Antes de engravidar, a analista de FP&A Debora Watanabe, gostava muito de comer mais alimentos salgados do que doces. “Entre um brigadeiro e uma coxinha, eu sempre escolhia o salgado”, relembra. Grávida de um menino, com 34 semanas, ela diz que antes de ter um bebê nunca pensou em fazer dieta ou controlar níveis de açúcar na alimentação. Mas foi na foi na 24ª semana, no exame da curva glicêmica, que Debora foi diagnosticada com diabetes gestacional.
“Na hora eu fiquei bem assustada, porque eu tive de controlar a ingestão de açúcar, eu fiquei preocupada principalmente com o que poderia causar no meu filho. Até então, eu estava aproveitando essa fase. Eu comia doces, tentava controlar a dieta, mas não me pressionava tanto. Eu evitava alimentos mais industrializados, como coca-cola, pra não prejudicar o bebê, mas começou a me dar muita vontade de comer açúcar e quando eu recebi esse diagnóstico eu fiquei bem preocupada e bem culpada achando que eu tinha me descuidado e causado isso”, relembra ela.
Débora faz parte dos 18% das gestantes que chegam a desenvolver diabetes gestacional, segundo dados do Sistema Único de Saúde (SUS). A cada dez mulheres, duas desenvolvem a doença. É a complicação mais comum que se tem numa gravidez. A doença acontece quando há alteração de glicemia na gestante. Segundo a médica obstetra Victória Gontijo, da Clínica Theia, em virtude do estado de alteração física do organismo, a gravidez predispõe a mulher ao diabetes gestacional. “Quando a gente engravida o nosso corpo quer que sobre açúcar para o bebê, pra alimentar essa criança. Então quando nos alimentamos de glicose, carboidratos e doces, ficamos com açúcar no sangue e precisamos que ele entre nas células para virar energia. O pâncreas vai produzir insulina, que é o hormônio que consegue colocar o açúcar pra dentro das células e transformá-lo em energia”.
A médica continua explicando como funciona no corpo de uma mulher grávida esse processo. “Quando estamos gestantes, a gente desenvolve uma resistência a essa insulina, exatamente pra não colocar toda glicose pra dentro das células e sobrar para o bebê. Isso causa a resistência. Quem tem tendência a ter diabetes, geralmente tem pais que já tiveram a doença ou são pacientes com obesidade, mais velhas, quem ganha muito peso durante a gestação. Fatores de risco associados também contribuem para o desenvolvimento de diabetes se há uma resistência a insulina”, ensina.
O diabetes gestacional é uma doença quase assintomática. Seus sintomas se assemelham aos indícios de gravidez, por isso é difícil detectar a doença. A melhor forma de descobrir a complicação é fazendo o rastreamento através dos exames de pré-natal. “Diabetes em si geralmente é uma doença que para dar sintomas tem de estar bastante descontrolada, aí ela vai dar muita fome, muita sede, muita vontade de urinar, mas isso é algo que geralmente as gestantes já sentem, então não é uma forma de ajudar no diagnóstico. Por isso é tão importante realizar exames de rastreamento na rotina da mulher”, alerta Victoria.
Como tratar o diabetes gestacional?
“No momento que a gente tem esse diagnóstico, a primeira coisa que precisa trabalhar é o hábito alimentar. Mudança de estilo de vida. Então vamos precisar de todos os cuidados nutricionais, iniciar as medições, porque é necessário ter um panorama geral de como tem sido as medidas (de glicose) ao longo do dia. É o que mais vai ter influência na glicemia”, relata a nutricionista da Clinica Theia, Laís Hess, que explica, antes de qualquer medicamento ser ministrado, é importante observar a estrutura de cada paciente. O atendimento deve ser personalizado, pois cada uma tem uma particularidade. Entretanto, adequações na dieta e atividades físicas são os primeiros tratamentos comportamentais a serem recomendados.
“ Quando uma gestante tem diagnóstico de diabetes gestacional, é importante explicar que ela vai ter uma alimentação saudável e que ela não irá fazer restrição de carboidratos. Muitas delas pensam isso e não é assim, elas precisam consumir esse tipo de alimento, mas a gente vai ajustar a qualidade. A alimentação dela terá de tudo. Proteína, gordura, só vamos trabalhar em fazer os ajustes gerais. O que vamos evitar? Alimentos refinados, açúcar, farinha branca, pães brancos, arroz branco, alimentos que sejam feitos com esses ingredientes. Vamos substituir, por exemplo, por tubérculos, cereais integrais, pão integral, alimentos com aveia, quinoa. O que acontece é uma troca por carboidratos complexos”, ensina Laís.
Esses foram alguns dos ajustes que Debora fez em sua alimentação, que não beneficiou somente sua gravidez, mas também a saúde de seu marido. A analista explica que seu pai é portador de diabetes, o que confirma uma das possibilidades de desenvolvimento da doença por fatores genéticos. Com o apoio de psicólogos e da família, ela começou uma mudança radical em sua alimentação. “Meus pais ajudam meu marido e eu com algumas marmitas na semana e começaram a preparar arroz integral, legumes, carnes. No mercado nós começamos a comprar mais frutas, coisas que a gente não tinha o hábito de comer ou consumia poucas vezes. Nós fizemos um caderninho com todas as coisas que comemos. O bebê está bem, a diabetes não afetou ele, está com um bom percentil de crescimento”, Débora ressalta que o apoio da nutricionista em seu pré-natal está sendo fundamental nas combinações ela deve fazer e no caso de específico, a cortar rigorosamente doces.
“Logo nos primeiros dias, quando eu cortei o açúcar, senti muito sono, muita irritação, foi bem estranho”, relembra a analista. Passada a adaptação, ela diz que conseguiu se adequar com a ausência de doces na alimentação e até o açúcar natural de alguns alimentos seu paladar já se acostumou a sentir.
Tratar a diabetes gestacional além de evitar que a mãe tenha pré-eclâmpsia, evita também o risco da gestante expor o bebê a doenças genéticas, parto prematuro e a macrossomia fetal, que é uma complicação caracterizada pela criança nascer grande demais em virtude do excesso de açúcar que a mãe transferiu para ele na gestação, geralmente bebês com essa complexidade nascem pesando acima de 4 quilos. É um fator de risco para o recém-nascido, pois pode causar alguns problemas como distocia de ombro, trauma durante o parto, imaturidade respiratória, risco da criança ir para uma unidade de terapia intensiva (UTI), entre outras complicações.
Dieta e atividade física são as primeiras medidas a serem adotadas. Caso o quadro necessite de mais atenção, a gestante precisará utilizar a medicação. A mais prescrita é a insulina, ministrada de forma subcutânea. A própria grávida pode fazer. O controle da diabetes gestacional é muito importante. Somente com ele é possível mapear os níveis de glicemia e indicar as melhores recomendações e tratamentos.
“Realizar mudança de vida, prática de atividade física e controlar ganho de peso. Não é que não vai ganhar peso, mas esse ganho de peso precisa ser adequado. Toda a parte do metabolismo da mulher altera muito. Se tem muito enjoo, vamos aliar os cuidados. Com sintomas específicos, como náuseas, eu preciso trabalhar muito bem com fracionamento de alimentos, tentar consumir num tempo melhor. Muitas mulheres tem um costume de ficar muito tempo em jejum, até pelo que é difundido, mas pra gestante não é uma estratégia que a gente pode usar”, alerta Laís.
Com os ajustes ideais e levando uma gestação tranquila, Debora espera o pequeno Gabriel, que ainda não nasceu, mas já colhe os frutos dos cuidados de sua mãe. “Você vai descobrindo como o seu organismo reage e é muito legal, ver o que funcionou pra mim foi uma descoberta muito mágica, me deixou até muito mais feliz”, finalizou ela.