Menos cópia de texto da lousa, mais experiências com cortadora a laser e impressora 3D. A cultura “mão na massa” - ou movimento maker, tendência difundida nos Estados Unidos - tem avançado no ensino superior brasileiro. A ideia é, com a prática, aumentar o interesse e melhorar a aprendizagem dos alunos. O novo modelo ganha espaço em vários campos, como Engenharia, Arquitetura, Artes e Design.
A Universidade de São Paulo (USP) é uma das pioneiras em levar atividades “mão na massa” para alunos de graduação, como nas Engenharias. E a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP abriga, desde 2011, o primeiro laboratório de fabricação digital (Fab Lab) do País credenciado por parâmetros internacionais. O Fab Lab é um dos principais tipos de espaço maker.
Agora, outras escolas têm investido na criação desses espaços. O Centro Universitário Belas Artes de São Paulo, por exemplo, abriu neste ano um laboratório de fabricação digital e prototipagem, com impressora 3D e cortadoras a laser.
No local, é possível trabalhar com materiais diversos, como madeira, plástico e tecido. Os projetos podem ser aqueles pedidos em aula ou de interesse pessoal dos alunos.
O principal projeto desenvolvido pelos alunos dos cursos de Arquitetura e Urbanismo e Design de Produto foi um abrigo de madeira. O acessório resolveu um problema real dos estudantes: proteger as pessoas do sol em uma área anexa ao prédio da faculdade.
“Foi a primeira chance de aplicar a teoria e ver o que funciona”, diz Ricardo Coji, de 21 anos, que estuda Arquitetura.
Segundo o aluno, o trabalho no laboratório incentiva a desbravar os softwares e tornar a execução mais precisa. Enio Moro Junior, coordenador do curso de Arquitetura, diz que os projetos do laboratório têm sido mais criativos, refinados e funcionais. “Também é bom aprender pelo erro. É tão importante quanto o acerto no percurso.” A Belas Artes já estuda ampliar o espaço de criação digital em 2016.
Integração. No Insper, os cursos de Engenharia - de Computação, Mecânica e Mecatrônica - nasceram em 2015 já com um Fab Lab, inaugurado na escola no ano anterior. “O processo de fazer está junto do pensar. Não é a teoria primeiro e a prática depois, como é comum nas universidades”, explica Heloísa Neves, coordenadora do laboratório.
Matheus Marotzke, de 19 anos, aluno de Engenharia Mecânica, passa mais de duas horas diárias no laboratório, mistura de oficina e sala high-tech. Quando não estão envolvidos em trabalhos de classe, os alunos têm autonomia: desde explorar aparelhos eletrônicos antigos até projetar novidades em três dimensões - como a prótese de uma mão, um dos projetos em andamento. “Quanto mais diferente, melhor.”
O interesse pelo Fab Lab foi tanto que ele já atua como monitor no espaço. “A gente tenta não dar respostas diretas, mas indicar o caminho correto de raciocínio.”
Além de ser frequentado pelos estudantes da faculdade, o laboratório é aberto ao público externo às quintas-feiras, das 12h30 às 21 horas. “Não há pessoa ou instituição que saiba mais que o outro. Tentamos criar o conhecimento em conjunto. Abrimos à comunidade para poderem nos ensinar também”, afirma Heloísa, uma das principais pesquisadoras sobre Fab Labs no País.
No Instituto Mauá de Tecnologia, o espaço maker serve para projetos especiais, em que alunos de Engenharia se dedicam a atividades práticas. Os espaços ainda não são abertos para todos os projetos, mas só os propostos em classe. Em 2015, o principal objetivo do espaço é produzir skates, que depois são doados. No ano que vem, serão patinetes.
Calouro de Engenharia de Produção do instituto, Rodriggo Basile, de 20 anos, já vive dilemas da indústria. “O tipo e o formato do skates nós tínhamos de escolher. E também saber se os processos eram possíveis de replicar, se os custos eram bons.”
Criação própria. Quando a escola não tem o espaço maker, os alunos também podem dar um jeito. Foi o que aconteceu no câmpus de Bauru da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Alunos de Design e Arquitetura, da graduação e da pós, resolveram iniciar, no fim de 2013, uma rede de criação colaborativa e fabricação digital, batizada de Sagui Lab.
O grupo faz oficinas, em que improvisam laboratórios “mão na massa” em salas ociosas da Unesp. Lá, os colegas e o público externo usam equipamentos de criação digital - até uma impressora 3D montada pelos próprios membros da rede. O próximo passo é montar um laboratório maker em um contêiner no câmpus.
Além da experiência prática, o Sagui Lab transforma a cultura acadêmica. “Os alunos estão aprendendo como é trabalhar com projetos abertos, dar sua contribuição independente da área”, diz Vitor Marchi, de 25 anos, um dos fundadores da rede. “O laboratório promove o acesso e a desmistificação da tecnologia”, completa o aluno de Design.