As relações humanas não são fáceis e, em se tratando de envolvimento amoroso, tudo é mais complexo. O momento da separação é extremamente doloroso na vida do indivíduo. Sentimentos como raiva, angústia, frustração, luto pelo relacionamento e tristeza invadem a pessoa e não é raro que surja o desejo de vingança. Em casos de divórcios não consensuais isso é mais evidente, na análise da psiquiatra Aline Machado Oliveira, especialista em Psicologia Clínica Junguiana. “Então, aquele membro do casal que está se sentindo rejeitado usará o que tiver em mãos para vingar-se do outro e é neste momento que os filhos são usados como ‘arma’. O cônjuge que afasta o filho do pai ou da mãe quer que o outro sinta a dor e a revolta que ele mesmo está sentindo pelo término do relacionamento”, afirma. E é nesse instante que surge um comportamento que se tornou crime no Brasil: a alienação parental. Para desvalorizar o outro, um dos ex-cônjuges começa a falar mal, a criticar e a julgar o outro na frente da criança. O filho se sente acuado e não sabe em quem acreditar. Em casos graves, ele começa dizer que não quer ver mais aquele que foi moralmente atacado por uma das partes e pode desenvolver sérios problemas psicológicos.
O que é alienação parental
O advogado Flávio Goldberg, mestre em Direito, explica que alienação parental é o processo psicológico e social através do qual uma pessoa manipula o filho para afastá-lo do outro genitor. “Trata-se de um exercício de poder alicerçado em ciúme ou sentimento de posse e muitas vezes com o objetivo de agredir o ex-cônjuge naquilo que lhe é mais precioso, ou seja, o resultado amoroso de uma relação afetiva que terminou”, esclarece. O especialista acrescenta que é muito frequente que a alienação parental seja produzida inclusive pelo medo da perda do afeto do filho, que ocorre com a cumplicidade eventual de familiares. “Nesta hipótese, acaba se travando uma disputa ambígua e confusa na qual os sentimentos indefinidos lesam a formação emocional da criança e estressando os laços obrigatórios do convívio imposto pelas circunstâncias”, afirma Flávio Goldberg. A psiquiatra Aline Machado Oliveira vai além e dá exemplos de casos em que outras pessoas da família, além do pai e da mãe, praticam a alienação parental, como os avós. “Um pai, por exemplo, poderá tomar as dores da filha que foi traída e abandonada pelo marido. Ele poderá sentir-se traído igualmente e ficar frustrado, com raiva pelas atitudes do seu então genro. Mesmo sem perceber, poderá passar a falar mal do genro para os netos e isto constitui a alienação parental. Uma mãe, por exemplo, poderá sentir-se muito magoada e entristecida ao saber que a nora separou-se do seu filho e foi morar com outro homem. Isto poderá levá-la a difamar esta nora para os seus netos, o que também constitui alienação parental. Se a mãe ou o pai da criança passar a difamar seus avós, tios ou primos durante o processo de separação, isto também constitui alienação parental, pois esta é uma tentativa de afastar a criança dos seus familiares paternos ou maternos”, ressalta.
Quais são os perigos da alienação parental
Os adultos que praticam a alienação parental estão tão envolvidos com seus próprios sentimentos que são incapazes de promover o respeito com os filhos. É dever dos pais não misturar os assuntos, pois as crianças naturalmente se sentem responsáveis pelas brigas e separações dos pais. “Então, em situações em que as crianças são usadas por um membro do casal para prejudicar o outro, a situação, que já era ruim, torna-se ainda pior. Este sentimento de culpa aumentará ainda mais na criança ao ver seus pais brigando e se difamando. E este sentimento de culpa poderá levar ao desenvolvimento de transtornos psiquiátricos”, ressalta Aline Machado Oliveira. O filho que sofre com a alienação parental pode apresentar sintomas de depressão, ansiedade, enurese noturna, terror noturno, insônia, ansiedade de separação e mutismo seletivo. A situação estressante também poderá prejudicar o sistema imunológico da criança e levar ao desenvolvimento de outras doenças, como as infecções. “Portanto, tanto o emocional quanto o organismo da criança ficarão prejudicados, o que certamente afetará seu desenvolvimento biopsicossocial”, alerta a psiquiatra.
Alienação parental é crime previsto em lei; saiba quais são as penas
A alienação parental é um crime previsto na lei número 13.431. “Quem comete alienação parental pode receber como punição a prisão preventiva ou incorrer em crime quando da desobediência de medidas protetivas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente e pela Lei Maria da Penha. Hoje cientificamente está comprovado que alienação parental na infância e na adolescência pode deformar a personalidade do indivíduo até a demência ou comportamentos patológicos. Nesta hipótese, é um crime que deve ser punido severamente", avalia o mestre em Direito Flávio Goldberg. A prisão preventiva é uma prisão cautelar que tem o objetivo de evitar que o acusado cometa novos crimes. Ela não poderá ultrapassar o prazo de 180 dias e, caso seja prorrogada por sentença, deve respeitar o prazo máximo de 360 dias. A punição vai depender de cada caso, de acordo com o advogado: “O juiz irá analisar o caso concreto, podendo decidir por penas mais brandas até mais severas, desde uma advertência para que cesse a atitude do alienador até a retirada de sua guarda, suspendendo o pátrio poder em casos extremos”.
Como provar a alienação parental
Existem algumas maneiras de provar que a criança está sendo vítima de alienação parental, inclusive com conteúdos enviados por WhatsApp ou e-mail, segundo o advogado Flávio Goldberg. “Além disso, por relatório de psicólogo que evidencie a prática de alienação parental. O serviço de assistência social também pode servir para saber se está ocorrendo tal prática abusiva. São profissionais especializados com recursos para auxiliar em situações de ocorrência da alienação parental”, explica.
O que fazer em caso de alienação parental
Se você está passando por um processo de separação ou alguém muito próximo a você está passando por isto, lembre-se de não praticar a alienação parental. Não é sobre você e por você, é pelo bem-estar físico e mental dos filhos do casal.
“Os filhos não precisam saber dos detalhes do término, como se houve ou não traição, abandono ou questões financeiras envolvidas. As crianças não saberão lidar com estas informações e isto somente fará com que se sintam ainda mais culpadas, angustiadas e deprimidas. Respeite seu filho (a), sobrinho (a), neto (a), afilhado (a). Proteja-o neste momento de dor e não torne a vida da criança ainda mais angustiante e infeliz”, aconselha a psiquiatra Aline Machado Oliveira. Para as crianças que se encontram em intenso sofrimento devido a separação dos pais, a psicoterapia infantil é o recomendada. Assim, a criança se sente mais à vontade para expressar seus sentimentos. O mesmo espaço de escuta psicológica é essencial para que esses pais que estão em sofrimento emocional também se cuidem.