapesp também conseguiu, através desse valor significativo, de aplicações, nos últimos anos, resguardar um colchão bastante pronunciado. E eu não estou aqui pra dizer ‘veja bem, é muito dinheiro, é pouco dinheiro’, não é isso.

Mas acho que deveria ser avaliado, por ser público, tem que ser constantemente avaliado, seja na esfera tributária, seja na esfera orçamentária. Aqui não é necessariamente mais ou menos carga. Acho que cai em um debate bobinho, de sou liberal, sou isso ou aquilo. Temos uma capacidade enorme no Brasil de avançar na margem de ganho de eficiência do processo orçamentário. É importante que a gente tenha instrumentos de maior maleabilidade, maior flexibilidade, que a gente consiga promover avaliações e reavaliações da política pública praticada.

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Por ser público, tem que ser constantemente avaliado, seja na esfera tributária, seja na esfera orçamentária. Aqui não é necessariamente mais ou menos carga. Acho que cai em um debate bobinho, de sou liberal, sou isso ou aquilo.

O senhor se surpreendeu com a reação negativa de muitos setores, acadêmicos, cientistas, empresários, indústria, contra a medida do governo?

Me surpreendeu como acabou gerando esse ruído significativo, vi umas manifestações de gente muito experiente na administração pública dizendo que vamos contingenciar 30% do orçamento. Ninguém contingenciou coisa nenhuma, não se remanejou nada. Está se dando transparência a um fato constitucional, algo que é perfeitamente aplicado, ela não necessariamente se concretiza na peça na LOA (lei orçamentária), numa proposta a ser enviada em setembro. Mas, na verdade, o debate é ótimo, do ponto de vista orçamentário. É isso que a sociedade tem que promover mesmo.

Esse é um bom debate, sobre um naco importante de recursos, ele precisa ter uma boa justificativa. Eu tenho certeza que a Fapesp vai trazer bons argumentos ou as pessoas que têm envolvimento com a Fapesp vão trazer bons argumentos. Tenho convicção de que a Fapesp faz um bom trabalho. Tenho convicção que a Fapesp certamente vai citar bons trabalhos feitos. Do ponto de vista técnico, não foi feita ainda uma avaliação dos programas, daquilo que a Fapesp faz com essa dotação, nem um debate mais político dos nossos representantes eleitos na Assembleia, esse debate ainda vai ser feito. Ele vai ser feito na peça orçamentária mesmo, na LOA.

Há um compromisso no governo de não cortar recursos da Fapesp?

O que há é possibilidade de aplicar a DREM, não há compromisso nem para um lado, nem para o outro.

Há alguma intenção do governo de mudar o artigo da LDO que fala sobre o orçamento da Fapesp?

Não, não há. Ele é muito singelo, ele faz um mero ajuste de remissão à Constituição Federal, não vejo necessidade disso. Confere não só transparência, mas a possibilidade, a opcionalidade, a faculdade de (reduzir em 30%). Mas as intenções são as melhores possíveis na administração e é óbvio que o debate público é importante.

Por que o governo incluiu também na LDO a ideia de diminuir a fatia do orçamento das três universidades públicas, USP, Unesp e Unicamp, e depois voltou atrás?

Existe uma filosofia, um intuito muito forte da minha parte, da administração, com relação a ter maior maleabilidade no orçamento, maior flexibilidade no nosso caminho do ponto de vista orçamentário. Aquele caso, a gente já divulgou isso e você também deu visibilidade, houve o retorno ao status quo, à aplicação dos 9,57% do ICMS para as universidades estaduais. O intuito era, dentro dessa mesma filosofia, de dar grande flexibilidade, de ganho de variabilidade do orçamento. De novo, não tinha nada dizendo “corte”. Você colocar mais um ou dois ou três elementos dentro de um determinado mínimo, aquilo é um mínimo, não quer dizer que você vai cortar recurso de ninguém. A gente não controla a economia mundial, nem a nacional, mas o intuito todo é que a gente consiga melhorar esse ambiente de negócio e gerar mais crescimento e, consequentemente, mais arrecadação. Se as coisas derem certo, se a gente conseguir viabilizar, e eu estou cada dia mais convencido que a gente vai ter uma economia mais pujante e mais arrecadação, de forma que ninguém seria diminuído no seu orçamento.

O senhor considera as vinculações de recursos para educação, universidades, Fapesp, um problema aqui no Estado de São Paulo?

Diria que a vinculações, quando quando você olha individualmente, em graus diferente, elas vão ter mérito. Porque elas certamente abarcam aquilo que é uma aspiração da sociedade. Mas quando você tem a junção dessas diversas vinculações, você torna a gestão do processo orçamentário mais difícil. As desvinculações já eram importantes 30 anos atrás e hoje talvez tenham ficado ainda mais importantes. Quando você tem um acúmulo de rigidez, isso torna o processo mais difícil.

USP, Unesp e Unicamp sustentam que a autonomia financeira, que vem dessa vinculação de uma parte do ICMS, foi crucial para que elas pudessem se planejar e estarem entre as maiores universidades do mundo hoje, sem depender da vontade de um ou outro governador.

As nossas universidades estaduais são joias da nossa sociedade paulista, dos 45 milhões de brasileiros aqui no Estado de São Paulo. Eu só acho importante a gente colocar as ponderações. Do mesmo jeito que benefícios vieram de todo o processo construído nas últimas décadas, também existem custos e é importante que a sociedade consiga sempre reavaliar os custos e benefícios de decisões. Também acho curioso dizer que foi importante para proteger do governador, de um determinado governador A, B ou C, não estou falando do meu, não. Quer dizer o sujeito é eleito pela população, com milhões e milhões de votos, e a gente precisa proteger? Proteger a proposta de lei de diretrizes orçamentária do sujeito que foi eleito, da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), de todos os 94 representantes do povo?

E eu acho curioso que tem uma certa narrativa. A tentativa de narrativa política de ficar pintando eu ou o governador como anticiência, eu acho muito limitada, muito superficial. É importante sempre avaliar e reavaliar os benefícios e os custos elencados de qualquer decisão, isso vale para tudo, inclusive para nossas joias. Tenho a maior admiração pelo meio acadêmico, tenho dois mestrados, o governador teve uma trajetória de estudo em escolas públicas, é um sujeito muito inteligente que sempre valorizou um input técnico científico.

As nossas universidades estaduais são joias da nossa sociedade paulista. Do mesmo jeito que benefícios vieram de todo o processo construído nas últimas décadas, também existem custos e é importante que a sociedade consiga sempre reavaliar os custos e benefícios de decisões.

No caso das universidades, houve impacto na imagem do governador ou foi percebido um erro? Qual foi a razão do recuo?

Não foi percebido um erro. O timing de discussão...francamente, se, no momento, o mais desejável é que a gente não adentre essa discussão, ela pode ser feita em outro tempo. O governador não se sentiu impactado. Ele já passou por uma campanha polarizada a aguda, com acusações. Então foi um bom debate sobre as nossas universidades estaduais. A gente também está tendo um bom debate sobre a Fapesp e isso só vai vai acelerar o processo de cada dia ter uma alocação ainda melhor do gasto público.

Se houvesse a desvinculação dos recursos da Fapesp para onde eles iriam, já que a Constituição fala em serviços prioritários, quais seriam eles?

Mas aí a gente está na esfera da hipóteses. Mas caso houvesse uma desvinculação, mesmo achando muito preliminar falar disso porque a gente não entrou nessa análise de aplicação, as aspirações da sociedade são amplas, inclusive no setor na educação. Então não acho que necessariamente é uma retirada de recurso de lado A pro lado B ou C, não se trata disso, é um conceito de estratégia de como ter uma uma melhor gestão do recurso público. A gente não está dizendo ‘aplique’, pelo contrário.

Com a reforma tributária e o fim do ICMS também precisará ser rediscutido o orçamento de USP, Unesp e Unicamp. O governo já tem uma proposta sobre isso?

Olha que oportunidade para a gente travar esse debate no alto patamar? Eu acho ótimo, na verdade. Nós temos as três joias na nossa constelação de universidades estaduais. Como melhor potencializar? Qual é o formato? Acho que é um debate para a sociedade mesmo, a discussão de como, quando, de que maneira vai resguardar essa autonomia. Como que você respalda isso? Respaldou-se até aqui com uma vinculação de 9,57% do ICMS. Mas tudo isso deve estar dentro de uma filosofia de avaliação e reavaliação da boa política pública.

O secretário estadual da Fazenda, Samuel Kinoshita, diz que o governo não vai mudar a lei de diretrizes orçamentárias que abre a possibilidade de reduzir em 30% os recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). “Não há compromisso nem para um lado, nem para o outro”, afirma em entrevista ao Estadão, sobre diminuir ou não a verba do órgão.

Para ele, foi feita apenas “uma medida de transparência” orçamentária, remetendo a algo já previsto na Constituição Federal, e as verbas ainda estão sendo analisadas. “Francamente, eu poderia fazer isso hoje. Por que não fiz?” questiona, completando que não entendeu por que houve “tanto ruído”.

Kinoshita argumenta que as muitas vinculações de recursos trazem rigidez ao orçamento e que “as políticas públicas precisam sempre ser reavaliadas”. “A tentativa de narrativa política de ficar pintando eu ou o governador como anticiência, eu acho muito limitada, muito superficial. É importante sempre avaliar e reavaliar os benefícios e os custos elencados de qualquer decisão, isso vale para tudo, inclusive para nossas joias”, diz, referindo-se às três universidades estaduais paulistas, Universidade de São Paulo (USP), Estadual de Campinas (Unicamp) e Estadual Paulista (Unesp).

A mesma lei de diretrizes orçamentárias (LDO) que prevê a possibilidade de desvincular verbas da Fapesp também havia proposto a redução de parte do orçamento das três universidades públicas paulistas, que têm autonomia financeira desde 1989 e recebem 9,57% da arrecadação do ICMS do Estado. Após reportagem do Estadão e repercussão negativa, o governo voltou atrás dessa decisão.

O secretário da Fazenda de São Paulo, Samuel Kinoshita, afirma que o debate sobre o uso de recursos é bom para sociedade Foto: Felipe Rau/Estadão

Já a Fapesp é financiada por 1% da receita tributária estadual, o que é previsto na Constituição paulista, também desde 1989. A possibilidade de redução de recursos está indicada no artigo 22 da LDO, enviada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) à Assembleia no mês passado, como relevou o Estadão.

O texto diz que a destinação levaria em conta a partir de 2025, também “os termos” do artigo 76-A do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal. Ele prevê que 30% das receitas de Estados e Distrito Federal relativas a impostos e taxas podem ser desvinculadas até 2032.

Apesar da emenda existir desde 2016, foi a primeira vez que ela foi citada explicitamente na LDO no que refere à Fapesp, o que causou preocupação no meio acadêmico, científico e até entre empresários e industriais.

Com um orçamento de cerca de R$ 2 bilhões, a Fapesp é uma das principais financiadoras da ciência e da inovação no País. Seus recursos vão para 10 mil de bolsas de pesquisadores, laboratórios, centros de inovação tecnológica e startups em áreas como mudança climática, bioenergia, câncer, aviação, agricultura e biodiversidade.

“Esse é um bom debate, sobre um naco importante de recursos, ele precisa ter uma boa justificativa. Eu tenho certeza que a Fapesp vai trazer bons argumentos. Eu tenho convicção de que a Fapesp faz um bom trabalho”, afirma o secretário.

Veja a seguir os principais trechos da entrevista.

Por que o governo colocou o artigo na lei de diretrizes orçamentárias (LDO) que abre a possibilidade de reduzir em 30% o orçamento da Fapesp?

É natural que alguns pontos gerem repercussão e percepções diferentes, mas no aspecto da Fapesp, o que eu promovi através da proposta de lei de diretrizes orçamentárias - e estou falando da lei de diretrizes orçamentárias, não do orçamento -, é um ajuste meramente pontual de remissão. Acrescenta-se o artigo 76A, que é basicamente a possibilidade da aplicação da DREM (Desvinculação de Receitas dos Estados e Municípios). É como se fosse um pointer, nós estamos apontando para um ativo da Constituição Federal que viabiliza a possibilidade de aplicação desse dispositivo. Um dispositivo que começou no meio dos anos 90, mudou de nome, mas a ideia de desvincular já estava no Brasil e é aplicada há 30 anos. É um conceito muito importante porque nosso orçamento paulatinamente foi perdendo essa capacidade de ajuste e ele foi ficando cada vez mais obrigatório.

Mas esse dispositivo nunca havia sido colocado explicitamente no que se refere à Fapesp, o que deu a entender que o governo tinha a intenção de usá-lo.

Isso faz parte de uma filosofia de modernização da administração e melhoria da gestão, de contenção de gastos de custeio. Tudo isso está muito concatenado e um ponto importante é a avaliação e reavaliação da política pública praticada, seja na esfera orçamentária, seja na tributária. Estamos evoluindo muito na revisão dos programas, uma revisão constante do orçamento, da política. Então, é sempre legítimo e desejável que esse debate ocorra. E aí você vai falar: ‘Poxa vida, então quer dizer que você já tem uma avaliação da política pública praticada na história orçamentária da Fapesp e já tem uma intenção?’ Não, não há intenção neste momento. Francamente, eu realmente poderia fazer hoje. Por que que eu não fiz?

O senhor está avaliando ainda o uso dos recursos da Fapesp para entender se há necessidade de redução?

Não, eu não fiz a avaliação da Fapesp. É óbvio que depois desse ruído, até pelos valores que a gente está falando, quer dizer, 1% da receita tributária do Estado de São Paulo é um valor bem significativo. A gente está falando de valores superiores a R$ 2 bilhões. Acho que é bastante dinheiro até no Estado de São Paulo, é dinheiro em qualquer lugar. Sabemos que a Fapesp também conseguiu, através desse valor significativo, de aplicações, nos últimos anos, resguardar um colchão bastante pronunciado. E eu não estou aqui pra dizer ‘veja bem, é muito dinheiro, é pouco dinheiro’, não é isso.

Mas acho que deveria ser avaliado, por ser público, tem que ser constantemente avaliado, seja na esfera tributária, seja na esfera orçamentária. Aqui não é necessariamente mais ou menos carga. Acho que cai em um debate bobinho, de sou liberal, sou isso ou aquilo. Temos uma capacidade enorme no Brasil de avançar na margem de ganho de eficiência do processo orçamentário. É importante que a gente tenha instrumentos de maior maleabilidade, maior flexibilidade, que a gente consiga promover avaliações e reavaliações da política pública praticada.

Por ser público, tem que ser constantemente avaliado, seja na esfera tributária, seja na esfera orçamentária. Aqui não é necessariamente mais ou menos carga. Acho que cai em um debate bobinho, de sou liberal, sou isso ou aquilo.

O senhor se surpreendeu com a reação negativa de muitos setores, acadêmicos, cientistas, empresários, indústria, contra a medida do governo?

Me surpreendeu como acabou gerando esse ruído significativo, vi umas manifestações de gente muito experiente na administração pública dizendo que vamos contingenciar 30% do orçamento. Ninguém contingenciou coisa nenhuma, não se remanejou nada. Está se dando transparência a um fato constitucional, algo que é perfeitamente aplicado, ela não necessariamente se concretiza na peça na LOA (lei orçamentária), numa proposta a ser enviada em setembro. Mas, na verdade, o debate é ótimo, do ponto de vista orçamentário. É isso que a sociedade tem que promover mesmo.

Esse é um bom debate, sobre um naco importante de recursos, ele precisa ter uma boa justificativa. Eu tenho certeza que a Fapesp vai trazer bons argumentos ou as pessoas que têm envolvimento com a Fapesp vão trazer bons argumentos. Tenho convicção de que a Fapesp faz um bom trabalho. Tenho convicção que a Fapesp certamente vai citar bons trabalhos feitos. Do ponto de vista técnico, não foi feita ainda uma avaliação dos programas, daquilo que a Fapesp faz com essa dotação, nem um debate mais político dos nossos representantes eleitos na Assembleia, esse debate ainda vai ser feito. Ele vai ser feito na peça orçamentária mesmo, na LOA.

Há um compromisso no governo de não cortar recursos da Fapesp?

O que há é possibilidade de aplicar a DREM, não há compromisso nem para um lado, nem para o outro.

Há alguma intenção do governo de mudar o artigo da LDO que fala sobre o orçamento da Fapesp?

Não, não há. Ele é muito singelo, ele faz um mero ajuste de remissão à Constituição Federal, não vejo necessidade disso. Confere não só transparência, mas a possibilidade, a opcionalidade, a faculdade de (reduzir em 30%). Mas as intenções são as melhores possíveis na administração e é óbvio que o debate público é importante.

Por que o governo incluiu também na LDO a ideia de diminuir a fatia do orçamento das três universidades públicas, USP, Unesp e Unicamp, e depois voltou atrás?

Existe uma filosofia, um intuito muito forte da minha parte, da administração, com relação a ter maior maleabilidade no orçamento, maior flexibilidade no nosso caminho do ponto de vista orçamentário. Aquele caso, a gente já divulgou isso e você também deu visibilidade, houve o retorno ao status quo, à aplicação dos 9,57% do ICMS para as universidades estaduais. O intuito era, dentro dessa mesma filosofia, de dar grande flexibilidade, de ganho de variabilidade do orçamento. De novo, não tinha nada dizendo “corte”. Você colocar mais um ou dois ou três elementos dentro de um determinado mínimo, aquilo é um mínimo, não quer dizer que você vai cortar recurso de ninguém. A gente não controla a economia mundial, nem a nacional, mas o intuito todo é que a gente consiga melhorar esse ambiente de negócio e gerar mais crescimento e, consequentemente, mais arrecadação. Se as coisas derem certo, se a gente conseguir viabilizar, e eu estou cada dia mais convencido que a gente vai ter uma economia mais pujante e mais arrecadação, de forma que ninguém seria diminuído no seu orçamento.

O senhor considera as vinculações de recursos para educação, universidades, Fapesp, um problema aqui no Estado de São Paulo?

Diria que a vinculações, quando quando você olha individualmente, em graus diferente, elas vão ter mérito. Porque elas certamente abarcam aquilo que é uma aspiração da sociedade. Mas quando você tem a junção dessas diversas vinculações, você torna a gestão do processo orçamentário mais difícil. As desvinculações já eram importantes 30 anos atrás e hoje talvez tenham ficado ainda mais importantes. Quando você tem um acúmulo de rigidez, isso torna o processo mais difícil.

USP, Unesp e Unicamp sustentam que a autonomia financeira, que vem dessa vinculação de uma parte do ICMS, foi crucial para que elas pudessem se planejar e estarem entre as maiores universidades do mundo hoje, sem depender da vontade de um ou outro governador.

As nossas universidades estaduais são joias da nossa sociedade paulista, dos 45 milhões de brasileiros aqui no Estado de São Paulo. Eu só acho importante a gente colocar as ponderações. Do mesmo jeito que benefícios vieram de todo o processo construído nas últimas décadas, também existem custos e é importante que a sociedade consiga sempre reavaliar os custos e benefícios de decisões. Também acho curioso dizer que foi importante para proteger do governador, de um determinado governador A, B ou C, não estou falando do meu, não. Quer dizer o sujeito é eleito pela população, com milhões e milhões de votos, e a gente precisa proteger? Proteger a proposta de lei de diretrizes orçamentária do sujeito que foi eleito, da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), de todos os 94 representantes do povo?

E eu acho curioso que tem uma certa narrativa. A tentativa de narrativa política de ficar pintando eu ou o governador como anticiência, eu acho muito limitada, muito superficial. É importante sempre avaliar e reavaliar os benefícios e os custos elencados de qualquer decisão, isso vale para tudo, inclusive para nossas joias. Tenho a maior admiração pelo meio acadêmico, tenho dois mestrados, o governador teve uma trajetória de estudo em escolas públicas, é um sujeito muito inteligente que sempre valorizou um input técnico científico.

As nossas universidades estaduais são joias da nossa sociedade paulista. Do mesmo jeito que benefícios vieram de todo o processo construído nas últimas décadas, também existem custos e é importante que a sociedade consiga sempre reavaliar os custos e benefícios de decisões.

No caso das universidades, houve impacto na imagem do governador ou foi percebido um erro? Qual foi a razão do recuo?

Não foi percebido um erro. O timing de discussão...francamente, se, no momento, o mais desejável é que a gente não adentre essa discussão, ela pode ser feita em outro tempo. O governador não se sentiu impactado. Ele já passou por uma campanha polarizada a aguda, com acusações. Então foi um bom debate sobre as nossas universidades estaduais. A gente também está tendo um bom debate sobre a Fapesp e isso só vai vai acelerar o processo de cada dia ter uma alocação ainda melhor do gasto público.

Se houvesse a desvinculação dos recursos da Fapesp para onde eles iriam, já que a Constituição fala em serviços prioritários, quais seriam eles?

Mas aí a gente está na esfera da hipóteses. Mas caso houvesse uma desvinculação, mesmo achando muito preliminar falar disso porque a gente não entrou nessa análise de aplicação, as aspirações da sociedade são amplas, inclusive no setor na educação. Então não acho que necessariamente é uma retirada de recurso de lado A pro lado B ou C, não se trata disso, é um conceito de estratégia de como ter uma uma melhor gestão do recurso público. A gente não está dizendo ‘aplique’, pelo contrário.

Com a reforma tributária e o fim do ICMS também precisará ser rediscutido o orçamento de USP, Unesp e Unicamp. O governo já tem uma proposta sobre isso?

Olha que oportunidade para a gente travar esse debate no alto patamar? Eu acho ótimo, na verdade. Nós temos as três joias na nossa constelação de universidades estaduais. Como melhor potencializar? Qual é o formato? Acho que é um debate para a sociedade mesmo, a discussão de como, quando, de que maneira vai resguardar essa autonomia. Como que você respalda isso? Respaldou-se até aqui com uma vinculação de 9,57% do ICMS. Mas tudo isso deve estar dentro de uma filosofia de avaliação e reavaliação da boa política pública.

O secretário estadual da Fazenda, Samuel Kinoshita, diz que o governo não vai mudar a lei de diretrizes orçamentárias que abre a possibilidade de reduzir em 30% os recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). “Não há compromisso nem para um lado, nem para o outro”, afirma em entrevista ao Estadão, sobre diminuir ou não a verba do órgão.

Para ele, foi feita apenas “uma medida de transparência” orçamentária, remetendo a algo já previsto na Constituição Federal, e as verbas ainda estão sendo analisadas. “Francamente, eu poderia fazer isso hoje. Por que não fiz?” questiona, completando que não entendeu por que houve “tanto ruído”.

Kinoshita argumenta que as muitas vinculações de recursos trazem rigidez ao orçamento e que “as políticas públicas precisam sempre ser reavaliadas”. “A tentativa de narrativa política de ficar pintando eu ou o governador como anticiência, eu acho muito limitada, muito superficial. É importante sempre avaliar e reavaliar os benefícios e os custos elencados de qualquer decisão, isso vale para tudo, inclusive para nossas joias”, diz, referindo-se às três universidades estaduais paulistas, Universidade de São Paulo (USP), Estadual de Campinas (Unicamp) e Estadual Paulista (Unesp).

A mesma lei de diretrizes orçamentárias (LDO) que prevê a possibilidade de desvincular verbas da Fapesp também havia proposto a redução de parte do orçamento das três universidades públicas paulistas, que têm autonomia financeira desde 1989 e recebem 9,57% da arrecadação do ICMS do Estado. Após reportagem do Estadão e repercussão negativa, o governo voltou atrás dessa decisão.

O secretário da Fazenda de São Paulo, Samuel Kinoshita, afirma que o debate sobre o uso de recursos é bom para sociedade Foto: Felipe Rau/Estadão

Já a Fapesp é financiada por 1% da receita tributária estadual, o que é previsto na Constituição paulista, também desde 1989. A possibilidade de redução de recursos está indicada no artigo 22 da LDO, enviada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) à Assembleia no mês passado, como relevou o Estadão.

O texto diz que a destinação levaria em conta a partir de 2025, também “os termos” do artigo 76-A do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal. Ele prevê que 30% das receitas de Estados e Distrito Federal relativas a impostos e taxas podem ser desvinculadas até 2032.

Apesar da emenda existir desde 2016, foi a primeira vez que ela foi citada explicitamente na LDO no que refere à Fapesp, o que causou preocupação no meio acadêmico, científico e até entre empresários e industriais.

Com um orçamento de cerca de R$ 2 bilhões, a Fapesp é uma das principais financiadoras da ciência e da inovação no País. Seus recursos vão para 10 mil de bolsas de pesquisadores, laboratórios, centros de inovação tecnológica e startups em áreas como mudança climática, bioenergia, câncer, aviação, agricultura e biodiversidade.

“Esse é um bom debate, sobre um naco importante de recursos, ele precisa ter uma boa justificativa. Eu tenho certeza que a Fapesp vai trazer bons argumentos. Eu tenho convicção de que a Fapesp faz um bom trabalho”, afirma o secretário.

Veja a seguir os principais trechos da entrevista.

Por que o governo colocou o artigo na lei de diretrizes orçamentárias (LDO) que abre a possibilidade de reduzir em 30% o orçamento da Fapesp?

É natural que alguns pontos gerem repercussão e percepções diferentes, mas no aspecto da Fapesp, o que eu promovi através da proposta de lei de diretrizes orçamentárias - e estou falando da lei de diretrizes orçamentárias, não do orçamento -, é um ajuste meramente pontual de remissão. Acrescenta-se o artigo 76A, que é basicamente a possibilidade da aplicação da DREM (Desvinculação de Receitas dos Estados e Municípios). É como se fosse um pointer, nós estamos apontando para um ativo da Constituição Federal que viabiliza a possibilidade de aplicação desse dispositivo. Um dispositivo que começou no meio dos anos 90, mudou de nome, mas a ideia de desvincular já estava no Brasil e é aplicada há 30 anos. É um conceito muito importante porque nosso orçamento paulatinamente foi perdendo essa capacidade de ajuste e ele foi ficando cada vez mais obrigatório.

Mas esse dispositivo nunca havia sido colocado explicitamente no que se refere à Fapesp, o que deu a entender que o governo tinha a intenção de usá-lo.

Isso faz parte de uma filosofia de modernização da administração e melhoria da gestão, de contenção de gastos de custeio. Tudo isso está muito concatenado e um ponto importante é a avaliação e reavaliação da política pública praticada, seja na esfera orçamentária, seja na tributária. Estamos evoluindo muito na revisão dos programas, uma revisão constante do orçamento, da política. Então, é sempre legítimo e desejável que esse debate ocorra. E aí você vai falar: ‘Poxa vida, então quer dizer que você já tem uma avaliação da política pública praticada na história orçamentária da Fapesp e já tem uma intenção?’ Não, não há intenção neste momento. Francamente, eu realmente poderia fazer hoje. Por que que eu não fiz?

O senhor está avaliando ainda o uso dos recursos da Fapesp para entender se há necessidade de redução?

Não, eu não fiz a avaliação da Fapesp. É óbvio que depois desse ruído, até pelos valores que a gente está falando, quer dizer, 1% da receita tributária do Estado de São Paulo é um valor bem significativo. A gente está falando de valores superiores a R$ 2 bilhões. Acho que é bastante dinheiro até no Estado de São Paulo, é dinheiro em qualquer lugar. Sabemos que a Fapesp também conseguiu, através desse valor significativo, de aplicações, nos últimos anos, resguardar um colchão bastante pronunciado. E eu não estou aqui pra dizer ‘veja bem, é muito dinheiro, é pouco dinheiro’, não é isso.

Mas acho que deveria ser avaliado, por ser público, tem que ser constantemente avaliado, seja na esfera tributária, seja na esfera orçamentária. Aqui não é necessariamente mais ou menos carga. Acho que cai em um debate bobinho, de sou liberal, sou isso ou aquilo. Temos uma capacidade enorme no Brasil de avançar na margem de ganho de eficiência do processo orçamentário. É importante que a gente tenha instrumentos de maior maleabilidade, maior flexibilidade, que a gente consiga promover avaliações e reavaliações da política pública praticada.

Por ser público, tem que ser constantemente avaliado, seja na esfera tributária, seja na esfera orçamentária. Aqui não é necessariamente mais ou menos carga. Acho que cai em um debate bobinho, de sou liberal, sou isso ou aquilo.

O senhor se surpreendeu com a reação negativa de muitos setores, acadêmicos, cientistas, empresários, indústria, contra a medida do governo?

Me surpreendeu como acabou gerando esse ruído significativo, vi umas manifestações de gente muito experiente na administração pública dizendo que vamos contingenciar 30% do orçamento. Ninguém contingenciou coisa nenhuma, não se remanejou nada. Está se dando transparência a um fato constitucional, algo que é perfeitamente aplicado, ela não necessariamente se concretiza na peça na LOA (lei orçamentária), numa proposta a ser enviada em setembro. Mas, na verdade, o debate é ótimo, do ponto de vista orçamentário. É isso que a sociedade tem que promover mesmo.

Esse é um bom debate, sobre um naco importante de recursos, ele precisa ter uma boa justificativa. Eu tenho certeza que a Fapesp vai trazer bons argumentos ou as pessoas que têm envolvimento com a Fapesp vão trazer bons argumentos. Tenho convicção de que a Fapesp faz um bom trabalho. Tenho convicção que a Fapesp certamente vai citar bons trabalhos feitos. Do ponto de vista técnico, não foi feita ainda uma avaliação dos programas, daquilo que a Fapesp faz com essa dotação, nem um debate mais político dos nossos representantes eleitos na Assembleia, esse debate ainda vai ser feito. Ele vai ser feito na peça orçamentária mesmo, na LOA.

Há um compromisso no governo de não cortar recursos da Fapesp?

O que há é possibilidade de aplicar a DREM, não há compromisso nem para um lado, nem para o outro.

Há alguma intenção do governo de mudar o artigo da LDO que fala sobre o orçamento da Fapesp?

Não, não há. Ele é muito singelo, ele faz um mero ajuste de remissão à Constituição Federal, não vejo necessidade disso. Confere não só transparência, mas a possibilidade, a opcionalidade, a faculdade de (reduzir em 30%). Mas as intenções são as melhores possíveis na administração e é óbvio que o debate público é importante.

Por que o governo incluiu também na LDO a ideia de diminuir a fatia do orçamento das três universidades públicas, USP, Unesp e Unicamp, e depois voltou atrás?

Existe uma filosofia, um intuito muito forte da minha parte, da administração, com relação a ter maior maleabilidade no orçamento, maior flexibilidade no nosso caminho do ponto de vista orçamentário. Aquele caso, a gente já divulgou isso e você também deu visibilidade, houve o retorno ao status quo, à aplicação dos 9,57% do ICMS para as universidades estaduais. O intuito era, dentro dessa mesma filosofia, de dar grande flexibilidade, de ganho de variabilidade do orçamento. De novo, não tinha nada dizendo “corte”. Você colocar mais um ou dois ou três elementos dentro de um determinado mínimo, aquilo é um mínimo, não quer dizer que você vai cortar recurso de ninguém. A gente não controla a economia mundial, nem a nacional, mas o intuito todo é que a gente consiga melhorar esse ambiente de negócio e gerar mais crescimento e, consequentemente, mais arrecadação. Se as coisas derem certo, se a gente conseguir viabilizar, e eu estou cada dia mais convencido que a gente vai ter uma economia mais pujante e mais arrecadação, de forma que ninguém seria diminuído no seu orçamento.

O senhor considera as vinculações de recursos para educação, universidades, Fapesp, um problema aqui no Estado de São Paulo?

Diria que a vinculações, quando quando você olha individualmente, em graus diferente, elas vão ter mérito. Porque elas certamente abarcam aquilo que é uma aspiração da sociedade. Mas quando você tem a junção dessas diversas vinculações, você torna a gestão do processo orçamentário mais difícil. As desvinculações já eram importantes 30 anos atrás e hoje talvez tenham ficado ainda mais importantes. Quando você tem um acúmulo de rigidez, isso torna o processo mais difícil.

USP, Unesp e Unicamp sustentam que a autonomia financeira, que vem dessa vinculação de uma parte do ICMS, foi crucial para que elas pudessem se planejar e estarem entre as maiores universidades do mundo hoje, sem depender da vontade de um ou outro governador.

As nossas universidades estaduais são joias da nossa sociedade paulista, dos 45 milhões de brasileiros aqui no Estado de São Paulo. Eu só acho importante a gente colocar as ponderações. Do mesmo jeito que benefícios vieram de todo o processo construído nas últimas décadas, também existem custos e é importante que a sociedade consiga sempre reavaliar os custos e benefícios de decisões. Também acho curioso dizer que foi importante para proteger do governador, de um determinado governador A, B ou C, não estou falando do meu, não. Quer dizer o sujeito é eleito pela população, com milhões e milhões de votos, e a gente precisa proteger? Proteger a proposta de lei de diretrizes orçamentária do sujeito que foi eleito, da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), de todos os 94 representantes do povo?

E eu acho curioso que tem uma certa narrativa. A tentativa de narrativa política de ficar pintando eu ou o governador como anticiência, eu acho muito limitada, muito superficial. É importante sempre avaliar e reavaliar os benefícios e os custos elencados de qualquer decisão, isso vale para tudo, inclusive para nossas joias. Tenho a maior admiração pelo meio acadêmico, tenho dois mestrados, o governador teve uma trajetória de estudo em escolas públicas, é um sujeito muito inteligente que sempre valorizou um input técnico científico.

As nossas universidades estaduais são joias da nossa sociedade paulista. Do mesmo jeito que benefícios vieram de todo o processo construído nas últimas décadas, também existem custos e é importante que a sociedade consiga sempre reavaliar os custos e benefícios de decisões.

No caso das universidades, houve impacto na imagem do governador ou foi percebido um erro? Qual foi a razão do recuo?

Não foi percebido um erro. O timing de discussão...francamente, se, no momento, o mais desejável é que a gente não adentre essa discussão, ela pode ser feita em outro tempo. O governador não se sentiu impactado. Ele já passou por uma campanha polarizada a aguda, com acusações. Então foi um bom debate sobre as nossas universidades estaduais. A gente também está tendo um bom debate sobre a Fapesp e isso só vai vai acelerar o processo de cada dia ter uma alocação ainda melhor do gasto público.

Se houvesse a desvinculação dos recursos da Fapesp para onde eles iriam, já que a Constituição fala em serviços prioritários, quais seriam eles?

Mas aí a gente está na esfera da hipóteses. Mas caso houvesse uma desvinculação, mesmo achando muito preliminar falar disso porque a gente não entrou nessa análise de aplicação, as aspirações da sociedade são amplas, inclusive no setor na educação. Então não acho que necessariamente é uma retirada de recurso de lado A pro lado B ou C, não se trata disso, é um conceito de estratégia de como ter uma uma melhor gestão do recurso público. A gente não está dizendo ‘aplique’, pelo contrário.

Com a reforma tributária e o fim do ICMS também precisará ser rediscutido o orçamento de USP, Unesp e Unicamp. O governo já tem uma proposta sobre isso?

Olha que oportunidade para a gente travar esse debate no alto patamar? Eu acho ótimo, na verdade. Nós temos as três joias na nossa constelação de universidades estaduais. Como melhor potencializar? Qual é o formato? Acho que é um debate para a sociedade mesmo, a discussão de como, quando, de que maneira vai resguardar essa autonomia. Como que você respalda isso? Respaldou-se até aqui com uma vinculação de 9,57% do ICMS. Mas tudo isso deve estar dentro de uma filosofia de avaliação e reavaliação da boa política pública.

O secretário estadual da Fazenda, Samuel Kinoshita, diz que o governo não vai mudar a lei de diretrizes orçamentárias que abre a possibilidade de reduzir em 30% os recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). “Não há compromisso nem para um lado, nem para o outro”, afirma em entrevista ao Estadão, sobre diminuir ou não a verba do órgão.

Para ele, foi feita apenas “uma medida de transparência” orçamentária, remetendo a algo já previsto na Constituição Federal, e as verbas ainda estão sendo analisadas. “Francamente, eu poderia fazer isso hoje. Por que não fiz?” questiona, completando que não entendeu por que houve “tanto ruído”.

Kinoshita argumenta que as muitas vinculações de recursos trazem rigidez ao orçamento e que “as políticas públicas precisam sempre ser reavaliadas”. “A tentativa de narrativa política de ficar pintando eu ou o governador como anticiência, eu acho muito limitada, muito superficial. É importante sempre avaliar e reavaliar os benefícios e os custos elencados de qualquer decisão, isso vale para tudo, inclusive para nossas joias”, diz, referindo-se às três universidades estaduais paulistas, Universidade de São Paulo (USP), Estadual de Campinas (Unicamp) e Estadual Paulista (Unesp).

A mesma lei de diretrizes orçamentárias (LDO) que prevê a possibilidade de desvincular verbas da Fapesp também havia proposto a redução de parte do orçamento das três universidades públicas paulistas, que têm autonomia financeira desde 1989 e recebem 9,57% da arrecadação do ICMS do Estado. Após reportagem do Estadão e repercussão negativa, o governo voltou atrás dessa decisão.

O secretário da Fazenda de São Paulo, Samuel Kinoshita, afirma que o debate sobre o uso de recursos é bom para sociedade Foto: Felipe Rau/Estadão

Já a Fapesp é financiada por 1% da receita tributária estadual, o que é previsto na Constituição paulista, também desde 1989. A possibilidade de redução de recursos está indicada no artigo 22 da LDO, enviada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) à Assembleia no mês passado, como relevou o Estadão.

O texto diz que a destinação levaria em conta a partir de 2025, também “os termos” do artigo 76-A do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal. Ele prevê que 30% das receitas de Estados e Distrito Federal relativas a impostos e taxas podem ser desvinculadas até 2032.

Apesar da emenda existir desde 2016, foi a primeira vez que ela foi citada explicitamente na LDO no que refere à Fapesp, o que causou preocupação no meio acadêmico, científico e até entre empresários e industriais.

Com um orçamento de cerca de R$ 2 bilhões, a Fapesp é uma das principais financiadoras da ciência e da inovação no País. Seus recursos vão para 10 mil de bolsas de pesquisadores, laboratórios, centros de inovação tecnológica e startups em áreas como mudança climática, bioenergia, câncer, aviação, agricultura e biodiversidade.

“Esse é um bom debate, sobre um naco importante de recursos, ele precisa ter uma boa justificativa. Eu tenho certeza que a Fapesp vai trazer bons argumentos. Eu tenho convicção de que a Fapesp faz um bom trabalho”, afirma o secretário.

Veja a seguir os principais trechos da entrevista.

Por que o governo colocou o artigo na lei de diretrizes orçamentárias (LDO) que abre a possibilidade de reduzir em 30% o orçamento da Fapesp?

É natural que alguns pontos gerem repercussão e percepções diferentes, mas no aspecto da Fapesp, o que eu promovi através da proposta de lei de diretrizes orçamentárias - e estou falando da lei de diretrizes orçamentárias, não do orçamento -, é um ajuste meramente pontual de remissão. Acrescenta-se o artigo 76A, que é basicamente a possibilidade da aplicação da DREM (Desvinculação de Receitas dos Estados e Municípios). É como se fosse um pointer, nós estamos apontando para um ativo da Constituição Federal que viabiliza a possibilidade de aplicação desse dispositivo. Um dispositivo que começou no meio dos anos 90, mudou de nome, mas a ideia de desvincular já estava no Brasil e é aplicada há 30 anos. É um conceito muito importante porque nosso orçamento paulatinamente foi perdendo essa capacidade de ajuste e ele foi ficando cada vez mais obrigatório.

Mas esse dispositivo nunca havia sido colocado explicitamente no que se refere à Fapesp, o que deu a entender que o governo tinha a intenção de usá-lo.

Isso faz parte de uma filosofia de modernização da administração e melhoria da gestão, de contenção de gastos de custeio. Tudo isso está muito concatenado e um ponto importante é a avaliação e reavaliação da política pública praticada, seja na esfera orçamentária, seja na tributária. Estamos evoluindo muito na revisão dos programas, uma revisão constante do orçamento, da política. Então, é sempre legítimo e desejável que esse debate ocorra. E aí você vai falar: ‘Poxa vida, então quer dizer que você já tem uma avaliação da política pública praticada na história orçamentária da Fapesp e já tem uma intenção?’ Não, não há intenção neste momento. Francamente, eu realmente poderia fazer hoje. Por que que eu não fiz?

O senhor está avaliando ainda o uso dos recursos da Fapesp para entender se há necessidade de redução?

Não, eu não fiz a avaliação da Fapesp. É óbvio que depois desse ruído, até pelos valores que a gente está falando, quer dizer, 1% da receita tributária do Estado de São Paulo é um valor bem significativo. A gente está falando de valores superiores a R$ 2 bilhões. Acho que é bastante dinheiro até no Estado de São Paulo, é dinheiro em qualquer lugar. Sabemos que a Fapesp também conseguiu, através desse valor significativo, de aplicações, nos últimos anos, resguardar um colchão bastante pronunciado. E eu não estou aqui pra dizer ‘veja bem, é muito dinheiro, é pouco dinheiro’, não é isso.

Mas acho que deveria ser avaliado, por ser público, tem que ser constantemente avaliado, seja na esfera tributária, seja na esfera orçamentária. Aqui não é necessariamente mais ou menos carga. Acho que cai em um debate bobinho, de sou liberal, sou isso ou aquilo. Temos uma capacidade enorme no Brasil de avançar na margem de ganho de eficiência do processo orçamentário. É importante que a gente tenha instrumentos de maior maleabilidade, maior flexibilidade, que a gente consiga promover avaliações e reavaliações da política pública praticada.

Por ser público, tem que ser constantemente avaliado, seja na esfera tributária, seja na esfera orçamentária. Aqui não é necessariamente mais ou menos carga. Acho que cai em um debate bobinho, de sou liberal, sou isso ou aquilo.

O senhor se surpreendeu com a reação negativa de muitos setores, acadêmicos, cientistas, empresários, indústria, contra a medida do governo?

Me surpreendeu como acabou gerando esse ruído significativo, vi umas manifestações de gente muito experiente na administração pública dizendo que vamos contingenciar 30% do orçamento. Ninguém contingenciou coisa nenhuma, não se remanejou nada. Está se dando transparência a um fato constitucional, algo que é perfeitamente aplicado, ela não necessariamente se concretiza na peça na LOA (lei orçamentária), numa proposta a ser enviada em setembro. Mas, na verdade, o debate é ótimo, do ponto de vista orçamentário. É isso que a sociedade tem que promover mesmo.

Esse é um bom debate, sobre um naco importante de recursos, ele precisa ter uma boa justificativa. Eu tenho certeza que a Fapesp vai trazer bons argumentos ou as pessoas que têm envolvimento com a Fapesp vão trazer bons argumentos. Tenho convicção de que a Fapesp faz um bom trabalho. Tenho convicção que a Fapesp certamente vai citar bons trabalhos feitos. Do ponto de vista técnico, não foi feita ainda uma avaliação dos programas, daquilo que a Fapesp faz com essa dotação, nem um debate mais político dos nossos representantes eleitos na Assembleia, esse debate ainda vai ser feito. Ele vai ser feito na peça orçamentária mesmo, na LOA.

Há um compromisso no governo de não cortar recursos da Fapesp?

O que há é possibilidade de aplicar a DREM, não há compromisso nem para um lado, nem para o outro.

Há alguma intenção do governo de mudar o artigo da LDO que fala sobre o orçamento da Fapesp?

Não, não há. Ele é muito singelo, ele faz um mero ajuste de remissão à Constituição Federal, não vejo necessidade disso. Confere não só transparência, mas a possibilidade, a opcionalidade, a faculdade de (reduzir em 30%). Mas as intenções são as melhores possíveis na administração e é óbvio que o debate público é importante.

Por que o governo incluiu também na LDO a ideia de diminuir a fatia do orçamento das três universidades públicas, USP, Unesp e Unicamp, e depois voltou atrás?

Existe uma filosofia, um intuito muito forte da minha parte, da administração, com relação a ter maior maleabilidade no orçamento, maior flexibilidade no nosso caminho do ponto de vista orçamentário. Aquele caso, a gente já divulgou isso e você também deu visibilidade, houve o retorno ao status quo, à aplicação dos 9,57% do ICMS para as universidades estaduais. O intuito era, dentro dessa mesma filosofia, de dar grande flexibilidade, de ganho de variabilidade do orçamento. De novo, não tinha nada dizendo “corte”. Você colocar mais um ou dois ou três elementos dentro de um determinado mínimo, aquilo é um mínimo, não quer dizer que você vai cortar recurso de ninguém. A gente não controla a economia mundial, nem a nacional, mas o intuito todo é que a gente consiga melhorar esse ambiente de negócio e gerar mais crescimento e, consequentemente, mais arrecadação. Se as coisas derem certo, se a gente conseguir viabilizar, e eu estou cada dia mais convencido que a gente vai ter uma economia mais pujante e mais arrecadação, de forma que ninguém seria diminuído no seu orçamento.

O senhor considera as vinculações de recursos para educação, universidades, Fapesp, um problema aqui no Estado de São Paulo?

Diria que a vinculações, quando quando você olha individualmente, em graus diferente, elas vão ter mérito. Porque elas certamente abarcam aquilo que é uma aspiração da sociedade. Mas quando você tem a junção dessas diversas vinculações, você torna a gestão do processo orçamentário mais difícil. As desvinculações já eram importantes 30 anos atrás e hoje talvez tenham ficado ainda mais importantes. Quando você tem um acúmulo de rigidez, isso torna o processo mais difícil.

USP, Unesp e Unicamp sustentam que a autonomia financeira, que vem dessa vinculação de uma parte do ICMS, foi crucial para que elas pudessem se planejar e estarem entre as maiores universidades do mundo hoje, sem depender da vontade de um ou outro governador.

As nossas universidades estaduais são joias da nossa sociedade paulista, dos 45 milhões de brasileiros aqui no Estado de São Paulo. Eu só acho importante a gente colocar as ponderações. Do mesmo jeito que benefícios vieram de todo o processo construído nas últimas décadas, também existem custos e é importante que a sociedade consiga sempre reavaliar os custos e benefícios de decisões. Também acho curioso dizer que foi importante para proteger do governador, de um determinado governador A, B ou C, não estou falando do meu, não. Quer dizer o sujeito é eleito pela população, com milhões e milhões de votos, e a gente precisa proteger? Proteger a proposta de lei de diretrizes orçamentária do sujeito que foi eleito, da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), de todos os 94 representantes do povo?

E eu acho curioso que tem uma certa narrativa. A tentativa de narrativa política de ficar pintando eu ou o governador como anticiência, eu acho muito limitada, muito superficial. É importante sempre avaliar e reavaliar os benefícios e os custos elencados de qualquer decisão, isso vale para tudo, inclusive para nossas joias. Tenho a maior admiração pelo meio acadêmico, tenho dois mestrados, o governador teve uma trajetória de estudo em escolas públicas, é um sujeito muito inteligente que sempre valorizou um input técnico científico.

As nossas universidades estaduais são joias da nossa sociedade paulista. Do mesmo jeito que benefícios vieram de todo o processo construído nas últimas décadas, também existem custos e é importante que a sociedade consiga sempre reavaliar os custos e benefícios de decisões.

No caso das universidades, houve impacto na imagem do governador ou foi percebido um erro? Qual foi a razão do recuo?

Não foi percebido um erro. O timing de discussão...francamente, se, no momento, o mais desejável é que a gente não adentre essa discussão, ela pode ser feita em outro tempo. O governador não se sentiu impactado. Ele já passou por uma campanha polarizada a aguda, com acusações. Então foi um bom debate sobre as nossas universidades estaduais. A gente também está tendo um bom debate sobre a Fapesp e isso só vai vai acelerar o processo de cada dia ter uma alocação ainda melhor do gasto público.

Se houvesse a desvinculação dos recursos da Fapesp para onde eles iriam, já que a Constituição fala em serviços prioritários, quais seriam eles?

Mas aí a gente está na esfera da hipóteses. Mas caso houvesse uma desvinculação, mesmo achando muito preliminar falar disso porque a gente não entrou nessa análise de aplicação, as aspirações da sociedade são amplas, inclusive no setor na educação. Então não acho que necessariamente é uma retirada de recurso de lado A pro lado B ou C, não se trata disso, é um conceito de estratégia de como ter uma uma melhor gestão do recurso público. A gente não está dizendo ‘aplique’, pelo contrário.

Com a reforma tributária e o fim do ICMS também precisará ser rediscutido o orçamento de USP, Unesp e Unicamp. O governo já tem uma proposta sobre isso?

Olha que oportunidade para a gente travar esse debate no alto patamar? Eu acho ótimo, na verdade. Nós temos as três joias na nossa constelação de universidades estaduais. Como melhor potencializar? Qual é o formato? Acho que é um debate para a sociedade mesmo, a discussão de como, quando, de que maneira vai resguardar essa autonomia. Como que você respalda isso? Respaldou-se até aqui com uma vinculação de 9,57% do ICMS. Mas tudo isso deve estar dentro de uma filosofia de avaliação e reavaliação da boa política pública.

O secretário estadual da Fazenda, Samuel Kinoshita, diz que o governo não vai mudar a lei de diretrizes orçamentárias que abre a possibilidade de reduzir em 30% os recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). “Não há compromisso nem para um lado, nem para o outro”, afirma em entrevista ao Estadão, sobre diminuir ou não a verba do órgão.

Para ele, foi feita apenas “uma medida de transparência” orçamentária, remetendo a algo já previsto na Constituição Federal, e as verbas ainda estão sendo analisadas. “Francamente, eu poderia fazer isso hoje. Por que não fiz?” questiona, completando que não entendeu por que houve “tanto ruído”.

Kinoshita argumenta que as muitas vinculações de recursos trazem rigidez ao orçamento e que “as políticas públicas precisam sempre ser reavaliadas”. “A tentativa de narrativa política de ficar pintando eu ou o governador como anticiência, eu acho muito limitada, muito superficial. É importante sempre avaliar e reavaliar os benefícios e os custos elencados de qualquer decisão, isso vale para tudo, inclusive para nossas joias”, diz, referindo-se às três universidades estaduais paulistas, Universidade de São Paulo (USP), Estadual de Campinas (Unicamp) e Estadual Paulista (Unesp).

A mesma lei de diretrizes orçamentárias (LDO) que prevê a possibilidade de desvincular verbas da Fapesp também havia proposto a redução de parte do orçamento das três universidades públicas paulistas, que têm autonomia financeira desde 1989 e recebem 9,57% da arrecadação do ICMS do Estado. Após reportagem do Estadão e repercussão negativa, o governo voltou atrás dessa decisão.

O secretário da Fazenda de São Paulo, Samuel Kinoshita, afirma que o debate sobre o uso de recursos é bom para sociedade Foto: Felipe Rau/Estadão

Já a Fapesp é financiada por 1% da receita tributária estadual, o que é previsto na Constituição paulista, também desde 1989. A possibilidade de redução de recursos está indicada no artigo 22 da LDO, enviada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) à Assembleia no mês passado, como relevou o Estadão.

O texto diz que a destinação levaria em conta a partir de 2025, também “os termos” do artigo 76-A do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal. Ele prevê que 30% das receitas de Estados e Distrito Federal relativas a impostos e taxas podem ser desvinculadas até 2032.

Apesar da emenda existir desde 2016, foi a primeira vez que ela foi citada explicitamente na LDO no que refere à Fapesp, o que causou preocupação no meio acadêmico, científico e até entre empresários e industriais.

Com um orçamento de cerca de R$ 2 bilhões, a Fapesp é uma das principais financiadoras da ciência e da inovação no País. Seus recursos vão para 10 mil de bolsas de pesquisadores, laboratórios, centros de inovação tecnológica e startups em áreas como mudança climática, bioenergia, câncer, aviação, agricultura e biodiversidade.

“Esse é um bom debate, sobre um naco importante de recursos, ele precisa ter uma boa justificativa. Eu tenho certeza que a Fapesp vai trazer bons argumentos. Eu tenho convicção de que a Fapesp faz um bom trabalho”, afirma o secretário.

Veja a seguir os principais trechos da entrevista.

Por que o governo colocou o artigo na lei de diretrizes orçamentárias (LDO) que abre a possibilidade de reduzir em 30% o orçamento da Fapesp?

É natural que alguns pontos gerem repercussão e percepções diferentes, mas no aspecto da Fapesp, o que eu promovi através da proposta de lei de diretrizes orçamentárias - e estou falando da lei de diretrizes orçamentárias, não do orçamento -, é um ajuste meramente pontual de remissão. Acrescenta-se o artigo 76A, que é basicamente a possibilidade da aplicação da DREM (Desvinculação de Receitas dos Estados e Municípios). É como se fosse um pointer, nós estamos apontando para um ativo da Constituição Federal que viabiliza a possibilidade de aplicação desse dispositivo. Um dispositivo que começou no meio dos anos 90, mudou de nome, mas a ideia de desvincular já estava no Brasil e é aplicada há 30 anos. É um conceito muito importante porque nosso orçamento paulatinamente foi perdendo essa capacidade de ajuste e ele foi ficando cada vez mais obrigatório.

Mas esse dispositivo nunca havia sido colocado explicitamente no que se refere à Fapesp, o que deu a entender que o governo tinha a intenção de usá-lo.

Isso faz parte de uma filosofia de modernização da administração e melhoria da gestão, de contenção de gastos de custeio. Tudo isso está muito concatenado e um ponto importante é a avaliação e reavaliação da política pública praticada, seja na esfera orçamentária, seja na tributária. Estamos evoluindo muito na revisão dos programas, uma revisão constante do orçamento, da política. Então, é sempre legítimo e desejável que esse debate ocorra. E aí você vai falar: ‘Poxa vida, então quer dizer que você já tem uma avaliação da política pública praticada na história orçamentária da Fapesp e já tem uma intenção?’ Não, não há intenção neste momento. Francamente, eu realmente poderia fazer hoje. Por que que eu não fiz?

O senhor está avaliando ainda o uso dos recursos da Fapesp para entender se há necessidade de redução?

Não, eu não fiz a avaliação da Fapesp. É óbvio que depois desse ruído, até pelos valores que a gente está falando, quer dizer, 1% da receita tributária do Estado de São Paulo é um valor bem significativo. A gente está falando de valores superiores a R$ 2 bilhões. Acho que é bastante dinheiro até no Estado de São Paulo, é dinheiro em qualquer lugar. Sabemos que a Fapesp também conseguiu, através desse valor significativo, de aplicações, nos últimos anos, resguardar um colchão bastante pronunciado. E eu não estou aqui pra dizer ‘veja bem, é muito dinheiro, é pouco dinheiro’, não é isso.

Mas acho que deveria ser avaliado, por ser público, tem que ser constantemente avaliado, seja na esfera tributária, seja na esfera orçamentária. Aqui não é necessariamente mais ou menos carga. Acho que cai em um debate bobinho, de sou liberal, sou isso ou aquilo. Temos uma capacidade enorme no Brasil de avançar na margem de ganho de eficiência do processo orçamentário. É importante que a gente tenha instrumentos de maior maleabilidade, maior flexibilidade, que a gente consiga promover avaliações e reavaliações da política pública praticada.

Por ser público, tem que ser constantemente avaliado, seja na esfera tributária, seja na esfera orçamentária. Aqui não é necessariamente mais ou menos carga. Acho que cai em um debate bobinho, de sou liberal, sou isso ou aquilo.

O senhor se surpreendeu com a reação negativa de muitos setores, acadêmicos, cientistas, empresários, indústria, contra a medida do governo?

Me surpreendeu como acabou gerando esse ruído significativo, vi umas manifestações de gente muito experiente na administração pública dizendo que vamos contingenciar 30% do orçamento. Ninguém contingenciou coisa nenhuma, não se remanejou nada. Está se dando transparência a um fato constitucional, algo que é perfeitamente aplicado, ela não necessariamente se concretiza na peça na LOA (lei orçamentária), numa proposta a ser enviada em setembro. Mas, na verdade, o debate é ótimo, do ponto de vista orçamentário. É isso que a sociedade tem que promover mesmo.

Esse é um bom debate, sobre um naco importante de recursos, ele precisa ter uma boa justificativa. Eu tenho certeza que a Fapesp vai trazer bons argumentos ou as pessoas que têm envolvimento com a Fapesp vão trazer bons argumentos. Tenho convicção de que a Fapesp faz um bom trabalho. Tenho convicção que a Fapesp certamente vai citar bons trabalhos feitos. Do ponto de vista técnico, não foi feita ainda uma avaliação dos programas, daquilo que a Fapesp faz com essa dotação, nem um debate mais político dos nossos representantes eleitos na Assembleia, esse debate ainda vai ser feito. Ele vai ser feito na peça orçamentária mesmo, na LOA.

Há um compromisso no governo de não cortar recursos da Fapesp?

O que há é possibilidade de aplicar a DREM, não há compromisso nem para um lado, nem para o outro.

Há alguma intenção do governo de mudar o artigo da LDO que fala sobre o orçamento da Fapesp?

Não, não há. Ele é muito singelo, ele faz um mero ajuste de remissão à Constituição Federal, não vejo necessidade disso. Confere não só transparência, mas a possibilidade, a opcionalidade, a faculdade de (reduzir em 30%). Mas as intenções são as melhores possíveis na administração e é óbvio que o debate público é importante.

Por que o governo incluiu também na LDO a ideia de diminuir a fatia do orçamento das três universidades públicas, USP, Unesp e Unicamp, e depois voltou atrás?

Existe uma filosofia, um intuito muito forte da minha parte, da administração, com relação a ter maior maleabilidade no orçamento, maior flexibilidade no nosso caminho do ponto de vista orçamentário. Aquele caso, a gente já divulgou isso e você também deu visibilidade, houve o retorno ao status quo, à aplicação dos 9,57% do ICMS para as universidades estaduais. O intuito era, dentro dessa mesma filosofia, de dar grande flexibilidade, de ganho de variabilidade do orçamento. De novo, não tinha nada dizendo “corte”. Você colocar mais um ou dois ou três elementos dentro de um determinado mínimo, aquilo é um mínimo, não quer dizer que você vai cortar recurso de ninguém. A gente não controla a economia mundial, nem a nacional, mas o intuito todo é que a gente consiga melhorar esse ambiente de negócio e gerar mais crescimento e, consequentemente, mais arrecadação. Se as coisas derem certo, se a gente conseguir viabilizar, e eu estou cada dia mais convencido que a gente vai ter uma economia mais pujante e mais arrecadação, de forma que ninguém seria diminuído no seu orçamento.

O senhor considera as vinculações de recursos para educação, universidades, Fapesp, um problema aqui no Estado de São Paulo?

Diria que a vinculações, quando quando você olha individualmente, em graus diferente, elas vão ter mérito. Porque elas certamente abarcam aquilo que é uma aspiração da sociedade. Mas quando você tem a junção dessas diversas vinculações, você torna a gestão do processo orçamentário mais difícil. As desvinculações já eram importantes 30 anos atrás e hoje talvez tenham ficado ainda mais importantes. Quando você tem um acúmulo de rigidez, isso torna o processo mais difícil.

USP, Unesp e Unicamp sustentam que a autonomia financeira, que vem dessa vinculação de uma parte do ICMS, foi crucial para que elas pudessem se planejar e estarem entre as maiores universidades do mundo hoje, sem depender da vontade de um ou outro governador.

As nossas universidades estaduais são joias da nossa sociedade paulista, dos 45 milhões de brasileiros aqui no Estado de São Paulo. Eu só acho importante a gente colocar as ponderações. Do mesmo jeito que benefícios vieram de todo o processo construído nas últimas décadas, também existem custos e é importante que a sociedade consiga sempre reavaliar os custos e benefícios de decisões. Também acho curioso dizer que foi importante para proteger do governador, de um determinado governador A, B ou C, não estou falando do meu, não. Quer dizer o sujeito é eleito pela população, com milhões e milhões de votos, e a gente precisa proteger? Proteger a proposta de lei de diretrizes orçamentária do sujeito que foi eleito, da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), de todos os 94 representantes do povo?

E eu acho curioso que tem uma certa narrativa. A tentativa de narrativa política de ficar pintando eu ou o governador como anticiência, eu acho muito limitada, muito superficial. É importante sempre avaliar e reavaliar os benefícios e os custos elencados de qualquer decisão, isso vale para tudo, inclusive para nossas joias. Tenho a maior admiração pelo meio acadêmico, tenho dois mestrados, o governador teve uma trajetória de estudo em escolas públicas, é um sujeito muito inteligente que sempre valorizou um input técnico científico.

As nossas universidades estaduais são joias da nossa sociedade paulista. Do mesmo jeito que benefícios vieram de todo o processo construído nas últimas décadas, também existem custos e é importante que a sociedade consiga sempre reavaliar os custos e benefícios de decisões.

No caso das universidades, houve impacto na imagem do governador ou foi percebido um erro? Qual foi a razão do recuo?

Não foi percebido um erro. O timing de discussão...francamente, se, no momento, o mais desejável é que a gente não adentre essa discussão, ela pode ser feita em outro tempo. O governador não se sentiu impactado. Ele já passou por uma campanha polarizada a aguda, com acusações. Então foi um bom debate sobre as nossas universidades estaduais. A gente também está tendo um bom debate sobre a Fapesp e isso só vai vai acelerar o processo de cada dia ter uma alocação ainda melhor do gasto público.

Se houvesse a desvinculação dos recursos da Fapesp para onde eles iriam, já que a Constituição fala em serviços prioritários, quais seriam eles?

Mas aí a gente está na esfera da hipóteses. Mas caso houvesse uma desvinculação, mesmo achando muito preliminar falar disso porque a gente não entrou nessa análise de aplicação, as aspirações da sociedade são amplas, inclusive no setor na educação. Então não acho que necessariamente é uma retirada de recurso de lado A pro lado B ou C, não se trata disso, é um conceito de estratégia de como ter uma uma melhor gestão do recurso público. A gente não está dizendo ‘aplique’, pelo contrário.

Com a reforma tributária e o fim do ICMS também precisará ser rediscutido o orçamento de USP, Unesp e Unicamp. O governo já tem uma proposta sobre isso?

Olha que oportunidade para a gente travar esse debate no alto patamar? Eu acho ótimo, na verdade. Nós temos as três joias na nossa constelação de universidades estaduais. Como melhor potencializar? Qual é o formato? Acho que é um debate para a sociedade mesmo, a discussão de como, quando, de que maneira vai resguardar essa autonomia. Como que você respalda isso? Respaldou-se até aqui com uma vinculação de 9,57% do ICMS. Mas tudo isso deve estar dentro de uma filosofia de avaliação e reavaliação da boa política pública.

Entrevista por Renata Cafardo

Repórter especial do ‘Estadão’ e fundadora da Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca)

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