Inscrições nazistas surgem na Faculdade de Direito da USP, que vê alta de manifestações de ódio


Direção informou ao Ministério Público sobre mensagens em elevadores, mobília e placa. Vice-diretora relata aumento de casos de intolerância e racismo após chegada de alunos cotistas

Por Beatriz Bulla
Atualização:

Desde o início do ano, inscrições de apologia ao nazismo têm se espalhado por paredes e mobiliários do histórico prédio da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) no Largo São Francisco, centro da capital paulista. Talhadas na madeira dos elevadores, mesas e cadeiras, e gravadas na placa de metal que identifica uma das salas de aula, as suásticas alarmaram a direção da faculdade, que já informou ao Ministério Público sobre o assunto.

Com quase 200 anos, Faculdade de Direito é uma das instituições de ensino mais tradicionais do País Foto: Tiago Queiroz/Estadão

O aparecimento do ícone que evoca os horrores do nazismo cristaliza a escalada das manifestações de ódio nos últimos anos dentro de uma das instituições mais prestigiosas do País e conhecida pela luta por direitos. Professores da faculdade destacam que a apologia ao nazismo na São Francisco aparece no mesmo momento em que há discursos de intolerância em razão da maior diversidade de alunos, impulsionada pelas cotas socioeconômicas e raciais.

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Segundo a vice-diretora, Ana Elisa Bechara, a faculdade informou aos grupos que monitoram esse tipo de crime no Ministério Público de São Paulo e no Ministério Público Federal (MPF). A conduta, diz ela, pode levar â expulsão da faculdade.

Em reunião com professores titulares, o diretor da Faculdade, Celso Campilongo, também afirmou que a diretoria considerava a gravação de símbolos nazistas pelo câmpus intolerável e reforçou que os responsáveis, quando identificados, responderão por seus atos.

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“É deplorável que no ambiente universitário em geral e, de modo particular, no âmbito de uma faculdade de Direito, manifestações preconceituosas, racistas e atentatórias aos Direitos Humanos ocorram”, afirmou Campilongo ao Estadão.

“Lamentável, sob todos os aspectos, que indivíduos ou grupos minoritários -- em clara violação à lei e às normas internas da USP -- façam inscrições de teor nazista, como suásticas, em muros e mobiliário da Faculdade”, acrescentou o diretor.

“Não são exatamente suásticas: são deliberadamente feitas de forma errada. Até nisso vemos uma covardia. Não são símbolos que partem de nada institucionalizado, são feitos de forma escondida”, afirma Bechara, que além de vice-diretora, é professora titular de Direito Penal da USP.

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Ela diz que o uso de câmeras de vigilância “não combina” com o ambiente da Faculdade de Direito, que se pretende uma área de livre expressão. A ausência dos equipamentos, porém, dificulta a identificação dos responsáveis.

O elevador, assim como o prédio, as salas de aula e até o mobiliário de boa parte do prédio histórico da São Francisco, é tombado. Qualquer reforma, portanto, mesmo para remover os símbolos, exige protocolo específico.

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Inscrição de apologia ao nazismo em placa de identificação de sala de aula da Faculdade de Direito da USP, registrada em agosto de 2024. Foto: Beatriz Bulla/Estadão

A apologia do nazismo usando símbolos é crime previsto em lei, com pena de reclusão. “Qualquer apologia ao nazismo usando símbolos é crime previsto na legislação e reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal. Quando pega isso em uma faculdade de Direito, onde há formação das pessoas que definem o encaminhamento das leis, há forte teor de incentivo ao discurso de ódio”, afirma Claudio Lottenberg, presidente da Confederação Israelita do Brasil (Conib).

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“É algo que para nós, como brasileiros, chama a atenção porque mostra insubordinação às práticas legais por pessoas que se propõem balizar suas ações pela lei. Não é só algo que diz respeito aos judeus, mas a todos”, acrescenta Lottenberg.

Como professora, Ana Elisa percebe com maior frequência a aparição de discursos de ódio ou racistas, de maneira anônima, na Faculdade, e muitas vezes ligados às cotas.

“Principalmente depois das cotas, temos um perfil do alunado muito diversificado, desde 2018. Temos 50% do alunado que faz parte desses grupos vulnerabilizados e isso muda um ‘montão’ de coisas”, afirma ela.

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Outra diferença é que, na década de 1990, a maior parte dos estudantes era do Estado de São Paulo. Hoje, a faculdade está mais “nacionalizada”. Ela diz receber relatos de alunos cotistas que dizem não se sentir “pertencentes” à instituição.

“Lá, temos um território de convívio que normalmente esses grupos não têm fora da faculdade. Temos coisas muito interessantes e positivas surgindo na faculdade, houve uma reviravolta em termos de valores, mas em paralelo tem um movimento de oposição que nasce ou se fortalece. Isso temos visto no mundo todo. E é assim também na faculdade”, afirma a diretora.

Faculdade de Direito da USP, no Largo São Francisco FOTO:WERTHER SANTANA / ESTADÃO CONTEÚDO Foto: WERTHER

Em 2022, a Faculdade de Direito da USP liderou um movimento favorável ao Estado Democrático de Direito e ao processo eleitoral, quando a sistema eleitoral estava sob ataque do ex-presidente Jair Bolsonaro.

A presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito da USP, Mariana Belussi, afirma que, a despeito de ter passado a chamar mais atenção neste ano, parte dos símbolos começou a surgir no ano passado, em período próximo à realização de uma greve estudantil, em outubro.

O momento coincide com o início da guerra entre Israel e o Hamas, após ataque feito pelo grupo terrorista no dia 7 de outubro. Ela diz que o centro acadêmico levou à direção da Faculdade a preocupação com a questão. “Tem parcela significativa da faculdade que pertence à comunidade judaica e ficamos preocupados”, afirma.

“Depois que vieram as cotas, vimos grupos de extrema direita começarem a atuar na faculdade. Durante a greve, vimos pessoas que se manifestaram pregando o ódio aos que estavam fazendo a greve”, afirma a estudante. Segundo ela, esses discursos de ódio não foram publicamente verbalizados, mas apareceram por meio de perfis anônimos na rede social X (antigo Twitter). Também no ano passado, cartazes com imagens impressas de um desses perfis de redes sociais foram colados no banheiro da faculdade.

Em uma das publicações, um usuário anônimo dizia que as faculdades públicas de elite no Brasil haviam se tornado uma “ocupação baixo-clero”.

A Sanfran, como é informalmente chamada, é berço acadêmico e político de diversas personalidades brasileiras -- e de 13 ex-presidentes da República. Na época de sua fundação, no século 19, a Faculdade de Direito da USP recebia os filhos da elite brasileira enviados de todas as regiões a São Paulo para se formarem advogados.

No início dos anos 2000, levantamentos da própria USP mostravam que a faculdade seguia sendo local de formar filhos da elite brasileira: o curso de Direito era aquele que, dentro de toda USP, tinha mais aprovados vindo de famílias com renda superior maior.

Inscrição de apologia ao nazismo em parede interna de elevador da Faculdade de Direito da USP, registrada em agosto de 2024. Foto: Beatriz Bulla/Estadão

A adoção da política de cotas na USP se deu em 2017 e a primeira turma de alunos cotistas da São Francisco se formou em 2023.

Além das cotas, a vice-diretora diz que o processo seletivo nacional, por meio do Enem, colabora para que a faculdade tenha mais diversidade. “Isso dá uma cara muito diferente à faculdade, que está mais colorida, tem essa mistura de alunos. Tenho alunos dessa elite socioeconômica de São Paulo e também aluno filho de pessoa em situação de rua. Isso muda a própria forma de convivência, a agenda de pesquisa da faculdade, enriquece o debate, mas coloca a sociedade para conversar”, afirma.

Procurada por meio da assessoria de imprensa, a reitoria da USP afirmou que caberia à diretoria da Faculdade de Direito se manifestar.

Desde o início do ano, inscrições de apologia ao nazismo têm se espalhado por paredes e mobiliários do histórico prédio da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) no Largo São Francisco, centro da capital paulista. Talhadas na madeira dos elevadores, mesas e cadeiras, e gravadas na placa de metal que identifica uma das salas de aula, as suásticas alarmaram a direção da faculdade, que já informou ao Ministério Público sobre o assunto.

Com quase 200 anos, Faculdade de Direito é uma das instituições de ensino mais tradicionais do País Foto: Tiago Queiroz/Estadão

O aparecimento do ícone que evoca os horrores do nazismo cristaliza a escalada das manifestações de ódio nos últimos anos dentro de uma das instituições mais prestigiosas do País e conhecida pela luta por direitos. Professores da faculdade destacam que a apologia ao nazismo na São Francisco aparece no mesmo momento em que há discursos de intolerância em razão da maior diversidade de alunos, impulsionada pelas cotas socioeconômicas e raciais.

Segundo a vice-diretora, Ana Elisa Bechara, a faculdade informou aos grupos que monitoram esse tipo de crime no Ministério Público de São Paulo e no Ministério Público Federal (MPF). A conduta, diz ela, pode levar â expulsão da faculdade.

Em reunião com professores titulares, o diretor da Faculdade, Celso Campilongo, também afirmou que a diretoria considerava a gravação de símbolos nazistas pelo câmpus intolerável e reforçou que os responsáveis, quando identificados, responderão por seus atos.

“É deplorável que no ambiente universitário em geral e, de modo particular, no âmbito de uma faculdade de Direito, manifestações preconceituosas, racistas e atentatórias aos Direitos Humanos ocorram”, afirmou Campilongo ao Estadão.

“Lamentável, sob todos os aspectos, que indivíduos ou grupos minoritários -- em clara violação à lei e às normas internas da USP -- façam inscrições de teor nazista, como suásticas, em muros e mobiliário da Faculdade”, acrescentou o diretor.

“Não são exatamente suásticas: são deliberadamente feitas de forma errada. Até nisso vemos uma covardia. Não são símbolos que partem de nada institucionalizado, são feitos de forma escondida”, afirma Bechara, que além de vice-diretora, é professora titular de Direito Penal da USP.

Ela diz que o uso de câmeras de vigilância “não combina” com o ambiente da Faculdade de Direito, que se pretende uma área de livre expressão. A ausência dos equipamentos, porém, dificulta a identificação dos responsáveis.

O elevador, assim como o prédio, as salas de aula e até o mobiliário de boa parte do prédio histórico da São Francisco, é tombado. Qualquer reforma, portanto, mesmo para remover os símbolos, exige protocolo específico.

Inscrição de apologia ao nazismo em placa de identificação de sala de aula da Faculdade de Direito da USP, registrada em agosto de 2024. Foto: Beatriz Bulla/Estadão

A apologia do nazismo usando símbolos é crime previsto em lei, com pena de reclusão. “Qualquer apologia ao nazismo usando símbolos é crime previsto na legislação e reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal. Quando pega isso em uma faculdade de Direito, onde há formação das pessoas que definem o encaminhamento das leis, há forte teor de incentivo ao discurso de ódio”, afirma Claudio Lottenberg, presidente da Confederação Israelita do Brasil (Conib).

“É algo que para nós, como brasileiros, chama a atenção porque mostra insubordinação às práticas legais por pessoas que se propõem balizar suas ações pela lei. Não é só algo que diz respeito aos judeus, mas a todos”, acrescenta Lottenberg.

Como professora, Ana Elisa percebe com maior frequência a aparição de discursos de ódio ou racistas, de maneira anônima, na Faculdade, e muitas vezes ligados às cotas.

“Principalmente depois das cotas, temos um perfil do alunado muito diversificado, desde 2018. Temos 50% do alunado que faz parte desses grupos vulnerabilizados e isso muda um ‘montão’ de coisas”, afirma ela.

Outra diferença é que, na década de 1990, a maior parte dos estudantes era do Estado de São Paulo. Hoje, a faculdade está mais “nacionalizada”. Ela diz receber relatos de alunos cotistas que dizem não se sentir “pertencentes” à instituição.

“Lá, temos um território de convívio que normalmente esses grupos não têm fora da faculdade. Temos coisas muito interessantes e positivas surgindo na faculdade, houve uma reviravolta em termos de valores, mas em paralelo tem um movimento de oposição que nasce ou se fortalece. Isso temos visto no mundo todo. E é assim também na faculdade”, afirma a diretora.

Faculdade de Direito da USP, no Largo São Francisco FOTO:WERTHER SANTANA / ESTADÃO CONTEÚDO Foto: WERTHER

Em 2022, a Faculdade de Direito da USP liderou um movimento favorável ao Estado Democrático de Direito e ao processo eleitoral, quando a sistema eleitoral estava sob ataque do ex-presidente Jair Bolsonaro.

A presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito da USP, Mariana Belussi, afirma que, a despeito de ter passado a chamar mais atenção neste ano, parte dos símbolos começou a surgir no ano passado, em período próximo à realização de uma greve estudantil, em outubro.

O momento coincide com o início da guerra entre Israel e o Hamas, após ataque feito pelo grupo terrorista no dia 7 de outubro. Ela diz que o centro acadêmico levou à direção da Faculdade a preocupação com a questão. “Tem parcela significativa da faculdade que pertence à comunidade judaica e ficamos preocupados”, afirma.

“Depois que vieram as cotas, vimos grupos de extrema direita começarem a atuar na faculdade. Durante a greve, vimos pessoas que se manifestaram pregando o ódio aos que estavam fazendo a greve”, afirma a estudante. Segundo ela, esses discursos de ódio não foram publicamente verbalizados, mas apareceram por meio de perfis anônimos na rede social X (antigo Twitter). Também no ano passado, cartazes com imagens impressas de um desses perfis de redes sociais foram colados no banheiro da faculdade.

Em uma das publicações, um usuário anônimo dizia que as faculdades públicas de elite no Brasil haviam se tornado uma “ocupação baixo-clero”.

A Sanfran, como é informalmente chamada, é berço acadêmico e político de diversas personalidades brasileiras -- e de 13 ex-presidentes da República. Na época de sua fundação, no século 19, a Faculdade de Direito da USP recebia os filhos da elite brasileira enviados de todas as regiões a São Paulo para se formarem advogados.

No início dos anos 2000, levantamentos da própria USP mostravam que a faculdade seguia sendo local de formar filhos da elite brasileira: o curso de Direito era aquele que, dentro de toda USP, tinha mais aprovados vindo de famílias com renda superior maior.

Inscrição de apologia ao nazismo em parede interna de elevador da Faculdade de Direito da USP, registrada em agosto de 2024. Foto: Beatriz Bulla/Estadão

A adoção da política de cotas na USP se deu em 2017 e a primeira turma de alunos cotistas da São Francisco se formou em 2023.

Além das cotas, a vice-diretora diz que o processo seletivo nacional, por meio do Enem, colabora para que a faculdade tenha mais diversidade. “Isso dá uma cara muito diferente à faculdade, que está mais colorida, tem essa mistura de alunos. Tenho alunos dessa elite socioeconômica de São Paulo e também aluno filho de pessoa em situação de rua. Isso muda a própria forma de convivência, a agenda de pesquisa da faculdade, enriquece o debate, mas coloca a sociedade para conversar”, afirma.

Procurada por meio da assessoria de imprensa, a reitoria da USP afirmou que caberia à diretoria da Faculdade de Direito se manifestar.

Desde o início do ano, inscrições de apologia ao nazismo têm se espalhado por paredes e mobiliários do histórico prédio da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) no Largo São Francisco, centro da capital paulista. Talhadas na madeira dos elevadores, mesas e cadeiras, e gravadas na placa de metal que identifica uma das salas de aula, as suásticas alarmaram a direção da faculdade, que já informou ao Ministério Público sobre o assunto.

Com quase 200 anos, Faculdade de Direito é uma das instituições de ensino mais tradicionais do País Foto: Tiago Queiroz/Estadão

O aparecimento do ícone que evoca os horrores do nazismo cristaliza a escalada das manifestações de ódio nos últimos anos dentro de uma das instituições mais prestigiosas do País e conhecida pela luta por direitos. Professores da faculdade destacam que a apologia ao nazismo na São Francisco aparece no mesmo momento em que há discursos de intolerância em razão da maior diversidade de alunos, impulsionada pelas cotas socioeconômicas e raciais.

Segundo a vice-diretora, Ana Elisa Bechara, a faculdade informou aos grupos que monitoram esse tipo de crime no Ministério Público de São Paulo e no Ministério Público Federal (MPF). A conduta, diz ela, pode levar â expulsão da faculdade.

Em reunião com professores titulares, o diretor da Faculdade, Celso Campilongo, também afirmou que a diretoria considerava a gravação de símbolos nazistas pelo câmpus intolerável e reforçou que os responsáveis, quando identificados, responderão por seus atos.

“É deplorável que no ambiente universitário em geral e, de modo particular, no âmbito de uma faculdade de Direito, manifestações preconceituosas, racistas e atentatórias aos Direitos Humanos ocorram”, afirmou Campilongo ao Estadão.

“Lamentável, sob todos os aspectos, que indivíduos ou grupos minoritários -- em clara violação à lei e às normas internas da USP -- façam inscrições de teor nazista, como suásticas, em muros e mobiliário da Faculdade”, acrescentou o diretor.

“Não são exatamente suásticas: são deliberadamente feitas de forma errada. Até nisso vemos uma covardia. Não são símbolos que partem de nada institucionalizado, são feitos de forma escondida”, afirma Bechara, que além de vice-diretora, é professora titular de Direito Penal da USP.

Ela diz que o uso de câmeras de vigilância “não combina” com o ambiente da Faculdade de Direito, que se pretende uma área de livre expressão. A ausência dos equipamentos, porém, dificulta a identificação dos responsáveis.

O elevador, assim como o prédio, as salas de aula e até o mobiliário de boa parte do prédio histórico da São Francisco, é tombado. Qualquer reforma, portanto, mesmo para remover os símbolos, exige protocolo específico.

Inscrição de apologia ao nazismo em placa de identificação de sala de aula da Faculdade de Direito da USP, registrada em agosto de 2024. Foto: Beatriz Bulla/Estadão

A apologia do nazismo usando símbolos é crime previsto em lei, com pena de reclusão. “Qualquer apologia ao nazismo usando símbolos é crime previsto na legislação e reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal. Quando pega isso em uma faculdade de Direito, onde há formação das pessoas que definem o encaminhamento das leis, há forte teor de incentivo ao discurso de ódio”, afirma Claudio Lottenberg, presidente da Confederação Israelita do Brasil (Conib).

“É algo que para nós, como brasileiros, chama a atenção porque mostra insubordinação às práticas legais por pessoas que se propõem balizar suas ações pela lei. Não é só algo que diz respeito aos judeus, mas a todos”, acrescenta Lottenberg.

Como professora, Ana Elisa percebe com maior frequência a aparição de discursos de ódio ou racistas, de maneira anônima, na Faculdade, e muitas vezes ligados às cotas.

“Principalmente depois das cotas, temos um perfil do alunado muito diversificado, desde 2018. Temos 50% do alunado que faz parte desses grupos vulnerabilizados e isso muda um ‘montão’ de coisas”, afirma ela.

Outra diferença é que, na década de 1990, a maior parte dos estudantes era do Estado de São Paulo. Hoje, a faculdade está mais “nacionalizada”. Ela diz receber relatos de alunos cotistas que dizem não se sentir “pertencentes” à instituição.

“Lá, temos um território de convívio que normalmente esses grupos não têm fora da faculdade. Temos coisas muito interessantes e positivas surgindo na faculdade, houve uma reviravolta em termos de valores, mas em paralelo tem um movimento de oposição que nasce ou se fortalece. Isso temos visto no mundo todo. E é assim também na faculdade”, afirma a diretora.

Faculdade de Direito da USP, no Largo São Francisco FOTO:WERTHER SANTANA / ESTADÃO CONTEÚDO Foto: WERTHER

Em 2022, a Faculdade de Direito da USP liderou um movimento favorável ao Estado Democrático de Direito e ao processo eleitoral, quando a sistema eleitoral estava sob ataque do ex-presidente Jair Bolsonaro.

A presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito da USP, Mariana Belussi, afirma que, a despeito de ter passado a chamar mais atenção neste ano, parte dos símbolos começou a surgir no ano passado, em período próximo à realização de uma greve estudantil, em outubro.

O momento coincide com o início da guerra entre Israel e o Hamas, após ataque feito pelo grupo terrorista no dia 7 de outubro. Ela diz que o centro acadêmico levou à direção da Faculdade a preocupação com a questão. “Tem parcela significativa da faculdade que pertence à comunidade judaica e ficamos preocupados”, afirma.

“Depois que vieram as cotas, vimos grupos de extrema direita começarem a atuar na faculdade. Durante a greve, vimos pessoas que se manifestaram pregando o ódio aos que estavam fazendo a greve”, afirma a estudante. Segundo ela, esses discursos de ódio não foram publicamente verbalizados, mas apareceram por meio de perfis anônimos na rede social X (antigo Twitter). Também no ano passado, cartazes com imagens impressas de um desses perfis de redes sociais foram colados no banheiro da faculdade.

Em uma das publicações, um usuário anônimo dizia que as faculdades públicas de elite no Brasil haviam se tornado uma “ocupação baixo-clero”.

A Sanfran, como é informalmente chamada, é berço acadêmico e político de diversas personalidades brasileiras -- e de 13 ex-presidentes da República. Na época de sua fundação, no século 19, a Faculdade de Direito da USP recebia os filhos da elite brasileira enviados de todas as regiões a São Paulo para se formarem advogados.

No início dos anos 2000, levantamentos da própria USP mostravam que a faculdade seguia sendo local de formar filhos da elite brasileira: o curso de Direito era aquele que, dentro de toda USP, tinha mais aprovados vindo de famílias com renda superior maior.

Inscrição de apologia ao nazismo em parede interna de elevador da Faculdade de Direito da USP, registrada em agosto de 2024. Foto: Beatriz Bulla/Estadão

A adoção da política de cotas na USP se deu em 2017 e a primeira turma de alunos cotistas da São Francisco se formou em 2023.

Além das cotas, a vice-diretora diz que o processo seletivo nacional, por meio do Enem, colabora para que a faculdade tenha mais diversidade. “Isso dá uma cara muito diferente à faculdade, que está mais colorida, tem essa mistura de alunos. Tenho alunos dessa elite socioeconômica de São Paulo e também aluno filho de pessoa em situação de rua. Isso muda a própria forma de convivência, a agenda de pesquisa da faculdade, enriquece o debate, mas coloca a sociedade para conversar”, afirma.

Procurada por meio da assessoria de imprensa, a reitoria da USP afirmou que caberia à diretoria da Faculdade de Direito se manifestar.

Desde o início do ano, inscrições de apologia ao nazismo têm se espalhado por paredes e mobiliários do histórico prédio da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) no Largo São Francisco, centro da capital paulista. Talhadas na madeira dos elevadores, mesas e cadeiras, e gravadas na placa de metal que identifica uma das salas de aula, as suásticas alarmaram a direção da faculdade, que já informou ao Ministério Público sobre o assunto.

Com quase 200 anos, Faculdade de Direito é uma das instituições de ensino mais tradicionais do País Foto: Tiago Queiroz/Estadão

O aparecimento do ícone que evoca os horrores do nazismo cristaliza a escalada das manifestações de ódio nos últimos anos dentro de uma das instituições mais prestigiosas do País e conhecida pela luta por direitos. Professores da faculdade destacam que a apologia ao nazismo na São Francisco aparece no mesmo momento em que há discursos de intolerância em razão da maior diversidade de alunos, impulsionada pelas cotas socioeconômicas e raciais.

Segundo a vice-diretora, Ana Elisa Bechara, a faculdade informou aos grupos que monitoram esse tipo de crime no Ministério Público de São Paulo e no Ministério Público Federal (MPF). A conduta, diz ela, pode levar â expulsão da faculdade.

Em reunião com professores titulares, o diretor da Faculdade, Celso Campilongo, também afirmou que a diretoria considerava a gravação de símbolos nazistas pelo câmpus intolerável e reforçou que os responsáveis, quando identificados, responderão por seus atos.

“É deplorável que no ambiente universitário em geral e, de modo particular, no âmbito de uma faculdade de Direito, manifestações preconceituosas, racistas e atentatórias aos Direitos Humanos ocorram”, afirmou Campilongo ao Estadão.

“Lamentável, sob todos os aspectos, que indivíduos ou grupos minoritários -- em clara violação à lei e às normas internas da USP -- façam inscrições de teor nazista, como suásticas, em muros e mobiliário da Faculdade”, acrescentou o diretor.

“Não são exatamente suásticas: são deliberadamente feitas de forma errada. Até nisso vemos uma covardia. Não são símbolos que partem de nada institucionalizado, são feitos de forma escondida”, afirma Bechara, que além de vice-diretora, é professora titular de Direito Penal da USP.

Ela diz que o uso de câmeras de vigilância “não combina” com o ambiente da Faculdade de Direito, que se pretende uma área de livre expressão. A ausência dos equipamentos, porém, dificulta a identificação dos responsáveis.

O elevador, assim como o prédio, as salas de aula e até o mobiliário de boa parte do prédio histórico da São Francisco, é tombado. Qualquer reforma, portanto, mesmo para remover os símbolos, exige protocolo específico.

Inscrição de apologia ao nazismo em placa de identificação de sala de aula da Faculdade de Direito da USP, registrada em agosto de 2024. Foto: Beatriz Bulla/Estadão

A apologia do nazismo usando símbolos é crime previsto em lei, com pena de reclusão. “Qualquer apologia ao nazismo usando símbolos é crime previsto na legislação e reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal. Quando pega isso em uma faculdade de Direito, onde há formação das pessoas que definem o encaminhamento das leis, há forte teor de incentivo ao discurso de ódio”, afirma Claudio Lottenberg, presidente da Confederação Israelita do Brasil (Conib).

“É algo que para nós, como brasileiros, chama a atenção porque mostra insubordinação às práticas legais por pessoas que se propõem balizar suas ações pela lei. Não é só algo que diz respeito aos judeus, mas a todos”, acrescenta Lottenberg.

Como professora, Ana Elisa percebe com maior frequência a aparição de discursos de ódio ou racistas, de maneira anônima, na Faculdade, e muitas vezes ligados às cotas.

“Principalmente depois das cotas, temos um perfil do alunado muito diversificado, desde 2018. Temos 50% do alunado que faz parte desses grupos vulnerabilizados e isso muda um ‘montão’ de coisas”, afirma ela.

Outra diferença é que, na década de 1990, a maior parte dos estudantes era do Estado de São Paulo. Hoje, a faculdade está mais “nacionalizada”. Ela diz receber relatos de alunos cotistas que dizem não se sentir “pertencentes” à instituição.

“Lá, temos um território de convívio que normalmente esses grupos não têm fora da faculdade. Temos coisas muito interessantes e positivas surgindo na faculdade, houve uma reviravolta em termos de valores, mas em paralelo tem um movimento de oposição que nasce ou se fortalece. Isso temos visto no mundo todo. E é assim também na faculdade”, afirma a diretora.

Faculdade de Direito da USP, no Largo São Francisco FOTO:WERTHER SANTANA / ESTADÃO CONTEÚDO Foto: WERTHER

Em 2022, a Faculdade de Direito da USP liderou um movimento favorável ao Estado Democrático de Direito e ao processo eleitoral, quando a sistema eleitoral estava sob ataque do ex-presidente Jair Bolsonaro.

A presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito da USP, Mariana Belussi, afirma que, a despeito de ter passado a chamar mais atenção neste ano, parte dos símbolos começou a surgir no ano passado, em período próximo à realização de uma greve estudantil, em outubro.

O momento coincide com o início da guerra entre Israel e o Hamas, após ataque feito pelo grupo terrorista no dia 7 de outubro. Ela diz que o centro acadêmico levou à direção da Faculdade a preocupação com a questão. “Tem parcela significativa da faculdade que pertence à comunidade judaica e ficamos preocupados”, afirma.

“Depois que vieram as cotas, vimos grupos de extrema direita começarem a atuar na faculdade. Durante a greve, vimos pessoas que se manifestaram pregando o ódio aos que estavam fazendo a greve”, afirma a estudante. Segundo ela, esses discursos de ódio não foram publicamente verbalizados, mas apareceram por meio de perfis anônimos na rede social X (antigo Twitter). Também no ano passado, cartazes com imagens impressas de um desses perfis de redes sociais foram colados no banheiro da faculdade.

Em uma das publicações, um usuário anônimo dizia que as faculdades públicas de elite no Brasil haviam se tornado uma “ocupação baixo-clero”.

A Sanfran, como é informalmente chamada, é berço acadêmico e político de diversas personalidades brasileiras -- e de 13 ex-presidentes da República. Na época de sua fundação, no século 19, a Faculdade de Direito da USP recebia os filhos da elite brasileira enviados de todas as regiões a São Paulo para se formarem advogados.

No início dos anos 2000, levantamentos da própria USP mostravam que a faculdade seguia sendo local de formar filhos da elite brasileira: o curso de Direito era aquele que, dentro de toda USP, tinha mais aprovados vindo de famílias com renda superior maior.

Inscrição de apologia ao nazismo em parede interna de elevador da Faculdade de Direito da USP, registrada em agosto de 2024. Foto: Beatriz Bulla/Estadão

A adoção da política de cotas na USP se deu em 2017 e a primeira turma de alunos cotistas da São Francisco se formou em 2023.

Além das cotas, a vice-diretora diz que o processo seletivo nacional, por meio do Enem, colabora para que a faculdade tenha mais diversidade. “Isso dá uma cara muito diferente à faculdade, que está mais colorida, tem essa mistura de alunos. Tenho alunos dessa elite socioeconômica de São Paulo e também aluno filho de pessoa em situação de rua. Isso muda a própria forma de convivência, a agenda de pesquisa da faculdade, enriquece o debate, mas coloca a sociedade para conversar”, afirma.

Procurada por meio da assessoria de imprensa, a reitoria da USP afirmou que caberia à diretoria da Faculdade de Direito se manifestar.

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