Biologicamente, o amor desenvolve no ser humano os hormônios de noradrenalina, dopamina, endorfina e oxitocina, que causam euforia, felicidade, aceleração no batimento cardíaco e prazer. Entretanto, é possível que o amor gere sensações negativas e dependência psicológica - é aí que ele vira doença.
O amor patológico, como é chamado pelos psiquiatras e psicólogos, causa sintomas de necessidade e abstinência, ansiedade e até depressão."A pessoa costuma deixar suas atividades, cuidados com ela mesma, com o trabalho, e fica pensando somente no parceiro. É como se ela largasse tudo para cuidar excessivamente do parceiro, de uma forma exagerada. É mais comum com mulheres, mas acontece com homens também", explica Andrea Lorena, psicóloga coordenadora do ambulatório de amor e ciúme patológico do Ambulatório Integrado dos Transtornos do Impulso (Pro-Amiti) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
Esse tipo de amor é mais comum do que se imagina e, por isso, foi criado o Mulheres Que Amam Demais Anônimas (Mada), um grupo que atua em diversas cidades do País, onde mulheres que sofrem de amor patológico têm espaço para desabafar e se recuperar. Nestes grupos, ignora-se a classe social, idade, profissão, religião ou nível educacional: todas se unem pelo objetivo de se livrar de um sentimento destrutivo que as impedem de levar uma vida feliz e normal.
"Eu ligava milhares de vezes, tinha ciúme excessivo, queria ficar o tempo todo com o parceiro. Só ficava em paz ao vê-lo no mesmo ambiente que eu, mesmo que ele nem estivesse falando comigo", diz uma mulher em uma das reuniões do grupo, que tem dinâmica semelhante ao Alcoólicos Anônimos. Os relatos das Madas, como elas se intitulam, se repete. "É como se eu não conseguisse respirar longe dele", diz outra mulher.
O sentimento destrutivo se manifesta tanto em mulheres que namoram há poucos anos como naquelas que são casadas há décadas. Muitas vezes, a mulher já se separou do parceiro, mas sofre mais do que o normal para superar a perda. Quando a mulher consegue se livrar do parceiro e passa a tratar a patologia, ela é intitulada uma Mada em recuperação. Na reunião, porém, isso não faz diferença: o lema de todas é conseguir, 'só por hoje', se livrar do amor que faz mal - cada ligação não feita, mensagem não enviada ou atividade independente do parceiro é comemorada.
Lorena explica que uma pessoa que ama demais fica fixada no parceiro e pensa que, sem ele, não será feliz com mais ninguém. "A pessoa que sofre com o amor patológico apresenta sintomas de abstinência quando o parceiro vai embora ou ameaça ir embora fisicamente, e nem precisa ser em caso de término, pode ser um simples caso de viagem. Ela sente insônia, come demais ou perde completamente o apetite, os batimentos cardíacos ficam acelerados, ela pode sentir dor muscular", explica a psicóloga.
O Hospital das Clínicas tem um núcleo referência para tratar pessoas que sofrem com o amor patológico, com tratamento psicoterápica em grupo que dura cerca de quatro meses. "Nas sessões, a pessoa vai trabalhar essa questão do vínculo, da autoestima, o resgate da confiança e das atividades dela. É comum essas pessoas perderem os amigos, então vamos tentar resgatar essas amizades. Muitas vezes, é só depois de dois, três meses de tratamento que nós descobrimos que a paciente tem filhos, porque ela esquece até disso e só fala do parceiro. Nós fazemos todo esse resgate na terapia. Não existe nenhum tratamento farmacológico, a não ser que haja alguma depressão ou ansiedade associada - neste caso, o psiquiatra vai receitar um medicamento", detalha Lorena. Cerca de 80% dos pacientes se cura após o fim do tratamento, que é gratuito.
As pessoas que querem descobrir se sentem amor patológico devem acessar o site do Pro-Amiti e responder a cinco pergunta, como "você gasta muito tempo para controlar as atividades do parceiro?" e "você costuma sentir angústia, taquicardia ou suor quando seu parceiro se distancia?". No site do Mada, são listadas 14 características de uma mulher que ama demais.