Para quem acreditava que a literatura e as redes sociais não caminhavam juntas, o BookTok, apelido dado ao “lado” literário do TikTok, veio para provar o contrário. A comunidade online foi a grande responsável pelo sucesso de Magnolia Parks, livro da australiana Jessa Hastings que chegou ao Brasil no último dia 17 de abril pela editora Intrínseca.
A trama segue o relacionamento conturbado entre Magnolia Parks, BJ Ballentine e seus amigos, jovens em seus 20 anos que fazem parte da mais alta elite de Londres, no Reino Unido. A história é frequentemente comparada com a série Gossip Girl, que foi um dos maiores sucessos da emissora norte-americana The CW entre os anos 2007 e 2012, e acompanha adolescentes ricos de Nova York, Estados Unidos.
“É engraçado, embora eu entenda completamente o paralelo com Gossip Girl e [os personagens] Blair e Chuck, eles não estavam na minha mente quando escrevi. Muito de quem Magnolia é e como ela interage com os meninos é baseado em uma versão muito mais jovem e com menos terapia de mim mesma”, revela Jessa.
Em entrevista ao Estadão, a escritora conta que a primeira versão do livro ficou pronta há cerca de seis anos e que, por muito tempo, ela tentou vendê-lo a editoras e agentes da maneira tradicional. No final de 2020, ela reescreveu o manuscrito original e, nos meses seguintes, já preparou duas sequências para a história.
Com isso, decidiu testar a sorte e publicar o livro de forma independente: “Eu estava cansada de não conseguir ir para frente e tinha a sensação de que a história seria bem recebida pelos leitores se eles realmente tivessem a chance de ler, então arriscamos”.
Com a ajuda do marido e de um amigo, que haviam acabado de abrir uma agência de marketing, Jessa investiu na estética e na divulgação do livro. A aposta deu certo e a história caiu nas graças de muitos influenciadores literários do TikTok, que impulsionaram as vendas do livro.
“Eu não conhecia o BookTok quando escrevi Magnolia”, revela Jessa. A autora conta que não tem uma presença muito forte no TikTok - “tenho 34 anos, me sinto muito velha”, brinca -, mas se diz grata pela forma como a comunidade apoiou ela e seus personagens.
“Não sabia que havia esse grupo incrivelmente barulhento e apaixonado de pessoas na internet lutando por livros que eles amam. Felizmente, Magnolia Parks encontrou seu caminho até lá sozinho”, diz.
Até o momento, já são mais de 24 milhões de visualizações em publicações com a hashtag com o nome do livro. Os vídeos vão de resenhas e trechos da obra a fãs citando artistas que imaginam como os personagens e fazendo edições com imagens que representam a estética da história.
Eventualmente, Jessa recebeu uma oferta da editora britânica Orion Fiction, que já publicou quatro livros da autora - todos no universo de Magnolia Parks. A Intrínseca confirmou ao Estadão que trará o restante da série ao Brasil, mas ainda não têm previsão de publicação.
“O TikTok está mudando completamente o mercado editorial, porque, de várias maneiras, você pode ignorar as editoras. Eles viraram o jogo”, opina a escritora. “São pessoas exigindo o que querem ler e consumir, em oposição às editoras dizendo: ‘Aqui está um livro para você amar e consumir’”.
A história
Magnolia Parks é escrito a partir de dois pontos de vista. Em um capítulo, o leitor acompanha a personagem que dá nome ao livro e, no outro, vê a situação a partir dos pensamentos de BJ, o ex-namorado da protagonista.
“Acho que a natureza pessoal do conteúdo exigia que fosse contado a partir da perspectiva dos personagens. Eu acho que a história contada dessa maneira significa que você é convidado a sentir junto com eles. Meu objetivo e intenção como escritora é sempre fazer as pessoas sentirem algo”, explica Jessa Hastings.
Magnolia é, conforme a sinopse da trama, “uma socialite lindíssima, rica e egocêntrica”, enquanto o jovem é descrito como “o bad boy mais popular e fotografado da Grã-Bretanha”. A relação da dupla é conturbada, já que os dois estão sempre juntos, mas constantemente têm atitudes que machucam um ao outro.
A autora defende que a relação não é “tóxica”, já que, para ela, essa é “uma simplificação excessiva dos personagens”. “Ambos são tão cheios de nuances e tão quebrados, e eles tiveram um amor tão intenso uma vez, algo que nenhum dos dois quis deixar de lado. Então, quando esse amor é tirado, brigar frequentemente é o único tipo de intimidade que eles têm”, aponta.
Além do ciúmes entre o ex-casal e a relação deles com outras pessoas do grupo de amigos, essas brigas também são causadas por fatores que não tem relação direta com o antigo namoro. BJ, por exemplo, tem um histórico com abuso de drogas, algo que Magnolia se preocupa muito durante a trama. Vale pontuar que o assunto pode gerar gatilhos para alguns leitores.
“Para mim, a série é sobre humanos, e humanos são confusos. Suas vidas quase nunca são perfeitas, há complicações, devastações, triunfos, decepções, emoções e momentos de ternura, então eu não olho para isso como, ‘uau, há muitas experiências pesadas em meus livros’. É mais como ‘há muita vida acontecendo em meus livros’”, diz Jessa.