IA nas Ciências Naturais: como preparar alunos e docentes para a utilização da tecnologia?


Popularização da inteligência artificial levanta debate sobre ações adotadas pelas instituições de ensino a fim de criar um consenso sobre o melhor uso

Por Renata Okumura
Atualização:

A capacidade da inteligência artificial de processar e analisar rapidamente grandes volumes de dados tem se mostrado cada vez mais presente nas Ciências Naturais. Isso foi evidenciado, recentemente, pelo Prêmio Nobel de Química e de Física, marcando o protagonismo da IA nas descobertas científicas. Diante disso, entra em debate se as faculdades dessas áreas devem preparar docentes e alunos quanto a utilização dessa tecnologia de forma eficaz e cuidadosa no cotidiano.

O termo inteligência artificial existe desde a década de 50, mas se popularizou nos últimos anos em razão do amplo volume de dados disponíveis, algoritmos avançados, além de melhorias no processamento computacional com o advento das GPUs.

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Mesmo dentro do campo de pesquisas científicas, por exemplo, o uso da IA não é recente. “As pesquisas em física experimental, por exemplo, envolvem identificar padrões em grandes conjuntos de dados e as técnicas estatísticas capazes de lidar com esse grande volume de dados são as habilitadas por inteligência artificial, especificamente técnicas de aprendizado de máquina”, afirma a professora do programa de pós-graduação Tecnologias da Inteligência e Design Digital (TIDD) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC SP), Dora Kaufman.

A doutora e pesquisadora em inteligência artificial Dora Kaufman, professora na PUC de São Paulo. Foto: Taba Benedicto/ Estadão

“Nos últimos anos, a gente teve uma aceleração, mais que um crescimento, porque surgiu uma nova classe de algoritmos na área de inteligência artificial, que se chama IA generativa (que usa o aprendizado da máquina na criação de conteúdos, como textos, imagens, músicas ou vídeos)”, afirma Ney Lemke, responsável pela Coordenadoria de Tecnologia da Informação (CTInf) da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e docente no Instituto de Biociências da universidade.

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Até então, essas interfaces já eram usadas, mas ainda era uma questão muito restrita a algumas comunidades. No entanto, após esses avanços, têm surgido muitas oportunidades para o uso delas em basicamente quase todas as áreas.

As Ciências Naturais envolvem áreas que trabalham com fenômenos naturais. Por meio de estudos, os profissionais realizam intervenções a fim de obter modelos teóricos e práticos para compreender como essas coisas funcionam. “O tempo todo os profissionais trabalham com dados. E a utilização da IA pode ajudar a qualificar melhor os dados transformando-os em evidências e, assim, construir melhores modelos”, na avaliação da professora Paula Carolei, docente do curso de Tecnologia em Design Educacional (TEDE) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Paula Carolei, professora do curso de Tecnologia em Design Educacional (TEDE) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Foto: Werther Santana/Estadão
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“Precisamos trabalhar tanto com a qualidade de análise dos dados, e modelos construídos a partir deles, não sejam apenas uma previsão ou projeção, como acontecia com uma IA preditiva, mas essa nova IA, chamava de generativa, que não apenas prevê, mas cria, tanto visualização de modelos, como ajuda na ler mais textos e relacionar melhor as informações, criando novos conteúdos a partir dessas conexões”, afirma a professora Paula.

Segundo a docente da Unifesp, no entanto, para testar e avaliar melhor e mais rapidamente esses modelos, para poder ter propostas tecnológicas mais assertivas, mais criativas e autorais, é preciso entender que a IA deve ajudar a lidar com a complexidade da vida e não reduzir artificialmente os fenômenos.

“Eu tenho trabalhado com IA como apoio a autoria dos estudantes na aprendizagem e dos professores, nas suas ações de ensino. A aprendizagem de modelos é complexa e não deve ser simplificada, mas a IA pode ajudar a explicitar as relações entre os dados e variáveis, ajudando na compreensão tanto dos fenômenos naturais, como nas propostas tecnológicas de inovação. Mas a IA tem que ser usada de várias formas, questionando as respostas apresentadas e refinando os resultados, não apenas como perguntas e respostas diretas, simplistas e imediatas”, afirma a professora da Unifesp.

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Para Dora, com a disseminação da IA, torna-se cada vez mais fundamental que as faculdades comecem a preparar os profissionais para o uso da tecnologia. “Não somente nas áreas de Ciências Naturais, mas igualmente nas Ciências Sociais e Humanas. A estrutura de ensino das universidades, não só no Brasil, mas no mundo inteiro, reflete a lógica compartimentalizada da economia industrial, no século XXI a inteligência artificial é estratégica para qualquer atividade em qualquer setor econômico ou de conhecimento”, afirma a docente.

Dentro da PUC SP, além de congressos que buscam incentivar professores e alunos para o desenvolvimento de projetos de IA, como a quinta edição do Congresso de IA PUC SP e PUC Campinas que aconteceu em 6 e 7 de novembro, também são organizados cursos para capacitar professores e funcionários. “É um longo processo, não é algo trivial, demanda tempo inclusive para efetivar mudanças culturais dado que o funcionamento dos sistemas de IA são bem diferentes dos sistemas programados. A primeira etapa é vencer a resistência, em parte advinda do medo de perder o emprego, de ser substituído pela automação, ou simplesmente de não conseguir acompanhar a velocidade das inovações”, afirma ela.

Conforme Paula, apesar de não ter nenhuma diretriz mais concreta e fechada sobre como aplicar a IA nas disciplinas nas áreas de Ciências Naturais, os professores estão pesquisando sobre a IA e como fazer uso da tecnologia, explorando o potencial dessas interfaces.

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“Estamos preocupados com essa tecnologia que já invadiu todas as áreas, e faz parte do papel da universidade, incorporar emergências sociais. Nesse movimento, não dá para definir regras a priori e sim construir regulamentações e propostas a partir de mais pesquisa, cursos e discussões. Eu mesmo tenho feito cursos para alunos e professores, nos quais compartilhamos experiências e desafios”, acrescenta a professora da Unifesp.

Ela defende que é fundamental preparar o aluno para ele entender que a IA pode ser uma grande aliada, mas não pode assumir o seu papel dentro do estudo. “Precisamos desenvolver metodologias para ajudar o aluno a ser mais pesquisador e menos decorador e reprodutor de conteúdo. Essa mudança metodológica é possível fazer sem precisar alterar diretrizes curriculares”, pondera Paula.

Na Unesp, iniciou-se um processo de discussão de uma normatização para inteligência artificial na universidade.”É preciso dar suporte para os alunos e professores que queiram ou não queiram usar. Então, isso tem que ser definido mesmo, senão daqui a pouco a gente vai começar a ter problemas. Determinados professores vão considerar que tal coisa é plágio, por exemplo. Então a universidade vai ter que tomar uma posição sobre a temática”, disse Lemke.

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Outro ponto a ser estudado é em razão dos avanços da IA dentro do contexto do docente. “O que é legal para o mundo, dentro da sala de aula, não é necessariamente uma boa ideia. Por exemplo, que a tecnologia que o professor irá usar, varie toda semana com uma versão nova porque são muitas variações e o professor precisa se adaptar rapidamente”, afirma o professor da Unesp.

“Também temos investido na área que está vinculada à formação de docentes da universidade, com vários cursos ministrados para a preparação dos docentes. A gente quer que a universidade disponibilize de forma disseminada acesso às inteligências artificiais. Estamos discutindo como verbalizar isso. Provavelmente, já vamos ter algum protótipo ainda no início do ano que vem”, disse Lemke. Segundo o docente da Unesp, a universidade também está preparando um projeto institucional neste sentido.

Segundo Dora, todos os cidadãos do século XXI precisam conhecer a lógica e o funcionamento da inteligência artificiaI. “Como a IA pode contribuir para que eu realize melhor as minhas atividades como estudante, professor e pesquisador, e como futuro profissional de mercado.”

Para a professora da PUC SP, embora necessária, a mudança nos currículos não é algo simples, pois envolve um processo que precisa ser liderado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que é uma órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC). “O poder público - no nível federal, estadual e municipal -, precisa fomentar as mudanças dos currículos com a participação de todas as partes interessadas, verificando a melhor maneira de agregar a IA nos currículos, por exemplo, da química, física, matemática, engenharia. Com exceção dos currículos de tecnologia, a IA deve permear todas as disciplinas, e não se constituir como uma disciplina isolada”, afirma a docente da PUC SP.

O MEC disse que faz parte do Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA). “Cursos e disciplinas na graduação, além de fomento à pesquisa, inclusão e acessibilidade na educação, são algumas das propostas da pasta e que também abrangem a disponibilização automática de vagas em cursos de Ciência de Dados e IA no Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).Recentemente, o ministério, por meio da Secretaria de Gestão da Informação, Inovação e Avaliação de Políticas Educacionais (Segape), promoveu o Seminário Educação, Governança de Dados e Inteligência Artificial com o objetivo de debater acerca da centralidade de uma política de governança de dados, visando garantir uma gestão baseada em dados precisos, completos e confiáveis.

A capacidade da inteligência artificial de processar e analisar rapidamente grandes volumes de dados tem se mostrado cada vez mais presente nas Ciências Naturais. Isso foi evidenciado, recentemente, pelo Prêmio Nobel de Química e de Física, marcando o protagonismo da IA nas descobertas científicas. Diante disso, entra em debate se as faculdades dessas áreas devem preparar docentes e alunos quanto a utilização dessa tecnologia de forma eficaz e cuidadosa no cotidiano.

O termo inteligência artificial existe desde a década de 50, mas se popularizou nos últimos anos em razão do amplo volume de dados disponíveis, algoritmos avançados, além de melhorias no processamento computacional com o advento das GPUs.

Mesmo dentro do campo de pesquisas científicas, por exemplo, o uso da IA não é recente. “As pesquisas em física experimental, por exemplo, envolvem identificar padrões em grandes conjuntos de dados e as técnicas estatísticas capazes de lidar com esse grande volume de dados são as habilitadas por inteligência artificial, especificamente técnicas de aprendizado de máquina”, afirma a professora do programa de pós-graduação Tecnologias da Inteligência e Design Digital (TIDD) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC SP), Dora Kaufman.

A doutora e pesquisadora em inteligência artificial Dora Kaufman, professora na PUC de São Paulo. Foto: Taba Benedicto/ Estadão

“Nos últimos anos, a gente teve uma aceleração, mais que um crescimento, porque surgiu uma nova classe de algoritmos na área de inteligência artificial, que se chama IA generativa (que usa o aprendizado da máquina na criação de conteúdos, como textos, imagens, músicas ou vídeos)”, afirma Ney Lemke, responsável pela Coordenadoria de Tecnologia da Informação (CTInf) da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e docente no Instituto de Biociências da universidade.

Até então, essas interfaces já eram usadas, mas ainda era uma questão muito restrita a algumas comunidades. No entanto, após esses avanços, têm surgido muitas oportunidades para o uso delas em basicamente quase todas as áreas.

As Ciências Naturais envolvem áreas que trabalham com fenômenos naturais. Por meio de estudos, os profissionais realizam intervenções a fim de obter modelos teóricos e práticos para compreender como essas coisas funcionam. “O tempo todo os profissionais trabalham com dados. E a utilização da IA pode ajudar a qualificar melhor os dados transformando-os em evidências e, assim, construir melhores modelos”, na avaliação da professora Paula Carolei, docente do curso de Tecnologia em Design Educacional (TEDE) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Paula Carolei, professora do curso de Tecnologia em Design Educacional (TEDE) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Foto: Werther Santana/Estadão

“Precisamos trabalhar tanto com a qualidade de análise dos dados, e modelos construídos a partir deles, não sejam apenas uma previsão ou projeção, como acontecia com uma IA preditiva, mas essa nova IA, chamava de generativa, que não apenas prevê, mas cria, tanto visualização de modelos, como ajuda na ler mais textos e relacionar melhor as informações, criando novos conteúdos a partir dessas conexões”, afirma a professora Paula.

Segundo a docente da Unifesp, no entanto, para testar e avaliar melhor e mais rapidamente esses modelos, para poder ter propostas tecnológicas mais assertivas, mais criativas e autorais, é preciso entender que a IA deve ajudar a lidar com a complexidade da vida e não reduzir artificialmente os fenômenos.

“Eu tenho trabalhado com IA como apoio a autoria dos estudantes na aprendizagem e dos professores, nas suas ações de ensino. A aprendizagem de modelos é complexa e não deve ser simplificada, mas a IA pode ajudar a explicitar as relações entre os dados e variáveis, ajudando na compreensão tanto dos fenômenos naturais, como nas propostas tecnológicas de inovação. Mas a IA tem que ser usada de várias formas, questionando as respostas apresentadas e refinando os resultados, não apenas como perguntas e respostas diretas, simplistas e imediatas”, afirma a professora da Unifesp.

Para Dora, com a disseminação da IA, torna-se cada vez mais fundamental que as faculdades comecem a preparar os profissionais para o uso da tecnologia. “Não somente nas áreas de Ciências Naturais, mas igualmente nas Ciências Sociais e Humanas. A estrutura de ensino das universidades, não só no Brasil, mas no mundo inteiro, reflete a lógica compartimentalizada da economia industrial, no século XXI a inteligência artificial é estratégica para qualquer atividade em qualquer setor econômico ou de conhecimento”, afirma a docente.

Dentro da PUC SP, além de congressos que buscam incentivar professores e alunos para o desenvolvimento de projetos de IA, como a quinta edição do Congresso de IA PUC SP e PUC Campinas que aconteceu em 6 e 7 de novembro, também são organizados cursos para capacitar professores e funcionários. “É um longo processo, não é algo trivial, demanda tempo inclusive para efetivar mudanças culturais dado que o funcionamento dos sistemas de IA são bem diferentes dos sistemas programados. A primeira etapa é vencer a resistência, em parte advinda do medo de perder o emprego, de ser substituído pela automação, ou simplesmente de não conseguir acompanhar a velocidade das inovações”, afirma ela.

Conforme Paula, apesar de não ter nenhuma diretriz mais concreta e fechada sobre como aplicar a IA nas disciplinas nas áreas de Ciências Naturais, os professores estão pesquisando sobre a IA e como fazer uso da tecnologia, explorando o potencial dessas interfaces.

“Estamos preocupados com essa tecnologia que já invadiu todas as áreas, e faz parte do papel da universidade, incorporar emergências sociais. Nesse movimento, não dá para definir regras a priori e sim construir regulamentações e propostas a partir de mais pesquisa, cursos e discussões. Eu mesmo tenho feito cursos para alunos e professores, nos quais compartilhamos experiências e desafios”, acrescenta a professora da Unifesp.

Ela defende que é fundamental preparar o aluno para ele entender que a IA pode ser uma grande aliada, mas não pode assumir o seu papel dentro do estudo. “Precisamos desenvolver metodologias para ajudar o aluno a ser mais pesquisador e menos decorador e reprodutor de conteúdo. Essa mudança metodológica é possível fazer sem precisar alterar diretrizes curriculares”, pondera Paula.

Na Unesp, iniciou-se um processo de discussão de uma normatização para inteligência artificial na universidade.”É preciso dar suporte para os alunos e professores que queiram ou não queiram usar. Então, isso tem que ser definido mesmo, senão daqui a pouco a gente vai começar a ter problemas. Determinados professores vão considerar que tal coisa é plágio, por exemplo. Então a universidade vai ter que tomar uma posição sobre a temática”, disse Lemke.

Outro ponto a ser estudado é em razão dos avanços da IA dentro do contexto do docente. “O que é legal para o mundo, dentro da sala de aula, não é necessariamente uma boa ideia. Por exemplo, que a tecnologia que o professor irá usar, varie toda semana com uma versão nova porque são muitas variações e o professor precisa se adaptar rapidamente”, afirma o professor da Unesp.

“Também temos investido na área que está vinculada à formação de docentes da universidade, com vários cursos ministrados para a preparação dos docentes. A gente quer que a universidade disponibilize de forma disseminada acesso às inteligências artificiais. Estamos discutindo como verbalizar isso. Provavelmente, já vamos ter algum protótipo ainda no início do ano que vem”, disse Lemke. Segundo o docente da Unesp, a universidade também está preparando um projeto institucional neste sentido.

Segundo Dora, todos os cidadãos do século XXI precisam conhecer a lógica e o funcionamento da inteligência artificiaI. “Como a IA pode contribuir para que eu realize melhor as minhas atividades como estudante, professor e pesquisador, e como futuro profissional de mercado.”

Para a professora da PUC SP, embora necessária, a mudança nos currículos não é algo simples, pois envolve um processo que precisa ser liderado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que é uma órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC). “O poder público - no nível federal, estadual e municipal -, precisa fomentar as mudanças dos currículos com a participação de todas as partes interessadas, verificando a melhor maneira de agregar a IA nos currículos, por exemplo, da química, física, matemática, engenharia. Com exceção dos currículos de tecnologia, a IA deve permear todas as disciplinas, e não se constituir como uma disciplina isolada”, afirma a docente da PUC SP.

O MEC disse que faz parte do Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA). “Cursos e disciplinas na graduação, além de fomento à pesquisa, inclusão e acessibilidade na educação, são algumas das propostas da pasta e que também abrangem a disponibilização automática de vagas em cursos de Ciência de Dados e IA no Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).Recentemente, o ministério, por meio da Secretaria de Gestão da Informação, Inovação e Avaliação de Políticas Educacionais (Segape), promoveu o Seminário Educação, Governança de Dados e Inteligência Artificial com o objetivo de debater acerca da centralidade de uma política de governança de dados, visando garantir uma gestão baseada em dados precisos, completos e confiáveis.

A capacidade da inteligência artificial de processar e analisar rapidamente grandes volumes de dados tem se mostrado cada vez mais presente nas Ciências Naturais. Isso foi evidenciado, recentemente, pelo Prêmio Nobel de Química e de Física, marcando o protagonismo da IA nas descobertas científicas. Diante disso, entra em debate se as faculdades dessas áreas devem preparar docentes e alunos quanto a utilização dessa tecnologia de forma eficaz e cuidadosa no cotidiano.

O termo inteligência artificial existe desde a década de 50, mas se popularizou nos últimos anos em razão do amplo volume de dados disponíveis, algoritmos avançados, além de melhorias no processamento computacional com o advento das GPUs.

Mesmo dentro do campo de pesquisas científicas, por exemplo, o uso da IA não é recente. “As pesquisas em física experimental, por exemplo, envolvem identificar padrões em grandes conjuntos de dados e as técnicas estatísticas capazes de lidar com esse grande volume de dados são as habilitadas por inteligência artificial, especificamente técnicas de aprendizado de máquina”, afirma a professora do programa de pós-graduação Tecnologias da Inteligência e Design Digital (TIDD) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC SP), Dora Kaufman.

A doutora e pesquisadora em inteligência artificial Dora Kaufman, professora na PUC de São Paulo. Foto: Taba Benedicto/ Estadão

“Nos últimos anos, a gente teve uma aceleração, mais que um crescimento, porque surgiu uma nova classe de algoritmos na área de inteligência artificial, que se chama IA generativa (que usa o aprendizado da máquina na criação de conteúdos, como textos, imagens, músicas ou vídeos)”, afirma Ney Lemke, responsável pela Coordenadoria de Tecnologia da Informação (CTInf) da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e docente no Instituto de Biociências da universidade.

Até então, essas interfaces já eram usadas, mas ainda era uma questão muito restrita a algumas comunidades. No entanto, após esses avanços, têm surgido muitas oportunidades para o uso delas em basicamente quase todas as áreas.

As Ciências Naturais envolvem áreas que trabalham com fenômenos naturais. Por meio de estudos, os profissionais realizam intervenções a fim de obter modelos teóricos e práticos para compreender como essas coisas funcionam. “O tempo todo os profissionais trabalham com dados. E a utilização da IA pode ajudar a qualificar melhor os dados transformando-os em evidências e, assim, construir melhores modelos”, na avaliação da professora Paula Carolei, docente do curso de Tecnologia em Design Educacional (TEDE) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Paula Carolei, professora do curso de Tecnologia em Design Educacional (TEDE) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Foto: Werther Santana/Estadão

“Precisamos trabalhar tanto com a qualidade de análise dos dados, e modelos construídos a partir deles, não sejam apenas uma previsão ou projeção, como acontecia com uma IA preditiva, mas essa nova IA, chamava de generativa, que não apenas prevê, mas cria, tanto visualização de modelos, como ajuda na ler mais textos e relacionar melhor as informações, criando novos conteúdos a partir dessas conexões”, afirma a professora Paula.

Segundo a docente da Unifesp, no entanto, para testar e avaliar melhor e mais rapidamente esses modelos, para poder ter propostas tecnológicas mais assertivas, mais criativas e autorais, é preciso entender que a IA deve ajudar a lidar com a complexidade da vida e não reduzir artificialmente os fenômenos.

“Eu tenho trabalhado com IA como apoio a autoria dos estudantes na aprendizagem e dos professores, nas suas ações de ensino. A aprendizagem de modelos é complexa e não deve ser simplificada, mas a IA pode ajudar a explicitar as relações entre os dados e variáveis, ajudando na compreensão tanto dos fenômenos naturais, como nas propostas tecnológicas de inovação. Mas a IA tem que ser usada de várias formas, questionando as respostas apresentadas e refinando os resultados, não apenas como perguntas e respostas diretas, simplistas e imediatas”, afirma a professora da Unifesp.

Para Dora, com a disseminação da IA, torna-se cada vez mais fundamental que as faculdades comecem a preparar os profissionais para o uso da tecnologia. “Não somente nas áreas de Ciências Naturais, mas igualmente nas Ciências Sociais e Humanas. A estrutura de ensino das universidades, não só no Brasil, mas no mundo inteiro, reflete a lógica compartimentalizada da economia industrial, no século XXI a inteligência artificial é estratégica para qualquer atividade em qualquer setor econômico ou de conhecimento”, afirma a docente.

Dentro da PUC SP, além de congressos que buscam incentivar professores e alunos para o desenvolvimento de projetos de IA, como a quinta edição do Congresso de IA PUC SP e PUC Campinas que aconteceu em 6 e 7 de novembro, também são organizados cursos para capacitar professores e funcionários. “É um longo processo, não é algo trivial, demanda tempo inclusive para efetivar mudanças culturais dado que o funcionamento dos sistemas de IA são bem diferentes dos sistemas programados. A primeira etapa é vencer a resistência, em parte advinda do medo de perder o emprego, de ser substituído pela automação, ou simplesmente de não conseguir acompanhar a velocidade das inovações”, afirma ela.

Conforme Paula, apesar de não ter nenhuma diretriz mais concreta e fechada sobre como aplicar a IA nas disciplinas nas áreas de Ciências Naturais, os professores estão pesquisando sobre a IA e como fazer uso da tecnologia, explorando o potencial dessas interfaces.

“Estamos preocupados com essa tecnologia que já invadiu todas as áreas, e faz parte do papel da universidade, incorporar emergências sociais. Nesse movimento, não dá para definir regras a priori e sim construir regulamentações e propostas a partir de mais pesquisa, cursos e discussões. Eu mesmo tenho feito cursos para alunos e professores, nos quais compartilhamos experiências e desafios”, acrescenta a professora da Unifesp.

Ela defende que é fundamental preparar o aluno para ele entender que a IA pode ser uma grande aliada, mas não pode assumir o seu papel dentro do estudo. “Precisamos desenvolver metodologias para ajudar o aluno a ser mais pesquisador e menos decorador e reprodutor de conteúdo. Essa mudança metodológica é possível fazer sem precisar alterar diretrizes curriculares”, pondera Paula.

Na Unesp, iniciou-se um processo de discussão de uma normatização para inteligência artificial na universidade.”É preciso dar suporte para os alunos e professores que queiram ou não queiram usar. Então, isso tem que ser definido mesmo, senão daqui a pouco a gente vai começar a ter problemas. Determinados professores vão considerar que tal coisa é plágio, por exemplo. Então a universidade vai ter que tomar uma posição sobre a temática”, disse Lemke.

Outro ponto a ser estudado é em razão dos avanços da IA dentro do contexto do docente. “O que é legal para o mundo, dentro da sala de aula, não é necessariamente uma boa ideia. Por exemplo, que a tecnologia que o professor irá usar, varie toda semana com uma versão nova porque são muitas variações e o professor precisa se adaptar rapidamente”, afirma o professor da Unesp.

“Também temos investido na área que está vinculada à formação de docentes da universidade, com vários cursos ministrados para a preparação dos docentes. A gente quer que a universidade disponibilize de forma disseminada acesso às inteligências artificiais. Estamos discutindo como verbalizar isso. Provavelmente, já vamos ter algum protótipo ainda no início do ano que vem”, disse Lemke. Segundo o docente da Unesp, a universidade também está preparando um projeto institucional neste sentido.

Segundo Dora, todos os cidadãos do século XXI precisam conhecer a lógica e o funcionamento da inteligência artificiaI. “Como a IA pode contribuir para que eu realize melhor as minhas atividades como estudante, professor e pesquisador, e como futuro profissional de mercado.”

Para a professora da PUC SP, embora necessária, a mudança nos currículos não é algo simples, pois envolve um processo que precisa ser liderado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que é uma órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC). “O poder público - no nível federal, estadual e municipal -, precisa fomentar as mudanças dos currículos com a participação de todas as partes interessadas, verificando a melhor maneira de agregar a IA nos currículos, por exemplo, da química, física, matemática, engenharia. Com exceção dos currículos de tecnologia, a IA deve permear todas as disciplinas, e não se constituir como uma disciplina isolada”, afirma a docente da PUC SP.

O MEC disse que faz parte do Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA). “Cursos e disciplinas na graduação, além de fomento à pesquisa, inclusão e acessibilidade na educação, são algumas das propostas da pasta e que também abrangem a disponibilização automática de vagas em cursos de Ciência de Dados e IA no Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).Recentemente, o ministério, por meio da Secretaria de Gestão da Informação, Inovação e Avaliação de Políticas Educacionais (Segape), promoveu o Seminário Educação, Governança de Dados e Inteligência Artificial com o objetivo de debater acerca da centralidade de uma política de governança de dados, visando garantir uma gestão baseada em dados precisos, completos e confiáveis.

A capacidade da inteligência artificial de processar e analisar rapidamente grandes volumes de dados tem se mostrado cada vez mais presente nas Ciências Naturais. Isso foi evidenciado, recentemente, pelo Prêmio Nobel de Química e de Física, marcando o protagonismo da IA nas descobertas científicas. Diante disso, entra em debate se as faculdades dessas áreas devem preparar docentes e alunos quanto a utilização dessa tecnologia de forma eficaz e cuidadosa no cotidiano.

O termo inteligência artificial existe desde a década de 50, mas se popularizou nos últimos anos em razão do amplo volume de dados disponíveis, algoritmos avançados, além de melhorias no processamento computacional com o advento das GPUs.

Mesmo dentro do campo de pesquisas científicas, por exemplo, o uso da IA não é recente. “As pesquisas em física experimental, por exemplo, envolvem identificar padrões em grandes conjuntos de dados e as técnicas estatísticas capazes de lidar com esse grande volume de dados são as habilitadas por inteligência artificial, especificamente técnicas de aprendizado de máquina”, afirma a professora do programa de pós-graduação Tecnologias da Inteligência e Design Digital (TIDD) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC SP), Dora Kaufman.

A doutora e pesquisadora em inteligência artificial Dora Kaufman, professora na PUC de São Paulo. Foto: Taba Benedicto/ Estadão

“Nos últimos anos, a gente teve uma aceleração, mais que um crescimento, porque surgiu uma nova classe de algoritmos na área de inteligência artificial, que se chama IA generativa (que usa o aprendizado da máquina na criação de conteúdos, como textos, imagens, músicas ou vídeos)”, afirma Ney Lemke, responsável pela Coordenadoria de Tecnologia da Informação (CTInf) da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e docente no Instituto de Biociências da universidade.

Até então, essas interfaces já eram usadas, mas ainda era uma questão muito restrita a algumas comunidades. No entanto, após esses avanços, têm surgido muitas oportunidades para o uso delas em basicamente quase todas as áreas.

As Ciências Naturais envolvem áreas que trabalham com fenômenos naturais. Por meio de estudos, os profissionais realizam intervenções a fim de obter modelos teóricos e práticos para compreender como essas coisas funcionam. “O tempo todo os profissionais trabalham com dados. E a utilização da IA pode ajudar a qualificar melhor os dados transformando-os em evidências e, assim, construir melhores modelos”, na avaliação da professora Paula Carolei, docente do curso de Tecnologia em Design Educacional (TEDE) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Paula Carolei, professora do curso de Tecnologia em Design Educacional (TEDE) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Foto: Werther Santana/Estadão

“Precisamos trabalhar tanto com a qualidade de análise dos dados, e modelos construídos a partir deles, não sejam apenas uma previsão ou projeção, como acontecia com uma IA preditiva, mas essa nova IA, chamava de generativa, que não apenas prevê, mas cria, tanto visualização de modelos, como ajuda na ler mais textos e relacionar melhor as informações, criando novos conteúdos a partir dessas conexões”, afirma a professora Paula.

Segundo a docente da Unifesp, no entanto, para testar e avaliar melhor e mais rapidamente esses modelos, para poder ter propostas tecnológicas mais assertivas, mais criativas e autorais, é preciso entender que a IA deve ajudar a lidar com a complexidade da vida e não reduzir artificialmente os fenômenos.

“Eu tenho trabalhado com IA como apoio a autoria dos estudantes na aprendizagem e dos professores, nas suas ações de ensino. A aprendizagem de modelos é complexa e não deve ser simplificada, mas a IA pode ajudar a explicitar as relações entre os dados e variáveis, ajudando na compreensão tanto dos fenômenos naturais, como nas propostas tecnológicas de inovação. Mas a IA tem que ser usada de várias formas, questionando as respostas apresentadas e refinando os resultados, não apenas como perguntas e respostas diretas, simplistas e imediatas”, afirma a professora da Unifesp.

Para Dora, com a disseminação da IA, torna-se cada vez mais fundamental que as faculdades comecem a preparar os profissionais para o uso da tecnologia. “Não somente nas áreas de Ciências Naturais, mas igualmente nas Ciências Sociais e Humanas. A estrutura de ensino das universidades, não só no Brasil, mas no mundo inteiro, reflete a lógica compartimentalizada da economia industrial, no século XXI a inteligência artificial é estratégica para qualquer atividade em qualquer setor econômico ou de conhecimento”, afirma a docente.

Dentro da PUC SP, além de congressos que buscam incentivar professores e alunos para o desenvolvimento de projetos de IA, como a quinta edição do Congresso de IA PUC SP e PUC Campinas que aconteceu em 6 e 7 de novembro, também são organizados cursos para capacitar professores e funcionários. “É um longo processo, não é algo trivial, demanda tempo inclusive para efetivar mudanças culturais dado que o funcionamento dos sistemas de IA são bem diferentes dos sistemas programados. A primeira etapa é vencer a resistência, em parte advinda do medo de perder o emprego, de ser substituído pela automação, ou simplesmente de não conseguir acompanhar a velocidade das inovações”, afirma ela.

Conforme Paula, apesar de não ter nenhuma diretriz mais concreta e fechada sobre como aplicar a IA nas disciplinas nas áreas de Ciências Naturais, os professores estão pesquisando sobre a IA e como fazer uso da tecnologia, explorando o potencial dessas interfaces.

“Estamos preocupados com essa tecnologia que já invadiu todas as áreas, e faz parte do papel da universidade, incorporar emergências sociais. Nesse movimento, não dá para definir regras a priori e sim construir regulamentações e propostas a partir de mais pesquisa, cursos e discussões. Eu mesmo tenho feito cursos para alunos e professores, nos quais compartilhamos experiências e desafios”, acrescenta a professora da Unifesp.

Ela defende que é fundamental preparar o aluno para ele entender que a IA pode ser uma grande aliada, mas não pode assumir o seu papel dentro do estudo. “Precisamos desenvolver metodologias para ajudar o aluno a ser mais pesquisador e menos decorador e reprodutor de conteúdo. Essa mudança metodológica é possível fazer sem precisar alterar diretrizes curriculares”, pondera Paula.

Na Unesp, iniciou-se um processo de discussão de uma normatização para inteligência artificial na universidade.”É preciso dar suporte para os alunos e professores que queiram ou não queiram usar. Então, isso tem que ser definido mesmo, senão daqui a pouco a gente vai começar a ter problemas. Determinados professores vão considerar que tal coisa é plágio, por exemplo. Então a universidade vai ter que tomar uma posição sobre a temática”, disse Lemke.

Outro ponto a ser estudado é em razão dos avanços da IA dentro do contexto do docente. “O que é legal para o mundo, dentro da sala de aula, não é necessariamente uma boa ideia. Por exemplo, que a tecnologia que o professor irá usar, varie toda semana com uma versão nova porque são muitas variações e o professor precisa se adaptar rapidamente”, afirma o professor da Unesp.

“Também temos investido na área que está vinculada à formação de docentes da universidade, com vários cursos ministrados para a preparação dos docentes. A gente quer que a universidade disponibilize de forma disseminada acesso às inteligências artificiais. Estamos discutindo como verbalizar isso. Provavelmente, já vamos ter algum protótipo ainda no início do ano que vem”, disse Lemke. Segundo o docente da Unesp, a universidade também está preparando um projeto institucional neste sentido.

Segundo Dora, todos os cidadãos do século XXI precisam conhecer a lógica e o funcionamento da inteligência artificiaI. “Como a IA pode contribuir para que eu realize melhor as minhas atividades como estudante, professor e pesquisador, e como futuro profissional de mercado.”

Para a professora da PUC SP, embora necessária, a mudança nos currículos não é algo simples, pois envolve um processo que precisa ser liderado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que é uma órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC). “O poder público - no nível federal, estadual e municipal -, precisa fomentar as mudanças dos currículos com a participação de todas as partes interessadas, verificando a melhor maneira de agregar a IA nos currículos, por exemplo, da química, física, matemática, engenharia. Com exceção dos currículos de tecnologia, a IA deve permear todas as disciplinas, e não se constituir como uma disciplina isolada”, afirma a docente da PUC SP.

O MEC disse que faz parte do Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA). “Cursos e disciplinas na graduação, além de fomento à pesquisa, inclusão e acessibilidade na educação, são algumas das propostas da pasta e que também abrangem a disponibilização automática de vagas em cursos de Ciência de Dados e IA no Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).Recentemente, o ministério, por meio da Secretaria de Gestão da Informação, Inovação e Avaliação de Políticas Educacionais (Segape), promoveu o Seminário Educação, Governança de Dados e Inteligência Artificial com o objetivo de debater acerca da centralidade de uma política de governança de dados, visando garantir uma gestão baseada em dados precisos, completos e confiáveis.

A capacidade da inteligência artificial de processar e analisar rapidamente grandes volumes de dados tem se mostrado cada vez mais presente nas Ciências Naturais. Isso foi evidenciado, recentemente, pelo Prêmio Nobel de Química e de Física, marcando o protagonismo da IA nas descobertas científicas. Diante disso, entra em debate se as faculdades dessas áreas devem preparar docentes e alunos quanto a utilização dessa tecnologia de forma eficaz e cuidadosa no cotidiano.

O termo inteligência artificial existe desde a década de 50, mas se popularizou nos últimos anos em razão do amplo volume de dados disponíveis, algoritmos avançados, além de melhorias no processamento computacional com o advento das GPUs.

Mesmo dentro do campo de pesquisas científicas, por exemplo, o uso da IA não é recente. “As pesquisas em física experimental, por exemplo, envolvem identificar padrões em grandes conjuntos de dados e as técnicas estatísticas capazes de lidar com esse grande volume de dados são as habilitadas por inteligência artificial, especificamente técnicas de aprendizado de máquina”, afirma a professora do programa de pós-graduação Tecnologias da Inteligência e Design Digital (TIDD) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC SP), Dora Kaufman.

A doutora e pesquisadora em inteligência artificial Dora Kaufman, professora na PUC de São Paulo. Foto: Taba Benedicto/ Estadão

“Nos últimos anos, a gente teve uma aceleração, mais que um crescimento, porque surgiu uma nova classe de algoritmos na área de inteligência artificial, que se chama IA generativa (que usa o aprendizado da máquina na criação de conteúdos, como textos, imagens, músicas ou vídeos)”, afirma Ney Lemke, responsável pela Coordenadoria de Tecnologia da Informação (CTInf) da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e docente no Instituto de Biociências da universidade.

Até então, essas interfaces já eram usadas, mas ainda era uma questão muito restrita a algumas comunidades. No entanto, após esses avanços, têm surgido muitas oportunidades para o uso delas em basicamente quase todas as áreas.

As Ciências Naturais envolvem áreas que trabalham com fenômenos naturais. Por meio de estudos, os profissionais realizam intervenções a fim de obter modelos teóricos e práticos para compreender como essas coisas funcionam. “O tempo todo os profissionais trabalham com dados. E a utilização da IA pode ajudar a qualificar melhor os dados transformando-os em evidências e, assim, construir melhores modelos”, na avaliação da professora Paula Carolei, docente do curso de Tecnologia em Design Educacional (TEDE) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Paula Carolei, professora do curso de Tecnologia em Design Educacional (TEDE) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Foto: Werther Santana/Estadão

“Precisamos trabalhar tanto com a qualidade de análise dos dados, e modelos construídos a partir deles, não sejam apenas uma previsão ou projeção, como acontecia com uma IA preditiva, mas essa nova IA, chamava de generativa, que não apenas prevê, mas cria, tanto visualização de modelos, como ajuda na ler mais textos e relacionar melhor as informações, criando novos conteúdos a partir dessas conexões”, afirma a professora Paula.

Segundo a docente da Unifesp, no entanto, para testar e avaliar melhor e mais rapidamente esses modelos, para poder ter propostas tecnológicas mais assertivas, mais criativas e autorais, é preciso entender que a IA deve ajudar a lidar com a complexidade da vida e não reduzir artificialmente os fenômenos.

“Eu tenho trabalhado com IA como apoio a autoria dos estudantes na aprendizagem e dos professores, nas suas ações de ensino. A aprendizagem de modelos é complexa e não deve ser simplificada, mas a IA pode ajudar a explicitar as relações entre os dados e variáveis, ajudando na compreensão tanto dos fenômenos naturais, como nas propostas tecnológicas de inovação. Mas a IA tem que ser usada de várias formas, questionando as respostas apresentadas e refinando os resultados, não apenas como perguntas e respostas diretas, simplistas e imediatas”, afirma a professora da Unifesp.

Para Dora, com a disseminação da IA, torna-se cada vez mais fundamental que as faculdades comecem a preparar os profissionais para o uso da tecnologia. “Não somente nas áreas de Ciências Naturais, mas igualmente nas Ciências Sociais e Humanas. A estrutura de ensino das universidades, não só no Brasil, mas no mundo inteiro, reflete a lógica compartimentalizada da economia industrial, no século XXI a inteligência artificial é estratégica para qualquer atividade em qualquer setor econômico ou de conhecimento”, afirma a docente.

Dentro da PUC SP, além de congressos que buscam incentivar professores e alunos para o desenvolvimento de projetos de IA, como a quinta edição do Congresso de IA PUC SP e PUC Campinas que aconteceu em 6 e 7 de novembro, também são organizados cursos para capacitar professores e funcionários. “É um longo processo, não é algo trivial, demanda tempo inclusive para efetivar mudanças culturais dado que o funcionamento dos sistemas de IA são bem diferentes dos sistemas programados. A primeira etapa é vencer a resistência, em parte advinda do medo de perder o emprego, de ser substituído pela automação, ou simplesmente de não conseguir acompanhar a velocidade das inovações”, afirma ela.

Conforme Paula, apesar de não ter nenhuma diretriz mais concreta e fechada sobre como aplicar a IA nas disciplinas nas áreas de Ciências Naturais, os professores estão pesquisando sobre a IA e como fazer uso da tecnologia, explorando o potencial dessas interfaces.

“Estamos preocupados com essa tecnologia que já invadiu todas as áreas, e faz parte do papel da universidade, incorporar emergências sociais. Nesse movimento, não dá para definir regras a priori e sim construir regulamentações e propostas a partir de mais pesquisa, cursos e discussões. Eu mesmo tenho feito cursos para alunos e professores, nos quais compartilhamos experiências e desafios”, acrescenta a professora da Unifesp.

Ela defende que é fundamental preparar o aluno para ele entender que a IA pode ser uma grande aliada, mas não pode assumir o seu papel dentro do estudo. “Precisamos desenvolver metodologias para ajudar o aluno a ser mais pesquisador e menos decorador e reprodutor de conteúdo. Essa mudança metodológica é possível fazer sem precisar alterar diretrizes curriculares”, pondera Paula.

Na Unesp, iniciou-se um processo de discussão de uma normatização para inteligência artificial na universidade.”É preciso dar suporte para os alunos e professores que queiram ou não queiram usar. Então, isso tem que ser definido mesmo, senão daqui a pouco a gente vai começar a ter problemas. Determinados professores vão considerar que tal coisa é plágio, por exemplo. Então a universidade vai ter que tomar uma posição sobre a temática”, disse Lemke.

Outro ponto a ser estudado é em razão dos avanços da IA dentro do contexto do docente. “O que é legal para o mundo, dentro da sala de aula, não é necessariamente uma boa ideia. Por exemplo, que a tecnologia que o professor irá usar, varie toda semana com uma versão nova porque são muitas variações e o professor precisa se adaptar rapidamente”, afirma o professor da Unesp.

“Também temos investido na área que está vinculada à formação de docentes da universidade, com vários cursos ministrados para a preparação dos docentes. A gente quer que a universidade disponibilize de forma disseminada acesso às inteligências artificiais. Estamos discutindo como verbalizar isso. Provavelmente, já vamos ter algum protótipo ainda no início do ano que vem”, disse Lemke. Segundo o docente da Unesp, a universidade também está preparando um projeto institucional neste sentido.

Segundo Dora, todos os cidadãos do século XXI precisam conhecer a lógica e o funcionamento da inteligência artificiaI. “Como a IA pode contribuir para que eu realize melhor as minhas atividades como estudante, professor e pesquisador, e como futuro profissional de mercado.”

Para a professora da PUC SP, embora necessária, a mudança nos currículos não é algo simples, pois envolve um processo que precisa ser liderado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que é uma órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC). “O poder público - no nível federal, estadual e municipal -, precisa fomentar as mudanças dos currículos com a participação de todas as partes interessadas, verificando a melhor maneira de agregar a IA nos currículos, por exemplo, da química, física, matemática, engenharia. Com exceção dos currículos de tecnologia, a IA deve permear todas as disciplinas, e não se constituir como uma disciplina isolada”, afirma a docente da PUC SP.

O MEC disse que faz parte do Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA). “Cursos e disciplinas na graduação, além de fomento à pesquisa, inclusão e acessibilidade na educação, são algumas das propostas da pasta e que também abrangem a disponibilização automática de vagas em cursos de Ciência de Dados e IA no Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).Recentemente, o ministério, por meio da Secretaria de Gestão da Informação, Inovação e Avaliação de Políticas Educacionais (Segape), promoveu o Seminário Educação, Governança de Dados e Inteligência Artificial com o objetivo de debater acerca da centralidade de uma política de governança de dados, visando garantir uma gestão baseada em dados precisos, completos e confiáveis.

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