Comportamento Adolescente e Educação

Adolescentes enfrentam crise de pânico após período "toca do urso"


Por Carolina Delboni

Depois de um longo tempo em isolamento social, adolescentes apresentam crises de pânico ao se depararem com a volta às aulas presenciais e a rotina fora de casa

A volta às aulas e a retomada de uma certa normalidade na vida têm causado estresse para alguns adolescentes. O que para um determinado grupo tem sido motivo de comemoração, para outro tem gerado medo, insegurança e ansiedade. Todos possíveis gatilhos para uma crise de pânico. Depois de tanto tempo afastado dos amigos, da vida social e do ambiente escolar, um aumento de casos de pânico em adolescentes já foi percebido nos consultórios médicos e de psicologia.

Primeira semana de aula e poucos dias no presencial já foram suficientes para que o filho mais velho da publicitária Isabela Novaes tivesse a primeira crise. "Ele é um menino ansioso, mas até o momento não tinha apresentado nenhum comportamento que precisássemos cuidar ou estar mais atento", conta. "Ele simplesmente achou que ia morrer. Dizia que estava com dificuldade de respirar, o corpo tremia e o coração disparou. A única coisa a fazer era acalmá-lo, mas ficamos assustados".

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Assusta presenciar a cena de um filho ou filha tendo uma crise de pânico. E está longe de não existir uma explicação mais concreta para o que está acontecendo. Os adolescentes tiveram um longo período em que a vida ficou suspensa e, de certa forma, puderam se manter escondidos em suas "tocas de urso" como apelidou o psicólogo Marcelo Wild Veiga, especialista nesta faixa etária.

 Foto: Estadão

"Eles ficaram uma etapa da vida hibernando, longe do convívio social, algo fundamental nesta etapa da vida. Na pandemia alguns já começaram a panicar quando começaram a sentir que não dava para ficar fora do mundo e, também, não dava para ficar dentro", fala. Para ele, o retorno está deixando tudo mais em flagrante. "A hora em que você sai para o mundo, é preciso lidar com ele, não dá apenas para desligar a câmera, fechar a porta do quarto e afastar os inúmeros conflitos, até mesmo viagens de férias se tornaram desafiadoras em toda a sua exposição. Temos visto acontecer e é um fato concreto", enfatiza.

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E foi justamente nas férias que a família da Adriana Campos, historiadora, enfrentou o primeiro episódio com a filha adolescente de 17 anos. "Estávamos dentro do avião, sentados, com cinto e ela entrou em pânico. Disse que não conseguia ficar ali com aquele monte de gente, que não ia conseguir viajar, precisava sair. Saímos todos e não teve viagem", conta.

Camlia dos Santos Albuquerque também relata um acontecimento com o filho de 16 anos. "Com a volta às aulas, a escola dele fez algumas provas que eles chamam de avaliação diagnóstica que é só pra saber como o aluno voltou. Bom, agora é presencial né e até então ele vinha fazendo tudo online", desabafa Camila que no dia recebeu um telefonema da escola porque o filho tinha tido uma crise de pânico e estava na enfermaria no aguardo da mãe.

Assim como os filhos da Adriana, Isabela e Camila, outros têm tido crises de pânico como resposta ao que se chama de fobia social. As razões são exatamente as mesmas apontadas pelo psicólogo Marcelo Veiga. Um aumento de ansiedade e medo de sair de casa, ou deixar a "toca do urso", para enfrentar o circulo social, as questões que se apresentam na escola, o mundo de maneira geral e eles mesmos. Afinal estamos falando de adolescentes.

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Uma fase que exige deles auto-percepcão, autoconhecimento, análise e enfrentamento das questões internas e externas. É aquele famoso "se reconhecer no mundo, pra se colocar no mundo". "Os adolescentes estão tendo uma retomada de todos os conflitos que a própria idade já exige deles e é difícil", fala Marcelo.

"Eles estavam muito isolados, sem ter que precisar conviver com aquela vida adolescente. Todo convívio social, a dinâmica das relações, dos afetos na classe, da condição de ser visto como um sujeito por inteiro estavam suspensas. E eles com muitas proteções dentro de casa, tanto da tela quanto na escola. Podiam colar nas provas, podiam se retirar dos enfrentamentos sociais, do olhar do outro, de tudo. E agora com a obrigação de um certo retorno começou a disparar muita coisa. A sensação de desamparo não está mais na solidão, mas na reinserção no mundo compartilhado".

O reflexo da pandemia nos adolescentes já extrapolou as quatro paredes do quarto. Por muito tempo, tivemos um isolamento dentro do isolamento e as dificuldades e os medos de se abrir as portas novamente estão aí. Alguns comemoraram o retorno à escola, ao circulo social da vida, outros estão com mais dificuldade e além de enfrentar o medo do mundo, precisam também enfrentar os medos internos.

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Não sabemos, de fato, o quanto essas crises de pânico podem ser colocadas na conta da pandemia porque estudos ainda estão sendo feitos. É tudo muito recente e segundo o professor de Psiquiatria da Infância e Adolescência do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, dr. Guilherme Polanczyk, "o que a gente sabe é que pessoas ao longo do tempo vão apresentar esses sintomas. Sempre foi assim e vai ser. O que ainda não está claro é se a pandemia fez esse numero crescer em relação ao que surgiria realmente".

Polanczyk relata muitos casos de ansiedade e depressão entre adolescentes nos consultórios e confirma que sim, a pandemia certamente contribuiu para que esses sintomas surgissem de maneira a provocar doenças mentais como a síndrome do pânico. Só ainda não está claro se são 100% sintomas da pandemia.

"O fato desses casos terem alguma relação com a pandemia não quer dizer que eles não surgiriam sem a pandemia. Poderiam ter outros estressores que serviriam como gatilho porque a gente sabe que transtornos mentais são complexos e envolvem questões genéticas, experiências na infância, estressores pontuais e traços de temperamento. Mas sim, é provável que nesses casos a pandemia possa ter contribuído", reitera dr. Guilherme.

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Entre as certezas que temos é que a pandemia nos deu um alerta para questões que possivelmente já estavam aí, talvez apenas à espera de um gatilho. Saúde mental é dos assuntos mais urgentes e contemporâneos. Precisamos olhar, falar e cuidar. Sejamos adultos, adolescentes ou crianças. Porque a vulnerabilidade é intrínseca ao ser humano.

Depois de um longo tempo em isolamento social, adolescentes apresentam crises de pânico ao se depararem com a volta às aulas presenciais e a rotina fora de casa

A volta às aulas e a retomada de uma certa normalidade na vida têm causado estresse para alguns adolescentes. O que para um determinado grupo tem sido motivo de comemoração, para outro tem gerado medo, insegurança e ansiedade. Todos possíveis gatilhos para uma crise de pânico. Depois de tanto tempo afastado dos amigos, da vida social e do ambiente escolar, um aumento de casos de pânico em adolescentes já foi percebido nos consultórios médicos e de psicologia.

Primeira semana de aula e poucos dias no presencial já foram suficientes para que o filho mais velho da publicitária Isabela Novaes tivesse a primeira crise. "Ele é um menino ansioso, mas até o momento não tinha apresentado nenhum comportamento que precisássemos cuidar ou estar mais atento", conta. "Ele simplesmente achou que ia morrer. Dizia que estava com dificuldade de respirar, o corpo tremia e o coração disparou. A única coisa a fazer era acalmá-lo, mas ficamos assustados".

Assusta presenciar a cena de um filho ou filha tendo uma crise de pânico. E está longe de não existir uma explicação mais concreta para o que está acontecendo. Os adolescentes tiveram um longo período em que a vida ficou suspensa e, de certa forma, puderam se manter escondidos em suas "tocas de urso" como apelidou o psicólogo Marcelo Wild Veiga, especialista nesta faixa etária.

 Foto: Estadão

"Eles ficaram uma etapa da vida hibernando, longe do convívio social, algo fundamental nesta etapa da vida. Na pandemia alguns já começaram a panicar quando começaram a sentir que não dava para ficar fora do mundo e, também, não dava para ficar dentro", fala. Para ele, o retorno está deixando tudo mais em flagrante. "A hora em que você sai para o mundo, é preciso lidar com ele, não dá apenas para desligar a câmera, fechar a porta do quarto e afastar os inúmeros conflitos, até mesmo viagens de férias se tornaram desafiadoras em toda a sua exposição. Temos visto acontecer e é um fato concreto", enfatiza.

E foi justamente nas férias que a família da Adriana Campos, historiadora, enfrentou o primeiro episódio com a filha adolescente de 17 anos. "Estávamos dentro do avião, sentados, com cinto e ela entrou em pânico. Disse que não conseguia ficar ali com aquele monte de gente, que não ia conseguir viajar, precisava sair. Saímos todos e não teve viagem", conta.

Camlia dos Santos Albuquerque também relata um acontecimento com o filho de 16 anos. "Com a volta às aulas, a escola dele fez algumas provas que eles chamam de avaliação diagnóstica que é só pra saber como o aluno voltou. Bom, agora é presencial né e até então ele vinha fazendo tudo online", desabafa Camila que no dia recebeu um telefonema da escola porque o filho tinha tido uma crise de pânico e estava na enfermaria no aguardo da mãe.

Assim como os filhos da Adriana, Isabela e Camila, outros têm tido crises de pânico como resposta ao que se chama de fobia social. As razões são exatamente as mesmas apontadas pelo psicólogo Marcelo Veiga. Um aumento de ansiedade e medo de sair de casa, ou deixar a "toca do urso", para enfrentar o circulo social, as questões que se apresentam na escola, o mundo de maneira geral e eles mesmos. Afinal estamos falando de adolescentes.

Uma fase que exige deles auto-percepcão, autoconhecimento, análise e enfrentamento das questões internas e externas. É aquele famoso "se reconhecer no mundo, pra se colocar no mundo". "Os adolescentes estão tendo uma retomada de todos os conflitos que a própria idade já exige deles e é difícil", fala Marcelo.

"Eles estavam muito isolados, sem ter que precisar conviver com aquela vida adolescente. Todo convívio social, a dinâmica das relações, dos afetos na classe, da condição de ser visto como um sujeito por inteiro estavam suspensas. E eles com muitas proteções dentro de casa, tanto da tela quanto na escola. Podiam colar nas provas, podiam se retirar dos enfrentamentos sociais, do olhar do outro, de tudo. E agora com a obrigação de um certo retorno começou a disparar muita coisa. A sensação de desamparo não está mais na solidão, mas na reinserção no mundo compartilhado".

O reflexo da pandemia nos adolescentes já extrapolou as quatro paredes do quarto. Por muito tempo, tivemos um isolamento dentro do isolamento e as dificuldades e os medos de se abrir as portas novamente estão aí. Alguns comemoraram o retorno à escola, ao circulo social da vida, outros estão com mais dificuldade e além de enfrentar o medo do mundo, precisam também enfrentar os medos internos.

Não sabemos, de fato, o quanto essas crises de pânico podem ser colocadas na conta da pandemia porque estudos ainda estão sendo feitos. É tudo muito recente e segundo o professor de Psiquiatria da Infância e Adolescência do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, dr. Guilherme Polanczyk, "o que a gente sabe é que pessoas ao longo do tempo vão apresentar esses sintomas. Sempre foi assim e vai ser. O que ainda não está claro é se a pandemia fez esse numero crescer em relação ao que surgiria realmente".

Polanczyk relata muitos casos de ansiedade e depressão entre adolescentes nos consultórios e confirma que sim, a pandemia certamente contribuiu para que esses sintomas surgissem de maneira a provocar doenças mentais como a síndrome do pânico. Só ainda não está claro se são 100% sintomas da pandemia.

"O fato desses casos terem alguma relação com a pandemia não quer dizer que eles não surgiriam sem a pandemia. Poderiam ter outros estressores que serviriam como gatilho porque a gente sabe que transtornos mentais são complexos e envolvem questões genéticas, experiências na infância, estressores pontuais e traços de temperamento. Mas sim, é provável que nesses casos a pandemia possa ter contribuído", reitera dr. Guilherme.

Entre as certezas que temos é que a pandemia nos deu um alerta para questões que possivelmente já estavam aí, talvez apenas à espera de um gatilho. Saúde mental é dos assuntos mais urgentes e contemporâneos. Precisamos olhar, falar e cuidar. Sejamos adultos, adolescentes ou crianças. Porque a vulnerabilidade é intrínseca ao ser humano.

Depois de um longo tempo em isolamento social, adolescentes apresentam crises de pânico ao se depararem com a volta às aulas presenciais e a rotina fora de casa

A volta às aulas e a retomada de uma certa normalidade na vida têm causado estresse para alguns adolescentes. O que para um determinado grupo tem sido motivo de comemoração, para outro tem gerado medo, insegurança e ansiedade. Todos possíveis gatilhos para uma crise de pânico. Depois de tanto tempo afastado dos amigos, da vida social e do ambiente escolar, um aumento de casos de pânico em adolescentes já foi percebido nos consultórios médicos e de psicologia.

Primeira semana de aula e poucos dias no presencial já foram suficientes para que o filho mais velho da publicitária Isabela Novaes tivesse a primeira crise. "Ele é um menino ansioso, mas até o momento não tinha apresentado nenhum comportamento que precisássemos cuidar ou estar mais atento", conta. "Ele simplesmente achou que ia morrer. Dizia que estava com dificuldade de respirar, o corpo tremia e o coração disparou. A única coisa a fazer era acalmá-lo, mas ficamos assustados".

Assusta presenciar a cena de um filho ou filha tendo uma crise de pânico. E está longe de não existir uma explicação mais concreta para o que está acontecendo. Os adolescentes tiveram um longo período em que a vida ficou suspensa e, de certa forma, puderam se manter escondidos em suas "tocas de urso" como apelidou o psicólogo Marcelo Wild Veiga, especialista nesta faixa etária.

 Foto: Estadão

"Eles ficaram uma etapa da vida hibernando, longe do convívio social, algo fundamental nesta etapa da vida. Na pandemia alguns já começaram a panicar quando começaram a sentir que não dava para ficar fora do mundo e, também, não dava para ficar dentro", fala. Para ele, o retorno está deixando tudo mais em flagrante. "A hora em que você sai para o mundo, é preciso lidar com ele, não dá apenas para desligar a câmera, fechar a porta do quarto e afastar os inúmeros conflitos, até mesmo viagens de férias se tornaram desafiadoras em toda a sua exposição. Temos visto acontecer e é um fato concreto", enfatiza.

E foi justamente nas férias que a família da Adriana Campos, historiadora, enfrentou o primeiro episódio com a filha adolescente de 17 anos. "Estávamos dentro do avião, sentados, com cinto e ela entrou em pânico. Disse que não conseguia ficar ali com aquele monte de gente, que não ia conseguir viajar, precisava sair. Saímos todos e não teve viagem", conta.

Camlia dos Santos Albuquerque também relata um acontecimento com o filho de 16 anos. "Com a volta às aulas, a escola dele fez algumas provas que eles chamam de avaliação diagnóstica que é só pra saber como o aluno voltou. Bom, agora é presencial né e até então ele vinha fazendo tudo online", desabafa Camila que no dia recebeu um telefonema da escola porque o filho tinha tido uma crise de pânico e estava na enfermaria no aguardo da mãe.

Assim como os filhos da Adriana, Isabela e Camila, outros têm tido crises de pânico como resposta ao que se chama de fobia social. As razões são exatamente as mesmas apontadas pelo psicólogo Marcelo Veiga. Um aumento de ansiedade e medo de sair de casa, ou deixar a "toca do urso", para enfrentar o circulo social, as questões que se apresentam na escola, o mundo de maneira geral e eles mesmos. Afinal estamos falando de adolescentes.

Uma fase que exige deles auto-percepcão, autoconhecimento, análise e enfrentamento das questões internas e externas. É aquele famoso "se reconhecer no mundo, pra se colocar no mundo". "Os adolescentes estão tendo uma retomada de todos os conflitos que a própria idade já exige deles e é difícil", fala Marcelo.

"Eles estavam muito isolados, sem ter que precisar conviver com aquela vida adolescente. Todo convívio social, a dinâmica das relações, dos afetos na classe, da condição de ser visto como um sujeito por inteiro estavam suspensas. E eles com muitas proteções dentro de casa, tanto da tela quanto na escola. Podiam colar nas provas, podiam se retirar dos enfrentamentos sociais, do olhar do outro, de tudo. E agora com a obrigação de um certo retorno começou a disparar muita coisa. A sensação de desamparo não está mais na solidão, mas na reinserção no mundo compartilhado".

O reflexo da pandemia nos adolescentes já extrapolou as quatro paredes do quarto. Por muito tempo, tivemos um isolamento dentro do isolamento e as dificuldades e os medos de se abrir as portas novamente estão aí. Alguns comemoraram o retorno à escola, ao circulo social da vida, outros estão com mais dificuldade e além de enfrentar o medo do mundo, precisam também enfrentar os medos internos.

Não sabemos, de fato, o quanto essas crises de pânico podem ser colocadas na conta da pandemia porque estudos ainda estão sendo feitos. É tudo muito recente e segundo o professor de Psiquiatria da Infância e Adolescência do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, dr. Guilherme Polanczyk, "o que a gente sabe é que pessoas ao longo do tempo vão apresentar esses sintomas. Sempre foi assim e vai ser. O que ainda não está claro é se a pandemia fez esse numero crescer em relação ao que surgiria realmente".

Polanczyk relata muitos casos de ansiedade e depressão entre adolescentes nos consultórios e confirma que sim, a pandemia certamente contribuiu para que esses sintomas surgissem de maneira a provocar doenças mentais como a síndrome do pânico. Só ainda não está claro se são 100% sintomas da pandemia.

"O fato desses casos terem alguma relação com a pandemia não quer dizer que eles não surgiriam sem a pandemia. Poderiam ter outros estressores que serviriam como gatilho porque a gente sabe que transtornos mentais são complexos e envolvem questões genéticas, experiências na infância, estressores pontuais e traços de temperamento. Mas sim, é provável que nesses casos a pandemia possa ter contribuído", reitera dr. Guilherme.

Entre as certezas que temos é que a pandemia nos deu um alerta para questões que possivelmente já estavam aí, talvez apenas à espera de um gatilho. Saúde mental é dos assuntos mais urgentes e contemporâneos. Precisamos olhar, falar e cuidar. Sejamos adultos, adolescentes ou crianças. Porque a vulnerabilidade é intrínseca ao ser humano.

Depois de um longo tempo em isolamento social, adolescentes apresentam crises de pânico ao se depararem com a volta às aulas presenciais e a rotina fora de casa

A volta às aulas e a retomada de uma certa normalidade na vida têm causado estresse para alguns adolescentes. O que para um determinado grupo tem sido motivo de comemoração, para outro tem gerado medo, insegurança e ansiedade. Todos possíveis gatilhos para uma crise de pânico. Depois de tanto tempo afastado dos amigos, da vida social e do ambiente escolar, um aumento de casos de pânico em adolescentes já foi percebido nos consultórios médicos e de psicologia.

Primeira semana de aula e poucos dias no presencial já foram suficientes para que o filho mais velho da publicitária Isabela Novaes tivesse a primeira crise. "Ele é um menino ansioso, mas até o momento não tinha apresentado nenhum comportamento que precisássemos cuidar ou estar mais atento", conta. "Ele simplesmente achou que ia morrer. Dizia que estava com dificuldade de respirar, o corpo tremia e o coração disparou. A única coisa a fazer era acalmá-lo, mas ficamos assustados".

Assusta presenciar a cena de um filho ou filha tendo uma crise de pânico. E está longe de não existir uma explicação mais concreta para o que está acontecendo. Os adolescentes tiveram um longo período em que a vida ficou suspensa e, de certa forma, puderam se manter escondidos em suas "tocas de urso" como apelidou o psicólogo Marcelo Wild Veiga, especialista nesta faixa etária.

 Foto: Estadão

"Eles ficaram uma etapa da vida hibernando, longe do convívio social, algo fundamental nesta etapa da vida. Na pandemia alguns já começaram a panicar quando começaram a sentir que não dava para ficar fora do mundo e, também, não dava para ficar dentro", fala. Para ele, o retorno está deixando tudo mais em flagrante. "A hora em que você sai para o mundo, é preciso lidar com ele, não dá apenas para desligar a câmera, fechar a porta do quarto e afastar os inúmeros conflitos, até mesmo viagens de férias se tornaram desafiadoras em toda a sua exposição. Temos visto acontecer e é um fato concreto", enfatiza.

E foi justamente nas férias que a família da Adriana Campos, historiadora, enfrentou o primeiro episódio com a filha adolescente de 17 anos. "Estávamos dentro do avião, sentados, com cinto e ela entrou em pânico. Disse que não conseguia ficar ali com aquele monte de gente, que não ia conseguir viajar, precisava sair. Saímos todos e não teve viagem", conta.

Camlia dos Santos Albuquerque também relata um acontecimento com o filho de 16 anos. "Com a volta às aulas, a escola dele fez algumas provas que eles chamam de avaliação diagnóstica que é só pra saber como o aluno voltou. Bom, agora é presencial né e até então ele vinha fazendo tudo online", desabafa Camila que no dia recebeu um telefonema da escola porque o filho tinha tido uma crise de pânico e estava na enfermaria no aguardo da mãe.

Assim como os filhos da Adriana, Isabela e Camila, outros têm tido crises de pânico como resposta ao que se chama de fobia social. As razões são exatamente as mesmas apontadas pelo psicólogo Marcelo Veiga. Um aumento de ansiedade e medo de sair de casa, ou deixar a "toca do urso", para enfrentar o circulo social, as questões que se apresentam na escola, o mundo de maneira geral e eles mesmos. Afinal estamos falando de adolescentes.

Uma fase que exige deles auto-percepcão, autoconhecimento, análise e enfrentamento das questões internas e externas. É aquele famoso "se reconhecer no mundo, pra se colocar no mundo". "Os adolescentes estão tendo uma retomada de todos os conflitos que a própria idade já exige deles e é difícil", fala Marcelo.

"Eles estavam muito isolados, sem ter que precisar conviver com aquela vida adolescente. Todo convívio social, a dinâmica das relações, dos afetos na classe, da condição de ser visto como um sujeito por inteiro estavam suspensas. E eles com muitas proteções dentro de casa, tanto da tela quanto na escola. Podiam colar nas provas, podiam se retirar dos enfrentamentos sociais, do olhar do outro, de tudo. E agora com a obrigação de um certo retorno começou a disparar muita coisa. A sensação de desamparo não está mais na solidão, mas na reinserção no mundo compartilhado".

O reflexo da pandemia nos adolescentes já extrapolou as quatro paredes do quarto. Por muito tempo, tivemos um isolamento dentro do isolamento e as dificuldades e os medos de se abrir as portas novamente estão aí. Alguns comemoraram o retorno à escola, ao circulo social da vida, outros estão com mais dificuldade e além de enfrentar o medo do mundo, precisam também enfrentar os medos internos.

Não sabemos, de fato, o quanto essas crises de pânico podem ser colocadas na conta da pandemia porque estudos ainda estão sendo feitos. É tudo muito recente e segundo o professor de Psiquiatria da Infância e Adolescência do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, dr. Guilherme Polanczyk, "o que a gente sabe é que pessoas ao longo do tempo vão apresentar esses sintomas. Sempre foi assim e vai ser. O que ainda não está claro é se a pandemia fez esse numero crescer em relação ao que surgiria realmente".

Polanczyk relata muitos casos de ansiedade e depressão entre adolescentes nos consultórios e confirma que sim, a pandemia certamente contribuiu para que esses sintomas surgissem de maneira a provocar doenças mentais como a síndrome do pânico. Só ainda não está claro se são 100% sintomas da pandemia.

"O fato desses casos terem alguma relação com a pandemia não quer dizer que eles não surgiriam sem a pandemia. Poderiam ter outros estressores que serviriam como gatilho porque a gente sabe que transtornos mentais são complexos e envolvem questões genéticas, experiências na infância, estressores pontuais e traços de temperamento. Mas sim, é provável que nesses casos a pandemia possa ter contribuído", reitera dr. Guilherme.

Entre as certezas que temos é que a pandemia nos deu um alerta para questões que possivelmente já estavam aí, talvez apenas à espera de um gatilho. Saúde mental é dos assuntos mais urgentes e contemporâneos. Precisamos olhar, falar e cuidar. Sejamos adultos, adolescentes ou crianças. Porque a vulnerabilidade é intrínseca ao ser humano.

Depois de um longo tempo em isolamento social, adolescentes apresentam crises de pânico ao se depararem com a volta às aulas presenciais e a rotina fora de casa

A volta às aulas e a retomada de uma certa normalidade na vida têm causado estresse para alguns adolescentes. O que para um determinado grupo tem sido motivo de comemoração, para outro tem gerado medo, insegurança e ansiedade. Todos possíveis gatilhos para uma crise de pânico. Depois de tanto tempo afastado dos amigos, da vida social e do ambiente escolar, um aumento de casos de pânico em adolescentes já foi percebido nos consultórios médicos e de psicologia.

Primeira semana de aula e poucos dias no presencial já foram suficientes para que o filho mais velho da publicitária Isabela Novaes tivesse a primeira crise. "Ele é um menino ansioso, mas até o momento não tinha apresentado nenhum comportamento que precisássemos cuidar ou estar mais atento", conta. "Ele simplesmente achou que ia morrer. Dizia que estava com dificuldade de respirar, o corpo tremia e o coração disparou. A única coisa a fazer era acalmá-lo, mas ficamos assustados".

Assusta presenciar a cena de um filho ou filha tendo uma crise de pânico. E está longe de não existir uma explicação mais concreta para o que está acontecendo. Os adolescentes tiveram um longo período em que a vida ficou suspensa e, de certa forma, puderam se manter escondidos em suas "tocas de urso" como apelidou o psicólogo Marcelo Wild Veiga, especialista nesta faixa etária.

 Foto: Estadão

"Eles ficaram uma etapa da vida hibernando, longe do convívio social, algo fundamental nesta etapa da vida. Na pandemia alguns já começaram a panicar quando começaram a sentir que não dava para ficar fora do mundo e, também, não dava para ficar dentro", fala. Para ele, o retorno está deixando tudo mais em flagrante. "A hora em que você sai para o mundo, é preciso lidar com ele, não dá apenas para desligar a câmera, fechar a porta do quarto e afastar os inúmeros conflitos, até mesmo viagens de férias se tornaram desafiadoras em toda a sua exposição. Temos visto acontecer e é um fato concreto", enfatiza.

E foi justamente nas férias que a família da Adriana Campos, historiadora, enfrentou o primeiro episódio com a filha adolescente de 17 anos. "Estávamos dentro do avião, sentados, com cinto e ela entrou em pânico. Disse que não conseguia ficar ali com aquele monte de gente, que não ia conseguir viajar, precisava sair. Saímos todos e não teve viagem", conta.

Camlia dos Santos Albuquerque também relata um acontecimento com o filho de 16 anos. "Com a volta às aulas, a escola dele fez algumas provas que eles chamam de avaliação diagnóstica que é só pra saber como o aluno voltou. Bom, agora é presencial né e até então ele vinha fazendo tudo online", desabafa Camila que no dia recebeu um telefonema da escola porque o filho tinha tido uma crise de pânico e estava na enfermaria no aguardo da mãe.

Assim como os filhos da Adriana, Isabela e Camila, outros têm tido crises de pânico como resposta ao que se chama de fobia social. As razões são exatamente as mesmas apontadas pelo psicólogo Marcelo Veiga. Um aumento de ansiedade e medo de sair de casa, ou deixar a "toca do urso", para enfrentar o circulo social, as questões que se apresentam na escola, o mundo de maneira geral e eles mesmos. Afinal estamos falando de adolescentes.

Uma fase que exige deles auto-percepcão, autoconhecimento, análise e enfrentamento das questões internas e externas. É aquele famoso "se reconhecer no mundo, pra se colocar no mundo". "Os adolescentes estão tendo uma retomada de todos os conflitos que a própria idade já exige deles e é difícil", fala Marcelo.

"Eles estavam muito isolados, sem ter que precisar conviver com aquela vida adolescente. Todo convívio social, a dinâmica das relações, dos afetos na classe, da condição de ser visto como um sujeito por inteiro estavam suspensas. E eles com muitas proteções dentro de casa, tanto da tela quanto na escola. Podiam colar nas provas, podiam se retirar dos enfrentamentos sociais, do olhar do outro, de tudo. E agora com a obrigação de um certo retorno começou a disparar muita coisa. A sensação de desamparo não está mais na solidão, mas na reinserção no mundo compartilhado".

O reflexo da pandemia nos adolescentes já extrapolou as quatro paredes do quarto. Por muito tempo, tivemos um isolamento dentro do isolamento e as dificuldades e os medos de se abrir as portas novamente estão aí. Alguns comemoraram o retorno à escola, ao circulo social da vida, outros estão com mais dificuldade e além de enfrentar o medo do mundo, precisam também enfrentar os medos internos.

Não sabemos, de fato, o quanto essas crises de pânico podem ser colocadas na conta da pandemia porque estudos ainda estão sendo feitos. É tudo muito recente e segundo o professor de Psiquiatria da Infância e Adolescência do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, dr. Guilherme Polanczyk, "o que a gente sabe é que pessoas ao longo do tempo vão apresentar esses sintomas. Sempre foi assim e vai ser. O que ainda não está claro é se a pandemia fez esse numero crescer em relação ao que surgiria realmente".

Polanczyk relata muitos casos de ansiedade e depressão entre adolescentes nos consultórios e confirma que sim, a pandemia certamente contribuiu para que esses sintomas surgissem de maneira a provocar doenças mentais como a síndrome do pânico. Só ainda não está claro se são 100% sintomas da pandemia.

"O fato desses casos terem alguma relação com a pandemia não quer dizer que eles não surgiriam sem a pandemia. Poderiam ter outros estressores que serviriam como gatilho porque a gente sabe que transtornos mentais são complexos e envolvem questões genéticas, experiências na infância, estressores pontuais e traços de temperamento. Mas sim, é provável que nesses casos a pandemia possa ter contribuído", reitera dr. Guilherme.

Entre as certezas que temos é que a pandemia nos deu um alerta para questões que possivelmente já estavam aí, talvez apenas à espera de um gatilho. Saúde mental é dos assuntos mais urgentes e contemporâneos. Precisamos olhar, falar e cuidar. Sejamos adultos, adolescentes ou crianças. Porque a vulnerabilidade é intrínseca ao ser humano.

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