Para as doenças, botox


De enxaqueca a incontinência urinária, a toxina botulínica pode ser utilizada no tratamento de diversos distúrbios

Por ANA GABRIELA VEROTTI

A toxina botulínica é largamente conhecida e utilizada em casos de tratamentos estéticos. Porém, a substância usada para amenizar rugas e linhas de expressão também está sendo incorporada ao tratamento de diversas doenças.

Produzida pela bactéria Clostridium botulinium do tipo A e conhecida por Botox - nome dado ao produto por um de seus fabricantes -, a toxina botulínica pode ser aplicada em casos de doenças dermatológicas, oftalmológicas, neurológicas, odontológicas e em muitas outras.

Ainda pouco divulgado, o método de tratamento com toxina botulínica não necessariamente promove a cura das doenças, mas ajuda a controlá-las e a diminuir a dependência de outros remédios. Apesar de ser um investimento alto, costuma valer a pena pela melhora na qualidade de vida. Com aplicações que variam de caso a caso, o recurso apresenta bons resultados e promete se tornar uma forma comum de tratamento para pacientes de todas as faixas etárias.

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Uso odontológico

Bruxismo, apertamento dos dentes, dores na articulação têmporo-mandibular, dores de cabeça de origem dentária e sorriso gengival são os casos em que a toxina botulínica pode ser aplicada na odontologia. “A toxina age bloqueando a ação das fibras musculares, interrompendo a atividade delas”, diz Rogério Zambonato, odontologista. No caso do bruxismo, há uma hiperatividade do sistema nervoso, que leva a maior atividade dos músculos da mastigação, causando o ranger dos dentes especialmente durante o sono. Ao aplicar a toxina, “diminui-se a força da musculatura, minimizando sua atividade”. O mesmo efeito é causado nos casos de apertamento dos dentes.

Zambonato comenta que muitos pacientes com crises intensas destas doenças se medicam todos os dias. “Com a toxina, abre-se uma janela de quase seis meses sem precisar de química diária”, diz.

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No caso de sorriso gengival, o odontologista compara o lábio superior a uma cortina: “por uma hiperfunção do lábio superior, a 'cortina' sobe em excesso quando a pessoa sorri. Aplicando a toxina em pontos específicos na musculatura do lábio superior, responsáveis por levantar a 'cortina', há uma exposição menor da gengiva e dos dentes”, conta.

Para ele, os preços do tratamento não são obstáculo. “Comparando com o uso de medicação por seis meses, sai num custo acessível”. Gasta-se em torno de R$ 800,00 por injeção.

Na urologia

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A toxina botulínica é indicada para a incontinência urinária de urgência, em que a pessoa tem necessidade de urinar logo após a bexiga começar a encher. “Há um medicamento oral que controla a bexiga e medidas de fisioterapia que ajudam a melhorar”, explica o urologista José Carlos Truzzi. “Se a pessoa não responde a essas condutas mais conservadoras, aí existe a indicação para a toxina botulínica”.

A aplicação, nesse caso, ocorre direto na bexiga, pela uretra, conferindo maior controle urinário entre seis e nove meses. Ela pode ser feita em adultos e crianças.

Truzzi relata que este quadro - bexiga neurogênica após trauma medular - ocorre devido a problemas como esclerose múltipla, Parkinson ou em decorrência de derrames, lesões medulares e paraplegia. O médico esclarece, porém, que a incontinência também pode ocorrer em pessoas que não apresentam nenhum comprometimento neurológico, o que caracteriza bexiga hiperativa idiopática. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou o uso da toxina para os casos neurológicos, e o médico acredita que este ano a agência também permita no uso idiopático.

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Uma vez aprovado pela Anvisa, o método pode utilizado na rede pública, e embora não esteja listado como procedimento específico no rol do Sistema Único de Saúde (SUS), “se o urologista tem o equipamento necessário e sabe fazer a aplicação, ele teoricamente pode fazer”, comenta Truzzi. Na rede particular, o valor, “apesar de não ser exorbitante, acaba sendo limitante em qualquer cenário”.

Mesmo assim, o médico considera o investimento válido. “Não é uma doença grave como um mal funcionamento renal, mas compromete muito a qualidade de vida. Tem paciente que deixa de sair de casa porque molha roupa, cadeira. Não é normal e realmente precisa buscar tratamento”, diz.

Para os olhos

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A toxina pode ser aplicada em alguns casos de estrabismo e tiques - o blefaroespasmo idiopático. “No estrabismo, só se houver baixa angulação e a história da doença não for longa”, explica o oftalmologista Virgílio Centurion, diretor clínico do Instituto de Moléstias Oculares (IMO). O procedimento também é possível após cirurgias de estrabismo em que sobrou um pequeno ângulo da doença e quando o paciente não pode tomar anestesia geral para realizar a cirurgia.

No caso do estrabismo, “quando o olho está virado em direção ao nariz, pode significar que o músculo responsável por este movimento está hiperfuncionante. Com uma dose mínima de toxina aplicada nesse músculo, ele funciona menos ou para de funcionar, e os olhos ficam paralelos”, diz.

O oftalmologista salienta que as primeiras doses devem ser pequenas para provocar o mínimo possível de efeitos colaterais. “Às vezes não se consegue o efeito desejado na primeira aplicação, mas o que não se pode é provocar uma paralisia mais intensa”, ele adiciona, explicando que os efeitos colaterais são praticamente inexistentes pois a aplicação é muito bem controlada.

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A ação de cada aplicação dura de quatro a seis meses, “mais ou menos o mesmo tempo de quando se utiliza a toxina com finalidade estética, então deve haver certa periodicidade”. Ele não vê o preço da aplicação como obstáculo: “o mercado se autorregula, e a toxina é relativamente acessível”.

Tratamento neurológico

Outro uso da toxina botulínica está no tratamento de doenças como paralisia cerebral e traumatismo craniano. No entanto, Cicero Vaz, fisiatra do Hospital Israelita Albert Einstein, avisa: “a toxina não estimula a melhoria do movimento diretamente, mas paralisa os músculos que a atrapalham”.

A toxina é indicada em caso de hipertonia, quando a musculatura fica com tônus exagerado, rígido. “Músculo tenso dói e atrapalha o movimento de músculos que estão mexendo normalmente”, explica o médico, que exalta ser importante definir quais músculos serão submetidos ao tratamento da toxina: “alguns músculos ajudam justamente por estarem tensos, então tem que saber escolher”.

Vaz comenta que esse procedimento é bastante utilizado em locais onde há centros de reabilitação, e que é disponibilizado pelo SUS. O problema é que há poucos centros de reabilitação públicos e médicos habilitados a fazer essa aplicação. Quanto aos custos na rede privada, considerados altos pelo fisiatra, “a tendência é que o preço diminua, ainda mais com a concorrência de fabricantes. Mas eu também aposto na abertura de novos centros de reabilitação”. Ele conta que nos centros públicos, os pacientes podem ter de esperar de seis a nove meses para começar o tratamento.

Ele esclarece que a contraindicações “são mais relativas do que absolutas. Reconhecidamente, só se a pessoa tiver alergia à toxina ou a algum componente dela”. Entre as relativas, figuram infecções no local onde a toxina seria aplicada e doenças sanguíneas que causam hemorragia.

O doutor enfatiza que apenas a aplicação da toxina botulínica não promove a recuperação. “É quase antiético aplicar só a toxina. O paciente deve estar em um contexto de readaptação, tendo como base de tratamento exercícios de reabilitação. A toxina é um recurso a mais”, finaliza.

Problemas dermatológicos 

De excesso de sudorese a neuralgia pós-herpética - decorrente de herpes zoster -, há muitas doenças dermatológicas em que a toxina pode ser aplicada. “O excesso de sudorese em si é muito incapacitante. A pessoa sua muito, o que causa muito incômodo socialmente”, comenta a dermatologista Natalia Cymrot. Além da aplicação da toxina, pode-se tratar o problema comcirurgia de secção de nervos ou com cremes e aparelhos que inibem sudorese.

A médica ressalta que na grande maioria das vezes não há efeitos colaterais. A toxina começa a agir a partir do quinto dia após a aplicação, e dura uma média de nove a dez meses. Para excesso de sudorese, Natalia calcula que seriam aplicadas de 100 a 200 unidades da toxina, a um preço entre R$ 1,5 mil a R$ 2 mil. “É uma técnica cara, mas muda a qualidade de vida”, defende.

A toxina pode ser utilizada em caso de disidrose, quando se formam bolhas. “O importante é pesquisar a causa da doença, que pode ser alergia a medicamento, reação à micose ou a contato com substância alergênica”, explica. O efeito dura entre sete e oito meses. A toxina também faz com que o hidrocistoma, um tumor benigno da pele, suma, e há casos de melhoras de lesões de psoríase.

Enxaqueca

A dermatologista Natalia Cymrot menciona que alguns casos de enxaqueca podem ser resolvidos com a aplicação da toxina. O excesso de tensão em músculos da face, da mastigação, do couro cabeludo e da nuca pode causar enxaqueca, e a aplicação da toxina pode diminuir o número de crises de dor e a intensidade delas.

A toxina também pode ser utilizada para distonias “desde a pessoa que fica piscando, virando a cabeça, como um tique, até distonias na laringe, por exemplo”, comenta o otorrinolaringologista Lucas Gomes Patrocínio.

Natalia garante que o método é seguro: “o maior efeito colateral é a aplicação em músculos que você não quer atingir”. A médica acredita que o tratamento será bastante utilizado no futuro.

Ainda tem dúvidas sobre o tratamento com toxina botulínica?

Escreva para: especialistaresponde@estadao.com

A toxina botulínica é largamente conhecida e utilizada em casos de tratamentos estéticos. Porém, a substância usada para amenizar rugas e linhas de expressão também está sendo incorporada ao tratamento de diversas doenças.

Produzida pela bactéria Clostridium botulinium do tipo A e conhecida por Botox - nome dado ao produto por um de seus fabricantes -, a toxina botulínica pode ser aplicada em casos de doenças dermatológicas, oftalmológicas, neurológicas, odontológicas e em muitas outras.

Ainda pouco divulgado, o método de tratamento com toxina botulínica não necessariamente promove a cura das doenças, mas ajuda a controlá-las e a diminuir a dependência de outros remédios. Apesar de ser um investimento alto, costuma valer a pena pela melhora na qualidade de vida. Com aplicações que variam de caso a caso, o recurso apresenta bons resultados e promete se tornar uma forma comum de tratamento para pacientes de todas as faixas etárias.

Uso odontológico

Bruxismo, apertamento dos dentes, dores na articulação têmporo-mandibular, dores de cabeça de origem dentária e sorriso gengival são os casos em que a toxina botulínica pode ser aplicada na odontologia. “A toxina age bloqueando a ação das fibras musculares, interrompendo a atividade delas”, diz Rogério Zambonato, odontologista. No caso do bruxismo, há uma hiperatividade do sistema nervoso, que leva a maior atividade dos músculos da mastigação, causando o ranger dos dentes especialmente durante o sono. Ao aplicar a toxina, “diminui-se a força da musculatura, minimizando sua atividade”. O mesmo efeito é causado nos casos de apertamento dos dentes.

Zambonato comenta que muitos pacientes com crises intensas destas doenças se medicam todos os dias. “Com a toxina, abre-se uma janela de quase seis meses sem precisar de química diária”, diz.

No caso de sorriso gengival, o odontologista compara o lábio superior a uma cortina: “por uma hiperfunção do lábio superior, a 'cortina' sobe em excesso quando a pessoa sorri. Aplicando a toxina em pontos específicos na musculatura do lábio superior, responsáveis por levantar a 'cortina', há uma exposição menor da gengiva e dos dentes”, conta.

Para ele, os preços do tratamento não são obstáculo. “Comparando com o uso de medicação por seis meses, sai num custo acessível”. Gasta-se em torno de R$ 800,00 por injeção.

Na urologia

A toxina botulínica é indicada para a incontinência urinária de urgência, em que a pessoa tem necessidade de urinar logo após a bexiga começar a encher. “Há um medicamento oral que controla a bexiga e medidas de fisioterapia que ajudam a melhorar”, explica o urologista José Carlos Truzzi. “Se a pessoa não responde a essas condutas mais conservadoras, aí existe a indicação para a toxina botulínica”.

A aplicação, nesse caso, ocorre direto na bexiga, pela uretra, conferindo maior controle urinário entre seis e nove meses. Ela pode ser feita em adultos e crianças.

Truzzi relata que este quadro - bexiga neurogênica após trauma medular - ocorre devido a problemas como esclerose múltipla, Parkinson ou em decorrência de derrames, lesões medulares e paraplegia. O médico esclarece, porém, que a incontinência também pode ocorrer em pessoas que não apresentam nenhum comprometimento neurológico, o que caracteriza bexiga hiperativa idiopática. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou o uso da toxina para os casos neurológicos, e o médico acredita que este ano a agência também permita no uso idiopático.

Uma vez aprovado pela Anvisa, o método pode utilizado na rede pública, e embora não esteja listado como procedimento específico no rol do Sistema Único de Saúde (SUS), “se o urologista tem o equipamento necessário e sabe fazer a aplicação, ele teoricamente pode fazer”, comenta Truzzi. Na rede particular, o valor, “apesar de não ser exorbitante, acaba sendo limitante em qualquer cenário”.

Mesmo assim, o médico considera o investimento válido. “Não é uma doença grave como um mal funcionamento renal, mas compromete muito a qualidade de vida. Tem paciente que deixa de sair de casa porque molha roupa, cadeira. Não é normal e realmente precisa buscar tratamento”, diz.

Para os olhos

A toxina pode ser aplicada em alguns casos de estrabismo e tiques - o blefaroespasmo idiopático. “No estrabismo, só se houver baixa angulação e a história da doença não for longa”, explica o oftalmologista Virgílio Centurion, diretor clínico do Instituto de Moléstias Oculares (IMO). O procedimento também é possível após cirurgias de estrabismo em que sobrou um pequeno ângulo da doença e quando o paciente não pode tomar anestesia geral para realizar a cirurgia.

No caso do estrabismo, “quando o olho está virado em direção ao nariz, pode significar que o músculo responsável por este movimento está hiperfuncionante. Com uma dose mínima de toxina aplicada nesse músculo, ele funciona menos ou para de funcionar, e os olhos ficam paralelos”, diz.

O oftalmologista salienta que as primeiras doses devem ser pequenas para provocar o mínimo possível de efeitos colaterais. “Às vezes não se consegue o efeito desejado na primeira aplicação, mas o que não se pode é provocar uma paralisia mais intensa”, ele adiciona, explicando que os efeitos colaterais são praticamente inexistentes pois a aplicação é muito bem controlada.

A ação de cada aplicação dura de quatro a seis meses, “mais ou menos o mesmo tempo de quando se utiliza a toxina com finalidade estética, então deve haver certa periodicidade”. Ele não vê o preço da aplicação como obstáculo: “o mercado se autorregula, e a toxina é relativamente acessível”.

Tratamento neurológico

Outro uso da toxina botulínica está no tratamento de doenças como paralisia cerebral e traumatismo craniano. No entanto, Cicero Vaz, fisiatra do Hospital Israelita Albert Einstein, avisa: “a toxina não estimula a melhoria do movimento diretamente, mas paralisa os músculos que a atrapalham”.

A toxina é indicada em caso de hipertonia, quando a musculatura fica com tônus exagerado, rígido. “Músculo tenso dói e atrapalha o movimento de músculos que estão mexendo normalmente”, explica o médico, que exalta ser importante definir quais músculos serão submetidos ao tratamento da toxina: “alguns músculos ajudam justamente por estarem tensos, então tem que saber escolher”.

Vaz comenta que esse procedimento é bastante utilizado em locais onde há centros de reabilitação, e que é disponibilizado pelo SUS. O problema é que há poucos centros de reabilitação públicos e médicos habilitados a fazer essa aplicação. Quanto aos custos na rede privada, considerados altos pelo fisiatra, “a tendência é que o preço diminua, ainda mais com a concorrência de fabricantes. Mas eu também aposto na abertura de novos centros de reabilitação”. Ele conta que nos centros públicos, os pacientes podem ter de esperar de seis a nove meses para começar o tratamento.

Ele esclarece que a contraindicações “são mais relativas do que absolutas. Reconhecidamente, só se a pessoa tiver alergia à toxina ou a algum componente dela”. Entre as relativas, figuram infecções no local onde a toxina seria aplicada e doenças sanguíneas que causam hemorragia.

O doutor enfatiza que apenas a aplicação da toxina botulínica não promove a recuperação. “É quase antiético aplicar só a toxina. O paciente deve estar em um contexto de readaptação, tendo como base de tratamento exercícios de reabilitação. A toxina é um recurso a mais”, finaliza.

Problemas dermatológicos 

De excesso de sudorese a neuralgia pós-herpética - decorrente de herpes zoster -, há muitas doenças dermatológicas em que a toxina pode ser aplicada. “O excesso de sudorese em si é muito incapacitante. A pessoa sua muito, o que causa muito incômodo socialmente”, comenta a dermatologista Natalia Cymrot. Além da aplicação da toxina, pode-se tratar o problema comcirurgia de secção de nervos ou com cremes e aparelhos que inibem sudorese.

A médica ressalta que na grande maioria das vezes não há efeitos colaterais. A toxina começa a agir a partir do quinto dia após a aplicação, e dura uma média de nove a dez meses. Para excesso de sudorese, Natalia calcula que seriam aplicadas de 100 a 200 unidades da toxina, a um preço entre R$ 1,5 mil a R$ 2 mil. “É uma técnica cara, mas muda a qualidade de vida”, defende.

A toxina pode ser utilizada em caso de disidrose, quando se formam bolhas. “O importante é pesquisar a causa da doença, que pode ser alergia a medicamento, reação à micose ou a contato com substância alergênica”, explica. O efeito dura entre sete e oito meses. A toxina também faz com que o hidrocistoma, um tumor benigno da pele, suma, e há casos de melhoras de lesões de psoríase.

Enxaqueca

A dermatologista Natalia Cymrot menciona que alguns casos de enxaqueca podem ser resolvidos com a aplicação da toxina. O excesso de tensão em músculos da face, da mastigação, do couro cabeludo e da nuca pode causar enxaqueca, e a aplicação da toxina pode diminuir o número de crises de dor e a intensidade delas.

A toxina também pode ser utilizada para distonias “desde a pessoa que fica piscando, virando a cabeça, como um tique, até distonias na laringe, por exemplo”, comenta o otorrinolaringologista Lucas Gomes Patrocínio.

Natalia garante que o método é seguro: “o maior efeito colateral é a aplicação em músculos que você não quer atingir”. A médica acredita que o tratamento será bastante utilizado no futuro.

Ainda tem dúvidas sobre o tratamento com toxina botulínica?

Escreva para: especialistaresponde@estadao.com

A toxina botulínica é largamente conhecida e utilizada em casos de tratamentos estéticos. Porém, a substância usada para amenizar rugas e linhas de expressão também está sendo incorporada ao tratamento de diversas doenças.

Produzida pela bactéria Clostridium botulinium do tipo A e conhecida por Botox - nome dado ao produto por um de seus fabricantes -, a toxina botulínica pode ser aplicada em casos de doenças dermatológicas, oftalmológicas, neurológicas, odontológicas e em muitas outras.

Ainda pouco divulgado, o método de tratamento com toxina botulínica não necessariamente promove a cura das doenças, mas ajuda a controlá-las e a diminuir a dependência de outros remédios. Apesar de ser um investimento alto, costuma valer a pena pela melhora na qualidade de vida. Com aplicações que variam de caso a caso, o recurso apresenta bons resultados e promete se tornar uma forma comum de tratamento para pacientes de todas as faixas etárias.

Uso odontológico

Bruxismo, apertamento dos dentes, dores na articulação têmporo-mandibular, dores de cabeça de origem dentária e sorriso gengival são os casos em que a toxina botulínica pode ser aplicada na odontologia. “A toxina age bloqueando a ação das fibras musculares, interrompendo a atividade delas”, diz Rogério Zambonato, odontologista. No caso do bruxismo, há uma hiperatividade do sistema nervoso, que leva a maior atividade dos músculos da mastigação, causando o ranger dos dentes especialmente durante o sono. Ao aplicar a toxina, “diminui-se a força da musculatura, minimizando sua atividade”. O mesmo efeito é causado nos casos de apertamento dos dentes.

Zambonato comenta que muitos pacientes com crises intensas destas doenças se medicam todos os dias. “Com a toxina, abre-se uma janela de quase seis meses sem precisar de química diária”, diz.

No caso de sorriso gengival, o odontologista compara o lábio superior a uma cortina: “por uma hiperfunção do lábio superior, a 'cortina' sobe em excesso quando a pessoa sorri. Aplicando a toxina em pontos específicos na musculatura do lábio superior, responsáveis por levantar a 'cortina', há uma exposição menor da gengiva e dos dentes”, conta.

Para ele, os preços do tratamento não são obstáculo. “Comparando com o uso de medicação por seis meses, sai num custo acessível”. Gasta-se em torno de R$ 800,00 por injeção.

Na urologia

A toxina botulínica é indicada para a incontinência urinária de urgência, em que a pessoa tem necessidade de urinar logo após a bexiga começar a encher. “Há um medicamento oral que controla a bexiga e medidas de fisioterapia que ajudam a melhorar”, explica o urologista José Carlos Truzzi. “Se a pessoa não responde a essas condutas mais conservadoras, aí existe a indicação para a toxina botulínica”.

A aplicação, nesse caso, ocorre direto na bexiga, pela uretra, conferindo maior controle urinário entre seis e nove meses. Ela pode ser feita em adultos e crianças.

Truzzi relata que este quadro - bexiga neurogênica após trauma medular - ocorre devido a problemas como esclerose múltipla, Parkinson ou em decorrência de derrames, lesões medulares e paraplegia. O médico esclarece, porém, que a incontinência também pode ocorrer em pessoas que não apresentam nenhum comprometimento neurológico, o que caracteriza bexiga hiperativa idiopática. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou o uso da toxina para os casos neurológicos, e o médico acredita que este ano a agência também permita no uso idiopático.

Uma vez aprovado pela Anvisa, o método pode utilizado na rede pública, e embora não esteja listado como procedimento específico no rol do Sistema Único de Saúde (SUS), “se o urologista tem o equipamento necessário e sabe fazer a aplicação, ele teoricamente pode fazer”, comenta Truzzi. Na rede particular, o valor, “apesar de não ser exorbitante, acaba sendo limitante em qualquer cenário”.

Mesmo assim, o médico considera o investimento válido. “Não é uma doença grave como um mal funcionamento renal, mas compromete muito a qualidade de vida. Tem paciente que deixa de sair de casa porque molha roupa, cadeira. Não é normal e realmente precisa buscar tratamento”, diz.

Para os olhos

A toxina pode ser aplicada em alguns casos de estrabismo e tiques - o blefaroespasmo idiopático. “No estrabismo, só se houver baixa angulação e a história da doença não for longa”, explica o oftalmologista Virgílio Centurion, diretor clínico do Instituto de Moléstias Oculares (IMO). O procedimento também é possível após cirurgias de estrabismo em que sobrou um pequeno ângulo da doença e quando o paciente não pode tomar anestesia geral para realizar a cirurgia.

No caso do estrabismo, “quando o olho está virado em direção ao nariz, pode significar que o músculo responsável por este movimento está hiperfuncionante. Com uma dose mínima de toxina aplicada nesse músculo, ele funciona menos ou para de funcionar, e os olhos ficam paralelos”, diz.

O oftalmologista salienta que as primeiras doses devem ser pequenas para provocar o mínimo possível de efeitos colaterais. “Às vezes não se consegue o efeito desejado na primeira aplicação, mas o que não se pode é provocar uma paralisia mais intensa”, ele adiciona, explicando que os efeitos colaterais são praticamente inexistentes pois a aplicação é muito bem controlada.

A ação de cada aplicação dura de quatro a seis meses, “mais ou menos o mesmo tempo de quando se utiliza a toxina com finalidade estética, então deve haver certa periodicidade”. Ele não vê o preço da aplicação como obstáculo: “o mercado se autorregula, e a toxina é relativamente acessível”.

Tratamento neurológico

Outro uso da toxina botulínica está no tratamento de doenças como paralisia cerebral e traumatismo craniano. No entanto, Cicero Vaz, fisiatra do Hospital Israelita Albert Einstein, avisa: “a toxina não estimula a melhoria do movimento diretamente, mas paralisa os músculos que a atrapalham”.

A toxina é indicada em caso de hipertonia, quando a musculatura fica com tônus exagerado, rígido. “Músculo tenso dói e atrapalha o movimento de músculos que estão mexendo normalmente”, explica o médico, que exalta ser importante definir quais músculos serão submetidos ao tratamento da toxina: “alguns músculos ajudam justamente por estarem tensos, então tem que saber escolher”.

Vaz comenta que esse procedimento é bastante utilizado em locais onde há centros de reabilitação, e que é disponibilizado pelo SUS. O problema é que há poucos centros de reabilitação públicos e médicos habilitados a fazer essa aplicação. Quanto aos custos na rede privada, considerados altos pelo fisiatra, “a tendência é que o preço diminua, ainda mais com a concorrência de fabricantes. Mas eu também aposto na abertura de novos centros de reabilitação”. Ele conta que nos centros públicos, os pacientes podem ter de esperar de seis a nove meses para começar o tratamento.

Ele esclarece que a contraindicações “são mais relativas do que absolutas. Reconhecidamente, só se a pessoa tiver alergia à toxina ou a algum componente dela”. Entre as relativas, figuram infecções no local onde a toxina seria aplicada e doenças sanguíneas que causam hemorragia.

O doutor enfatiza que apenas a aplicação da toxina botulínica não promove a recuperação. “É quase antiético aplicar só a toxina. O paciente deve estar em um contexto de readaptação, tendo como base de tratamento exercícios de reabilitação. A toxina é um recurso a mais”, finaliza.

Problemas dermatológicos 

De excesso de sudorese a neuralgia pós-herpética - decorrente de herpes zoster -, há muitas doenças dermatológicas em que a toxina pode ser aplicada. “O excesso de sudorese em si é muito incapacitante. A pessoa sua muito, o que causa muito incômodo socialmente”, comenta a dermatologista Natalia Cymrot. Além da aplicação da toxina, pode-se tratar o problema comcirurgia de secção de nervos ou com cremes e aparelhos que inibem sudorese.

A médica ressalta que na grande maioria das vezes não há efeitos colaterais. A toxina começa a agir a partir do quinto dia após a aplicação, e dura uma média de nove a dez meses. Para excesso de sudorese, Natalia calcula que seriam aplicadas de 100 a 200 unidades da toxina, a um preço entre R$ 1,5 mil a R$ 2 mil. “É uma técnica cara, mas muda a qualidade de vida”, defende.

A toxina pode ser utilizada em caso de disidrose, quando se formam bolhas. “O importante é pesquisar a causa da doença, que pode ser alergia a medicamento, reação à micose ou a contato com substância alergênica”, explica. O efeito dura entre sete e oito meses. A toxina também faz com que o hidrocistoma, um tumor benigno da pele, suma, e há casos de melhoras de lesões de psoríase.

Enxaqueca

A dermatologista Natalia Cymrot menciona que alguns casos de enxaqueca podem ser resolvidos com a aplicação da toxina. O excesso de tensão em músculos da face, da mastigação, do couro cabeludo e da nuca pode causar enxaqueca, e a aplicação da toxina pode diminuir o número de crises de dor e a intensidade delas.

A toxina também pode ser utilizada para distonias “desde a pessoa que fica piscando, virando a cabeça, como um tique, até distonias na laringe, por exemplo”, comenta o otorrinolaringologista Lucas Gomes Patrocínio.

Natalia garante que o método é seguro: “o maior efeito colateral é a aplicação em músculos que você não quer atingir”. A médica acredita que o tratamento será bastante utilizado no futuro.

Ainda tem dúvidas sobre o tratamento com toxina botulínica?

Escreva para: especialistaresponde@estadao.com

A toxina botulínica é largamente conhecida e utilizada em casos de tratamentos estéticos. Porém, a substância usada para amenizar rugas e linhas de expressão também está sendo incorporada ao tratamento de diversas doenças.

Produzida pela bactéria Clostridium botulinium do tipo A e conhecida por Botox - nome dado ao produto por um de seus fabricantes -, a toxina botulínica pode ser aplicada em casos de doenças dermatológicas, oftalmológicas, neurológicas, odontológicas e em muitas outras.

Ainda pouco divulgado, o método de tratamento com toxina botulínica não necessariamente promove a cura das doenças, mas ajuda a controlá-las e a diminuir a dependência de outros remédios. Apesar de ser um investimento alto, costuma valer a pena pela melhora na qualidade de vida. Com aplicações que variam de caso a caso, o recurso apresenta bons resultados e promete se tornar uma forma comum de tratamento para pacientes de todas as faixas etárias.

Uso odontológico

Bruxismo, apertamento dos dentes, dores na articulação têmporo-mandibular, dores de cabeça de origem dentária e sorriso gengival são os casos em que a toxina botulínica pode ser aplicada na odontologia. “A toxina age bloqueando a ação das fibras musculares, interrompendo a atividade delas”, diz Rogério Zambonato, odontologista. No caso do bruxismo, há uma hiperatividade do sistema nervoso, que leva a maior atividade dos músculos da mastigação, causando o ranger dos dentes especialmente durante o sono. Ao aplicar a toxina, “diminui-se a força da musculatura, minimizando sua atividade”. O mesmo efeito é causado nos casos de apertamento dos dentes.

Zambonato comenta que muitos pacientes com crises intensas destas doenças se medicam todos os dias. “Com a toxina, abre-se uma janela de quase seis meses sem precisar de química diária”, diz.

No caso de sorriso gengival, o odontologista compara o lábio superior a uma cortina: “por uma hiperfunção do lábio superior, a 'cortina' sobe em excesso quando a pessoa sorri. Aplicando a toxina em pontos específicos na musculatura do lábio superior, responsáveis por levantar a 'cortina', há uma exposição menor da gengiva e dos dentes”, conta.

Para ele, os preços do tratamento não são obstáculo. “Comparando com o uso de medicação por seis meses, sai num custo acessível”. Gasta-se em torno de R$ 800,00 por injeção.

Na urologia

A toxina botulínica é indicada para a incontinência urinária de urgência, em que a pessoa tem necessidade de urinar logo após a bexiga começar a encher. “Há um medicamento oral que controla a bexiga e medidas de fisioterapia que ajudam a melhorar”, explica o urologista José Carlos Truzzi. “Se a pessoa não responde a essas condutas mais conservadoras, aí existe a indicação para a toxina botulínica”.

A aplicação, nesse caso, ocorre direto na bexiga, pela uretra, conferindo maior controle urinário entre seis e nove meses. Ela pode ser feita em adultos e crianças.

Truzzi relata que este quadro - bexiga neurogênica após trauma medular - ocorre devido a problemas como esclerose múltipla, Parkinson ou em decorrência de derrames, lesões medulares e paraplegia. O médico esclarece, porém, que a incontinência também pode ocorrer em pessoas que não apresentam nenhum comprometimento neurológico, o que caracteriza bexiga hiperativa idiopática. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou o uso da toxina para os casos neurológicos, e o médico acredita que este ano a agência também permita no uso idiopático.

Uma vez aprovado pela Anvisa, o método pode utilizado na rede pública, e embora não esteja listado como procedimento específico no rol do Sistema Único de Saúde (SUS), “se o urologista tem o equipamento necessário e sabe fazer a aplicação, ele teoricamente pode fazer”, comenta Truzzi. Na rede particular, o valor, “apesar de não ser exorbitante, acaba sendo limitante em qualquer cenário”.

Mesmo assim, o médico considera o investimento válido. “Não é uma doença grave como um mal funcionamento renal, mas compromete muito a qualidade de vida. Tem paciente que deixa de sair de casa porque molha roupa, cadeira. Não é normal e realmente precisa buscar tratamento”, diz.

Para os olhos

A toxina pode ser aplicada em alguns casos de estrabismo e tiques - o blefaroespasmo idiopático. “No estrabismo, só se houver baixa angulação e a história da doença não for longa”, explica o oftalmologista Virgílio Centurion, diretor clínico do Instituto de Moléstias Oculares (IMO). O procedimento também é possível após cirurgias de estrabismo em que sobrou um pequeno ângulo da doença e quando o paciente não pode tomar anestesia geral para realizar a cirurgia.

No caso do estrabismo, “quando o olho está virado em direção ao nariz, pode significar que o músculo responsável por este movimento está hiperfuncionante. Com uma dose mínima de toxina aplicada nesse músculo, ele funciona menos ou para de funcionar, e os olhos ficam paralelos”, diz.

O oftalmologista salienta que as primeiras doses devem ser pequenas para provocar o mínimo possível de efeitos colaterais. “Às vezes não se consegue o efeito desejado na primeira aplicação, mas o que não se pode é provocar uma paralisia mais intensa”, ele adiciona, explicando que os efeitos colaterais são praticamente inexistentes pois a aplicação é muito bem controlada.

A ação de cada aplicação dura de quatro a seis meses, “mais ou menos o mesmo tempo de quando se utiliza a toxina com finalidade estética, então deve haver certa periodicidade”. Ele não vê o preço da aplicação como obstáculo: “o mercado se autorregula, e a toxina é relativamente acessível”.

Tratamento neurológico

Outro uso da toxina botulínica está no tratamento de doenças como paralisia cerebral e traumatismo craniano. No entanto, Cicero Vaz, fisiatra do Hospital Israelita Albert Einstein, avisa: “a toxina não estimula a melhoria do movimento diretamente, mas paralisa os músculos que a atrapalham”.

A toxina é indicada em caso de hipertonia, quando a musculatura fica com tônus exagerado, rígido. “Músculo tenso dói e atrapalha o movimento de músculos que estão mexendo normalmente”, explica o médico, que exalta ser importante definir quais músculos serão submetidos ao tratamento da toxina: “alguns músculos ajudam justamente por estarem tensos, então tem que saber escolher”.

Vaz comenta que esse procedimento é bastante utilizado em locais onde há centros de reabilitação, e que é disponibilizado pelo SUS. O problema é que há poucos centros de reabilitação públicos e médicos habilitados a fazer essa aplicação. Quanto aos custos na rede privada, considerados altos pelo fisiatra, “a tendência é que o preço diminua, ainda mais com a concorrência de fabricantes. Mas eu também aposto na abertura de novos centros de reabilitação”. Ele conta que nos centros públicos, os pacientes podem ter de esperar de seis a nove meses para começar o tratamento.

Ele esclarece que a contraindicações “são mais relativas do que absolutas. Reconhecidamente, só se a pessoa tiver alergia à toxina ou a algum componente dela”. Entre as relativas, figuram infecções no local onde a toxina seria aplicada e doenças sanguíneas que causam hemorragia.

O doutor enfatiza que apenas a aplicação da toxina botulínica não promove a recuperação. “É quase antiético aplicar só a toxina. O paciente deve estar em um contexto de readaptação, tendo como base de tratamento exercícios de reabilitação. A toxina é um recurso a mais”, finaliza.

Problemas dermatológicos 

De excesso de sudorese a neuralgia pós-herpética - decorrente de herpes zoster -, há muitas doenças dermatológicas em que a toxina pode ser aplicada. “O excesso de sudorese em si é muito incapacitante. A pessoa sua muito, o que causa muito incômodo socialmente”, comenta a dermatologista Natalia Cymrot. Além da aplicação da toxina, pode-se tratar o problema comcirurgia de secção de nervos ou com cremes e aparelhos que inibem sudorese.

A médica ressalta que na grande maioria das vezes não há efeitos colaterais. A toxina começa a agir a partir do quinto dia após a aplicação, e dura uma média de nove a dez meses. Para excesso de sudorese, Natalia calcula que seriam aplicadas de 100 a 200 unidades da toxina, a um preço entre R$ 1,5 mil a R$ 2 mil. “É uma técnica cara, mas muda a qualidade de vida”, defende.

A toxina pode ser utilizada em caso de disidrose, quando se formam bolhas. “O importante é pesquisar a causa da doença, que pode ser alergia a medicamento, reação à micose ou a contato com substância alergênica”, explica. O efeito dura entre sete e oito meses. A toxina também faz com que o hidrocistoma, um tumor benigno da pele, suma, e há casos de melhoras de lesões de psoríase.

Enxaqueca

A dermatologista Natalia Cymrot menciona que alguns casos de enxaqueca podem ser resolvidos com a aplicação da toxina. O excesso de tensão em músculos da face, da mastigação, do couro cabeludo e da nuca pode causar enxaqueca, e a aplicação da toxina pode diminuir o número de crises de dor e a intensidade delas.

A toxina também pode ser utilizada para distonias “desde a pessoa que fica piscando, virando a cabeça, como um tique, até distonias na laringe, por exemplo”, comenta o otorrinolaringologista Lucas Gomes Patrocínio.

Natalia garante que o método é seguro: “o maior efeito colateral é a aplicação em músculos que você não quer atingir”. A médica acredita que o tratamento será bastante utilizado no futuro.

Ainda tem dúvidas sobre o tratamento com toxina botulínica?

Escreva para: especialistaresponde@estadao.com

A toxina botulínica é largamente conhecida e utilizada em casos de tratamentos estéticos. Porém, a substância usada para amenizar rugas e linhas de expressão também está sendo incorporada ao tratamento de diversas doenças.

Produzida pela bactéria Clostridium botulinium do tipo A e conhecida por Botox - nome dado ao produto por um de seus fabricantes -, a toxina botulínica pode ser aplicada em casos de doenças dermatológicas, oftalmológicas, neurológicas, odontológicas e em muitas outras.

Ainda pouco divulgado, o método de tratamento com toxina botulínica não necessariamente promove a cura das doenças, mas ajuda a controlá-las e a diminuir a dependência de outros remédios. Apesar de ser um investimento alto, costuma valer a pena pela melhora na qualidade de vida. Com aplicações que variam de caso a caso, o recurso apresenta bons resultados e promete se tornar uma forma comum de tratamento para pacientes de todas as faixas etárias.

Uso odontológico

Bruxismo, apertamento dos dentes, dores na articulação têmporo-mandibular, dores de cabeça de origem dentária e sorriso gengival são os casos em que a toxina botulínica pode ser aplicada na odontologia. “A toxina age bloqueando a ação das fibras musculares, interrompendo a atividade delas”, diz Rogério Zambonato, odontologista. No caso do bruxismo, há uma hiperatividade do sistema nervoso, que leva a maior atividade dos músculos da mastigação, causando o ranger dos dentes especialmente durante o sono. Ao aplicar a toxina, “diminui-se a força da musculatura, minimizando sua atividade”. O mesmo efeito é causado nos casos de apertamento dos dentes.

Zambonato comenta que muitos pacientes com crises intensas destas doenças se medicam todos os dias. “Com a toxina, abre-se uma janela de quase seis meses sem precisar de química diária”, diz.

No caso de sorriso gengival, o odontologista compara o lábio superior a uma cortina: “por uma hiperfunção do lábio superior, a 'cortina' sobe em excesso quando a pessoa sorri. Aplicando a toxina em pontos específicos na musculatura do lábio superior, responsáveis por levantar a 'cortina', há uma exposição menor da gengiva e dos dentes”, conta.

Para ele, os preços do tratamento não são obstáculo. “Comparando com o uso de medicação por seis meses, sai num custo acessível”. Gasta-se em torno de R$ 800,00 por injeção.

Na urologia

A toxina botulínica é indicada para a incontinência urinária de urgência, em que a pessoa tem necessidade de urinar logo após a bexiga começar a encher. “Há um medicamento oral que controla a bexiga e medidas de fisioterapia que ajudam a melhorar”, explica o urologista José Carlos Truzzi. “Se a pessoa não responde a essas condutas mais conservadoras, aí existe a indicação para a toxina botulínica”.

A aplicação, nesse caso, ocorre direto na bexiga, pela uretra, conferindo maior controle urinário entre seis e nove meses. Ela pode ser feita em adultos e crianças.

Truzzi relata que este quadro - bexiga neurogênica após trauma medular - ocorre devido a problemas como esclerose múltipla, Parkinson ou em decorrência de derrames, lesões medulares e paraplegia. O médico esclarece, porém, que a incontinência também pode ocorrer em pessoas que não apresentam nenhum comprometimento neurológico, o que caracteriza bexiga hiperativa idiopática. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou o uso da toxina para os casos neurológicos, e o médico acredita que este ano a agência também permita no uso idiopático.

Uma vez aprovado pela Anvisa, o método pode utilizado na rede pública, e embora não esteja listado como procedimento específico no rol do Sistema Único de Saúde (SUS), “se o urologista tem o equipamento necessário e sabe fazer a aplicação, ele teoricamente pode fazer”, comenta Truzzi. Na rede particular, o valor, “apesar de não ser exorbitante, acaba sendo limitante em qualquer cenário”.

Mesmo assim, o médico considera o investimento válido. “Não é uma doença grave como um mal funcionamento renal, mas compromete muito a qualidade de vida. Tem paciente que deixa de sair de casa porque molha roupa, cadeira. Não é normal e realmente precisa buscar tratamento”, diz.

Para os olhos

A toxina pode ser aplicada em alguns casos de estrabismo e tiques - o blefaroespasmo idiopático. “No estrabismo, só se houver baixa angulação e a história da doença não for longa”, explica o oftalmologista Virgílio Centurion, diretor clínico do Instituto de Moléstias Oculares (IMO). O procedimento também é possível após cirurgias de estrabismo em que sobrou um pequeno ângulo da doença e quando o paciente não pode tomar anestesia geral para realizar a cirurgia.

No caso do estrabismo, “quando o olho está virado em direção ao nariz, pode significar que o músculo responsável por este movimento está hiperfuncionante. Com uma dose mínima de toxina aplicada nesse músculo, ele funciona menos ou para de funcionar, e os olhos ficam paralelos”, diz.

O oftalmologista salienta que as primeiras doses devem ser pequenas para provocar o mínimo possível de efeitos colaterais. “Às vezes não se consegue o efeito desejado na primeira aplicação, mas o que não se pode é provocar uma paralisia mais intensa”, ele adiciona, explicando que os efeitos colaterais são praticamente inexistentes pois a aplicação é muito bem controlada.

A ação de cada aplicação dura de quatro a seis meses, “mais ou menos o mesmo tempo de quando se utiliza a toxina com finalidade estética, então deve haver certa periodicidade”. Ele não vê o preço da aplicação como obstáculo: “o mercado se autorregula, e a toxina é relativamente acessível”.

Tratamento neurológico

Outro uso da toxina botulínica está no tratamento de doenças como paralisia cerebral e traumatismo craniano. No entanto, Cicero Vaz, fisiatra do Hospital Israelita Albert Einstein, avisa: “a toxina não estimula a melhoria do movimento diretamente, mas paralisa os músculos que a atrapalham”.

A toxina é indicada em caso de hipertonia, quando a musculatura fica com tônus exagerado, rígido. “Músculo tenso dói e atrapalha o movimento de músculos que estão mexendo normalmente”, explica o médico, que exalta ser importante definir quais músculos serão submetidos ao tratamento da toxina: “alguns músculos ajudam justamente por estarem tensos, então tem que saber escolher”.

Vaz comenta que esse procedimento é bastante utilizado em locais onde há centros de reabilitação, e que é disponibilizado pelo SUS. O problema é que há poucos centros de reabilitação públicos e médicos habilitados a fazer essa aplicação. Quanto aos custos na rede privada, considerados altos pelo fisiatra, “a tendência é que o preço diminua, ainda mais com a concorrência de fabricantes. Mas eu também aposto na abertura de novos centros de reabilitação”. Ele conta que nos centros públicos, os pacientes podem ter de esperar de seis a nove meses para começar o tratamento.

Ele esclarece que a contraindicações “são mais relativas do que absolutas. Reconhecidamente, só se a pessoa tiver alergia à toxina ou a algum componente dela”. Entre as relativas, figuram infecções no local onde a toxina seria aplicada e doenças sanguíneas que causam hemorragia.

O doutor enfatiza que apenas a aplicação da toxina botulínica não promove a recuperação. “É quase antiético aplicar só a toxina. O paciente deve estar em um contexto de readaptação, tendo como base de tratamento exercícios de reabilitação. A toxina é um recurso a mais”, finaliza.

Problemas dermatológicos 

De excesso de sudorese a neuralgia pós-herpética - decorrente de herpes zoster -, há muitas doenças dermatológicas em que a toxina pode ser aplicada. “O excesso de sudorese em si é muito incapacitante. A pessoa sua muito, o que causa muito incômodo socialmente”, comenta a dermatologista Natalia Cymrot. Além da aplicação da toxina, pode-se tratar o problema comcirurgia de secção de nervos ou com cremes e aparelhos que inibem sudorese.

A médica ressalta que na grande maioria das vezes não há efeitos colaterais. A toxina começa a agir a partir do quinto dia após a aplicação, e dura uma média de nove a dez meses. Para excesso de sudorese, Natalia calcula que seriam aplicadas de 100 a 200 unidades da toxina, a um preço entre R$ 1,5 mil a R$ 2 mil. “É uma técnica cara, mas muda a qualidade de vida”, defende.

A toxina pode ser utilizada em caso de disidrose, quando se formam bolhas. “O importante é pesquisar a causa da doença, que pode ser alergia a medicamento, reação à micose ou a contato com substância alergênica”, explica. O efeito dura entre sete e oito meses. A toxina também faz com que o hidrocistoma, um tumor benigno da pele, suma, e há casos de melhoras de lesões de psoríase.

Enxaqueca

A dermatologista Natalia Cymrot menciona que alguns casos de enxaqueca podem ser resolvidos com a aplicação da toxina. O excesso de tensão em músculos da face, da mastigação, do couro cabeludo e da nuca pode causar enxaqueca, e a aplicação da toxina pode diminuir o número de crises de dor e a intensidade delas.

A toxina também pode ser utilizada para distonias “desde a pessoa que fica piscando, virando a cabeça, como um tique, até distonias na laringe, por exemplo”, comenta o otorrinolaringologista Lucas Gomes Patrocínio.

Natalia garante que o método é seguro: “o maior efeito colateral é a aplicação em músculos que você não quer atingir”. A médica acredita que o tratamento será bastante utilizado no futuro.

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