Com pouco destaque em um relatório de 200 páginas sobre tecnologia, a Unesco evidenciou na semana passada o que pode ser um impacto amedrontador da inteligência artificial na educação. Por dar respostas rápidas em um tempo em que rapidez é entendida como sinônimo de eficiência, ferramentas como Chat GPT podem retirar do estudante um dos grandes propósitos pelo qual vamos à escola ou à universidade: aprender a pensar.
Pode parecer catastrófico demais para algo ainda sem muitas evidências, mas a Unesco dá o tom em seu relatório: “essas ferramentas poderiam exercer um impacto negativo na motivação do estudante de conduzir pesquisas independentes e achar soluções”.
E não é só porque as soluções encontradas pelo Chat GPT podem ser piores, ter vieses, indicar informação não checada e de fontes não confiáveis, é porque o mais importante é o processo. A IA em breve vai dar respostas perfeitas. Mas na educação, diferentemente do que muita gente pode pensar, o que vale não é nota 10. E, sim, a construção do conhecimento.
Ela acontece durante as etapas de aprendizagem, como na preparação para se escrever um trabalho escolar. O cérebro coleta informações, relaciona umas com as outras, questiona, analisa, tira conclusões. E depois, ao tentar expressar suas próprias ideias em um texto, vem um outro exercício cerebral, com organização do pensamento, priorização, experimentação, acionamento da memória.
Todos esses processos fazem o estudante não só aprender o que está sendo proposto na escola, mas também a lidar com outras tarefas do dia a dia, a se relacionar com as pessoas, planejar, tomar decisões simples ou importantes. Pesquisas já mostraram até que a leitura de um romance ajuda o cérebro a desenvolver empatia, já que o leitor se coloca no lugar do personagem.
Mas tudo isso passa batido quando o Chat GPT faz todo o trabalho de um universitário, como relataram anonimamente vários estudantes ao podcast The Daily, do The New York Times, no mês passado. Um deles conta que mostrou à ferramenta um parágrafo escrito por ele mesmo e pediu que o robô fizesse um outro texto, sobre outro assunto, com o seu estilo. Deu certo e ele recebeu nota máxima.
A IA na educação também pode, claro, identificar melhor as dificuldades de cada estudante e tornar o ensino mais personalizado. Ou fornecer em segundos informações que levariam muito tempo para serem encontradas, corrigir provas para os professores e liberá-los para trabalhos mais interessantes com os alunos.
O que não se sabe é se a inteligência artificial é o ponto de virada, ou seja, a grande revolução prometida há anos desde que a tecnologia começou a entrar na sala de aula. Quando surgiram as calculadoras eletrônicas, na década de 1970, acreditou-se que ninguém mais aprenderia a fazer contas. Ainda se começa ensinar Matemática sem elas para as crianças, mas os equipamentos já fazem parte do material escolar em algumas idades.
Difícil para Unesco ou qualquer um hoje prever os limites da inteligência artificial. O relatório mundial, no entanto, faz questão de frisar o que parece óbvio: os alunos precisam aprender com e sem tecnologia na escola. E nós, que não somos robôs, podemos ter sempre um olhar atento para que a IA não arruine o processo mais brilhante da mente humana: a aprendizagem.