A ativista de inclusão e jornalista Mariana Rosa foi indicada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nesta segunda-feira, 5, para uma das 13 novas vagas do Conselho Nacional de Educação (CNE). Mariana se posiciona fortemente nas redes sociais contra o parecer 50, aprovado no CNE no fim do ano passado.
O documento traz novas diretrizes para a educação de alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Ele gerou polêmica na comunidade acadêmica e nas escolas; está sendo revisado e até hoje não foi homologado pelo ministro Camilo Santana (PT).
Entenda polêmica sobre autismo no CNE
O parecer 50 prevê diretrizes para inclusão de crianças com TEA com base em pesquisas ligadas à análise do comportamento, área da Psicologia menos difundida no Brasil, mas prevalente em muitos países, como os Estados Unidos.
O documento lista práticas que deveriam fazer parte do ambiente escolar, da formação de professores e de acompanhantes dos alunos com TEA. O parecer foi elaborado no CNE com a colaboração de profissionais da Psicologia e da Educação, mas há correntes que reclamam não terem sido contempladas.
Há debates entre os dois lados sobre questões práticas, como a entrada ou não de acompanhante para o aluno na sala de aula, mas o acirramento tem camadas mais profundas e conceituais sobre qual o papel da escola. E ainda carrega embates de correntes diferentes da Psicologia e da educação, que têm entendimentos diversos sobre o desenvolvimento humano.
Movimentos sociais e entidades ligadas à esquerda são contra o documento, como a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), cujo presidente - Heleno Araújo - também foi indicado nesta segunda-feira para o CNE por Lula.
Hoje há 634.875 alunos diagnosticados com TEA nas escolas públicas e particulares brasileiras, alta de mais de 1,4 mil% nos últimos dez anos, segundo o MEC. Crianças no espectro autista têm alterações de neurodesenvolvimento que afetam, em geral, a comunicação, a linguagem, a interação social, os comportamentos e a aprendizagem.
Apesar de esses alunos estarem matriculados em escolas regulares - e não em instituições especializadas em cada deficiência, como no passado, antes da difusão do conceito da inclusão - é consenso entre os dois lados que a educação inclusiva não se efetivou como deveria.
Foi na tentativa de organizar diretrizes e legislações nem sempre claras sobre o assunto que o parecer começou a ser elaborado.
Em abril, um movimento intitulado #homologacamilo cresceu nas redes sociais, pressionando o MEC a ratificar o documento. O mesmo grupo entregou ao ministro um documento com cerca de 2,6 mil assinaturas de entidades de apoio ao texto.
O CNE é um órgão de assessoramento do ministério, mas atua de forma autônoma, produzindo normativas e avaliando políticas. Seus pareceres precisam ser homologados pelo ministro para serem efetivamente considerados como norma.
Críticos do texto - entre os quais está Mariana e integrantes do próprio MEC -, no entanto, veem tentativa de impor uma abordagem médica na educação, que seria contrária à função e a autonomia da escola. E ainda dizem que as recomendações atenderiam a interesses do mercado.
Novo texto do parecer
Segundo o Estadão apurou, o MEC já havia pedido ao CNE que revisasse o texto por causa das críticas e trechos que explicitavam práticas ligadas à área da análise do comportamento foram retirados.
Entre as citadas no relatório, estavam o “reforçamento”, que é a “aplicação de uma consequência”, como um comentário elogioso, por exemplo, “após uma resposta dada pelo aluno que aumenta a probabilidade de ele emitir a resposta no futuro em situações semelhantes”.
Depois de passar por consulta pública, o parecer com texto modificado seria votado no CNE na semana passada, mas o MEC pediu vistas. Ainda não há previsão para nova votação.
A entrada de Mariana no CNE foi mal recebida por grupos que apoiavam o documento e entendida como mensagem do governo Lula de que não aprova os termos que o assunto foi tratado.
Mariana faz mestrado em Educação na Universidade de São Paulo (USP) e integra ainda da Comissão Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, grupo criado em 2023 para assessorar o MEC nas políticas da área, e que se posicionou contrário ao parecer. Ela também é fundadora do Instituto Cáue e integrante do Coletivo Feminista Helen Keller.