Em uma manhã de meados de 2013, Octavian Mihai adentrou num quarto com luz suave, mobiliado com uma pequena estátua de Buda, uma caixa de lenços e uma rosa vermelha. Usando um cálice de cerâmica, ele engoliu uma cápsula de psilocibina, ingrediente encontrado em cogumelos alucinógenos.
Depois, botou uma máscara sobre os olhos, fones de ouvido e se deitou em um sofá. Em pouco tempo, imagens voagem como estrelas cadentes: um mundo em espiral que parecia um tabuleiro de xadrez azul e verde, ele em uma maca diante de um hospital, seus pais, olhando para ele com tristeza dolorosa enquanto Mihai tentava tocá-los, cheio de amor infantil.
A psilocibina é ilegal nos Estados Unidos há mais de 40 anos, mas Mihai, que acabou de terminar o tratamento para linfoma de Hodgkin no terceiro estágio, estava participando de um estudo que buscava determinar se a droga pode reduzir a ansiedade e a depressão em pacientes com câncer. Durante a sessão de oito horas, um psiquiatra e um assistente social do Centro Médico Langone da Universidade de Nova York permaneceram ao seu lado.
Os resultados desse estudo, e de uma análise clínica similar, controlada e pequena, foram impressionantes. Cerca de 80 por cento dos pacientes com câncer mostraram clinicamente reduções significativas nos dois distúrbios psicológicos, reação sustentada por sete meses após a dose única. Os efeitos colaterais foram mínimos.
Nas duas análises, a intensidade da experiência mística descrita pelos pacientes estava ligada ao grau com que a depressão e a ansiedade reduziram.
Os estudos, feitos por pesquisadores da Universidade de Nova York, com 29 pacientes, e da Universidade Johns Hopkins, com 51, foram divulgados ao mesmo tempo na publicação "The Journal of Psychopharmacology". Eles prosseguiram após uma análise árdua dos órgãos reguladores e são os maiores e mais meticulosos entre alguns estudos que exploram o possível benefício terapêutico da psilocibina.
O Dr. Jeffrey Lieberman, ex-presidente da Associação Psiquiátrica Americana, e o Dr. Daniel Shalev, do Instituto Psiquiátrico do Estado de Nova York, entre os principais nomes da psiquiatria, medicina da dependência e cuidados paliativos, aprovaram o trabalho. Segundo eles, os estudos são "um modelo para rever compostos químicos criminalizados de uma forma ética e segura".
Ainda de acordo com eles, se as restrições à pesquisa fossem aliviadas, "existiria grande potencial para novas descobertas científicas e aplicações clínicas".
Embora os pacientes com câncer não tenham acesso em breve à psilocibina administrada terapeuticamente, as descobertas dão força às aplicações para ampliar a pesquisa para vários centros com centenas de participantes.
Alguns profissionais médicos não querem saber desses estudos. O Dr. William Breitbart, diretor do departamento de Psiquiatria do Centro de Câncer do Memorial Sloan-Kettering, questionou o uso de pacientes com câncer. "A maconha medicinal deu seu passo inicial afirmando que os 'pacientes com câncer estão sofrendo, estão perto da morte, então, por compaixão, vamos torná-la disponível'. E assim você é capaz de estender essa droga a outros propósitos."
Testes com psilocibina estão em andamento nos Estados Unidos e na Europa para alcoolismo, vício em tabaco e depressão resistente à depressão. Outros alucinógenos também estão sendo estudados em busca de aplicação clínica. Nesta semana, a FDA, agência norte-americana reguladora de alimentos e medicamentos, aprovou um estudo em larga escala do MDMA, a droga ilegal mais conhecida com ecstasy, para transtorno de estresse pós-traumático.
A angústia psicológica ligada ao câncer, que aflige até 40 por cento dos pacientes, pode ser resistente à terapia convencional. A ansiedade de Mihai começou quando os médicos finalmente lhe contaram que estava em remissão.
Ele ficava tocando os nódulos do pescoço, onde o câncer se anunciara. Mihai voou para a Europa para comemorar o fim do tratamento e a formatura na faculdade, mas voltou abruptamente a Nova York, apavorado por estar longe dos oncologistas. Ele começou a beber diariamente, com intensidade, pondo em risco sua saúde frágil.
Alarmados, os médicos sugeriram o estudo com psilocibina.
Ele ingeriu a cápsula e começou a viajar. Depois de ver a si mesmo em uma maca de hospital, Mihai disse ter tido uma epifania.
"Por que está se deixando apavorar pelo fato de o câncer ter voltado? É burrice. Você tem força para se livrar do medo", ele disse para si mesmo. "Foi nessa hora que vi fumaça preta saindo do meu corpo. E foi sensacional."
Três anos depois, Mihai, agora com 25 anos e médico assistente em Las Vegas, declarou não estar mais ansioso com o câncer nem com a morte. A sessão "tornou minha vida mais rica".
Nas décadas de 1940 e 50, os alucinógenos foram estudados em centenas de pesquisas. Nos anos 1970, porém, quando foram colocados na categoria regulatória mais restrita, o campo de pesquisa quase acabou.
Desde 2000, pesquisadores começaram a estudá-los, principalmente com financiamento privado. Os dois estudos antes citados se basearam num projeto piloto com psilocibina de 2011, da Universidade da Califórnia, campus de Los Angeles, envolvendo 12 pacientes com câncer.
Ambos têm semelhanças. Todos os voluntários tinham diagnóstico de ansiedade ligada ao câncer ou depressão. Os pacientes receberam aleatoriamente um placebo ou psilocibina sintética, sem saberem qual era. Em sete semanas, receberam a outra amostra.
Todos os pacientes foram instruídos a respeito da droga, monitorados por duas pessoas durante as sessões com placebo e psilocibina, além de avaliados posteriormente.
Os pesquisadores criaram listas musicais com sete horas de duração, adequadas aos ritmos antecipados da reação da droga. A Universidade de Nova York preferiu os estilos new age e "world music" – Brian Eno, cítara indiana, didjeridu. A Johns Hopkins foi com clássicos ocidentais.
Na Universidade de Nova York, psicoterapeutas tentaram assentar a sessão na memória dos pacientes pedindo que escrevessem as visões em um diário e discutissem a experiência em reuniões. O estudo da Johns Hopkins, chefiado por Roland R. Griffiths, psicofarmacologista, contava com motivos que incentivavam os participantes a "confiar, deixar para lá e se abrir".
Os pesquisadores da Universidade de Nova York avaliaram os pacientes no dia seguinte e constataram que os efeitos eram imediatos na maioria deles.
O Dr. Stephen Ross, principal pesquisador e chefe de psiquiatria da dependência da Universidade de Nova York, assinalou que os antidepressivos, em contrapartida, podem demorar semanas para mostrar benefícios.
"Pacientes com câncer ansiosos e deprimidos precisam de ajuda imediata, principalmente se levarmos em consideração que correm um risco elevado de tentar o suicídio", ele afirma.
Os pesquisadores não sabem por que a psilocibina funcionou nessas condições. Exames de neuroimagem com voluntários saudáveis mostram áreas do cérebro se iluminando ou descansando durante a dose. Os alucinógenos ativam um receptor de serotonina que pode levar a alterações de consciência relatadas rotineiramente.
Uma teoria é a de que a psilocibina interrompe o circuito de pensamento egoísta que é tão pronunciado em pessoas deprimidas, abrindo caminho para uma experiência mística de unidade altruísta.
Os estudos receberam financiamento do Instituto de Pesquisa Heffter, uma aliança de cientistas interessados no estudo médico de alucinógenos. O Dr. George Greer, um dos fundadores da entidade, não vê futuro comercial da psilocibina, ainda que um dia ela seja aprovada para uso terapêutico, porque esses pacientes precisaram de somente uma dose.
Pelo contrário, ele prevê um fabricante sem fins lucrativos, com distribuição restrita a clínicas especializadas.
Os pesquisadores foram enfáticos quanto ao fato de que esses resultados não deveriam ser interpretados como uma aprovação ao autotratamento com cogumelos alucinógenos. Griffiths observou que os pacientes recebiam amplo apoio, o que pode ter aprofundado e garantido as transformações de afirmação da vida.
"As pessoas tomam psilocibina em uma rave ou no Burning Man" – o festival de arte e espetáculos no deserto – "mas o efeito evapora como água escorrendo por suas mãos".