Reflexões sobre gênero, violência e sociedade

Eu ainda vejo as cores da bandeira


Por Nana Soares

Estou morando na Inglaterra para fazer um mestrado e tenho acompanhado à distância os eventos políticos do Brasil, inevitavelmente tendo uma perspectiva diferente em relação a quem tem o fardo e o privilégio de estar no país nesse momento. O contato próximo com dezenas de nacionalidades me lembra que o que acontece no Brasil não é um evento isolado, mas me renova as energias para, apesar dos pesares, ver luz no fim do túnel.

Na segunda-feira, após a eleição de Jair Bolsonaro para a presidência, colegas e professores se dirigiram aos brasileiros para mostrar solidariedade e dizerem que sentem muito. Alguns dias antes, meu colega de apartamento me pediu para explicar o contexto político brasileiro. Ele é sírio. Falei da polarização que marcava nossos discursos, os ataques de ódio durante a campanha eleitoral, o argumento de ambos os lados e a fragilidade da nossa democracia em meio a tudo. Expliquei, com lágrimas nos olhos, como temia um governo autoritário.

Quando acabei de falar, instantaneamente me dei conta de que estava reclamando do meu país para alguém que vem da Síria, uma nação que há anos é arrasada por uma guerra civil que fez milhões de vítimas. Não que a situação do Brasil não exija preocupação e não seja assustadora, mas percebi que minha leitura do nosso contexto trouxe doses desproporcionais de sofrimento. "Só se lembre que por pior que seu país esteja, ele não chegou realmente ao pior", disse ele para mim.

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Pedi desculpas e começamos a falar da Síria. Perguntei como ele via o futuro do país, já que, entre outras coisas, a Síria vê nascer uma geração de analfabetos, já que é perigoso demais ir para a escola. Esta foi a resposta de Abdullah, meu flatmate:

Imagine a bandeira do seu país. Agora a imagine em preto e branco. É como vejo o futuro da Síria: sem nenhuma cor.

Essa frase, com toda sua simplicidade, foi a lição que eu precisava ouvir agora, e por isso compartilho neste espaço. Percebi que, por pior que seja a situação no Brasil, nunca deixei de enxergar um futuro colorido neste país. E ainda não consigo fazê-lo, mesmo após fim de Ministério do Esporte, Meio Ambiente e criação de um Ministério da Família.

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O Brasil é brilhante, diverso e vibrante e nenhuma política conseguiu apagar isso até hoje. Negros, mulheres, LGBTs e indígenas nunca tiveram futuro garantido, mas sempre lutaram pelos seus e pelos outros. Sempre resistiram. Vão (vamos!) continuar resistindo e vivendo suas vidas.

Agora, tudo parece confuso, perdido, sem saída. Não está. A democracia não acaba no dia da eleição e menos ainda nossa gana por mudanças e por viver livremente. Continuamos tendo mecanismos para impedir retrocessos e redes para cuidar de nós mesmos. Continuamos tendo futuro pela frente. Nossa história simplesmente não termina aqui.

As cores da nossa bandeira podem até estar opacas, mas permanecem vivas, presentes, brilhantes. Somos pátria de Marielles, não de seus algozes. Respiremos fundo e encaremos o que vai vir pela frente.

Estou morando na Inglaterra para fazer um mestrado e tenho acompanhado à distância os eventos políticos do Brasil, inevitavelmente tendo uma perspectiva diferente em relação a quem tem o fardo e o privilégio de estar no país nesse momento. O contato próximo com dezenas de nacionalidades me lembra que o que acontece no Brasil não é um evento isolado, mas me renova as energias para, apesar dos pesares, ver luz no fim do túnel.

Na segunda-feira, após a eleição de Jair Bolsonaro para a presidência, colegas e professores se dirigiram aos brasileiros para mostrar solidariedade e dizerem que sentem muito. Alguns dias antes, meu colega de apartamento me pediu para explicar o contexto político brasileiro. Ele é sírio. Falei da polarização que marcava nossos discursos, os ataques de ódio durante a campanha eleitoral, o argumento de ambos os lados e a fragilidade da nossa democracia em meio a tudo. Expliquei, com lágrimas nos olhos, como temia um governo autoritário.

Quando acabei de falar, instantaneamente me dei conta de que estava reclamando do meu país para alguém que vem da Síria, uma nação que há anos é arrasada por uma guerra civil que fez milhões de vítimas. Não que a situação do Brasil não exija preocupação e não seja assustadora, mas percebi que minha leitura do nosso contexto trouxe doses desproporcionais de sofrimento. "Só se lembre que por pior que seu país esteja, ele não chegou realmente ao pior", disse ele para mim.

Pedi desculpas e começamos a falar da Síria. Perguntei como ele via o futuro do país, já que, entre outras coisas, a Síria vê nascer uma geração de analfabetos, já que é perigoso demais ir para a escola. Esta foi a resposta de Abdullah, meu flatmate:

Imagine a bandeira do seu país. Agora a imagine em preto e branco. É como vejo o futuro da Síria: sem nenhuma cor.

Essa frase, com toda sua simplicidade, foi a lição que eu precisava ouvir agora, e por isso compartilho neste espaço. Percebi que, por pior que seja a situação no Brasil, nunca deixei de enxergar um futuro colorido neste país. E ainda não consigo fazê-lo, mesmo após fim de Ministério do Esporte, Meio Ambiente e criação de um Ministério da Família.

O Brasil é brilhante, diverso e vibrante e nenhuma política conseguiu apagar isso até hoje. Negros, mulheres, LGBTs e indígenas nunca tiveram futuro garantido, mas sempre lutaram pelos seus e pelos outros. Sempre resistiram. Vão (vamos!) continuar resistindo e vivendo suas vidas.

Agora, tudo parece confuso, perdido, sem saída. Não está. A democracia não acaba no dia da eleição e menos ainda nossa gana por mudanças e por viver livremente. Continuamos tendo mecanismos para impedir retrocessos e redes para cuidar de nós mesmos. Continuamos tendo futuro pela frente. Nossa história simplesmente não termina aqui.

As cores da nossa bandeira podem até estar opacas, mas permanecem vivas, presentes, brilhantes. Somos pátria de Marielles, não de seus algozes. Respiremos fundo e encaremos o que vai vir pela frente.

Estou morando na Inglaterra para fazer um mestrado e tenho acompanhado à distância os eventos políticos do Brasil, inevitavelmente tendo uma perspectiva diferente em relação a quem tem o fardo e o privilégio de estar no país nesse momento. O contato próximo com dezenas de nacionalidades me lembra que o que acontece no Brasil não é um evento isolado, mas me renova as energias para, apesar dos pesares, ver luz no fim do túnel.

Na segunda-feira, após a eleição de Jair Bolsonaro para a presidência, colegas e professores se dirigiram aos brasileiros para mostrar solidariedade e dizerem que sentem muito. Alguns dias antes, meu colega de apartamento me pediu para explicar o contexto político brasileiro. Ele é sírio. Falei da polarização que marcava nossos discursos, os ataques de ódio durante a campanha eleitoral, o argumento de ambos os lados e a fragilidade da nossa democracia em meio a tudo. Expliquei, com lágrimas nos olhos, como temia um governo autoritário.

Quando acabei de falar, instantaneamente me dei conta de que estava reclamando do meu país para alguém que vem da Síria, uma nação que há anos é arrasada por uma guerra civil que fez milhões de vítimas. Não que a situação do Brasil não exija preocupação e não seja assustadora, mas percebi que minha leitura do nosso contexto trouxe doses desproporcionais de sofrimento. "Só se lembre que por pior que seu país esteja, ele não chegou realmente ao pior", disse ele para mim.

Pedi desculpas e começamos a falar da Síria. Perguntei como ele via o futuro do país, já que, entre outras coisas, a Síria vê nascer uma geração de analfabetos, já que é perigoso demais ir para a escola. Esta foi a resposta de Abdullah, meu flatmate:

Imagine a bandeira do seu país. Agora a imagine em preto e branco. É como vejo o futuro da Síria: sem nenhuma cor.

Essa frase, com toda sua simplicidade, foi a lição que eu precisava ouvir agora, e por isso compartilho neste espaço. Percebi que, por pior que seja a situação no Brasil, nunca deixei de enxergar um futuro colorido neste país. E ainda não consigo fazê-lo, mesmo após fim de Ministério do Esporte, Meio Ambiente e criação de um Ministério da Família.

O Brasil é brilhante, diverso e vibrante e nenhuma política conseguiu apagar isso até hoje. Negros, mulheres, LGBTs e indígenas nunca tiveram futuro garantido, mas sempre lutaram pelos seus e pelos outros. Sempre resistiram. Vão (vamos!) continuar resistindo e vivendo suas vidas.

Agora, tudo parece confuso, perdido, sem saída. Não está. A democracia não acaba no dia da eleição e menos ainda nossa gana por mudanças e por viver livremente. Continuamos tendo mecanismos para impedir retrocessos e redes para cuidar de nós mesmos. Continuamos tendo futuro pela frente. Nossa história simplesmente não termina aqui.

As cores da nossa bandeira podem até estar opacas, mas permanecem vivas, presentes, brilhantes. Somos pátria de Marielles, não de seus algozes. Respiremos fundo e encaremos o que vai vir pela frente.

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