Computadores e tablets estarão mais presentes na vida de professores e estudantes do que lousas e apostilas. Até 2030, a maior parte do ensino será personalizada, ou seja, vai acompanhar o ritmo e os interesses de cada aluno. Aulas online serão mais importantes do que as presenciais. Essas são apostas para a educação do futuro de 645 especialistas ouvidos por pesquisa do World Innovation Summit for Education (Wise), da Fundação Catar. O levantamento, que será lançado nesta semana e foi obtido com exclusividade pelo Estado, reuniu opiniões de experts de todos os continentes. No estudo, 93% dos pesquisadores apontam que a inovação - social, tecnológica e pedagógica - será a chave para o avanço educacional nos próximos anos, com mudanças estruturais significativas no papel do governo, da escola, dos professores e dos alunos. Na educação do futuro, as escolas terão formatos híbridos, usando plataformas online e espaços físicos onde ocorram as interações sociais entre estudantes. O professor, nesse modelo, deixará de ser peça central na aprendizagem para se tornar o mediador do processo de aquisição de conhecimento, segundo 73% dos especialistas. A tecnologia será fundamental, mas apenas distribuir os aparelhos não basta, destaca o trabalho. Para serem incorporados, os dispositivos deverão ter propósitos claros para melhorar o ensino. No Brasil, experiências inovadoras de ensino, que enfocam a educação personalizada e o professor como tutor, já estão sendo aplicadas, tanto nas redes particulares quanto públicas. O problema, contudo, é reproduzir esses modelos - ainda pontuais - em larga escala, de acordo com especialistas ouvidos pelo Estado. Entre os desafios, estão a fragmentação das políticas educacionais, a falta de estrutura e a dificuldade para que os professores, na maioria formados na perspectiva mais tradicional, se adaptem às constantes transformações. Entre as previsões feitas pelo Wise, está a predominância, no futuro, das competências socioemocionais, que envolvem questões pessoais e interpessoais, como responsabilidade e estabilidade emocional, por exemplo. Segundo os especialistas, a intimidade com cálculos ou memorização de datas históricas dizem pouco sobre o aluno. A maioria também não acredita que todos devam aprender os mesmos conteúdos ao mesmo tempo. 83% deles afirmam que o currículo terá parâmetros básicos, mas será moldado de acordo com o perfil e o ritmo de progressão de cada estudante. Além dos livros. Um dos exemplos brasileiros de foco nas competências socioemocionais é o Colégio Estadual Chico Anysio, no Rio de Janeiro. A unidade, inaugurada em 2013, faz parte de um projeto da Secretaria de Educação fluminense e o Instituto Ayrton Senna. A escola tem jornada integral no ensino médio, mas sem conteúdo profissionalizante. Os eixos da formação envolvem trabalho, convívio, aprendizagem e autonomia. "Temos projetos de pesquisa, em que somos protagonistas", conta Anna Beatriz Figueiredo, de 17 anos, aluna do 2º ano do ensino médio do Chico Anysio. A jovem, que antes estudava em um colégio público convencional, percebe a diferença entre os modelos. "Antes, eu estava em uma condição passiva, sem muita voz", lembra. De acordo com Anna Beatriz, o trabalho com essas habilidades ajuda tanto nas disciplinas básicas quanto fora da escola. "Essa bagagem se reflete na forma como lidamos com as críticas e os desafios", diz ela, que está no colégio desde o ano passado. "Meus pais perceberam a diferença na minha postura". Willmann Costa, diretor da unidade, explica que o objetivo é interligar os conhecimentos e desfazer as barreiras entre professores e alunos. "É um modelo de currículo atrativo, mais próximo da juventude", destaca. Âncora. O modelo menos conteudista também é adotado no Projeto Âncora, que tem uma escola localizada em Cotia, na Grande São Paulo. Com turmas mistas, compostas por crianças e adolescentes de várias idades, a proposta da instituição é que os estudantes aprendam uns com os outros. Na escola, o currículo não é engessado, mas formatado a partir do interesse dos estudantes. "Cada um aprende no seu ritmo. Não preciso aprender ao mesmo tempo que o meu colega", afirma a aluna Giulia Jacobete, de 14 anos. Fabio Zsigmond, educador e diretor do projeto explica que os alunos aprendem os conteúdos curriculares enquanto desenvolvem seus projetos. “O aluno se planeja para desenvolver o que ele tem interesse, como um livro, por exemplo. E a partir daí ele aprende os objetivos curriculares”, explica. “Não é de forma cronológica, separado por disciplina e alunos por idade, mas de uma forma orgânica.” No Âncora, o professor é um mediador do caminho de aprendizagem do aluno. “Não é necessário ele ficar falando sobre um conhecimento que já está disponível nos livros ou na internet”, afirma Zsigmond. “É mais produtivo ele propiciar uma discussão e fazer uma reflexão.”