Um passeio pela cultura sneakerhead no Brasil e no mundo

Fábrica da Vulcabras no Ceará é exemplo de eficiência


Fábrica de Horizonte, que produz os modelos esportivos da Olympikus, Mizuno e Under Armour, utiliza processos modernos de produção de todas as partes dos tênis

Por Diego Ortiz
Atualização:
Cabedal do tênis é todo feito na fábrica Foto: Olympikus/Estadão

Um convite especial chegou à caixa de entrada do e-mail: conhecer a fábrica da Vulcabras em Horizonte, Ceará. Uma planta de 140,1 mil m² de área construída que fabrica os tênis da Olympikus, que têm conquistado muitos fãs no mundo das corridas, além dos modelos nacionais da Under Armour e Mizuno. É o tipo de convite que um apaixonado por sneakers não recusaria jamais. São Paulo - Fortaleza, 3 horas de voo, hotel, pernoite, uma hora de carro até a fábrica e uma boa notícia para quem torce pela indústria nacional. O complexo que a Vulcabras construiu em Horizonte não deixa nada a desejar em relação às fábricas de tênis de outros países que já visitei, dada sua versatilidade de linha, aproveitamento de materiais e processos de aferição de qualidade. Para me receber na fábrica estava Pedro Bartelle, CEO da Vulcabras, que assumiu a empresa em 2015 para mudar completamente os rumos do que vinha sendo feito e fincar a bandeira da democratização da corrida no País.

A fábrica de Horizonte abriu as portas em 1996 e passou por diversas modificações para abrigar os atuais 12 mil funcionários que produzem toda a linha de tênis esportivos das marcas Olympikus, Mizuno e Under Armour. A última expansão começou no início deste ano, com uma adição de 8.030 m² aos 132.080 m² já existentes. O investimento fez parte dos R$ 750 milhões que vêm sendo aplicados pela Vulcabras ao longo dos últimos seis anos em tecnologia e modernização das fábricas de Horizonte e Itapetinga, na Bahia, e no centro de Pesquisa & Desenvolvimento do grupo em Parobé, Rio Grande do Sul.

continua após a publicidade
Teares para produção do cabedal do tênis Foto: Olympikus/Estadão

Durante o passeio pela fábrica, Bartelle contou que a Vulcabras está acima da curva de crescimento do mercado por ter investido muito nos últimos anos para fazer mais produtos e mais tipos de produtos, o que permitiu à empresa ter aparatos para fabricar tênis com qualquer tecnologia do mundo comumente usada em modelos de performance, como EVA expandida, Pebax e placas de fibra de carbono. Com o objetivo, inclusive, de agregar mais marcas no futuro além da Under Armour e Mizuno.

“Uma coisa eu digo, muito humildemente: qualquer marca que estiver dentro da Vulcabras vai performar melhor no mercado brasileiro. Temos os melhores recursos, mais experiência e mais capilaridade de distribuição, que são coisas muito importantes”, afirma. Bartelle cita como exemplo a Mizuno, que dobrou de tamanho desde que passou a fazer parte da Vulcabras há quatro anos. “Fomos agregando mais produtos ao core que é running de alta performance e lifestyle e agora vamos entrar no futebol para valer com as chuteiras, o patrocínio ao Gabigol e o patrocínio de clubes, que já estamos discutindo e em 2025 vamos ter novidades”.

continua após a publicidade
Máquinas de corte a laser para cabedais mais tecnológicos Foto: Olympikus/Estadão

Com a Under Armour, a questão é outra: canal de distribuição. 80% das vendas mundiais da UA são de roupa, aqui no Brasil apenas 20%, mas poucos são os pontos de venda da marca, além das conhecidas como outlets, que na verdade são lojas mistas, que também vendem lançamentos. De acordo com Bartelle, o crescimento passa todo pela abertura de lojas próprias para ampliar a venda direta, para que o consumidor veja o diferencial da Under Armour, que é a qualidade dos tecidos e dos cortes das roupas. “Além disso, acreditamos muito na expansão do estilo militar, muito usado no Brasil para caça e pesca. Começamos a trazer as botas e vemos trazer as roupas em breve”.

No entanto, é na Olympikus, marca proprietária da Vulcabras, que a revolução é maior. Mais de duas mil pessoas foram contratadas nos últimos 18 meses para dar vazão ao sucesso da linha Corre, atualmente o modelo de corrida mais usado no País segundo os apps Strava e Corrida Perfeita. “A coleção do Corre não chegou a nem 50% do potencial que tem por aqui. E já te adianto que para o ano que vem vamos lançar dois novos tênis, sendo um deles um de performance de sola alta sem placa, porque tem muita gente que não pode usar placa. O Corre 4 é apenas um bebê, vamos ter o 10, 11, 12...”, sentencia Bartelle.

continua após a publicidade
Há várias máquinas de moldes Foto: Olympikus/Estadão

Este sucesso de vendas é creditado, além dos acertos administrativos e de gestão, à estratégia de convidar a comunidade da corrida para co-criar o tênis. Pessoas do Brasil inteiro, que correm nos variados pisos e temperaturas, foram convocadas para usar e opinar sobre o tênis. E estrelas também, como Vanderlei Cordeiro de Lima, que tem ajudado a desenvolver o Corre 3 e depois o 4, com opiniões bastante favoráveis sobre o custo/benefício do tênis. “Escutamos, por exemplo, um pedido antigo de que os tênis importados são muito estreitos na frente e fizemos um Corre 4 mais largo e isso foi logo apontado como um dos motivos de compra do tênis”.

Olympikus Corre 4 Foto: Olympikus/Estadão
continua após a publicidade

Olympikus quer a Europa

O próximo passo da marca é a Europa e alguns países da América Latina. A marca aposta na tendência do mercado europeu de se abrir para novas marcas, com outros players fora dos mais tradicionais crescendo muito. “Assim que acharmos o nosso posicionamento correto, sei que vamos ter sucesso porque o produto é muito bom”, afirma Bartelle. Na Argentina, a marca já vendeu mais de 1,5 milhão de pares de modelos casuais, não de running, e aguarda apenas uma segurança jurídica maior para começar a exportar o Corre, seguindo para a Colômbia e Chile.

No entanto, duas palavras que assombram os produtores brasileiros também tiram o sono da Vulcabras: custo Brasil. Segundo a Abicalçados, associação que reúne os produtores locais, o custo da mão de obra na Ásia é um terço do valor do Brasil, sendo que 40% do custo do calçado incide sobre a mão de obra. Ou seja, deixa de ser uma questão de eficiência e de produtividade. Ainda de acordo com a entidade, a situação só vai mudar quando as empresas brasileiras tiverem o mesmo incentivo governamental para exportar que os asiáticos. “Para se internacionalizar, vai chegar um ponto, infelizmente, que a Olympikus vai ter que produzir fora do país se nada mudar. Não é o que a gente quer, já que somos o maior empregador do Ceará, o quinto maior da indústria de transformação e temos muito orgulho disso”, lamenta Bartelle.

continua após a publicidade
Corte do tecido é preciso Foto: Olympikus/Estadão

Da Europa para Horizonte novamente, Bartelle diz que 2024 foi um ano de expansão da fábrica, que cresce por capacidade de produto e por complexidade de tecnologia, mas que acima de tudo foi um ano de defender resultados, margens e a saúde da empresa. “De fato, as trocas de governo, seja qual for, toda a reforma tributária, tudo isso deixou o empresariado brasileiro muito apreensivo. Porque não se sabia direito quando se implementaria, que regras do jogo existiriam. Uma delas, que já está sendo implementada, é nociva, que é a reoneração da folha. 17 setores foram desonerados, um deles é o calçadista, que é um dos que mais emprega. Então, a gente já vai ter um custo maior no ano que vem, que vai ter que ser repassado em parte no produto, o resto nós vamos ter que absorver, e mesmo assim teremos que crescer”.

Para isso, os planos da Vulcabras são continuar expandindo a capacidade de produção. Uma coisa que chama muita atenção na fábrica de Horizonte é a quantidade de teares para confecção dos cabedais, as formas para criar os moldes plásticos, a expansão das solas de EVA e a facilidade com que tênis de marcas e características diferentes dividem a mesma linha de produção. O segredo, segundo Bartelle, é que a Vulcabras não é mais uma fábrica de calçados que impõe uma estratégia para o mercado, mas sim uma gestora de marcas que tem uma indústria como grande diferencial competitivo.

continua após a publicidade
Digitalização da produção é cada vez maior Foto: Olympikus/Estadão

Outro foco muito importante é o da sustentabilidade. De acordo com Bartelle, a fábrica da Vulcabras em Horizonte é a mais sustentável de calçados do Brasil e talvez até do mundo. “Da Ásia com certeza”. Impulsionada por leis, mas muitas vezes por iniciativa própria, a planta cearense tem várias iniciativas interessantes. Ela usa, por exemplo, 100% de energia eólica, fruto de um projeto que recebeu investimento da empresa e que gerou um contrato de fornecimento de 13 anos. Além disso, quase todos os resíduos de produção são reutilizados em outros tênis, e os que não são viram material para botas de jardinagem e para recapear estradas. A água também é tratada para reúso, o esgoto não é jogado diretamente. “Reúso e menos descarte geram rentabilidade e competitividade, que é sempre o viés que abraçamos aqui como extra além da preservação ambiental. É investimento dentro da sustentabilidade”.

“Eu vim aqui no primeiro dia dessa empresa há 27 anos. Entrei na cidade de Horizonte e vi carne pendurada para venda, coisa bem típica do interior do Nordeste. Hoje, Horizonte é uma cidade desenvolvida, que triplicou de tamanho. Viemos para cá em condições de competitividade, por incentivos fiscais, mas também com uma missão social trabalhosa que é formar mão de obra qualificada. Tivemos que criar cultura organizacional, instalar tudo, treinar todo mundo, não foi fácil fazer. Mas hoje o Nordeste é um exemplo de produção e a qualidade dos nossos produtos é muito boa porque tem uma mão de obra também muito boa. O que resulta, no fim, em uma reputação muito positiva no mercado e bons dividendos para os nossos milhares de acionistas - 35% das ações estão espalhadas no mercado. E com esses dividendos, eles estão comprando os nossos tênis para correr. Isso dá muito orgulho”, finaliza Bartelle.

Viagem feita a convite da Vulcabras.

Cabedal do tênis é todo feito na fábrica Foto: Olympikus/Estadão

Um convite especial chegou à caixa de entrada do e-mail: conhecer a fábrica da Vulcabras em Horizonte, Ceará. Uma planta de 140,1 mil m² de área construída que fabrica os tênis da Olympikus, que têm conquistado muitos fãs no mundo das corridas, além dos modelos nacionais da Under Armour e Mizuno. É o tipo de convite que um apaixonado por sneakers não recusaria jamais. São Paulo - Fortaleza, 3 horas de voo, hotel, pernoite, uma hora de carro até a fábrica e uma boa notícia para quem torce pela indústria nacional. O complexo que a Vulcabras construiu em Horizonte não deixa nada a desejar em relação às fábricas de tênis de outros países que já visitei, dada sua versatilidade de linha, aproveitamento de materiais e processos de aferição de qualidade. Para me receber na fábrica estava Pedro Bartelle, CEO da Vulcabras, que assumiu a empresa em 2015 para mudar completamente os rumos do que vinha sendo feito e fincar a bandeira da democratização da corrida no País.

A fábrica de Horizonte abriu as portas em 1996 e passou por diversas modificações para abrigar os atuais 12 mil funcionários que produzem toda a linha de tênis esportivos das marcas Olympikus, Mizuno e Under Armour. A última expansão começou no início deste ano, com uma adição de 8.030 m² aos 132.080 m² já existentes. O investimento fez parte dos R$ 750 milhões que vêm sendo aplicados pela Vulcabras ao longo dos últimos seis anos em tecnologia e modernização das fábricas de Horizonte e Itapetinga, na Bahia, e no centro de Pesquisa & Desenvolvimento do grupo em Parobé, Rio Grande do Sul.

Teares para produção do cabedal do tênis Foto: Olympikus/Estadão

Durante o passeio pela fábrica, Bartelle contou que a Vulcabras está acima da curva de crescimento do mercado por ter investido muito nos últimos anos para fazer mais produtos e mais tipos de produtos, o que permitiu à empresa ter aparatos para fabricar tênis com qualquer tecnologia do mundo comumente usada em modelos de performance, como EVA expandida, Pebax e placas de fibra de carbono. Com o objetivo, inclusive, de agregar mais marcas no futuro além da Under Armour e Mizuno.

“Uma coisa eu digo, muito humildemente: qualquer marca que estiver dentro da Vulcabras vai performar melhor no mercado brasileiro. Temos os melhores recursos, mais experiência e mais capilaridade de distribuição, que são coisas muito importantes”, afirma. Bartelle cita como exemplo a Mizuno, que dobrou de tamanho desde que passou a fazer parte da Vulcabras há quatro anos. “Fomos agregando mais produtos ao core que é running de alta performance e lifestyle e agora vamos entrar no futebol para valer com as chuteiras, o patrocínio ao Gabigol e o patrocínio de clubes, que já estamos discutindo e em 2025 vamos ter novidades”.

Máquinas de corte a laser para cabedais mais tecnológicos Foto: Olympikus/Estadão

Com a Under Armour, a questão é outra: canal de distribuição. 80% das vendas mundiais da UA são de roupa, aqui no Brasil apenas 20%, mas poucos são os pontos de venda da marca, além das conhecidas como outlets, que na verdade são lojas mistas, que também vendem lançamentos. De acordo com Bartelle, o crescimento passa todo pela abertura de lojas próprias para ampliar a venda direta, para que o consumidor veja o diferencial da Under Armour, que é a qualidade dos tecidos e dos cortes das roupas. “Além disso, acreditamos muito na expansão do estilo militar, muito usado no Brasil para caça e pesca. Começamos a trazer as botas e vemos trazer as roupas em breve”.

No entanto, é na Olympikus, marca proprietária da Vulcabras, que a revolução é maior. Mais de duas mil pessoas foram contratadas nos últimos 18 meses para dar vazão ao sucesso da linha Corre, atualmente o modelo de corrida mais usado no País segundo os apps Strava e Corrida Perfeita. “A coleção do Corre não chegou a nem 50% do potencial que tem por aqui. E já te adianto que para o ano que vem vamos lançar dois novos tênis, sendo um deles um de performance de sola alta sem placa, porque tem muita gente que não pode usar placa. O Corre 4 é apenas um bebê, vamos ter o 10, 11, 12...”, sentencia Bartelle.

Há várias máquinas de moldes Foto: Olympikus/Estadão

Este sucesso de vendas é creditado, além dos acertos administrativos e de gestão, à estratégia de convidar a comunidade da corrida para co-criar o tênis. Pessoas do Brasil inteiro, que correm nos variados pisos e temperaturas, foram convocadas para usar e opinar sobre o tênis. E estrelas também, como Vanderlei Cordeiro de Lima, que tem ajudado a desenvolver o Corre 3 e depois o 4, com opiniões bastante favoráveis sobre o custo/benefício do tênis. “Escutamos, por exemplo, um pedido antigo de que os tênis importados são muito estreitos na frente e fizemos um Corre 4 mais largo e isso foi logo apontado como um dos motivos de compra do tênis”.

Olympikus Corre 4 Foto: Olympikus/Estadão

Olympikus quer a Europa

O próximo passo da marca é a Europa e alguns países da América Latina. A marca aposta na tendência do mercado europeu de se abrir para novas marcas, com outros players fora dos mais tradicionais crescendo muito. “Assim que acharmos o nosso posicionamento correto, sei que vamos ter sucesso porque o produto é muito bom”, afirma Bartelle. Na Argentina, a marca já vendeu mais de 1,5 milhão de pares de modelos casuais, não de running, e aguarda apenas uma segurança jurídica maior para começar a exportar o Corre, seguindo para a Colômbia e Chile.

No entanto, duas palavras que assombram os produtores brasileiros também tiram o sono da Vulcabras: custo Brasil. Segundo a Abicalçados, associação que reúne os produtores locais, o custo da mão de obra na Ásia é um terço do valor do Brasil, sendo que 40% do custo do calçado incide sobre a mão de obra. Ou seja, deixa de ser uma questão de eficiência e de produtividade. Ainda de acordo com a entidade, a situação só vai mudar quando as empresas brasileiras tiverem o mesmo incentivo governamental para exportar que os asiáticos. “Para se internacionalizar, vai chegar um ponto, infelizmente, que a Olympikus vai ter que produzir fora do país se nada mudar. Não é o que a gente quer, já que somos o maior empregador do Ceará, o quinto maior da indústria de transformação e temos muito orgulho disso”, lamenta Bartelle.

Corte do tecido é preciso Foto: Olympikus/Estadão

Da Europa para Horizonte novamente, Bartelle diz que 2024 foi um ano de expansão da fábrica, que cresce por capacidade de produto e por complexidade de tecnologia, mas que acima de tudo foi um ano de defender resultados, margens e a saúde da empresa. “De fato, as trocas de governo, seja qual for, toda a reforma tributária, tudo isso deixou o empresariado brasileiro muito apreensivo. Porque não se sabia direito quando se implementaria, que regras do jogo existiriam. Uma delas, que já está sendo implementada, é nociva, que é a reoneração da folha. 17 setores foram desonerados, um deles é o calçadista, que é um dos que mais emprega. Então, a gente já vai ter um custo maior no ano que vem, que vai ter que ser repassado em parte no produto, o resto nós vamos ter que absorver, e mesmo assim teremos que crescer”.

Para isso, os planos da Vulcabras são continuar expandindo a capacidade de produção. Uma coisa que chama muita atenção na fábrica de Horizonte é a quantidade de teares para confecção dos cabedais, as formas para criar os moldes plásticos, a expansão das solas de EVA e a facilidade com que tênis de marcas e características diferentes dividem a mesma linha de produção. O segredo, segundo Bartelle, é que a Vulcabras não é mais uma fábrica de calçados que impõe uma estratégia para o mercado, mas sim uma gestora de marcas que tem uma indústria como grande diferencial competitivo.

Digitalização da produção é cada vez maior Foto: Olympikus/Estadão

Outro foco muito importante é o da sustentabilidade. De acordo com Bartelle, a fábrica da Vulcabras em Horizonte é a mais sustentável de calçados do Brasil e talvez até do mundo. “Da Ásia com certeza”. Impulsionada por leis, mas muitas vezes por iniciativa própria, a planta cearense tem várias iniciativas interessantes. Ela usa, por exemplo, 100% de energia eólica, fruto de um projeto que recebeu investimento da empresa e que gerou um contrato de fornecimento de 13 anos. Além disso, quase todos os resíduos de produção são reutilizados em outros tênis, e os que não são viram material para botas de jardinagem e para recapear estradas. A água também é tratada para reúso, o esgoto não é jogado diretamente. “Reúso e menos descarte geram rentabilidade e competitividade, que é sempre o viés que abraçamos aqui como extra além da preservação ambiental. É investimento dentro da sustentabilidade”.

“Eu vim aqui no primeiro dia dessa empresa há 27 anos. Entrei na cidade de Horizonte e vi carne pendurada para venda, coisa bem típica do interior do Nordeste. Hoje, Horizonte é uma cidade desenvolvida, que triplicou de tamanho. Viemos para cá em condições de competitividade, por incentivos fiscais, mas também com uma missão social trabalhosa que é formar mão de obra qualificada. Tivemos que criar cultura organizacional, instalar tudo, treinar todo mundo, não foi fácil fazer. Mas hoje o Nordeste é um exemplo de produção e a qualidade dos nossos produtos é muito boa porque tem uma mão de obra também muito boa. O que resulta, no fim, em uma reputação muito positiva no mercado e bons dividendos para os nossos milhares de acionistas - 35% das ações estão espalhadas no mercado. E com esses dividendos, eles estão comprando os nossos tênis para correr. Isso dá muito orgulho”, finaliza Bartelle.

Viagem feita a convite da Vulcabras.

Cabedal do tênis é todo feito na fábrica Foto: Olympikus/Estadão

Um convite especial chegou à caixa de entrada do e-mail: conhecer a fábrica da Vulcabras em Horizonte, Ceará. Uma planta de 140,1 mil m² de área construída que fabrica os tênis da Olympikus, que têm conquistado muitos fãs no mundo das corridas, além dos modelos nacionais da Under Armour e Mizuno. É o tipo de convite que um apaixonado por sneakers não recusaria jamais. São Paulo - Fortaleza, 3 horas de voo, hotel, pernoite, uma hora de carro até a fábrica e uma boa notícia para quem torce pela indústria nacional. O complexo que a Vulcabras construiu em Horizonte não deixa nada a desejar em relação às fábricas de tênis de outros países que já visitei, dada sua versatilidade de linha, aproveitamento de materiais e processos de aferição de qualidade. Para me receber na fábrica estava Pedro Bartelle, CEO da Vulcabras, que assumiu a empresa em 2015 para mudar completamente os rumos do que vinha sendo feito e fincar a bandeira da democratização da corrida no País.

A fábrica de Horizonte abriu as portas em 1996 e passou por diversas modificações para abrigar os atuais 12 mil funcionários que produzem toda a linha de tênis esportivos das marcas Olympikus, Mizuno e Under Armour. A última expansão começou no início deste ano, com uma adição de 8.030 m² aos 132.080 m² já existentes. O investimento fez parte dos R$ 750 milhões que vêm sendo aplicados pela Vulcabras ao longo dos últimos seis anos em tecnologia e modernização das fábricas de Horizonte e Itapetinga, na Bahia, e no centro de Pesquisa & Desenvolvimento do grupo em Parobé, Rio Grande do Sul.

Teares para produção do cabedal do tênis Foto: Olympikus/Estadão

Durante o passeio pela fábrica, Bartelle contou que a Vulcabras está acima da curva de crescimento do mercado por ter investido muito nos últimos anos para fazer mais produtos e mais tipos de produtos, o que permitiu à empresa ter aparatos para fabricar tênis com qualquer tecnologia do mundo comumente usada em modelos de performance, como EVA expandida, Pebax e placas de fibra de carbono. Com o objetivo, inclusive, de agregar mais marcas no futuro além da Under Armour e Mizuno.

“Uma coisa eu digo, muito humildemente: qualquer marca que estiver dentro da Vulcabras vai performar melhor no mercado brasileiro. Temos os melhores recursos, mais experiência e mais capilaridade de distribuição, que são coisas muito importantes”, afirma. Bartelle cita como exemplo a Mizuno, que dobrou de tamanho desde que passou a fazer parte da Vulcabras há quatro anos. “Fomos agregando mais produtos ao core que é running de alta performance e lifestyle e agora vamos entrar no futebol para valer com as chuteiras, o patrocínio ao Gabigol e o patrocínio de clubes, que já estamos discutindo e em 2025 vamos ter novidades”.

Máquinas de corte a laser para cabedais mais tecnológicos Foto: Olympikus/Estadão

Com a Under Armour, a questão é outra: canal de distribuição. 80% das vendas mundiais da UA são de roupa, aqui no Brasil apenas 20%, mas poucos são os pontos de venda da marca, além das conhecidas como outlets, que na verdade são lojas mistas, que também vendem lançamentos. De acordo com Bartelle, o crescimento passa todo pela abertura de lojas próprias para ampliar a venda direta, para que o consumidor veja o diferencial da Under Armour, que é a qualidade dos tecidos e dos cortes das roupas. “Além disso, acreditamos muito na expansão do estilo militar, muito usado no Brasil para caça e pesca. Começamos a trazer as botas e vemos trazer as roupas em breve”.

No entanto, é na Olympikus, marca proprietária da Vulcabras, que a revolução é maior. Mais de duas mil pessoas foram contratadas nos últimos 18 meses para dar vazão ao sucesso da linha Corre, atualmente o modelo de corrida mais usado no País segundo os apps Strava e Corrida Perfeita. “A coleção do Corre não chegou a nem 50% do potencial que tem por aqui. E já te adianto que para o ano que vem vamos lançar dois novos tênis, sendo um deles um de performance de sola alta sem placa, porque tem muita gente que não pode usar placa. O Corre 4 é apenas um bebê, vamos ter o 10, 11, 12...”, sentencia Bartelle.

Há várias máquinas de moldes Foto: Olympikus/Estadão

Este sucesso de vendas é creditado, além dos acertos administrativos e de gestão, à estratégia de convidar a comunidade da corrida para co-criar o tênis. Pessoas do Brasil inteiro, que correm nos variados pisos e temperaturas, foram convocadas para usar e opinar sobre o tênis. E estrelas também, como Vanderlei Cordeiro de Lima, que tem ajudado a desenvolver o Corre 3 e depois o 4, com opiniões bastante favoráveis sobre o custo/benefício do tênis. “Escutamos, por exemplo, um pedido antigo de que os tênis importados são muito estreitos na frente e fizemos um Corre 4 mais largo e isso foi logo apontado como um dos motivos de compra do tênis”.

Olympikus Corre 4 Foto: Olympikus/Estadão

Olympikus quer a Europa

O próximo passo da marca é a Europa e alguns países da América Latina. A marca aposta na tendência do mercado europeu de se abrir para novas marcas, com outros players fora dos mais tradicionais crescendo muito. “Assim que acharmos o nosso posicionamento correto, sei que vamos ter sucesso porque o produto é muito bom”, afirma Bartelle. Na Argentina, a marca já vendeu mais de 1,5 milhão de pares de modelos casuais, não de running, e aguarda apenas uma segurança jurídica maior para começar a exportar o Corre, seguindo para a Colômbia e Chile.

No entanto, duas palavras que assombram os produtores brasileiros também tiram o sono da Vulcabras: custo Brasil. Segundo a Abicalçados, associação que reúne os produtores locais, o custo da mão de obra na Ásia é um terço do valor do Brasil, sendo que 40% do custo do calçado incide sobre a mão de obra. Ou seja, deixa de ser uma questão de eficiência e de produtividade. Ainda de acordo com a entidade, a situação só vai mudar quando as empresas brasileiras tiverem o mesmo incentivo governamental para exportar que os asiáticos. “Para se internacionalizar, vai chegar um ponto, infelizmente, que a Olympikus vai ter que produzir fora do país se nada mudar. Não é o que a gente quer, já que somos o maior empregador do Ceará, o quinto maior da indústria de transformação e temos muito orgulho disso”, lamenta Bartelle.

Corte do tecido é preciso Foto: Olympikus/Estadão

Da Europa para Horizonte novamente, Bartelle diz que 2024 foi um ano de expansão da fábrica, que cresce por capacidade de produto e por complexidade de tecnologia, mas que acima de tudo foi um ano de defender resultados, margens e a saúde da empresa. “De fato, as trocas de governo, seja qual for, toda a reforma tributária, tudo isso deixou o empresariado brasileiro muito apreensivo. Porque não se sabia direito quando se implementaria, que regras do jogo existiriam. Uma delas, que já está sendo implementada, é nociva, que é a reoneração da folha. 17 setores foram desonerados, um deles é o calçadista, que é um dos que mais emprega. Então, a gente já vai ter um custo maior no ano que vem, que vai ter que ser repassado em parte no produto, o resto nós vamos ter que absorver, e mesmo assim teremos que crescer”.

Para isso, os planos da Vulcabras são continuar expandindo a capacidade de produção. Uma coisa que chama muita atenção na fábrica de Horizonte é a quantidade de teares para confecção dos cabedais, as formas para criar os moldes plásticos, a expansão das solas de EVA e a facilidade com que tênis de marcas e características diferentes dividem a mesma linha de produção. O segredo, segundo Bartelle, é que a Vulcabras não é mais uma fábrica de calçados que impõe uma estratégia para o mercado, mas sim uma gestora de marcas que tem uma indústria como grande diferencial competitivo.

Digitalização da produção é cada vez maior Foto: Olympikus/Estadão

Outro foco muito importante é o da sustentabilidade. De acordo com Bartelle, a fábrica da Vulcabras em Horizonte é a mais sustentável de calçados do Brasil e talvez até do mundo. “Da Ásia com certeza”. Impulsionada por leis, mas muitas vezes por iniciativa própria, a planta cearense tem várias iniciativas interessantes. Ela usa, por exemplo, 100% de energia eólica, fruto de um projeto que recebeu investimento da empresa e que gerou um contrato de fornecimento de 13 anos. Além disso, quase todos os resíduos de produção são reutilizados em outros tênis, e os que não são viram material para botas de jardinagem e para recapear estradas. A água também é tratada para reúso, o esgoto não é jogado diretamente. “Reúso e menos descarte geram rentabilidade e competitividade, que é sempre o viés que abraçamos aqui como extra além da preservação ambiental. É investimento dentro da sustentabilidade”.

“Eu vim aqui no primeiro dia dessa empresa há 27 anos. Entrei na cidade de Horizonte e vi carne pendurada para venda, coisa bem típica do interior do Nordeste. Hoje, Horizonte é uma cidade desenvolvida, que triplicou de tamanho. Viemos para cá em condições de competitividade, por incentivos fiscais, mas também com uma missão social trabalhosa que é formar mão de obra qualificada. Tivemos que criar cultura organizacional, instalar tudo, treinar todo mundo, não foi fácil fazer. Mas hoje o Nordeste é um exemplo de produção e a qualidade dos nossos produtos é muito boa porque tem uma mão de obra também muito boa. O que resulta, no fim, em uma reputação muito positiva no mercado e bons dividendos para os nossos milhares de acionistas - 35% das ações estão espalhadas no mercado. E com esses dividendos, eles estão comprando os nossos tênis para correr. Isso dá muito orgulho”, finaliza Bartelle.

Viagem feita a convite da Vulcabras.

Cabedal do tênis é todo feito na fábrica Foto: Olympikus/Estadão

Um convite especial chegou à caixa de entrada do e-mail: conhecer a fábrica da Vulcabras em Horizonte, Ceará. Uma planta de 140,1 mil m² de área construída que fabrica os tênis da Olympikus, que têm conquistado muitos fãs no mundo das corridas, além dos modelos nacionais da Under Armour e Mizuno. É o tipo de convite que um apaixonado por sneakers não recusaria jamais. São Paulo - Fortaleza, 3 horas de voo, hotel, pernoite, uma hora de carro até a fábrica e uma boa notícia para quem torce pela indústria nacional. O complexo que a Vulcabras construiu em Horizonte não deixa nada a desejar em relação às fábricas de tênis de outros países que já visitei, dada sua versatilidade de linha, aproveitamento de materiais e processos de aferição de qualidade. Para me receber na fábrica estava Pedro Bartelle, CEO da Vulcabras, que assumiu a empresa em 2015 para mudar completamente os rumos do que vinha sendo feito e fincar a bandeira da democratização da corrida no País.

A fábrica de Horizonte abriu as portas em 1996 e passou por diversas modificações para abrigar os atuais 12 mil funcionários que produzem toda a linha de tênis esportivos das marcas Olympikus, Mizuno e Under Armour. A última expansão começou no início deste ano, com uma adição de 8.030 m² aos 132.080 m² já existentes. O investimento fez parte dos R$ 750 milhões que vêm sendo aplicados pela Vulcabras ao longo dos últimos seis anos em tecnologia e modernização das fábricas de Horizonte e Itapetinga, na Bahia, e no centro de Pesquisa & Desenvolvimento do grupo em Parobé, Rio Grande do Sul.

Teares para produção do cabedal do tênis Foto: Olympikus/Estadão

Durante o passeio pela fábrica, Bartelle contou que a Vulcabras está acima da curva de crescimento do mercado por ter investido muito nos últimos anos para fazer mais produtos e mais tipos de produtos, o que permitiu à empresa ter aparatos para fabricar tênis com qualquer tecnologia do mundo comumente usada em modelos de performance, como EVA expandida, Pebax e placas de fibra de carbono. Com o objetivo, inclusive, de agregar mais marcas no futuro além da Under Armour e Mizuno.

“Uma coisa eu digo, muito humildemente: qualquer marca que estiver dentro da Vulcabras vai performar melhor no mercado brasileiro. Temos os melhores recursos, mais experiência e mais capilaridade de distribuição, que são coisas muito importantes”, afirma. Bartelle cita como exemplo a Mizuno, que dobrou de tamanho desde que passou a fazer parte da Vulcabras há quatro anos. “Fomos agregando mais produtos ao core que é running de alta performance e lifestyle e agora vamos entrar no futebol para valer com as chuteiras, o patrocínio ao Gabigol e o patrocínio de clubes, que já estamos discutindo e em 2025 vamos ter novidades”.

Máquinas de corte a laser para cabedais mais tecnológicos Foto: Olympikus/Estadão

Com a Under Armour, a questão é outra: canal de distribuição. 80% das vendas mundiais da UA são de roupa, aqui no Brasil apenas 20%, mas poucos são os pontos de venda da marca, além das conhecidas como outlets, que na verdade são lojas mistas, que também vendem lançamentos. De acordo com Bartelle, o crescimento passa todo pela abertura de lojas próprias para ampliar a venda direta, para que o consumidor veja o diferencial da Under Armour, que é a qualidade dos tecidos e dos cortes das roupas. “Além disso, acreditamos muito na expansão do estilo militar, muito usado no Brasil para caça e pesca. Começamos a trazer as botas e vemos trazer as roupas em breve”.

No entanto, é na Olympikus, marca proprietária da Vulcabras, que a revolução é maior. Mais de duas mil pessoas foram contratadas nos últimos 18 meses para dar vazão ao sucesso da linha Corre, atualmente o modelo de corrida mais usado no País segundo os apps Strava e Corrida Perfeita. “A coleção do Corre não chegou a nem 50% do potencial que tem por aqui. E já te adianto que para o ano que vem vamos lançar dois novos tênis, sendo um deles um de performance de sola alta sem placa, porque tem muita gente que não pode usar placa. O Corre 4 é apenas um bebê, vamos ter o 10, 11, 12...”, sentencia Bartelle.

Há várias máquinas de moldes Foto: Olympikus/Estadão

Este sucesso de vendas é creditado, além dos acertos administrativos e de gestão, à estratégia de convidar a comunidade da corrida para co-criar o tênis. Pessoas do Brasil inteiro, que correm nos variados pisos e temperaturas, foram convocadas para usar e opinar sobre o tênis. E estrelas também, como Vanderlei Cordeiro de Lima, que tem ajudado a desenvolver o Corre 3 e depois o 4, com opiniões bastante favoráveis sobre o custo/benefício do tênis. “Escutamos, por exemplo, um pedido antigo de que os tênis importados são muito estreitos na frente e fizemos um Corre 4 mais largo e isso foi logo apontado como um dos motivos de compra do tênis”.

Olympikus Corre 4 Foto: Olympikus/Estadão

Olympikus quer a Europa

O próximo passo da marca é a Europa e alguns países da América Latina. A marca aposta na tendência do mercado europeu de se abrir para novas marcas, com outros players fora dos mais tradicionais crescendo muito. “Assim que acharmos o nosso posicionamento correto, sei que vamos ter sucesso porque o produto é muito bom”, afirma Bartelle. Na Argentina, a marca já vendeu mais de 1,5 milhão de pares de modelos casuais, não de running, e aguarda apenas uma segurança jurídica maior para começar a exportar o Corre, seguindo para a Colômbia e Chile.

No entanto, duas palavras que assombram os produtores brasileiros também tiram o sono da Vulcabras: custo Brasil. Segundo a Abicalçados, associação que reúne os produtores locais, o custo da mão de obra na Ásia é um terço do valor do Brasil, sendo que 40% do custo do calçado incide sobre a mão de obra. Ou seja, deixa de ser uma questão de eficiência e de produtividade. Ainda de acordo com a entidade, a situação só vai mudar quando as empresas brasileiras tiverem o mesmo incentivo governamental para exportar que os asiáticos. “Para se internacionalizar, vai chegar um ponto, infelizmente, que a Olympikus vai ter que produzir fora do país se nada mudar. Não é o que a gente quer, já que somos o maior empregador do Ceará, o quinto maior da indústria de transformação e temos muito orgulho disso”, lamenta Bartelle.

Corte do tecido é preciso Foto: Olympikus/Estadão

Da Europa para Horizonte novamente, Bartelle diz que 2024 foi um ano de expansão da fábrica, que cresce por capacidade de produto e por complexidade de tecnologia, mas que acima de tudo foi um ano de defender resultados, margens e a saúde da empresa. “De fato, as trocas de governo, seja qual for, toda a reforma tributária, tudo isso deixou o empresariado brasileiro muito apreensivo. Porque não se sabia direito quando se implementaria, que regras do jogo existiriam. Uma delas, que já está sendo implementada, é nociva, que é a reoneração da folha. 17 setores foram desonerados, um deles é o calçadista, que é um dos que mais emprega. Então, a gente já vai ter um custo maior no ano que vem, que vai ter que ser repassado em parte no produto, o resto nós vamos ter que absorver, e mesmo assim teremos que crescer”.

Para isso, os planos da Vulcabras são continuar expandindo a capacidade de produção. Uma coisa que chama muita atenção na fábrica de Horizonte é a quantidade de teares para confecção dos cabedais, as formas para criar os moldes plásticos, a expansão das solas de EVA e a facilidade com que tênis de marcas e características diferentes dividem a mesma linha de produção. O segredo, segundo Bartelle, é que a Vulcabras não é mais uma fábrica de calçados que impõe uma estratégia para o mercado, mas sim uma gestora de marcas que tem uma indústria como grande diferencial competitivo.

Digitalização da produção é cada vez maior Foto: Olympikus/Estadão

Outro foco muito importante é o da sustentabilidade. De acordo com Bartelle, a fábrica da Vulcabras em Horizonte é a mais sustentável de calçados do Brasil e talvez até do mundo. “Da Ásia com certeza”. Impulsionada por leis, mas muitas vezes por iniciativa própria, a planta cearense tem várias iniciativas interessantes. Ela usa, por exemplo, 100% de energia eólica, fruto de um projeto que recebeu investimento da empresa e que gerou um contrato de fornecimento de 13 anos. Além disso, quase todos os resíduos de produção são reutilizados em outros tênis, e os que não são viram material para botas de jardinagem e para recapear estradas. A água também é tratada para reúso, o esgoto não é jogado diretamente. “Reúso e menos descarte geram rentabilidade e competitividade, que é sempre o viés que abraçamos aqui como extra além da preservação ambiental. É investimento dentro da sustentabilidade”.

“Eu vim aqui no primeiro dia dessa empresa há 27 anos. Entrei na cidade de Horizonte e vi carne pendurada para venda, coisa bem típica do interior do Nordeste. Hoje, Horizonte é uma cidade desenvolvida, que triplicou de tamanho. Viemos para cá em condições de competitividade, por incentivos fiscais, mas também com uma missão social trabalhosa que é formar mão de obra qualificada. Tivemos que criar cultura organizacional, instalar tudo, treinar todo mundo, não foi fácil fazer. Mas hoje o Nordeste é um exemplo de produção e a qualidade dos nossos produtos é muito boa porque tem uma mão de obra também muito boa. O que resulta, no fim, em uma reputação muito positiva no mercado e bons dividendos para os nossos milhares de acionistas - 35% das ações estão espalhadas no mercado. E com esses dividendos, eles estão comprando os nossos tênis para correr. Isso dá muito orgulho”, finaliza Bartelle.

Viagem feita a convite da Vulcabras.

Cabedal do tênis é todo feito na fábrica Foto: Olympikus/Estadão

Um convite especial chegou à caixa de entrada do e-mail: conhecer a fábrica da Vulcabras em Horizonte, Ceará. Uma planta de 140,1 mil m² de área construída que fabrica os tênis da Olympikus, que têm conquistado muitos fãs no mundo das corridas, além dos modelos nacionais da Under Armour e Mizuno. É o tipo de convite que um apaixonado por sneakers não recusaria jamais. São Paulo - Fortaleza, 3 horas de voo, hotel, pernoite, uma hora de carro até a fábrica e uma boa notícia para quem torce pela indústria nacional. O complexo que a Vulcabras construiu em Horizonte não deixa nada a desejar em relação às fábricas de tênis de outros países que já visitei, dada sua versatilidade de linha, aproveitamento de materiais e processos de aferição de qualidade. Para me receber na fábrica estava Pedro Bartelle, CEO da Vulcabras, que assumiu a empresa em 2015 para mudar completamente os rumos do que vinha sendo feito e fincar a bandeira da democratização da corrida no País.

A fábrica de Horizonte abriu as portas em 1996 e passou por diversas modificações para abrigar os atuais 12 mil funcionários que produzem toda a linha de tênis esportivos das marcas Olympikus, Mizuno e Under Armour. A última expansão começou no início deste ano, com uma adição de 8.030 m² aos 132.080 m² já existentes. O investimento fez parte dos R$ 750 milhões que vêm sendo aplicados pela Vulcabras ao longo dos últimos seis anos em tecnologia e modernização das fábricas de Horizonte e Itapetinga, na Bahia, e no centro de Pesquisa & Desenvolvimento do grupo em Parobé, Rio Grande do Sul.

Teares para produção do cabedal do tênis Foto: Olympikus/Estadão

Durante o passeio pela fábrica, Bartelle contou que a Vulcabras está acima da curva de crescimento do mercado por ter investido muito nos últimos anos para fazer mais produtos e mais tipos de produtos, o que permitiu à empresa ter aparatos para fabricar tênis com qualquer tecnologia do mundo comumente usada em modelos de performance, como EVA expandida, Pebax e placas de fibra de carbono. Com o objetivo, inclusive, de agregar mais marcas no futuro além da Under Armour e Mizuno.

“Uma coisa eu digo, muito humildemente: qualquer marca que estiver dentro da Vulcabras vai performar melhor no mercado brasileiro. Temos os melhores recursos, mais experiência e mais capilaridade de distribuição, que são coisas muito importantes”, afirma. Bartelle cita como exemplo a Mizuno, que dobrou de tamanho desde que passou a fazer parte da Vulcabras há quatro anos. “Fomos agregando mais produtos ao core que é running de alta performance e lifestyle e agora vamos entrar no futebol para valer com as chuteiras, o patrocínio ao Gabigol e o patrocínio de clubes, que já estamos discutindo e em 2025 vamos ter novidades”.

Máquinas de corte a laser para cabedais mais tecnológicos Foto: Olympikus/Estadão

Com a Under Armour, a questão é outra: canal de distribuição. 80% das vendas mundiais da UA são de roupa, aqui no Brasil apenas 20%, mas poucos são os pontos de venda da marca, além das conhecidas como outlets, que na verdade são lojas mistas, que também vendem lançamentos. De acordo com Bartelle, o crescimento passa todo pela abertura de lojas próprias para ampliar a venda direta, para que o consumidor veja o diferencial da Under Armour, que é a qualidade dos tecidos e dos cortes das roupas. “Além disso, acreditamos muito na expansão do estilo militar, muito usado no Brasil para caça e pesca. Começamos a trazer as botas e vemos trazer as roupas em breve”.

No entanto, é na Olympikus, marca proprietária da Vulcabras, que a revolução é maior. Mais de duas mil pessoas foram contratadas nos últimos 18 meses para dar vazão ao sucesso da linha Corre, atualmente o modelo de corrida mais usado no País segundo os apps Strava e Corrida Perfeita. “A coleção do Corre não chegou a nem 50% do potencial que tem por aqui. E já te adianto que para o ano que vem vamos lançar dois novos tênis, sendo um deles um de performance de sola alta sem placa, porque tem muita gente que não pode usar placa. O Corre 4 é apenas um bebê, vamos ter o 10, 11, 12...”, sentencia Bartelle.

Há várias máquinas de moldes Foto: Olympikus/Estadão

Este sucesso de vendas é creditado, além dos acertos administrativos e de gestão, à estratégia de convidar a comunidade da corrida para co-criar o tênis. Pessoas do Brasil inteiro, que correm nos variados pisos e temperaturas, foram convocadas para usar e opinar sobre o tênis. E estrelas também, como Vanderlei Cordeiro de Lima, que tem ajudado a desenvolver o Corre 3 e depois o 4, com opiniões bastante favoráveis sobre o custo/benefício do tênis. “Escutamos, por exemplo, um pedido antigo de que os tênis importados são muito estreitos na frente e fizemos um Corre 4 mais largo e isso foi logo apontado como um dos motivos de compra do tênis”.

Olympikus Corre 4 Foto: Olympikus/Estadão

Olympikus quer a Europa

O próximo passo da marca é a Europa e alguns países da América Latina. A marca aposta na tendência do mercado europeu de se abrir para novas marcas, com outros players fora dos mais tradicionais crescendo muito. “Assim que acharmos o nosso posicionamento correto, sei que vamos ter sucesso porque o produto é muito bom”, afirma Bartelle. Na Argentina, a marca já vendeu mais de 1,5 milhão de pares de modelos casuais, não de running, e aguarda apenas uma segurança jurídica maior para começar a exportar o Corre, seguindo para a Colômbia e Chile.

No entanto, duas palavras que assombram os produtores brasileiros também tiram o sono da Vulcabras: custo Brasil. Segundo a Abicalçados, associação que reúne os produtores locais, o custo da mão de obra na Ásia é um terço do valor do Brasil, sendo que 40% do custo do calçado incide sobre a mão de obra. Ou seja, deixa de ser uma questão de eficiência e de produtividade. Ainda de acordo com a entidade, a situação só vai mudar quando as empresas brasileiras tiverem o mesmo incentivo governamental para exportar que os asiáticos. “Para se internacionalizar, vai chegar um ponto, infelizmente, que a Olympikus vai ter que produzir fora do país se nada mudar. Não é o que a gente quer, já que somos o maior empregador do Ceará, o quinto maior da indústria de transformação e temos muito orgulho disso”, lamenta Bartelle.

Corte do tecido é preciso Foto: Olympikus/Estadão

Da Europa para Horizonte novamente, Bartelle diz que 2024 foi um ano de expansão da fábrica, que cresce por capacidade de produto e por complexidade de tecnologia, mas que acima de tudo foi um ano de defender resultados, margens e a saúde da empresa. “De fato, as trocas de governo, seja qual for, toda a reforma tributária, tudo isso deixou o empresariado brasileiro muito apreensivo. Porque não se sabia direito quando se implementaria, que regras do jogo existiriam. Uma delas, que já está sendo implementada, é nociva, que é a reoneração da folha. 17 setores foram desonerados, um deles é o calçadista, que é um dos que mais emprega. Então, a gente já vai ter um custo maior no ano que vem, que vai ter que ser repassado em parte no produto, o resto nós vamos ter que absorver, e mesmo assim teremos que crescer”.

Para isso, os planos da Vulcabras são continuar expandindo a capacidade de produção. Uma coisa que chama muita atenção na fábrica de Horizonte é a quantidade de teares para confecção dos cabedais, as formas para criar os moldes plásticos, a expansão das solas de EVA e a facilidade com que tênis de marcas e características diferentes dividem a mesma linha de produção. O segredo, segundo Bartelle, é que a Vulcabras não é mais uma fábrica de calçados que impõe uma estratégia para o mercado, mas sim uma gestora de marcas que tem uma indústria como grande diferencial competitivo.

Digitalização da produção é cada vez maior Foto: Olympikus/Estadão

Outro foco muito importante é o da sustentabilidade. De acordo com Bartelle, a fábrica da Vulcabras em Horizonte é a mais sustentável de calçados do Brasil e talvez até do mundo. “Da Ásia com certeza”. Impulsionada por leis, mas muitas vezes por iniciativa própria, a planta cearense tem várias iniciativas interessantes. Ela usa, por exemplo, 100% de energia eólica, fruto de um projeto que recebeu investimento da empresa e que gerou um contrato de fornecimento de 13 anos. Além disso, quase todos os resíduos de produção são reutilizados em outros tênis, e os que não são viram material para botas de jardinagem e para recapear estradas. A água também é tratada para reúso, o esgoto não é jogado diretamente. “Reúso e menos descarte geram rentabilidade e competitividade, que é sempre o viés que abraçamos aqui como extra além da preservação ambiental. É investimento dentro da sustentabilidade”.

“Eu vim aqui no primeiro dia dessa empresa há 27 anos. Entrei na cidade de Horizonte e vi carne pendurada para venda, coisa bem típica do interior do Nordeste. Hoje, Horizonte é uma cidade desenvolvida, que triplicou de tamanho. Viemos para cá em condições de competitividade, por incentivos fiscais, mas também com uma missão social trabalhosa que é formar mão de obra qualificada. Tivemos que criar cultura organizacional, instalar tudo, treinar todo mundo, não foi fácil fazer. Mas hoje o Nordeste é um exemplo de produção e a qualidade dos nossos produtos é muito boa porque tem uma mão de obra também muito boa. O que resulta, no fim, em uma reputação muito positiva no mercado e bons dividendos para os nossos milhares de acionistas - 35% das ações estão espalhadas no mercado. E com esses dividendos, eles estão comprando os nossos tênis para correr. Isso dá muito orgulho”, finaliza Bartelle.

Viagem feita a convite da Vulcabras.

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.