Fazer de fato uma educação antirracista ainda é um desafio sem tamanho para escolas públicas e particulares do País. É preciso respeitar a lei e ter no currículo a história e a cultura afro-brasileiras, ler mais autores negros e negras, aprender a lidar pedagogicamente com racismo em conflitos rotineiros da sala de aula. Mas não há manual antirracista que não fale da importância do exemplo.
Em especial em escolas particulares de elite, o exemplo de professores, coordenadores, diretores negros ou negras mostra para crianças de todas as raças que os lugares de liderança e respeito são de todos. Mas, claro, isso anda muito mais devagar do que gostaríamos.
Com graça, saltos perfeitos e dedicação, a ginasta de ouro Rebeca Andrade é uma aula a jato de educação antirracista. Mulher, negra, periférica, vencedora, digna de um orgulho e um respeito que não cabem em nossos corações. E nos corações dos pequenos brasileiros e brasileiras que vão fazer a nossa sociedade no futuro.
Para as crianças, ver Rebeca se tornar a atleta com mais medalhas olímpicas do Brasil de todos os tempos - reverenciada em um pódio com outras duas medalhistas negras - ensina muito.
Ensina que não só os brancos chegam lá com esforço - ou muitas vezes, sem. Ela e as outras tantas mulheres que estão fazendo história nessas olimpíadas pelo Brasil, como Bia Souza, Rayssa Leal, as mulheres do futebol, ensinam sobre gênero também.
Isso em um País em que as meninas pretas e pardas são as que mais abandonam as escolas, por causa da gravidez na adolescência ou por terem que ajudar em tarefas domésticas. São elas também que pior se saem no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), mesmo em comparação com meninos pretos.
Dados de provas do 9º ano mostram que as meninas negras, mesmo entre as que têm nível sócio econômico alto, tiram notas parecidas a dos meninos também negros, mas pobres. Em relação aos meninos brancos ricos então, a diferença chega a dois anos de escolaridade.
As alunas - brancas ou pretas - historicamente também têm resultado inferior nas provas do Pisa, o exame mundial de estudantes, em Matemática.
Tudo isso resultado de uma cultura machista e racista, estruturada por séculos de escravidão e desigualdade. Numa sociedade em que professores não acreditam nelas, pais não incentivam desde as brincadeiras mais simples da primeira infância e que se insiste em olhar para seu cabelo, sua pele, sua cor.
As medalhas não falam só de esporte. Falam de orgulho, de igualdade. Meninas de todo o País estão desejando ser ginastas, judocas ou skatistas (as duas últimas modalidades também tão associadas aos homens), mas é mais que isso.
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As crianças e adolescentes estão brilhando seus olhos ao admirar uma mulher negra. Estamos todos, mulheres e homens do País, de todas as raças. Tem maior educação antirracista que essa?
A escola ainda caminha a passos lentos para banir o racismo estrutural de currículos e atitudes diárias, mas com certeza as Olimpíadas de Paris ajudam a encurtar caminhos. Obrigada, Rebeca, a educação também te agradece.