Comportamento Adolescente e Educação

Rolagem automática: a nova função do Tik Tok que deveria ser proibida


Por Carolina Delboni

Com tantas pesquisas e estudos que comprovam a relação entre o uso irrestrito das redes sociais e os danos à saúde mental de crianças e adolescentes, o Tik Tok lançou uma ferramenta que estimula ainda mais o uso desenfreado pela geração.

Há uma, até duas, décadas atrás, ninguém sabia ao certo o que seria da geração que cresceria conectada aos aparelhos eletrônicos. As crianças que nasceram nos anos 2000 são hoje adolescentes e jovens adultos. Foi a primeira geração que experimentou os jogos eletrônicos, desenhos e filmes em tablets. Aprenderam a baixar jogos, acessar o Youtube e dividir tempo de amigos e brincadeira com o aparelho. Em média, ganharam o primeiro celular aos 11 anos.

Mas quem nasceu nos anos 2010, começou o movimento muito mais cedo, nos anos iniciais da vida, os quais a gente chama de Primeira Infância. Essas crianças, chamadas de Geração Alpha, ganham o primeiro celular, em média, na faixa dos 8 anos de idade - 3 anos mais cedo que a geração anterior - segundo a pesquisa Crianças Digitais feita Kaspersky. Se isso tem consequências?

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Não para menos, essas crianças e adolescentes são as que mais enfrentam os efeitos colaterais do uso ilimitado de tablets e smartphones. São muito mais impacientes porque não aprenderam - e continuam sem aprender - a esperar. Têm uma série de retardos no desenvolvimento físico e motor do corpo porque brincaram menos, seja em parquinhos ou na natureza ou no apartamento dentro de casa.

São crianças e adolescentes que têm extrema dificuldade de usar um lápis ou pegar qualquer objeto que exija a pinça, como a gente chama. São também uma geração que têm frequentado consultórios de psicólogos e psiquiatras cada vez mais cedo. Sem falar na lista de especialistas que passam por conta do "não desenvolvimento esperado para a faixa etária".

É sabido que doenças crônicas, como ansiedade e depressão - que cresceram cerca 120% nos últimos três anos e atingem 36% das crianças e 60% dos adolescentes segundo dados da Unicef - podem ser combatidas com mudanças de hábitos como alimentação mais saudável, prática de atividades físicas, relacionamentos prazerosos e o uso controlado de aparelhos eletrônicos.

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Nada que não se saiba, mas tudo que parece termos perdido o controle. E não há como não se preocupar com todos esses problemas decorrentes do uso indevido dos aparelhos eletrônicos e das plataformas que lá habitam.

Principalmente porque as consequências danosas são indiscutíveis quando se observa o desenvolvimento integral, cognitivo e psicoemocional, de crianças e adolescentes. Mas precisamos buscar maneiras de nos relacionarmos mais equilibradas e saudáveis com a tecnologia e os recursos todos de entretenimento e relacionamento que ela nos proporciona porque essa é uma realidade que não entrará em extinção. O desafio é saber dosá-la.

foto Getty Image  
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O tempo que é considerado bom para navegar entre Youtube, Instagram e Tik Tok já é consenso entre médicos de áreas diversas de atuação: máximo de 2h entre 6 e 10 anos e 3h entre 11 e 18. Mas como fazer quando a rede social mais usada por crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos, segundo pesquisa TIC Kids Online Brasil 2022, disponibiliza um botão de rolagem automática?

Na contramão das indicações de todos os órgão e sociedades médicas que pedem restrições de tempo de uso nas redes sociais para crianças e adolescentes, a mais usada entre eles, lança um botão que facilita a permanência num looping de vídeos sugeridos, inclusive, pela própria plataforma.

O que isso significa? Que quando você ativa o botão de rolagem automática do Tik Tok ele fica passando vídeos sem precisar do seu dedinho jogando a tela para cima - veja, nem mais movimentar o dedo para cima eles precisam.

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Aliás, tem gente que nem mais segura o celular para assistir vídeos. Existem no mercado dois acessórios que deixam as mãos do usuário livre: o suporte de mesa que tem sido usado em escrivaninhas e camas, e o anel de rolagem.

Isso, os japoneses inventaram o "Tik Tok-anel de controle remoto bluetooth com anel de rolagem para iphone, ipad, android, ios, foto, mini, escala". E para além das questões abordadas aqui, existe ainda o fato dos vídeos que ficam num scroll infinito serem selecionados pela plataforma.

Propaganda japonesa mostra jovem deitada na cama com o anel Tok Tok de rolagem (foto divulgação)  
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A criança ou adolescente que está ali, quase que num processo de osmose, começa a ver sugestões de vídeos que podem - como não podem - ter relação com suas preferências. É assim quando adultos colocam o shuffle do Spotfy, certo?

Mas veja: shuffle significa embaralhar. O que a plataforma faz é um mix entre o que o usuário gosta e o que ela quer que você veja e, sem perceber, ela vai embaralhando os conteúdos e quando você percebe está vendo muito mais o que lhe é sugerido do que o que você procuraria ver. Percebe o perigo de tudo isso?

Há quem escolha não olhar para todos estes contextos disponíveis e continue obtendo uma suposta paz com a liberação indiscriminada dos aparelhos a seus filhos. Mas há quem escolha desafiar o que parece ser impossível.

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Se neste momento da humanidade, em que tantas pesquisas e estudos comprovam os danos causados pelas redes sociais no desenvolvimento emocional, psicológico e motor dos nossos filhos, não fizermos nenhum movimento de mudança, certamente, teremos que lidar com as próximas gerações de adultos com habilidades socioemocionais totalmente atrofiadas.

Em matéria recente no Financial Times, foi publicado o resultado da revisão de 28 estudos com o tema uso de redes sociais por jovens x riscos à saúde mental, pelo International Journal of Environmental Research and Public Health. O órgão examinou, ao todo, 49 artigos científicos publicados sobre distúrbios alimentares, depressão e doenças psicológicas.

A conclusão é de que quanto mais tempo os adolescentes passam nas redes sociais, maiores são os índices de transtornos mentais, além de outras consequências que podem ser adversas.

Outra, publicada no The Atlantic, em 2017, já questionava se os smartphones tinham a capacidade de destruir uma geração e mostrava como o suposto esconderijo das redes sociais dava a falsa sensação de segurança às pessoas que não precisavam se relacionar frente a frente.

Veja como eu uso a palavra "suposta/suposto" em vários momentos deste texto. Porque as redes sociais proporcionam isso: uma suposta segurança, uma suposta relação social com determinado grupo, um suposto pertencimento, um suposto reconhecimento, um suposto sucesso e por aí vai. Mas a que custas?

Estamos permitindo que crianças e adolescentes paguem o preço com sua própria saúde mental. E por quê? Por que passou a ser tão difícil determinar o tempo de tela? Por que os pais têm medo de impor limites aos filhos? Por que a gente ainda não entendeu que as plataformas precisam de regras como tudo na vida, no mundo?

Veja, eu vou fazer uma analogia bem básica para dar concretude à permissividade que reina nesse universo. Nenhum pai ou mãe em sã consciência daria uma caixa de Bis a seu filho, seja ele criança ou adolescente, e permitiria que ele comesse até o último chocolate do pacote, certo?

Ainda que o produto chame Bis e que esteja explicito o "coma mais", são 20 unidades que vem na caixinha. É muita coisa. Ninguém precisa comer 20 chocolates de uma vez, até porque quando isso acontece é espantoso. E se, por acaso, uma criança ou um adolescente adquire o hábito de comer 20 Bis, com certa frequência, sabemos todos que temos um problema de compulsão para lidar.

Então eu lhe pergunto: por que permitir que seu filho devore uma caixa de Bis todo dia nas redes sociais? Ou melhor: por que permitir que plataformas como Instagram e Tik Tok devorem o cérebro do teu filho? Fragilize o emocional dele que está em pleno desenvolvimento?

É preciso perder o medo de impor limites. É preciso retomar para si - pais - a responsabilidade de educar os próprios filhos. Não dá para continuar assistindo a deterioração emocional de uma geração praticamente inteira. Existe sim uma responsabilidade que é das plataformas, mas existe uma que é nossa.

Mas como fazer? O que fazer? Retomar o bom e velho diálogo. Aquele velho conhecido nosso onde duas ou mais pessoas conversam sobre um determinado assunto. Desde cedo, desde o momento em que se decide dar um aparelho eletrônico na mão de uma criança, é preciso conversar sobre tudo que existe como possibilidade ali dentro.

É preciso ensinar que não se pode aceitar bala de estranho. É preciso colocar regras - combinado não sai caro, lembra desse ditado? É preciso conhecer o ambiente, as plataformas, as pessoas que seu filho segue. Saiba quem são, assista os conteúdos deles para você poder conversar com seu filho sobre o que ele assiste.

Indique vídeos e matérias que ele também possa ler e se abastecer de outros conhecimentos. Amplie a visão que ele tem de determinada rede social ou pessoa que ele segue. Mostre e converse sobre pesquisas e estudos. Incentive a procurar amigos fora das redes e a fazer programas presenciais.

Estimule o esporte, crie ambientes saudáveis dentro de casa, ofereça programas com a família aos finais de semana, faça combinados como "celular na mesa não pode", puxe conversa, enfrente a cara feia, enfrente o suposto ataque ou chilique do seu filho. Não tenha medo.

Não tenha medo de dizer "não". Permissividade está longe de ser uma boa demonstração de amor. Crianças e adolescentes precisam de limites e contornos e se ausentar do seu papel como pai e mãe, definitivamente, não é uma solução. Coragem.

Com tantas pesquisas e estudos que comprovam a relação entre o uso irrestrito das redes sociais e os danos à saúde mental de crianças e adolescentes, o Tik Tok lançou uma ferramenta que estimula ainda mais o uso desenfreado pela geração.

Há uma, até duas, décadas atrás, ninguém sabia ao certo o que seria da geração que cresceria conectada aos aparelhos eletrônicos. As crianças que nasceram nos anos 2000 são hoje adolescentes e jovens adultos. Foi a primeira geração que experimentou os jogos eletrônicos, desenhos e filmes em tablets. Aprenderam a baixar jogos, acessar o Youtube e dividir tempo de amigos e brincadeira com o aparelho. Em média, ganharam o primeiro celular aos 11 anos.

Mas quem nasceu nos anos 2010, começou o movimento muito mais cedo, nos anos iniciais da vida, os quais a gente chama de Primeira Infância. Essas crianças, chamadas de Geração Alpha, ganham o primeiro celular, em média, na faixa dos 8 anos de idade - 3 anos mais cedo que a geração anterior - segundo a pesquisa Crianças Digitais feita Kaspersky. Se isso tem consequências?

Não para menos, essas crianças e adolescentes são as que mais enfrentam os efeitos colaterais do uso ilimitado de tablets e smartphones. São muito mais impacientes porque não aprenderam - e continuam sem aprender - a esperar. Têm uma série de retardos no desenvolvimento físico e motor do corpo porque brincaram menos, seja em parquinhos ou na natureza ou no apartamento dentro de casa.

São crianças e adolescentes que têm extrema dificuldade de usar um lápis ou pegar qualquer objeto que exija a pinça, como a gente chama. São também uma geração que têm frequentado consultórios de psicólogos e psiquiatras cada vez mais cedo. Sem falar na lista de especialistas que passam por conta do "não desenvolvimento esperado para a faixa etária".

É sabido que doenças crônicas, como ansiedade e depressão - que cresceram cerca 120% nos últimos três anos e atingem 36% das crianças e 60% dos adolescentes segundo dados da Unicef - podem ser combatidas com mudanças de hábitos como alimentação mais saudável, prática de atividades físicas, relacionamentos prazerosos e o uso controlado de aparelhos eletrônicos.

Nada que não se saiba, mas tudo que parece termos perdido o controle. E não há como não se preocupar com todos esses problemas decorrentes do uso indevido dos aparelhos eletrônicos e das plataformas que lá habitam.

Principalmente porque as consequências danosas são indiscutíveis quando se observa o desenvolvimento integral, cognitivo e psicoemocional, de crianças e adolescentes. Mas precisamos buscar maneiras de nos relacionarmos mais equilibradas e saudáveis com a tecnologia e os recursos todos de entretenimento e relacionamento que ela nos proporciona porque essa é uma realidade que não entrará em extinção. O desafio é saber dosá-la.

foto Getty Image  

O tempo que é considerado bom para navegar entre Youtube, Instagram e Tik Tok já é consenso entre médicos de áreas diversas de atuação: máximo de 2h entre 6 e 10 anos e 3h entre 11 e 18. Mas como fazer quando a rede social mais usada por crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos, segundo pesquisa TIC Kids Online Brasil 2022, disponibiliza um botão de rolagem automática?

Na contramão das indicações de todos os órgão e sociedades médicas que pedem restrições de tempo de uso nas redes sociais para crianças e adolescentes, a mais usada entre eles, lança um botão que facilita a permanência num looping de vídeos sugeridos, inclusive, pela própria plataforma.

O que isso significa? Que quando você ativa o botão de rolagem automática do Tik Tok ele fica passando vídeos sem precisar do seu dedinho jogando a tela para cima - veja, nem mais movimentar o dedo para cima eles precisam.

Aliás, tem gente que nem mais segura o celular para assistir vídeos. Existem no mercado dois acessórios que deixam as mãos do usuário livre: o suporte de mesa que tem sido usado em escrivaninhas e camas, e o anel de rolagem.

Isso, os japoneses inventaram o "Tik Tok-anel de controle remoto bluetooth com anel de rolagem para iphone, ipad, android, ios, foto, mini, escala". E para além das questões abordadas aqui, existe ainda o fato dos vídeos que ficam num scroll infinito serem selecionados pela plataforma.

Propaganda japonesa mostra jovem deitada na cama com o anel Tok Tok de rolagem (foto divulgação)  

A criança ou adolescente que está ali, quase que num processo de osmose, começa a ver sugestões de vídeos que podem - como não podem - ter relação com suas preferências. É assim quando adultos colocam o shuffle do Spotfy, certo?

Mas veja: shuffle significa embaralhar. O que a plataforma faz é um mix entre o que o usuário gosta e o que ela quer que você veja e, sem perceber, ela vai embaralhando os conteúdos e quando você percebe está vendo muito mais o que lhe é sugerido do que o que você procuraria ver. Percebe o perigo de tudo isso?

Há quem escolha não olhar para todos estes contextos disponíveis e continue obtendo uma suposta paz com a liberação indiscriminada dos aparelhos a seus filhos. Mas há quem escolha desafiar o que parece ser impossível.

Se neste momento da humanidade, em que tantas pesquisas e estudos comprovam os danos causados pelas redes sociais no desenvolvimento emocional, psicológico e motor dos nossos filhos, não fizermos nenhum movimento de mudança, certamente, teremos que lidar com as próximas gerações de adultos com habilidades socioemocionais totalmente atrofiadas.

Em matéria recente no Financial Times, foi publicado o resultado da revisão de 28 estudos com o tema uso de redes sociais por jovens x riscos à saúde mental, pelo International Journal of Environmental Research and Public Health. O órgão examinou, ao todo, 49 artigos científicos publicados sobre distúrbios alimentares, depressão e doenças psicológicas.

A conclusão é de que quanto mais tempo os adolescentes passam nas redes sociais, maiores são os índices de transtornos mentais, além de outras consequências que podem ser adversas.

Outra, publicada no The Atlantic, em 2017, já questionava se os smartphones tinham a capacidade de destruir uma geração e mostrava como o suposto esconderijo das redes sociais dava a falsa sensação de segurança às pessoas que não precisavam se relacionar frente a frente.

Veja como eu uso a palavra "suposta/suposto" em vários momentos deste texto. Porque as redes sociais proporcionam isso: uma suposta segurança, uma suposta relação social com determinado grupo, um suposto pertencimento, um suposto reconhecimento, um suposto sucesso e por aí vai. Mas a que custas?

Estamos permitindo que crianças e adolescentes paguem o preço com sua própria saúde mental. E por quê? Por que passou a ser tão difícil determinar o tempo de tela? Por que os pais têm medo de impor limites aos filhos? Por que a gente ainda não entendeu que as plataformas precisam de regras como tudo na vida, no mundo?

Veja, eu vou fazer uma analogia bem básica para dar concretude à permissividade que reina nesse universo. Nenhum pai ou mãe em sã consciência daria uma caixa de Bis a seu filho, seja ele criança ou adolescente, e permitiria que ele comesse até o último chocolate do pacote, certo?

Ainda que o produto chame Bis e que esteja explicito o "coma mais", são 20 unidades que vem na caixinha. É muita coisa. Ninguém precisa comer 20 chocolates de uma vez, até porque quando isso acontece é espantoso. E se, por acaso, uma criança ou um adolescente adquire o hábito de comer 20 Bis, com certa frequência, sabemos todos que temos um problema de compulsão para lidar.

Então eu lhe pergunto: por que permitir que seu filho devore uma caixa de Bis todo dia nas redes sociais? Ou melhor: por que permitir que plataformas como Instagram e Tik Tok devorem o cérebro do teu filho? Fragilize o emocional dele que está em pleno desenvolvimento?

É preciso perder o medo de impor limites. É preciso retomar para si - pais - a responsabilidade de educar os próprios filhos. Não dá para continuar assistindo a deterioração emocional de uma geração praticamente inteira. Existe sim uma responsabilidade que é das plataformas, mas existe uma que é nossa.

Mas como fazer? O que fazer? Retomar o bom e velho diálogo. Aquele velho conhecido nosso onde duas ou mais pessoas conversam sobre um determinado assunto. Desde cedo, desde o momento em que se decide dar um aparelho eletrônico na mão de uma criança, é preciso conversar sobre tudo que existe como possibilidade ali dentro.

É preciso ensinar que não se pode aceitar bala de estranho. É preciso colocar regras - combinado não sai caro, lembra desse ditado? É preciso conhecer o ambiente, as plataformas, as pessoas que seu filho segue. Saiba quem são, assista os conteúdos deles para você poder conversar com seu filho sobre o que ele assiste.

Indique vídeos e matérias que ele também possa ler e se abastecer de outros conhecimentos. Amplie a visão que ele tem de determinada rede social ou pessoa que ele segue. Mostre e converse sobre pesquisas e estudos. Incentive a procurar amigos fora das redes e a fazer programas presenciais.

Estimule o esporte, crie ambientes saudáveis dentro de casa, ofereça programas com a família aos finais de semana, faça combinados como "celular na mesa não pode", puxe conversa, enfrente a cara feia, enfrente o suposto ataque ou chilique do seu filho. Não tenha medo.

Não tenha medo de dizer "não". Permissividade está longe de ser uma boa demonstração de amor. Crianças e adolescentes precisam de limites e contornos e se ausentar do seu papel como pai e mãe, definitivamente, não é uma solução. Coragem.

Com tantas pesquisas e estudos que comprovam a relação entre o uso irrestrito das redes sociais e os danos à saúde mental de crianças e adolescentes, o Tik Tok lançou uma ferramenta que estimula ainda mais o uso desenfreado pela geração.

Há uma, até duas, décadas atrás, ninguém sabia ao certo o que seria da geração que cresceria conectada aos aparelhos eletrônicos. As crianças que nasceram nos anos 2000 são hoje adolescentes e jovens adultos. Foi a primeira geração que experimentou os jogos eletrônicos, desenhos e filmes em tablets. Aprenderam a baixar jogos, acessar o Youtube e dividir tempo de amigos e brincadeira com o aparelho. Em média, ganharam o primeiro celular aos 11 anos.

Mas quem nasceu nos anos 2010, começou o movimento muito mais cedo, nos anos iniciais da vida, os quais a gente chama de Primeira Infância. Essas crianças, chamadas de Geração Alpha, ganham o primeiro celular, em média, na faixa dos 8 anos de idade - 3 anos mais cedo que a geração anterior - segundo a pesquisa Crianças Digitais feita Kaspersky. Se isso tem consequências?

Não para menos, essas crianças e adolescentes são as que mais enfrentam os efeitos colaterais do uso ilimitado de tablets e smartphones. São muito mais impacientes porque não aprenderam - e continuam sem aprender - a esperar. Têm uma série de retardos no desenvolvimento físico e motor do corpo porque brincaram menos, seja em parquinhos ou na natureza ou no apartamento dentro de casa.

São crianças e adolescentes que têm extrema dificuldade de usar um lápis ou pegar qualquer objeto que exija a pinça, como a gente chama. São também uma geração que têm frequentado consultórios de psicólogos e psiquiatras cada vez mais cedo. Sem falar na lista de especialistas que passam por conta do "não desenvolvimento esperado para a faixa etária".

É sabido que doenças crônicas, como ansiedade e depressão - que cresceram cerca 120% nos últimos três anos e atingem 36% das crianças e 60% dos adolescentes segundo dados da Unicef - podem ser combatidas com mudanças de hábitos como alimentação mais saudável, prática de atividades físicas, relacionamentos prazerosos e o uso controlado de aparelhos eletrônicos.

Nada que não se saiba, mas tudo que parece termos perdido o controle. E não há como não se preocupar com todos esses problemas decorrentes do uso indevido dos aparelhos eletrônicos e das plataformas que lá habitam.

Principalmente porque as consequências danosas são indiscutíveis quando se observa o desenvolvimento integral, cognitivo e psicoemocional, de crianças e adolescentes. Mas precisamos buscar maneiras de nos relacionarmos mais equilibradas e saudáveis com a tecnologia e os recursos todos de entretenimento e relacionamento que ela nos proporciona porque essa é uma realidade que não entrará em extinção. O desafio é saber dosá-la.

foto Getty Image  

O tempo que é considerado bom para navegar entre Youtube, Instagram e Tik Tok já é consenso entre médicos de áreas diversas de atuação: máximo de 2h entre 6 e 10 anos e 3h entre 11 e 18. Mas como fazer quando a rede social mais usada por crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos, segundo pesquisa TIC Kids Online Brasil 2022, disponibiliza um botão de rolagem automática?

Na contramão das indicações de todos os órgão e sociedades médicas que pedem restrições de tempo de uso nas redes sociais para crianças e adolescentes, a mais usada entre eles, lança um botão que facilita a permanência num looping de vídeos sugeridos, inclusive, pela própria plataforma.

O que isso significa? Que quando você ativa o botão de rolagem automática do Tik Tok ele fica passando vídeos sem precisar do seu dedinho jogando a tela para cima - veja, nem mais movimentar o dedo para cima eles precisam.

Aliás, tem gente que nem mais segura o celular para assistir vídeos. Existem no mercado dois acessórios que deixam as mãos do usuário livre: o suporte de mesa que tem sido usado em escrivaninhas e camas, e o anel de rolagem.

Isso, os japoneses inventaram o "Tik Tok-anel de controle remoto bluetooth com anel de rolagem para iphone, ipad, android, ios, foto, mini, escala". E para além das questões abordadas aqui, existe ainda o fato dos vídeos que ficam num scroll infinito serem selecionados pela plataforma.

Propaganda japonesa mostra jovem deitada na cama com o anel Tok Tok de rolagem (foto divulgação)  

A criança ou adolescente que está ali, quase que num processo de osmose, começa a ver sugestões de vídeos que podem - como não podem - ter relação com suas preferências. É assim quando adultos colocam o shuffle do Spotfy, certo?

Mas veja: shuffle significa embaralhar. O que a plataforma faz é um mix entre o que o usuário gosta e o que ela quer que você veja e, sem perceber, ela vai embaralhando os conteúdos e quando você percebe está vendo muito mais o que lhe é sugerido do que o que você procuraria ver. Percebe o perigo de tudo isso?

Há quem escolha não olhar para todos estes contextos disponíveis e continue obtendo uma suposta paz com a liberação indiscriminada dos aparelhos a seus filhos. Mas há quem escolha desafiar o que parece ser impossível.

Se neste momento da humanidade, em que tantas pesquisas e estudos comprovam os danos causados pelas redes sociais no desenvolvimento emocional, psicológico e motor dos nossos filhos, não fizermos nenhum movimento de mudança, certamente, teremos que lidar com as próximas gerações de adultos com habilidades socioemocionais totalmente atrofiadas.

Em matéria recente no Financial Times, foi publicado o resultado da revisão de 28 estudos com o tema uso de redes sociais por jovens x riscos à saúde mental, pelo International Journal of Environmental Research and Public Health. O órgão examinou, ao todo, 49 artigos científicos publicados sobre distúrbios alimentares, depressão e doenças psicológicas.

A conclusão é de que quanto mais tempo os adolescentes passam nas redes sociais, maiores são os índices de transtornos mentais, além de outras consequências que podem ser adversas.

Outra, publicada no The Atlantic, em 2017, já questionava se os smartphones tinham a capacidade de destruir uma geração e mostrava como o suposto esconderijo das redes sociais dava a falsa sensação de segurança às pessoas que não precisavam se relacionar frente a frente.

Veja como eu uso a palavra "suposta/suposto" em vários momentos deste texto. Porque as redes sociais proporcionam isso: uma suposta segurança, uma suposta relação social com determinado grupo, um suposto pertencimento, um suposto reconhecimento, um suposto sucesso e por aí vai. Mas a que custas?

Estamos permitindo que crianças e adolescentes paguem o preço com sua própria saúde mental. E por quê? Por que passou a ser tão difícil determinar o tempo de tela? Por que os pais têm medo de impor limites aos filhos? Por que a gente ainda não entendeu que as plataformas precisam de regras como tudo na vida, no mundo?

Veja, eu vou fazer uma analogia bem básica para dar concretude à permissividade que reina nesse universo. Nenhum pai ou mãe em sã consciência daria uma caixa de Bis a seu filho, seja ele criança ou adolescente, e permitiria que ele comesse até o último chocolate do pacote, certo?

Ainda que o produto chame Bis e que esteja explicito o "coma mais", são 20 unidades que vem na caixinha. É muita coisa. Ninguém precisa comer 20 chocolates de uma vez, até porque quando isso acontece é espantoso. E se, por acaso, uma criança ou um adolescente adquire o hábito de comer 20 Bis, com certa frequência, sabemos todos que temos um problema de compulsão para lidar.

Então eu lhe pergunto: por que permitir que seu filho devore uma caixa de Bis todo dia nas redes sociais? Ou melhor: por que permitir que plataformas como Instagram e Tik Tok devorem o cérebro do teu filho? Fragilize o emocional dele que está em pleno desenvolvimento?

É preciso perder o medo de impor limites. É preciso retomar para si - pais - a responsabilidade de educar os próprios filhos. Não dá para continuar assistindo a deterioração emocional de uma geração praticamente inteira. Existe sim uma responsabilidade que é das plataformas, mas existe uma que é nossa.

Mas como fazer? O que fazer? Retomar o bom e velho diálogo. Aquele velho conhecido nosso onde duas ou mais pessoas conversam sobre um determinado assunto. Desde cedo, desde o momento em que se decide dar um aparelho eletrônico na mão de uma criança, é preciso conversar sobre tudo que existe como possibilidade ali dentro.

É preciso ensinar que não se pode aceitar bala de estranho. É preciso colocar regras - combinado não sai caro, lembra desse ditado? É preciso conhecer o ambiente, as plataformas, as pessoas que seu filho segue. Saiba quem são, assista os conteúdos deles para você poder conversar com seu filho sobre o que ele assiste.

Indique vídeos e matérias que ele também possa ler e se abastecer de outros conhecimentos. Amplie a visão que ele tem de determinada rede social ou pessoa que ele segue. Mostre e converse sobre pesquisas e estudos. Incentive a procurar amigos fora das redes e a fazer programas presenciais.

Estimule o esporte, crie ambientes saudáveis dentro de casa, ofereça programas com a família aos finais de semana, faça combinados como "celular na mesa não pode", puxe conversa, enfrente a cara feia, enfrente o suposto ataque ou chilique do seu filho. Não tenha medo.

Não tenha medo de dizer "não". Permissividade está longe de ser uma boa demonstração de amor. Crianças e adolescentes precisam de limites e contornos e se ausentar do seu papel como pai e mãe, definitivamente, não é uma solução. Coragem.

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