Comportamento Adolescente e Educação

Protagonismo nas escolas: meninas lideram ações e movimentos


Por Carolina Delboni

Quatro meninas contam como suas histórias mobilizaram ações de protagonismo dentro das escolas e nas comunidades onde vivem

Foi-se o tempo em que falar de meninas na escola se restringia ao estereótipo das paqueras no recreio e os acontecimentos cotidianos. As meninas de 2021 estão muito mais preocupadas em resolver questões sociais, a batalhar pelas minorias e fazer com que os meninos entendam que o comportamento machista não tem mais espaço no mundo.

Elas ainda não foram escolhidas como "personalidade do ano" pela revista Forbes ou ganharam a capa da Time com um feito internacional, mas elas têm protagonizado mudanças pra lá de relevantes dentro de suas próprias escolas e comunidades. O papel delas é fundamental para a construção de uma sociedade onde políticas públicas possam ser pensadas - e construídas - com uma base maior de equidade de gênero, raça e posição social.

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Quatro meninas contam como suas histórias e incômodos pessoais as levaram a pensar e protagonizar projetos que provocavam mudanças sociais e não apenas individuais.

Nayara Teixeira, 17 anos, São Paulo, capital "Sou bolsista em projetos estudantis desde 2018, quando fui aprovada no Ismart, um instituto que seleciona alunos de baixa renda para estudar em escolas de excelência. Ao sair da periferia e adentrar espaços elitizados, enquanto mulher preta e periférica, muitas vezes senti que minhas demandas, como a questão racial, as disparidades socioeconômicas e todas as intersecções necessárias em debates feministas, não eram postas em pauta.

Foi conversando com amigas, em especial, com Andressa Sayuri Morishima Teixeira, que compreendi que esse incômodo não era só meu, mas sim de muitas meninas da escola. Decidimos fundar um clube feminista na escola que se chamava Clube Vênus Girl Up que só pode nascer por conta do bootcamp que a Andressa fez com o Girl Up Brasil.

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A ideia era criar um espaço seguro, onde as meninas do colégio pudessem compartilhar questões diversas e serem acolhidas. Acabou que o clube cresceu muito! Como grupo, realizamos o "Aulão ENEM Solidário" para alunos da rede pública de educação, onde arrecadamos dinheiro para garantir acesso à internet de um cursinho popular. Outra ação solidária importante foi nossa mega arrecadação de absorvente para mulheres em situação vulnerável. Impactamos mais de 1200 mulheres.

Junto dessas ações, conhecemos o Clube Elza Soares que havia protocolado e aprovado um projeto de lei no Rio de Janeiro o qual garantia a inclusão de absorventes nas cestas básicas do estado. Foi a partir deste contexto que nosso Clube, unido aos clubes do Girl Up de todo o Brasil, passou a se empenhar em uma grande ação: protocolar projetos de leis similares ao do Rio de Janeiro em diversos estados brasileiros. Não acreditávamos que íamos alcançar tantas pessoas, mas basta começar. A mudança é possível e necessária."

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Nayara durante o PoliONU (um modelo de simulação da ONU organizado e protagonizado pelos alunos da escola) onde foi mesa diretora de um comitê sobre poluição industrial e o descarte inadequado de resíduos Foto: Estadão

Luísa Manoela, 17 anos, Poços de Caldas, Minas Gerais "Como diz Elza Soares, 'Meu país é meu lugar de fala'. É onde começa a história de quem somos, mudando a nós mesmos e então a sociedade ao nosso redor. E Luísa é sobre isso. Ao invés de supor soluções, eu sempre procurei entender as raízes dos problemas de minha comunidade, para então ecoar a minha voz. E pensando nisso, aos 12 anos, peguei uma sacola com livros e fui até um asilo de mulheres que ficava em cima de minha antiga casa. O primeiro dia tornaram-se 2 anos de conversas e histórias profundas.

Também sempre fui fascinada pelas ciências e tecnologia e quando entrei no Técnico do Médio, no Instituto Federal de Muzambinho, me engajei no CNPq (Centro Nacional de Pesquisa) e em olimpíadas científicas. Na mesma época, por não concordar com o fato de estudantes de escolas públicas e adultos que não terminavam o Ensino Médio não terem acesso à uma educação de qualidade e humanizada, fundei e passei a liderar o Guardiões da Educação, projeto que oferece mentorias para ENEM, olimpíadas científicas, oportunidades nacionais e internacionais (focadas no ensino médio) e idiomas (inglês e espanhol); e que ainda oferece extracurriculares, como aulas de educação ambiental, política apartidária e programação, e clubes.

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Hoje, após 9 meses de iniciativa, já são mais de 1000 pessoas impactadas diretamente de 18 estados brasileiros e tudo é feito de forma voluntária através de uma equipe de 32 jovens engajados que se uniram para transformar a educação brasileira. E comunidade é a chave do projeto: a liderança é horizontalizada, de modo que todos têm papel de líder ao trabalhar colaborativamente. A iniciativa é 100% voluntária e sem fins lucrativos e conta com orientação psicológica oferecida por psicólogos voluntários e em parceria com a Rede AutoEstima-se."

Luísa em entrega voluntária de arrecadações que fizeram durante a pandemia para grupo de pessoas em vulnerabilidade  Foto: Estadão
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Rebeca Souza, 17 anos, Aracajú, Sergipe "Sempre fui apaixonada por política e gostava muito de conversar com meu pai sobre o que estava acontecendo no país e no mundo. Sempre fui muito determinada, ou teimosa, e também convicta de que minhas opiniões e ações podiam agregar àquele meio que eu vivia. Mas mesmo muito confiante, percebia que era ignorada, alguns até pediam, 'educadamente' pra que eu ficasse quieta. Outros alegavam que não tinha idade suficiente para debater sobre política e isso me incomodava tanto! Eu tinha opinião, por que não podia expressá-la?

Entrei na pré-adolescência e encontrei no movimento feminista visões com as quais me identifiquei muito. Era um lugar onde eu podia falar de política. Uma amiga e alguns professores da escola me deram força e consegui encontrar minha voz. Entrei para o Girl Up e comecei a participar de debates e movimentos com pautas diversas. E foi neste lugar que entendi que minha idade não era um empecilho.

Desenvolvi vários projetos, mas queria destacar a PL sobre Pobreza Menstrual, assunto que é tão tabu, mas biologicamente natural. Uma pauta que já avançou em alguns estados, mas aqui em SE estamos começando a alavancar.

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E estamos tirando do forno o Movimento Democratizou cujo intuito é defender e democratizar a política através de conteúdo em redes sociais. O movimento surgiu da análise das necessidades de falar e entender política, de forma simples, direta e apartidária para os jovens e adultos, porque somos os eleitores e os que detém o poder de colocar pessoas para nos representar.

Cada dia tenho mais e mais certeza que quero ser a futura presidenta do Brasil. Lembro que quando Dilma Rousseff foi eleita, apesar do impeachment que ela sofreu, ver uma mulher no cargo mais importante do país é um indício que as coisas podem mudar e isso me emociona e me inspira a chegar um dia nessa mesma posição, na qual eu consiga combater o machismo, atender as necessidades da população e ser uma agente de mudanças no maior cargo do Brasil.

Rebeca com coletivo de meninas que discutem política e maneiras de democratizá-la  Foto: Estadão

Isabelle Christina, 18 anos, filha da Regiane, 42, ambas do Grajaú "Fiz meu primeiro intercâmbio aos 13 anos e fui bolsista no Colégio Bandeirantes, pelo Ismart (Instituto Social para Motivar, Apoiar e Reconhecer Talentos). Sempre me vi como uma das únicas meninas negras em todos esses contextos e comecei a me sentir muito negligente de não exercer meu papel de agente multiplicadora para transformar essa realidade e gerar oportunidades para jovens do mesmo ponto de partida que eu.

Minha mãe foi fundamental. Ela sofreu muito preconceito por ser negra e decidiu que eu não teria uma vida como a que ela teve, e que a educação seria a base do sucesso. Nunca me deu bonecas, me dava livros. Em 2017, eu e minha mãe fundamos o Projeto Meninas Negras, com 10 meninas participantes. A proposta era inserir meninas afrodescendentes de 12 a 24 anos nos parâmetros acadêmicos, profissionais e culturais preparando para que fossem jovens negras protagonistas.

Desde o princípio, o Projeto Meninas Negras se enxerga como uma ponte entre as oportunidades e as pessoas que não possuem acesso a elas devido a má? distribuição social. Nosso foco principal é ensinar as pessoas a sonhar muito grande! Só? assim poderão se tornar protagonistas de suas vidas e, consequentemente, conseguirão criar as próprias oportunidades.

Hoje o projeto também atende a demanda da periferia em geral, incluindo meninos e jovens não negros. E começamos a atender estudantes que vivem em abrigo, sem a família. Inclusão é para todo mundo. Eu apresentei o projeto num fórum da ONU e acredito que as instituições e empresas precisam ser treinadas. Devem mudar muito mais do que seus processos seletivos, precisam transformar toda uma cultura, um mindset. E de menina em menina a gente vai mudando o mundo."

Isabelle e a mãe Regiane que para além do papel maternal, acompanha a filha em todas as empreitadas  Foto: Estadão

Quatro meninas contam como suas histórias mobilizaram ações de protagonismo dentro das escolas e nas comunidades onde vivem

Foi-se o tempo em que falar de meninas na escola se restringia ao estereótipo das paqueras no recreio e os acontecimentos cotidianos. As meninas de 2021 estão muito mais preocupadas em resolver questões sociais, a batalhar pelas minorias e fazer com que os meninos entendam que o comportamento machista não tem mais espaço no mundo.

Elas ainda não foram escolhidas como "personalidade do ano" pela revista Forbes ou ganharam a capa da Time com um feito internacional, mas elas têm protagonizado mudanças pra lá de relevantes dentro de suas próprias escolas e comunidades. O papel delas é fundamental para a construção de uma sociedade onde políticas públicas possam ser pensadas - e construídas - com uma base maior de equidade de gênero, raça e posição social.

Quatro meninas contam como suas histórias e incômodos pessoais as levaram a pensar e protagonizar projetos que provocavam mudanças sociais e não apenas individuais.

Nayara Teixeira, 17 anos, São Paulo, capital "Sou bolsista em projetos estudantis desde 2018, quando fui aprovada no Ismart, um instituto que seleciona alunos de baixa renda para estudar em escolas de excelência. Ao sair da periferia e adentrar espaços elitizados, enquanto mulher preta e periférica, muitas vezes senti que minhas demandas, como a questão racial, as disparidades socioeconômicas e todas as intersecções necessárias em debates feministas, não eram postas em pauta.

Foi conversando com amigas, em especial, com Andressa Sayuri Morishima Teixeira, que compreendi que esse incômodo não era só meu, mas sim de muitas meninas da escola. Decidimos fundar um clube feminista na escola que se chamava Clube Vênus Girl Up que só pode nascer por conta do bootcamp que a Andressa fez com o Girl Up Brasil.

A ideia era criar um espaço seguro, onde as meninas do colégio pudessem compartilhar questões diversas e serem acolhidas. Acabou que o clube cresceu muito! Como grupo, realizamos o "Aulão ENEM Solidário" para alunos da rede pública de educação, onde arrecadamos dinheiro para garantir acesso à internet de um cursinho popular. Outra ação solidária importante foi nossa mega arrecadação de absorvente para mulheres em situação vulnerável. Impactamos mais de 1200 mulheres.

Junto dessas ações, conhecemos o Clube Elza Soares que havia protocolado e aprovado um projeto de lei no Rio de Janeiro o qual garantia a inclusão de absorventes nas cestas básicas do estado. Foi a partir deste contexto que nosso Clube, unido aos clubes do Girl Up de todo o Brasil, passou a se empenhar em uma grande ação: protocolar projetos de leis similares ao do Rio de Janeiro em diversos estados brasileiros. Não acreditávamos que íamos alcançar tantas pessoas, mas basta começar. A mudança é possível e necessária."

Nayara durante o PoliONU (um modelo de simulação da ONU organizado e protagonizado pelos alunos da escola) onde foi mesa diretora de um comitê sobre poluição industrial e o descarte inadequado de resíduos Foto: Estadão

Luísa Manoela, 17 anos, Poços de Caldas, Minas Gerais "Como diz Elza Soares, 'Meu país é meu lugar de fala'. É onde começa a história de quem somos, mudando a nós mesmos e então a sociedade ao nosso redor. E Luísa é sobre isso. Ao invés de supor soluções, eu sempre procurei entender as raízes dos problemas de minha comunidade, para então ecoar a minha voz. E pensando nisso, aos 12 anos, peguei uma sacola com livros e fui até um asilo de mulheres que ficava em cima de minha antiga casa. O primeiro dia tornaram-se 2 anos de conversas e histórias profundas.

Também sempre fui fascinada pelas ciências e tecnologia e quando entrei no Técnico do Médio, no Instituto Federal de Muzambinho, me engajei no CNPq (Centro Nacional de Pesquisa) e em olimpíadas científicas. Na mesma época, por não concordar com o fato de estudantes de escolas públicas e adultos que não terminavam o Ensino Médio não terem acesso à uma educação de qualidade e humanizada, fundei e passei a liderar o Guardiões da Educação, projeto que oferece mentorias para ENEM, olimpíadas científicas, oportunidades nacionais e internacionais (focadas no ensino médio) e idiomas (inglês e espanhol); e que ainda oferece extracurriculares, como aulas de educação ambiental, política apartidária e programação, e clubes.

Hoje, após 9 meses de iniciativa, já são mais de 1000 pessoas impactadas diretamente de 18 estados brasileiros e tudo é feito de forma voluntária através de uma equipe de 32 jovens engajados que se uniram para transformar a educação brasileira. E comunidade é a chave do projeto: a liderança é horizontalizada, de modo que todos têm papel de líder ao trabalhar colaborativamente. A iniciativa é 100% voluntária e sem fins lucrativos e conta com orientação psicológica oferecida por psicólogos voluntários e em parceria com a Rede AutoEstima-se."

Luísa em entrega voluntária de arrecadações que fizeram durante a pandemia para grupo de pessoas em vulnerabilidade  Foto: Estadão

Rebeca Souza, 17 anos, Aracajú, Sergipe "Sempre fui apaixonada por política e gostava muito de conversar com meu pai sobre o que estava acontecendo no país e no mundo. Sempre fui muito determinada, ou teimosa, e também convicta de que minhas opiniões e ações podiam agregar àquele meio que eu vivia. Mas mesmo muito confiante, percebia que era ignorada, alguns até pediam, 'educadamente' pra que eu ficasse quieta. Outros alegavam que não tinha idade suficiente para debater sobre política e isso me incomodava tanto! Eu tinha opinião, por que não podia expressá-la?

Entrei na pré-adolescência e encontrei no movimento feminista visões com as quais me identifiquei muito. Era um lugar onde eu podia falar de política. Uma amiga e alguns professores da escola me deram força e consegui encontrar minha voz. Entrei para o Girl Up e comecei a participar de debates e movimentos com pautas diversas. E foi neste lugar que entendi que minha idade não era um empecilho.

Desenvolvi vários projetos, mas queria destacar a PL sobre Pobreza Menstrual, assunto que é tão tabu, mas biologicamente natural. Uma pauta que já avançou em alguns estados, mas aqui em SE estamos começando a alavancar.

E estamos tirando do forno o Movimento Democratizou cujo intuito é defender e democratizar a política através de conteúdo em redes sociais. O movimento surgiu da análise das necessidades de falar e entender política, de forma simples, direta e apartidária para os jovens e adultos, porque somos os eleitores e os que detém o poder de colocar pessoas para nos representar.

Cada dia tenho mais e mais certeza que quero ser a futura presidenta do Brasil. Lembro que quando Dilma Rousseff foi eleita, apesar do impeachment que ela sofreu, ver uma mulher no cargo mais importante do país é um indício que as coisas podem mudar e isso me emociona e me inspira a chegar um dia nessa mesma posição, na qual eu consiga combater o machismo, atender as necessidades da população e ser uma agente de mudanças no maior cargo do Brasil.

Rebeca com coletivo de meninas que discutem política e maneiras de democratizá-la  Foto: Estadão

Isabelle Christina, 18 anos, filha da Regiane, 42, ambas do Grajaú "Fiz meu primeiro intercâmbio aos 13 anos e fui bolsista no Colégio Bandeirantes, pelo Ismart (Instituto Social para Motivar, Apoiar e Reconhecer Talentos). Sempre me vi como uma das únicas meninas negras em todos esses contextos e comecei a me sentir muito negligente de não exercer meu papel de agente multiplicadora para transformar essa realidade e gerar oportunidades para jovens do mesmo ponto de partida que eu.

Minha mãe foi fundamental. Ela sofreu muito preconceito por ser negra e decidiu que eu não teria uma vida como a que ela teve, e que a educação seria a base do sucesso. Nunca me deu bonecas, me dava livros. Em 2017, eu e minha mãe fundamos o Projeto Meninas Negras, com 10 meninas participantes. A proposta era inserir meninas afrodescendentes de 12 a 24 anos nos parâmetros acadêmicos, profissionais e culturais preparando para que fossem jovens negras protagonistas.

Desde o princípio, o Projeto Meninas Negras se enxerga como uma ponte entre as oportunidades e as pessoas que não possuem acesso a elas devido a má? distribuição social. Nosso foco principal é ensinar as pessoas a sonhar muito grande! Só? assim poderão se tornar protagonistas de suas vidas e, consequentemente, conseguirão criar as próprias oportunidades.

Hoje o projeto também atende a demanda da periferia em geral, incluindo meninos e jovens não negros. E começamos a atender estudantes que vivem em abrigo, sem a família. Inclusão é para todo mundo. Eu apresentei o projeto num fórum da ONU e acredito que as instituições e empresas precisam ser treinadas. Devem mudar muito mais do que seus processos seletivos, precisam transformar toda uma cultura, um mindset. E de menina em menina a gente vai mudando o mundo."

Isabelle e a mãe Regiane que para além do papel maternal, acompanha a filha em todas as empreitadas  Foto: Estadão

Quatro meninas contam como suas histórias mobilizaram ações de protagonismo dentro das escolas e nas comunidades onde vivem

Foi-se o tempo em que falar de meninas na escola se restringia ao estereótipo das paqueras no recreio e os acontecimentos cotidianos. As meninas de 2021 estão muito mais preocupadas em resolver questões sociais, a batalhar pelas minorias e fazer com que os meninos entendam que o comportamento machista não tem mais espaço no mundo.

Elas ainda não foram escolhidas como "personalidade do ano" pela revista Forbes ou ganharam a capa da Time com um feito internacional, mas elas têm protagonizado mudanças pra lá de relevantes dentro de suas próprias escolas e comunidades. O papel delas é fundamental para a construção de uma sociedade onde políticas públicas possam ser pensadas - e construídas - com uma base maior de equidade de gênero, raça e posição social.

Quatro meninas contam como suas histórias e incômodos pessoais as levaram a pensar e protagonizar projetos que provocavam mudanças sociais e não apenas individuais.

Nayara Teixeira, 17 anos, São Paulo, capital "Sou bolsista em projetos estudantis desde 2018, quando fui aprovada no Ismart, um instituto que seleciona alunos de baixa renda para estudar em escolas de excelência. Ao sair da periferia e adentrar espaços elitizados, enquanto mulher preta e periférica, muitas vezes senti que minhas demandas, como a questão racial, as disparidades socioeconômicas e todas as intersecções necessárias em debates feministas, não eram postas em pauta.

Foi conversando com amigas, em especial, com Andressa Sayuri Morishima Teixeira, que compreendi que esse incômodo não era só meu, mas sim de muitas meninas da escola. Decidimos fundar um clube feminista na escola que se chamava Clube Vênus Girl Up que só pode nascer por conta do bootcamp que a Andressa fez com o Girl Up Brasil.

A ideia era criar um espaço seguro, onde as meninas do colégio pudessem compartilhar questões diversas e serem acolhidas. Acabou que o clube cresceu muito! Como grupo, realizamos o "Aulão ENEM Solidário" para alunos da rede pública de educação, onde arrecadamos dinheiro para garantir acesso à internet de um cursinho popular. Outra ação solidária importante foi nossa mega arrecadação de absorvente para mulheres em situação vulnerável. Impactamos mais de 1200 mulheres.

Junto dessas ações, conhecemos o Clube Elza Soares que havia protocolado e aprovado um projeto de lei no Rio de Janeiro o qual garantia a inclusão de absorventes nas cestas básicas do estado. Foi a partir deste contexto que nosso Clube, unido aos clubes do Girl Up de todo o Brasil, passou a se empenhar em uma grande ação: protocolar projetos de leis similares ao do Rio de Janeiro em diversos estados brasileiros. Não acreditávamos que íamos alcançar tantas pessoas, mas basta começar. A mudança é possível e necessária."

Nayara durante o PoliONU (um modelo de simulação da ONU organizado e protagonizado pelos alunos da escola) onde foi mesa diretora de um comitê sobre poluição industrial e o descarte inadequado de resíduos Foto: Estadão

Luísa Manoela, 17 anos, Poços de Caldas, Minas Gerais "Como diz Elza Soares, 'Meu país é meu lugar de fala'. É onde começa a história de quem somos, mudando a nós mesmos e então a sociedade ao nosso redor. E Luísa é sobre isso. Ao invés de supor soluções, eu sempre procurei entender as raízes dos problemas de minha comunidade, para então ecoar a minha voz. E pensando nisso, aos 12 anos, peguei uma sacola com livros e fui até um asilo de mulheres que ficava em cima de minha antiga casa. O primeiro dia tornaram-se 2 anos de conversas e histórias profundas.

Também sempre fui fascinada pelas ciências e tecnologia e quando entrei no Técnico do Médio, no Instituto Federal de Muzambinho, me engajei no CNPq (Centro Nacional de Pesquisa) e em olimpíadas científicas. Na mesma época, por não concordar com o fato de estudantes de escolas públicas e adultos que não terminavam o Ensino Médio não terem acesso à uma educação de qualidade e humanizada, fundei e passei a liderar o Guardiões da Educação, projeto que oferece mentorias para ENEM, olimpíadas científicas, oportunidades nacionais e internacionais (focadas no ensino médio) e idiomas (inglês e espanhol); e que ainda oferece extracurriculares, como aulas de educação ambiental, política apartidária e programação, e clubes.

Hoje, após 9 meses de iniciativa, já são mais de 1000 pessoas impactadas diretamente de 18 estados brasileiros e tudo é feito de forma voluntária através de uma equipe de 32 jovens engajados que se uniram para transformar a educação brasileira. E comunidade é a chave do projeto: a liderança é horizontalizada, de modo que todos têm papel de líder ao trabalhar colaborativamente. A iniciativa é 100% voluntária e sem fins lucrativos e conta com orientação psicológica oferecida por psicólogos voluntários e em parceria com a Rede AutoEstima-se."

Luísa em entrega voluntária de arrecadações que fizeram durante a pandemia para grupo de pessoas em vulnerabilidade  Foto: Estadão

Rebeca Souza, 17 anos, Aracajú, Sergipe "Sempre fui apaixonada por política e gostava muito de conversar com meu pai sobre o que estava acontecendo no país e no mundo. Sempre fui muito determinada, ou teimosa, e também convicta de que minhas opiniões e ações podiam agregar àquele meio que eu vivia. Mas mesmo muito confiante, percebia que era ignorada, alguns até pediam, 'educadamente' pra que eu ficasse quieta. Outros alegavam que não tinha idade suficiente para debater sobre política e isso me incomodava tanto! Eu tinha opinião, por que não podia expressá-la?

Entrei na pré-adolescência e encontrei no movimento feminista visões com as quais me identifiquei muito. Era um lugar onde eu podia falar de política. Uma amiga e alguns professores da escola me deram força e consegui encontrar minha voz. Entrei para o Girl Up e comecei a participar de debates e movimentos com pautas diversas. E foi neste lugar que entendi que minha idade não era um empecilho.

Desenvolvi vários projetos, mas queria destacar a PL sobre Pobreza Menstrual, assunto que é tão tabu, mas biologicamente natural. Uma pauta que já avançou em alguns estados, mas aqui em SE estamos começando a alavancar.

E estamos tirando do forno o Movimento Democratizou cujo intuito é defender e democratizar a política através de conteúdo em redes sociais. O movimento surgiu da análise das necessidades de falar e entender política, de forma simples, direta e apartidária para os jovens e adultos, porque somos os eleitores e os que detém o poder de colocar pessoas para nos representar.

Cada dia tenho mais e mais certeza que quero ser a futura presidenta do Brasil. Lembro que quando Dilma Rousseff foi eleita, apesar do impeachment que ela sofreu, ver uma mulher no cargo mais importante do país é um indício que as coisas podem mudar e isso me emociona e me inspira a chegar um dia nessa mesma posição, na qual eu consiga combater o machismo, atender as necessidades da população e ser uma agente de mudanças no maior cargo do Brasil.

Rebeca com coletivo de meninas que discutem política e maneiras de democratizá-la  Foto: Estadão

Isabelle Christina, 18 anos, filha da Regiane, 42, ambas do Grajaú "Fiz meu primeiro intercâmbio aos 13 anos e fui bolsista no Colégio Bandeirantes, pelo Ismart (Instituto Social para Motivar, Apoiar e Reconhecer Talentos). Sempre me vi como uma das únicas meninas negras em todos esses contextos e comecei a me sentir muito negligente de não exercer meu papel de agente multiplicadora para transformar essa realidade e gerar oportunidades para jovens do mesmo ponto de partida que eu.

Minha mãe foi fundamental. Ela sofreu muito preconceito por ser negra e decidiu que eu não teria uma vida como a que ela teve, e que a educação seria a base do sucesso. Nunca me deu bonecas, me dava livros. Em 2017, eu e minha mãe fundamos o Projeto Meninas Negras, com 10 meninas participantes. A proposta era inserir meninas afrodescendentes de 12 a 24 anos nos parâmetros acadêmicos, profissionais e culturais preparando para que fossem jovens negras protagonistas.

Desde o princípio, o Projeto Meninas Negras se enxerga como uma ponte entre as oportunidades e as pessoas que não possuem acesso a elas devido a má? distribuição social. Nosso foco principal é ensinar as pessoas a sonhar muito grande! Só? assim poderão se tornar protagonistas de suas vidas e, consequentemente, conseguirão criar as próprias oportunidades.

Hoje o projeto também atende a demanda da periferia em geral, incluindo meninos e jovens não negros. E começamos a atender estudantes que vivem em abrigo, sem a família. Inclusão é para todo mundo. Eu apresentei o projeto num fórum da ONU e acredito que as instituições e empresas precisam ser treinadas. Devem mudar muito mais do que seus processos seletivos, precisam transformar toda uma cultura, um mindset. E de menina em menina a gente vai mudando o mundo."

Isabelle e a mãe Regiane que para além do papel maternal, acompanha a filha em todas as empreitadas  Foto: Estadão

Quatro meninas contam como suas histórias mobilizaram ações de protagonismo dentro das escolas e nas comunidades onde vivem

Foi-se o tempo em que falar de meninas na escola se restringia ao estereótipo das paqueras no recreio e os acontecimentos cotidianos. As meninas de 2021 estão muito mais preocupadas em resolver questões sociais, a batalhar pelas minorias e fazer com que os meninos entendam que o comportamento machista não tem mais espaço no mundo.

Elas ainda não foram escolhidas como "personalidade do ano" pela revista Forbes ou ganharam a capa da Time com um feito internacional, mas elas têm protagonizado mudanças pra lá de relevantes dentro de suas próprias escolas e comunidades. O papel delas é fundamental para a construção de uma sociedade onde políticas públicas possam ser pensadas - e construídas - com uma base maior de equidade de gênero, raça e posição social.

Quatro meninas contam como suas histórias e incômodos pessoais as levaram a pensar e protagonizar projetos que provocavam mudanças sociais e não apenas individuais.

Nayara Teixeira, 17 anos, São Paulo, capital "Sou bolsista em projetos estudantis desde 2018, quando fui aprovada no Ismart, um instituto que seleciona alunos de baixa renda para estudar em escolas de excelência. Ao sair da periferia e adentrar espaços elitizados, enquanto mulher preta e periférica, muitas vezes senti que minhas demandas, como a questão racial, as disparidades socioeconômicas e todas as intersecções necessárias em debates feministas, não eram postas em pauta.

Foi conversando com amigas, em especial, com Andressa Sayuri Morishima Teixeira, que compreendi que esse incômodo não era só meu, mas sim de muitas meninas da escola. Decidimos fundar um clube feminista na escola que se chamava Clube Vênus Girl Up que só pode nascer por conta do bootcamp que a Andressa fez com o Girl Up Brasil.

A ideia era criar um espaço seguro, onde as meninas do colégio pudessem compartilhar questões diversas e serem acolhidas. Acabou que o clube cresceu muito! Como grupo, realizamos o "Aulão ENEM Solidário" para alunos da rede pública de educação, onde arrecadamos dinheiro para garantir acesso à internet de um cursinho popular. Outra ação solidária importante foi nossa mega arrecadação de absorvente para mulheres em situação vulnerável. Impactamos mais de 1200 mulheres.

Junto dessas ações, conhecemos o Clube Elza Soares que havia protocolado e aprovado um projeto de lei no Rio de Janeiro o qual garantia a inclusão de absorventes nas cestas básicas do estado. Foi a partir deste contexto que nosso Clube, unido aos clubes do Girl Up de todo o Brasil, passou a se empenhar em uma grande ação: protocolar projetos de leis similares ao do Rio de Janeiro em diversos estados brasileiros. Não acreditávamos que íamos alcançar tantas pessoas, mas basta começar. A mudança é possível e necessária."

Nayara durante o PoliONU (um modelo de simulação da ONU organizado e protagonizado pelos alunos da escola) onde foi mesa diretora de um comitê sobre poluição industrial e o descarte inadequado de resíduos Foto: Estadão

Luísa Manoela, 17 anos, Poços de Caldas, Minas Gerais "Como diz Elza Soares, 'Meu país é meu lugar de fala'. É onde começa a história de quem somos, mudando a nós mesmos e então a sociedade ao nosso redor. E Luísa é sobre isso. Ao invés de supor soluções, eu sempre procurei entender as raízes dos problemas de minha comunidade, para então ecoar a minha voz. E pensando nisso, aos 12 anos, peguei uma sacola com livros e fui até um asilo de mulheres que ficava em cima de minha antiga casa. O primeiro dia tornaram-se 2 anos de conversas e histórias profundas.

Também sempre fui fascinada pelas ciências e tecnologia e quando entrei no Técnico do Médio, no Instituto Federal de Muzambinho, me engajei no CNPq (Centro Nacional de Pesquisa) e em olimpíadas científicas. Na mesma época, por não concordar com o fato de estudantes de escolas públicas e adultos que não terminavam o Ensino Médio não terem acesso à uma educação de qualidade e humanizada, fundei e passei a liderar o Guardiões da Educação, projeto que oferece mentorias para ENEM, olimpíadas científicas, oportunidades nacionais e internacionais (focadas no ensino médio) e idiomas (inglês e espanhol); e que ainda oferece extracurriculares, como aulas de educação ambiental, política apartidária e programação, e clubes.

Hoje, após 9 meses de iniciativa, já são mais de 1000 pessoas impactadas diretamente de 18 estados brasileiros e tudo é feito de forma voluntária através de uma equipe de 32 jovens engajados que se uniram para transformar a educação brasileira. E comunidade é a chave do projeto: a liderança é horizontalizada, de modo que todos têm papel de líder ao trabalhar colaborativamente. A iniciativa é 100% voluntária e sem fins lucrativos e conta com orientação psicológica oferecida por psicólogos voluntários e em parceria com a Rede AutoEstima-se."

Luísa em entrega voluntária de arrecadações que fizeram durante a pandemia para grupo de pessoas em vulnerabilidade  Foto: Estadão

Rebeca Souza, 17 anos, Aracajú, Sergipe "Sempre fui apaixonada por política e gostava muito de conversar com meu pai sobre o que estava acontecendo no país e no mundo. Sempre fui muito determinada, ou teimosa, e também convicta de que minhas opiniões e ações podiam agregar àquele meio que eu vivia. Mas mesmo muito confiante, percebia que era ignorada, alguns até pediam, 'educadamente' pra que eu ficasse quieta. Outros alegavam que não tinha idade suficiente para debater sobre política e isso me incomodava tanto! Eu tinha opinião, por que não podia expressá-la?

Entrei na pré-adolescência e encontrei no movimento feminista visões com as quais me identifiquei muito. Era um lugar onde eu podia falar de política. Uma amiga e alguns professores da escola me deram força e consegui encontrar minha voz. Entrei para o Girl Up e comecei a participar de debates e movimentos com pautas diversas. E foi neste lugar que entendi que minha idade não era um empecilho.

Desenvolvi vários projetos, mas queria destacar a PL sobre Pobreza Menstrual, assunto que é tão tabu, mas biologicamente natural. Uma pauta que já avançou em alguns estados, mas aqui em SE estamos começando a alavancar.

E estamos tirando do forno o Movimento Democratizou cujo intuito é defender e democratizar a política através de conteúdo em redes sociais. O movimento surgiu da análise das necessidades de falar e entender política, de forma simples, direta e apartidária para os jovens e adultos, porque somos os eleitores e os que detém o poder de colocar pessoas para nos representar.

Cada dia tenho mais e mais certeza que quero ser a futura presidenta do Brasil. Lembro que quando Dilma Rousseff foi eleita, apesar do impeachment que ela sofreu, ver uma mulher no cargo mais importante do país é um indício que as coisas podem mudar e isso me emociona e me inspira a chegar um dia nessa mesma posição, na qual eu consiga combater o machismo, atender as necessidades da população e ser uma agente de mudanças no maior cargo do Brasil.

Rebeca com coletivo de meninas que discutem política e maneiras de democratizá-la  Foto: Estadão

Isabelle Christina, 18 anos, filha da Regiane, 42, ambas do Grajaú "Fiz meu primeiro intercâmbio aos 13 anos e fui bolsista no Colégio Bandeirantes, pelo Ismart (Instituto Social para Motivar, Apoiar e Reconhecer Talentos). Sempre me vi como uma das únicas meninas negras em todos esses contextos e comecei a me sentir muito negligente de não exercer meu papel de agente multiplicadora para transformar essa realidade e gerar oportunidades para jovens do mesmo ponto de partida que eu.

Minha mãe foi fundamental. Ela sofreu muito preconceito por ser negra e decidiu que eu não teria uma vida como a que ela teve, e que a educação seria a base do sucesso. Nunca me deu bonecas, me dava livros. Em 2017, eu e minha mãe fundamos o Projeto Meninas Negras, com 10 meninas participantes. A proposta era inserir meninas afrodescendentes de 12 a 24 anos nos parâmetros acadêmicos, profissionais e culturais preparando para que fossem jovens negras protagonistas.

Desde o princípio, o Projeto Meninas Negras se enxerga como uma ponte entre as oportunidades e as pessoas que não possuem acesso a elas devido a má? distribuição social. Nosso foco principal é ensinar as pessoas a sonhar muito grande! Só? assim poderão se tornar protagonistas de suas vidas e, consequentemente, conseguirão criar as próprias oportunidades.

Hoje o projeto também atende a demanda da periferia em geral, incluindo meninos e jovens não negros. E começamos a atender estudantes que vivem em abrigo, sem a família. Inclusão é para todo mundo. Eu apresentei o projeto num fórum da ONU e acredito que as instituições e empresas precisam ser treinadas. Devem mudar muito mais do que seus processos seletivos, precisam transformar toda uma cultura, um mindset. E de menina em menina a gente vai mudando o mundo."

Isabelle e a mãe Regiane que para além do papel maternal, acompanha a filha em todas as empreitadas  Foto: Estadão

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