A cena é corriqueira: você atende o telefone, ao mesmo tempo em que o celular toca, novos e-mails pipocam na tela do computador e pessoas falam ao seu redor no escritório. Em meio a essa sobrecarga de estímulos, nem sempre é fácil manter o foco e finalizar as tarefas. O resultado é que trabalha-se cada vez mais horas, sem, contudo, garantir uma maior produtividade. "As pessoas preferem ficar até depois do expediente porque são menos interrompidas", constata Christian Barbosa, autor do livro Tríade do Tempo (Campus) e um dos diretores da empresa de mesmo nome, especializada em gestão de tempo. O esquema "desfocado" das horas extras cobra honorários da vida pessoal. A começar pela falta de tempo para ver os amigos e conviver com os familiares. Fica ainda aquele sentimento de frustração pela falta de conclusão das tarefas. Christian acredita que as empresas também têm culpa. "Geralmente não há uma política clara de prioridades", comenta. "Hoje quase não há baias ou separações entre os funcionários, que se atrapalham mutuamente." No momento, ele está finalizando um livro sobre gestão de tempo para mulheres, com previsão de lançamento para o final do ano, pela Editora Gente. "A mulher tem mais urgência de tempo, pois acumula papéis: deve ser boa profissional, mãe, filha, amiga." Independentemente do sexo, ele constata que as pessoas perfeccionistas tendem a ser mais focadas. Já as comunicativas costumam "pular mais de galho em galho" e dizer muito "sim". Aliás, a pesquisa da Tríade do Tempo constatou que 75% dos brasileiros têm dificuldade de dizer não, um fator que leva, por si só, à falta de foco. A psicóloga Ana Maria Rossi, especialista em estresse e autora do livro Autocontrole (Record), informa que a falta de foco é uma das queixas mais comuns em seu consultório. "Isso acontece porque as pessoas estão expostas a muitos estímulos." O estresse, o medo e a raiva também podem minar o poder de foco, mas a ansiedade é a principal sabotadora interna. "Os ansiosos não se concentram no presente, estão sempre preocupados com o futuro ou passado", constata ela, que também enquadra a mulher como mais suscetível ao problema por ser uma "multitarefeira" por natureza. CONCENTRAÇÃO A advogada Maria Luiza Cavalcante Lima, de 37 anos, sentiu na pele os efeitos da sobrecarga de trabalho - e da falta de foco. Montou um escritório de advocacia e passou cinco anos como capitã e única tripulante. Atendia o telefone, cuidava da parte jurídica e financeira, assumia muitos processos ao mesmo tempo. Ficou grávida em meio ao turbilhão profissional e, quando seu filho nasceu, levou-o ao trabalho durante seis meses. "Houve ocasiões em que pedia licença no meio de reuniões para trocar a fralda dele." Em 2005, ela tomou consciência de que sua vida estava bagunçada demais. "Não conseguia me concentrar no momento." Com a ajuda de dois livros, deu uma virada em seu cotidiano: O Programa de Eficiência Pessoal (Makron Books), do americano Kerry Gleeson; e Tríade do Tempo (Campus), de Christian Barbosa. Conta que até fez um treinamento de gestão do tempo na empresa do último. Ao mesmo tempo, foi colocando ordem na vida financeira e decidiu mudar o escritório para um endereço mais próximo da mãe, que cuidava de seu filho. Conquistou um emprego em uma grande empresa e uma das maiores lições foi aprender a dizer não. Separar os papéis que desempenha em cada momento também foi um recurso positivo para a mudança. Hoje, consegue até desligar o celular. "É muito bom me propor a fazer uma coisa, grande ou pequena, e conseguir cumpri-la." Advogado de 36 anos do ramo de petróleo, Roberto Fabricio também caiu no redemoinho da falta de foco. Desde o seu primeiro estágio, aos 18 anos, sentiu que tinha uma dificuldade de concentração: era freqüente, por exemplo, voltar do fórum sem ter pego todas as informações requisitadas. "Costumava adiar tudo", conta. Ele também é músico e compositor e, mesmo nessa atividade prazerosa, apresentava problemas. "Compunha canções, mas nunca as terminava." Começou a atribuir parte do problema à velocidade de seu raciocínio, que ele considera acima da média. "Sempre fiz tudo muito rápido e nem sempre as pessoas acompanhavam. Isso criava ansiedade." Alguns anos atrás, aprendeu técnicas de meditação, que o ajudaram a entrar em contato consigo mesmo. "A análise também me ajudou a entender todo esse processo." Mas Roberto credita à prática do budismo a solução para o problema. "É um tipo diferente de meditação. Oramos com um mantra, e isso traz muito foco", conta. "Hoje me concentro em uma coisa de cada vez. Se estou fazendo uma petição, não atendo o telefone. E aprendi a delegar mais." Agora também finaliza suas composições: tem uma banda e está ensaiando para fazer shows a partir do final do ano. Fabricio é solteiro e diz que até os relacionamentos amorosos melhoraram depois que parou de "esquecer datas importantes". "Já estive em 20% da minha excelência para fazer tudo o que quero na vida. Hoje estou em 75%, digamos, mas sei que posso chegar a 100%." Segundo ele, o foco ajuda muito.
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