Nos anos 80, no caldeirão da Vanguarda Paulista, surgiu um grupo com objetivo diferente.
Nos anos 1980, em meio ao caldeirão da Vanguarda Paulista, enquanto todos se esforçavam para criar a próxima revolução artística, um grupo surgiu com um objetivo diferente: perder dinheiro. O Piratas de Pochete não queria fazer sentido e, com certeza, não queria ser ouvido -- mas, paradoxalmente, foi. Por pouquíssimo tempo, mas foi.
O líder da trupe era o bafalonista Ronnie von Fonseca. De família aristocrática, seu pai era dono de uma fábrica de relógios de ponto. Revoltado com as posições conservadoras da família, fugiu de casa aos 52 anos para aprender contraponto.
Nas cordas estava Paulão Reverb. Seu talento para tocar era tão grande quanto sua aversão por afinar o instrumento. Era comum vê-lo no palco brigando com o amplificador, não por questões técnicas, mas por acreditar que "a verdadeira arte está no erro".
Na bateria, o singular Ganzá Jr. Seu estilo consistia em bater em qualquer coisa ao alcance -- tamborins, paredes, em sua própria cabeça e até no público.
O tecladista era Beto Tekla, cujo método pianístico envolvia usar apenas o cotovelo e, às vezes, a testa. Acreditava que harmonia era uma palavra criada por críticos reacionários para aprisionar o espírito criativo e que a verdadeira liberdade sonora estava no acaso. Durante seus famosos solos percussivos, narrava, em voz alta, a história de um porquinho-da-índia imaginário chamado Zezo.
Outro destaque foi Régis Z., o flautista que não tocava flauta. Seu instrumento era uma língua de sogra -- e ele a soprava com o fervor de quem estava fazendo um teste de bafômetro, sob tortura, no Doi-Codi.
O hit mais famoso do grupo, "Quem mexeu no meu arroz com pequi?", era uma canção existencialista sobre dilemas contemporâneos, interpretada com tanta intensidade que críticos compararam a experiência de ouvi-la a ser atropelado por uma betoneira em alta velocidade. A letra falava sobre alienígenas que furtavam pamonhas em Goiânia, uma metáfora que ninguém jamais entendeu -- nem mesmo Ronnie von Fonseca, que escreveu a canção numa madrugada após discutir o significado do pequi com um guarda noturno.
O ápice da carreira do Piratas de Pochete foi uma apresentação no Centro Cultural de Ribeirão dos Índios. Entraram no palco montados em pandas infláveis e saíram após apenas cinco minutos, alegando que o público não estava "espiritualmente pronto" para a complexidade daquele som. O show se tornou lendário, em grande parte porque ninguém sabia ao certo se estavam falando sério ou se tudo não passava de mais um espetáculo elaborado com baixo orçamento.
No fim, o Piratas de Pochete desapareceu tão rápido quanto surgiu. Régis Z. criou a banda "Dona Geralda e os Dragões de Papelão", que faz uma releitura sinfônica do trabalho de Bert Kaempfert. Reverb se aposentou e hoje fabrica amplificadores que já vêm desregulados de fábrica. Os outros integrantes montaram um bufê infantil usando o nome da banda.
O conjunto deixou uma pilha de LPs que só tocam no sentido inverso e uma série de entrevistas nas quais Ronnie von Fonseca divaga sobre o futuro da MPB, os neutrinos e porque acredita que o purê de chuchu será a chave para a paz mundial.
Alguns dizem que foram os precursores de algo grandioso. Outros, que foram um erro de cálculo das gravadoras. Mas, como afirma Beto Tekla, enquanto golpeia o piano com a orelha: "Se não faz sentido, é porque estamos no caminho certo".